domingo, 30 de setembro de 2018

Três mitos sobre uma presidência de Bolsonaro



Três mitos sobre uma presidência de Bolsonaro

Steven Levitsky


Há quem vote no candidato acreditando que o Congresso e o Judiciário irão controlá-lo


A polarização nubla nossas percepções. À medida que um segundo turno entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad se torna cada vez mais provável, os brasileiros de centro e de centro-direita encaram uma escolha entre um candidato democrático cujas políticas eles desaprovam (Haddad) e um candidato abertamente autoritário (Bolsonaro).
Alguns abrirão mão de seus princípios democráticos por Bolsonaro. Isso é um erro histórico semelhante ao cometido pelos conservadores alemães em 1932 e pelos venezuelanos progressistas em 1998.
Para justificar seu apoio a um autoritário, muita gente diz que Bolsonaro talvez não seja tão ruim. Três argumentos são especialmente comuns. Como Daniel Ziblatt e eu descobrimos ao pesquisar para o nosso livro “Como As Democracias Morrem”, argumentos semelhantes foram propostos para candidatos autoritários em outros países. E eles foram um erro em quase todos os casos.

1. ELE NÃO FARÁ O QUE DIZ

Bolsonaro e Hamilton Mourão fizeram declarações abertamente antidemocráticas —expressando apoio a golpes de Estado, ditadura, tortura e execuções extrajudiciais. Muitos dos partidários de Bolsonaro afirmam que ele não está falando sério sobre essas coisas e que não as faria, como presidente. São “só palavras”.
Esse é um erro grave. Candidatos autoritários em sua maioria se tornam líderes autoritários. Hitler, Mussolini, Perón, Chávez, Correa, Morales, Duterte nas Filipinas e Erdogan na Turquia —todos adotaram discursos autoritários em campanha e atacaram as instituições democráticas quando chegaram ao poder. Palavras em geral se tornam atos, isso é especialmente verdadeiro quanto aos populistas como Bolsonaro. 
Populistas são eleitos sob a promessa de que atacarão o sistema. Conquistam um mandato para sepultar a elite política. Aqueles que não executam essa missão perdem apoio rapidamente. Os populistas sabem disso. E, assim, a maioria deles faz o que disse que faria.

2. ELE É INCOMPETENTE DEMAIS PARA AMEAÇAR A DEMOCRACIA

Muitos eleitores relutantes de Bolsonaro imaginam que faltaria a ele a capacidade e o poder necessários para solapar as instituições democráticas brasileiras. O Congresso ou os tribunais o deteriam. Isso é igualmente falso. Mesmo políticos aparentemente fracos e inexperientes, vindos de fora do sistema, são capazes de destruir a democracia.
A elite peruana não levou Alberto Fujimori a sério quando ele foi eleito em 1990. Mas o Peru estava em crise e os peruanos estavam zangados com seus políticos. Quando o Congresso e juízes tentaram restringir Fujimori, ele os atacou como criminosos e corruptos, definindo-os como uma elite antidemocrática que havia traído o povo peruano e estava bloqueando os esforços do presidente para resolver os problemas do país.
A maioria dos peruanos simpatizava com a visão do presidente. E quando Fujimori fechou o Congresso e aboliu a Constituição, seus índices de aprovação subiram acima dos 80%. Por conta da imensa popularidade de Fujimori, a elite não foi capaz de detê-lo. Em uma crise, quando o descontentamento público está crescendo, não é preciso talento, experiência ou um plano coerente para subverter a democracia. Basta um pouco de demagogia.

