Postado em 24 out 2014
sonhava em trabalhar na Veja. Eu sabia que gostava de escrever e que a
Veja era a maior revista do país, praticamente a única que quase todos
tinham acesso e comentavam na minha cidade.
Nasci e cresci em Laguna, uma pequena cidade de Santa Catarina, o
estado mais de direita do Brasil, numa época em que a internet não era
nada perto do que é hoje. E as matérias da Veja eram discutidas no
colégio.
Chegavam a cair em provas, como “atualidades” e a Biblioteca disponibilizava um arquivo de Vejas para pesquisa.
Talvez por isso eu não me culpo, acredito que não tinha muita escolha.
Era uma cidade com uns 50.000 habitantes, e, que eu me lembre, todos acreditavam na Veja.
Cheguei então na faculdade com esse pensamento e nas primeiras
semanas de aula lembro que um professor pediu pra que nós elegêssemos
nosso jornalista favorito. Mais de 80% da turma elegeu o Arnaldo Jabor e
o segundo mais votado foi William Bonner.
Eu também era fã do Jabor na época, mas talvez para ser diferente,
para aparecer, ou porque realmente eu pensava assim, escolhi outro: o
colunista da Veja, Diogo Mainardi.
Eu vibrava com as tiradas sarcásticas, o humor ácido e as frases
curtas do Mainardi. Pouco me importava o conteúdo que eu não entendia
direito, ou pior, eu concordava até os meus 17 anos. Ele falava de
economia, política, filosofia e xingava o Lula. Lembro que era o que eu
mais gostava: do jeito que ele xingava o Lula.
Era isso o que, na época, eu mais ouvia as pessoas fazerem em Laguna, e o Mainardi levava o xingamento a um outro nível.
Vale lembrar que o governador, os senadores, deputados e
provavelmente a maioria dos prefeitos e vereadores de Santa Catarina
eram do DEM, PP e outros partidos de extrema direita ou quase isso.
Santa Catarina sempre foi uma capitania hereditária da direita
conservadora. Talvez porque lá a desigualdade nunca existiu como em
outros estados, nem mesmo a escravidão, e ao invés de mão de obra
escrava, o estado se serviu muito bem dos imigrantes europeus. Por isso
os catarinenses são tão loiros e fazem tanto sucesso nos comerciais de
margarina.
E talvez por não ter que lidar ou mesmo ver de perto a miséria
extrema e a desigualdade obscena que afeta muito mais outros estados,
nós, catarinenses, somos um povo tão despolitizado, tão rebanho de
oligarquias direitistas e tão suscetível às manipulações grosseiras
dessa mídia criminosa na qual eu queria trabalhar até os meus 17 anos.
Mas essas são talvez apenas as minhas desculpas por ter sido tão
estúpido até essa idade e Santa Catarina é mesmo um estado lindo. Aécio
também deve ter as desculpas dele para dizer, em entrevista com a mesma
idade, que todos no Rio de Janeiro tem uma ou duas empregadas e que as
mulheres não precisam trabalhar.
Mas é que a capa criminosa da Veja dessa semana realmente foi demais
para mim e eu senti a mais profunda vergonha por um dia já ter sonhado
em trabalhar nessa revista. Vergonha por não ter percebido antes. Por
ter algum dia sido cúmplice dos crimes que ela comete em defesa dos
próprios interesses desesperados.
Se Dilma vencer no domingo, será a prova de que a Veja acabou como revista de jornalismo.
Ela pode até continuar a existir, mas deve ser ensinado nas escolas e
universidades que aquilo que ela faz tem outro nome, não é jornalismo.
Realmente não sei hoje como chamar, mas ainda espero que um dia chamemos de crime.
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