3. SOMOS CAPAZES DE CONTROLÁ-LO

Esse é o mais perigoso dos mitos. Os políticos que ajudaram a levar Mussolini, Hitler, Perón, Chávez e Erdogan ao poder tinham uma coisa em comum: todos subestimaram seus aliados autoritários. Acreditavam, incorretamente, que seriam capazes de controlá-los.
Quando os liberais italianos se alinharam com os fascistas em 1921, facilitando a ascensão de Mussolini ao poder, o fizeram por acreditar que Mussolini era um político comum, que os ajudaria a derrotar a esquerda mas que eles seriam capazes de controlar. A elite alemã ridicularizava Hitler, chamando-o de “tolo” e “palhaço”.
Os conservadores aceitaram sua indicação como chanceler (primeiro-ministro) na crença de que seriam capazes de usá-lo para buscar seus próprios objetivos políticos. O gabinete inicial de Hitler estava repleto de políticos conservadores experientes, que, ao que se acreditava, colocariam o inexperiente Hitler em seu devido lugar. O líder conservador Franz von Papen disse aos seus aliados: “Não se preocupem. Em dois meses, nós o teremos empurrado com tanta força para o canto que ele vai até apitar”.
Apoiar um candidato autoritário é um jogo perigoso que raramente termina bem. O cientista político Milan Svolik demonstrou que, sob condições de polarização como as que prevalecem hoje no Brasil, as pessoas desprezam seus rivais ideológicos a tal ponto que se dispõem a tolerar autoritarismo, do lado delas.
É assim que morrem as democracias.
Steven Levitsky
É cientista político, autor do livro "Como as Democracias Morrem"

Fux e o jogo dos sete erros




Fux e o jogo dos sete erros

Censura imposta por ministro do STF a entrevista com Lula fere a lei


Davi Tangerino
Há três dias, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux cassou decisão do ministro Ricardo Lewandowski que autorizava a Monica Bergamo a entrevistar Lula. Caso a entrevista já tivesse acontecido, Fux proibia a publicação, sob pena do crime de desobediência.
Fux fundamentou sua decisão na Lei n. 8.437/92, que confere aos presidentes de tribunais poderes de cassar liminares.
A decisão está equivocada, pelos seguintes motivos:
Primeiro. A decisão de Lewandowski não era uma liminar, ou seja, uma decisão provisória, urgente, cujo mérito seria decido mais tarde, por um colegiado do STF. Era uma decisão de mérito, tomada sozinho, a que se chama por isso mesmo de decisão monocrática. 
Segundo. A lei é expressa: apenas o Ministério Público e entidades jurídicas de direito público podem pedir a tal suspensão de liminar. Quem pediu a cassação da decisão foi o Partido Novo, que é entidade de direito privado.
Terceiro. O STF já decidiu que não cabe suspensão de liminar contra decisão de outro ministro do STF. Para a então presidente, ministra Cármen Lúcia "a redação do referido dispositivo não deixa dúvida de que é incabível ao presidente de determinado tribunal conhecer do pedido de suspensão contra decisões prolatadas por membros do mesmo órgão colegiado".
Quarto. Qual o risco à ordem pública, em uma entrevista com Lula? Há algo que ela poderia dizer que não pudesse ser dito a quem o visitasse, ou por meio de um bilhete? Algo diferente do que já foi dito até em audiências em Curitiba?
Em curtas palavras: não cabia suspensão de liminar, já que não havia nem liminar, nem risco à ordem pública e, ainda que houvesse, seria de ministro do STF, e o Partido Novo não podia pedir. 
A decisão, além disso, erra no mérito.
Quinto. Censura prévia, parte 1. Fux projeta que Lula diria coisas que desinformariam o eleitor, em exercício de futurologia que, como já dito acima, mostra-se pouco plausível já que Lula fala, e bastante, por meio de seus interlocutores. Inclusive por escrito.
Sexto. Censura prévia, parte 2. Fala, ainda, em "relativização excepcional do direito de imprensa". É tão surpreendente que um ministro do STF flerte com um precedente de tolher a liberdade de imprensa que o mais sensato talvez seja simplesmente citar outro ministro, alinhado com Curitiba, acima de qualquer suspeita em matéria de Lula: Fachin afirmou que "o STF proibiu a censura de publicações jornalísticas, bem como tornou excepcional qualquer tipo de intervenção estatal na divulgação de notícias e de opiniões, sendo certo, ainda, que eventual abuso da liberdade de expressão deve ser reparado, preferencialmente, por meio de retificação, direito de resposta ou indenização" (em decisão de 10.9.2018).
Sétimo. Criminalização da imprensa. Se a linguagem da decisão de Fachin ainda comportar alguma margem de interpretação é certo que criminalizar a liberdade de imprensa foge a padrões minimamente democráticos.
Juízes (alguns poucos, é bom frisar, porém em várias instâncias) têm tomado decisões que consideram intimamente corretas, porém mandando às favas o ordenamento jurídico e, assim, traindo a própria legitimidade da decisão que tomam. Pouco importa se Fux acha um absurdo que Lula dê entrevistas; ou que o magistrado do juizado especial de Goiânia ache as urnas eletrônicas perigosas; ou se o juiz em férias achou ruim o alvará de soltura do tribunal.
A caneta não é propriedade deles; apenas exercem um poder que o Estado lhes confere e que só é legítimo se observar o figurino legal. Se o Judiciário ignorar a lei, que legitimidade terá para exigir que os outros Poderes e os cidadãos o façam?
Davi Tangerino é advogado criminalista e professor de Direito Penal da FGV

Difícil convencer o inteligente, impossível convencer o burro


Difícil convencer o inteligente, impossível convencer o burro

Gregorio Duvivier


Enquanto o ingênuo acredita em tudo, o estúpido desconfia de qualquer coisa o que dá mais ou menos no mesmo



“Os políticos que ajudaram a levar Mussolini, Hitler, Perón, Chávez e Erdogan ao poder tinham uma coisa em comum”, diz Steven Levitsky, em artigo pra Folha. “Acreditavam, incorretamente, que seriam capazes de controlá-los.” 
Rico adora brincar de fantoche. Paulo Guedes descreve seu candidato à Piauí como um “sujeito completamente tosco” —por isso, talvez, ideal. Precisavam de um candidato ao mesmo tempo burro, pra implantar um plano econômico impopular, e autoritário, pra caso o plano não desse certo. 
Parece a premissa de uma comédia da Sessão da Tarde, em que ricos escolhem um bobo pra ser laranja —e se arrependem. “Deu a louca na Presidência! Neste verão, Adam Sandler é Bolsonaro, o candidato idiota.”

O filme obviamente, é uma bosta. Como diz o personagem de Robert Downey Jr em “Trovão Tropical”: “Never go full retard”. Vale pros atores, também vale pras eleições. 
Nada mais perigoso que a estupidez. O estúpido não ouve. “É difícil convencer uma pessoa inteligente”, diz a máxima. “Mas impossível mesmo é convencer uma pessoa burra.”
Folha descobre que a ex-mulher de Bolsonaro afirmou que ele a ameaçava de morte. A Folha é petista! A Veja apura que ele ocultou patrimônio. A Veja é comunista! 
O estúpido —de direita e de esquerda— é imune à realidade. Há quem confunda a estupidez com ingenuidade, mas enquanto o ingênuo acredita em tudo, o estúpido desconfia de qualquer coisa —o que dá mais ou menos no mesmo.
A realidade se distingue da ficção porque ela não deixa de existir se você não acreditar nela. Não acreditar na facada não impede Bolsonaro de ter feito uma colostomia. Não acreditar que ele fará um governo autoritário não impede ele de já estar sendo autoritário antes mesmo de eleito. 
E lembre-se: ninguém vai ser poupado. Também Carlos Lacerda, um dos líderes civis do golpe de 64, teve seus direitos políticos cassados no AI-5.
Gregorio Duvivier
É ator e escritor. Também é um dos criadores do portal de humor Porta dos Fundos.

Sobre o Fenômeno de Bullshit Jobs: um trabalho divertido

Sobre o Fenômeno de Bullshit Jobs: um trabalho divertido

de David Graeber

http://strikemag.org/bullshit-jobs/



No ano de 1930, John Maynard Keynes previu que, no final do século, a tecnologia teria avançado suficientemente para que países como a Grã-Bretanha ou os Estados Unidos tivessem uma semana de trabalho de 15 horas. Há todos os motivos para acreditar que ele estava certo. Em termos tecnológicos, somos capazes disso. E ainda assim não aconteceu. Em vez disso, a tecnologia foi preparada para descobrir maneiras de nos fazer trabalhar mais. Para conseguir isso, os trabalhos tiveram que ser criados que são, efetivamente, sem sentido. Imensas pessoas, na Europa e na América do Norte em particular, passam toda a sua vida profissional realizando tarefas que, secretamente, acreditam, não precisam realmente ser realizadas. O dano moral e espiritual que vem dessa situação é profundo. É uma cicatriz em toda a nossa alma coletiva.

Por que a prometida utopia de Keynes - ainda aguardada ansiosamente nos anos 60 - nunca se concretizou? A linha padrão hoje é que ele não constatou o aumento maciço do consumismo. Dada a escolha entre menos horas e mais brinquedos e prazeres, escolhemos coletivamente o último. Isso apresenta um belo conto de moralidade, mas até mesmo um momento de reflexão mostra que não pode ser verdade. Sim, testemunhamos a criação de uma variedade infinita de novos empregos e indústrias desde os anos 20, mas muito poucos têm algo a ver com a produção e distribuição de sushi, iPhones ou tênis sofisticados.

Então, quais são esses novos empregos, precisamente? Um relatório recente que compara o emprego nos EUA entre 1910 e 2000 nos dá uma imagem clara (e noto, uma coisa que praticamente ecoou no Reino Unido). Ao longo do último século, o número de trabalhadores empregados como empregados domésticos, na indústria e no setor agrícola entrou em colapso. Ao mesmo tempo, "trabalhadores profissionais, gerenciais, administrativos, de vendas e de serviços" triplicaram, crescendo "de um quarto para três quartos do emprego total". Em outras palavras, os empregos produtivos, como previsto, foram em grande parte automatizados (mesmo se você considerar trabalhadores industriais globalmente, incluindo as massas trabalhadoras na Índia e na China, esses trabalhadores ainda não são uma porcentagem tão grande da população mundial quanto eles costumava ser.)

Mas, em vez de permitir uma redução maciça de horas de trabalho para libertar a população do mundo para buscar seus próprios projetos, prazeres, visões e idéias, vimos o aumento do número de setores de 'serviços' e do setor administrativo, até e incluindo a criação de indústrias totalmente novas, como serviços financeiros ou telemarketing, ou a expansão sem precedentes de setores como direito empresarial, administração acadêmica e de saúde, recursos humanos e relações públicas. E esses números nem sequer refletem sobre todas aquelas pessoas cujo trabalho é fornecer suporte administrativo, técnico ou de segurança para essas indústrias, ou para todo o tipo de indústrias auxiliares (lavadoras de cães, entregas de pizza durante a noite inteira) que só existe porque todo mundo está gastando muito do seu tempo trabalhando em todos os outros.

É isso que proponho chamar de 'besteiras de emprego'.

É como se alguém estivesse lá fora fazendo trabalhos inúteis apenas para manter todos nós trabalhando. E aqui, precisamente, está o mistério. No capitalismo, isso é precisamente o que não deveria acontecer. Claro, nos velhos estados socialistas ineficientes como a União Soviética, onde o emprego era considerado um direito e um dever sagrado, o sistema contava com tantos empregos quanto o necessário (por isso, nas lojas de departamentos soviéticas, eram necessários três balconistas para vender). um pedaço de carne). Mas, é claro, esse é o tipo de problema que a concorrência do mercado deve consertar. De acordo com a teoria econômica, pelo menos, a última coisa que uma empresa em busca de lucro vai fazer é desembolsar dinheiro para os trabalhadores que eles realmente não precisam empregar. Ainda assim, de alguma forma, isso acontece.

Enquanto as corporações podem se envolver em um enxugamento implacável, as demissões e a aceleração invariavelmente recaem sobre a classe de pessoas que estão realmente fabricando, movimentando, consertando e mantendo as coisas; por meio de alguma estranha alquimia que ninguém consegue explicar, o número de traficantes de papel assalariado parece se expandir, e mais e mais funcionários se encontram, não diferentes dos trabalhadores soviéticos trabalhando 40 ou até 50 horas por semana no papel, mas trabalhando efetivamente 15 horas exatamente como Keynes previu, já que o resto do seu tempo é gasto organizando ou participando de seminários motivacionais, atualizando seus perfis no facebook ou baixando caixas de TV.

A resposta claramente não é econômica: é moral e política. A classe dominante descobriu que uma população feliz e produtiva, com tempo livre em mãos, é um perigo mortal (pense no que começou a acontecer quando isso começou a ser aproximado nos anos 60). E, por outro lado, a sensação de que o trabalho é um valor moral em si mesmo, e de que qualquer pessoa que não esteja disposta a se submeter a algum tipo de intensa disciplina de trabalho durante a maior parte de suas horas de vigília não merece nada, é extraordinariamente conveniente para eles.

Certa vez, ao contemplar o crescimento aparentemente interminável de responsabilidades administrativas nos departamentos acadêmicos britânicos, encontrei uma possível visão do inferno. Inferno é uma coleção de pessoas que estão gastando a maior parte do tempo trabalhando em uma tarefa que não gostam e não são especialmente boas. Digamos que eles foram contratados porque eram excelentes fabricantes de armários e, em seguida, descobrem que eles devem gastar muito do seu tempo fritando peixes. Nem a tarefa realmente precisa ser feita - pelo menos, há apenas um número muito limitado de peixes que precisam ser fritos. No entanto, de alguma forma, todos ficam tão obcecados com o ressentimento com o pensamento de que alguns de seus colegas de trabalho poderiam estar gastando mais tempo fazendo armários, e não cumprindo sua parte das responsabilidades de fritar peixe, que em pouco tempo " s pilhas infinitas de peixes mal cozidos e inúteis que se acumulam em toda a oficina e é tudo o que alguém realmente faz. Eu acho que isso é realmente uma descrição bastante precisa da dinâmica moral da nossa própria economia.

Agora, percebo que qualquer argumento desse tipo se deparará com objeções imediatas: 'quem é você para dizer quais trabalhos são realmente' necessários '? O que é necessário de qualquer maneira? Você é um professor de antropologia, qual é a “necessidade” disso? (E, de fato, muitos leitores de tablóides considerariam a existência do meu trabalho como a própria definição de gasto social desperdiçador.) E, em um nível, isso é obviamente verdade. Não pode haver medida objetiva de valor social.

Não pretendo dizer a alguém que está convencido de que está fazendo uma contribuição significativa para o mundo que, na verdade, não é. Mas e as pessoas que estão convencidas de que seus empregos não têm sentido? Não faz muito tempo, voltei a entrar em contato com um amigo de escola que não via desde os 12 anos. Fiquei impressionado ao descobrir que nesse ínterim ele havia se tornado o primeiro poeta, depois o vocalista de uma banda de indie rock. Eu tinha ouvido algumas de suas músicas no rádio sem ter ideia de que o cantor era alguém que eu realmente conhecia. Ele era obviamente brilhante, inovador, e seu trabalho tinha inquestionavelmente iluminado e melhorado as vidas das pessoas em todo o mundo. No entanto, depois de alguns álbuns sem sucesso, ele perdeu o contrato, e atormentado com dívidas e uma filha recém-nascida, acabou, como ele disse, "tomando a escolha padrão de tantas pessoas sem direção: escola de direito." Agora ele é um advogado corporativo que trabalha em uma importante firma de Nova York. Ele foi o primeiro a admitir que seu trabalho era totalmente sem sentido, não contribuía em nada para o mundo e, em sua própria opinião, não deveria realmente existir.

Há muitas perguntas que alguém poderia fazer aqui, começando com o que diz sobre nossa sociedade que parece gerar uma demanda extremamente limitada por talentosos poetas-músicos, mas uma demanda aparentemente infinita por especialistas em direito empresarial? (Resposta: se 1% da população controla a maior parte da riqueza disponível, o que chamamos de 'mercado' reflete o que eles consideram útil ou importante, e não qualquer outra pessoa.) Mas ainda mais, isso mostra que a maioria das pessoas nesses empregos finalmente ciente disso. Na verdade, eu não tenho certeza se já conheci um advogado corporativo que não achava que o trabalho deles fosse uma besteira. O mesmo vale para quase todas as novas indústrias descritas acima. Há toda uma classe de profissionais assalariados que, se você os conhecer em festas e admitir que você faz algo que pode ser considerado interessante (um antropólogo,

Esta é uma profunda violência psicológica aqui. Como alguém pode começar a falar de dignidade no trabalho de parto quando alguém secretamente sente que seu trabalho não deveria existir? Como não pode criar uma sensação de raiva profunda e ressentimento? No entanto, é o gênio peculiar de nossa sociedade que seus governantes descobriram uma maneira, como no caso das fritadeiras, de assegurar que a raiva seja dirigida precisamente contra aqueles que realmente conseguem fazer um trabalho significativo. Por exemplo: em nossa sociedade, parece haver uma regra geral de que, quanto mais obviamente o trabalho de uma pessoa beneficia outras pessoas, menos provavelmente será pago por ela. Mais uma vez, uma medida objetiva é difícil de encontrar, mas uma maneira fácil de obter um sentido é perguntar: o que aconteceria se toda essa classe de pessoas simplesmente desaparecesse? Diga o que quiser sobre enfermeiras, coletores de lixo ou mecânicos, É óbvio que se eles desaparecessem em uma nuvem de fumaça, os resultados seriam imediatos e catastróficos. Um mundo sem professores ou estivadores logo estaria em apuros, e mesmo um sem escritores de ficção científica ou músicos ska seria claramente um lugar menor.Não está totalmente claro como a humanidade sofreria se todos os CEOs, lobistas, pesquisadores de relações públicas, atuários, operadores de telemarketing, oficiais de justiça ou consultores jurídicos de similaridade desaparecessem. (Muitos suspeitam que isso possa melhorar bastante.) No entanto, além de algumas exceções bem-elogiadas (médicos), a regra é surpreendentemente boa.

Ainda mais perverso, parece haver um sentido amplo de que é assim que as coisas deveriam ser. Este é um dos pontos fortes secretos do populismo de direita. Você pode ver isso quando os tablóides aumentam o ressentimento contra os trabalhadores de tubo para paralisar Londres durante as disputas contratuais: o próprio fato de que os trabalhadores do metrô podem paralisar Londres mostra que seu trabalho é realmente necessário, mas isso parece ser precisamente o que incomoda as pessoas. É ainda mais claro nos EUA, onde os republicanos tiveram um sucesso notável em mobilizar ressentimento contra os professores ou trabalhadores da indústria automobilística (e não, significativamente, contra os administradores escolares ou gerentes da indústria automobilística que realmente causam os problemas) por seus salários e benefícios supostamente inchados. É como se eles estivessem sendo informados 'mas você pode ensinar crianças! Ou faça carros! Você começa a ter empregos reais!

Se alguém tivesse projetado um regime de trabalho perfeitamente adequado para manter o poder do capital financeiro, é difícil ver como eles poderiam ter feito um trabalho melhor. Trabalhadores reais e produtivos são implacavelmente espremidos e explorados. Os restantes dividem-se entre um estrato aterrorizado do estrato universalmente injuriado e desempregado e um estrato maior que são basicamente pagos para nada fazer, em posições destinadas a identificá-los com as perspectivas e sensibilidades da classe dominante (gestores, administradores, etc.). ) - e particularmente seus avatares financeiros - mas, ao mesmo tempo, promover um ressentimento fervente contra qualquer pessoa cujo trabalho tenha valor social claro e inegável. Claramente, o sistema nunca foi projetado conscientemente. Surgiu de quase um século de tentativa e erro. Mas é a única explicação para por que, apesar de nossas capacidades tecnológicas,

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

‘NA DITADURA TUDO ERA MELHOR’. ENTENDA A MAIOR FAKE NEWS DA HISTÓRIA DO BRASIL.


‘NA DITADURA TUDO ERA MELHOR’. ENTENDA A MAIOR FAKE NEWS DA HISTÓRIA DO BRASIL.

João Filho
The Intercept Brasil

22 de Setembro de 2018, 23h50

O CAPITÃO JAIR BOLSONARO acredita que a ditadura militar foi uma época dourada para o Brasil. “Era completamente diferente de hoje. Naquele tempo você tinha liberdade, segurança, ensino de qualidade, a saúde era melhor.”

Apesar de nem as vírgulas dentro dessas aspas serem verdadeiras, a lorota de Bolsonaro tem colado com certa facilidade. Não é raro encontrar jovens defendendo o regime militar. Há também os que viveram a época e garantem que tudo era melhor. Todos da minha geração tem um tio, um pai ou um avô que afirma com muita convicção que o ensino público era fantástico, que não havia corrupção, que a economia bombava e que se podia andar tranquilamente nas ruas sem medo da violência. Mas essas experiências particulares não refletem exatamente o que se passava com a totalidade dos brasileiros naquele período. A bolha do seu tio não representa o Brasil.

A verdade é que os brasileiros conhecem pouco sobre a ditadura militar instalada no país. Pesquisa Datafolha de 2008 revelou que oito entre dez brasileiros nunca ouviram falar do AI-5, o principal símbolo do período militar. O AI-5 autorizou os militares a fechar o Congresso e a cassar mandatos, suspendeu direitos políticos de todos os cidadãos, estabeleceu a censura prévia à imprensa, entre outras arbitrariedades próprias de ditaduras.

Talvez alguns considerem que esse foi o custo a se pagar para termos uma boa segurança pública, uma economia forte e uma educação qualidade. Bom, nós não tivemos nada disso. Ao fim da ditadura, os militares devolveram aos civis um país em frangalhos em todas essas áreas.  A herança maldita até hoje não foi superada e muitos dos nossos problemas atuais foram originados naquele período.

O capitão Bolsonaro e o general Mourão apostam no desconhecimento do brasileiro e se apresentam como os representantes do período militar. E até aqui estão se saindo muito bem nessa missão.

O tão falado “milagre econômico” durou apenas cinco anos entre os 21 do regime. De 1968 a 1973, enquanto o nível de repressão aumentava com o AI-5, o crescimento do PIB foi gigantesco, com média de 10% de crescimento ao ano, alcançando 14% em 1973. O que Bolsonaro e sua turma não contam é que embutido nesse boom econômico veio o boom da concentração de renda e da desigualdade social. Quando estourou a crise da dívida externa, o PIB despencou, chegando a ter índices negativos em 1981 e 1983, dando início à chamada “década perdida”.

Logo no início do regime, a inflação caiu bastante graças ao arrocho salarial, ou seja, às custas do trabalhador. Caiu de 92% para 34% no primeiro ano, mas disparou nos anos 1980, chegando em 1985 com um número espantoso de 242%. A dívida externa em 1964 era de US$ 3,4 bilhões. Em 1985, era de US$ 91 bilhões. Esse é o legado econômico que os militares deixaram para o país. E quem leu o projeto de Bolsonaro para economia tem certeza de que o futuro pode ser ainda pior.

Para o ensino público brasileiro, a ditadura também foi uma tragédia. Apesar de ter aumentado o contingente de alunos após tornar o ensino obrigatório, os investimentos em educação foram pífios. A combinação de professores com baixos salários, falta de material básico e contratação de docentes sem formação piorou consideravelmente a qualidade de ensino. No fim da ditadura, em 1982, o Banco Mundial divulgou um estudo em que o Brasil aparecia com o menor percentual de gasto público em educação da América Latina: 6,5% do PIB, aproximadamente o mesmo percentual gasto hoje. O cenário era tão miserável que, em algumas regiões, era bastante comum ter professores sem o 1º grau completo dando aula para estudantes do 1º grau.

Segundo a professora Renata Machado de Assis, da Universidade Federal de Goiás, em um artigo acadêmico sobrena estrutura física das escolas, que apresentaram condições precárias de uso; no número de professores leigos, que aumentou entre 1973 e 1983, fato que se mostrou mais grave na região Nordeste, onde 36% do quadro docente tinha apenas o 1º grau completo; e nos salários e condições de trabalhos dos professores, que sofreram um crescente processo de deterioração”.

A violência urbana também aumentou durante a ditadura. Os números da criminalidade são muito menores do que os de hoje, mas maiores do que no período anterior ao golpe. Não era a calmaria que Bolsonaro apregoa por aí. Foi justamente durante o regime militar que a criminalidade começou a aumentar. Em artigo para a Gazeta do Povo no ano passado, Maurício Brum conta como o endurecimento do regime não teve nenhum efeito na redução dos crimes. “Um caso sintomático é o de São Paulo, maior cidade do Brasil. Segundo levantamento feito pelo jornal O Estado de São Paulo em 2012, até o início da década de 1960 o índice de homicídios na cidade raramente superava 5 a cada 100 mil habitantes. Em 1985, ao final da ditadura, esses números haviam subido para 36,9. O índice seguiria subindo até o final dos anos 1990, antes de entrar em declínio – hoje a taxa de homicídios em São Paulo é de 7,4 a cada 100 mil paulistanos.” Então, pode acrescentar mais isso na conta dos militares: o alto índice de criminalidade no Brasil também é um legado da ditadura.

Nessa semana, encontrei alguns vídeos* no Youtube que ilustram bem o drama que o Brasil vivia ao final da ditadura militar. Recortei cinco trechos que mostram rebeliões em presídios, greves, corrupção, enfim, tudo aquilo que Bolsonaro garante nunca ter existido durante esses tempos de escuridão.



Globo Repórter de 31 de janeiro 1982

Procurador que investigava a Fraude da Mandioca no Banco do Brasil foi assassinado por um major. Parece mesmo que na ditadura do Bolsonaro reinava a paz e a ética na política.






Globo Repórter de 01 de janeiro de 1983 – Retrospectiva 1982

Rebeliões em presídios e trabalhadores sem receber salário apanhando por protestar. No regime militar era tudo diferente, né?







Edição do Jornal Nacional de julho de 1984

O preço do trigo e farinha nas alturas porque o FMI mandou reduzir os subsídios. Essa era a realidade da época que Bolsonaro trata como anos dourados.





Edição do SPTV do dia 26 fevereiro de 1985

A ditadura militar havia acabado de chegar ao fim. Diferentemente do que prega Bolsonaro, o caos imperava no Brasil. Greves, crise econômica e violência nas ruas. Foi assim que a ditadura militar entregou o país para os civis. A violência urbana era tão grande que o então secretário de segurança pública Michel Temer prometeu colocar mais Rota, a tropa de elite mais temida do país, na rua.





*Todos os trechos foram recortados de vídeos postados pelo canal Pedro Janov

domingo, 23 de setembro de 2018

Imagina eu num pau de arara?

Imagina eu num pau de arara?


Antonio Prata


Acho absurdo pensar que poderia ser morto por uma ditadura em pleno século 21



Caro (e)leitor, cara (e)leitora, se você gosta das minhas crônicas e pretende votar no Bolsonaro, “spoiler alert”: no caso de uma ditadura
como a que já foi mais de uma vez aventada pelo capitão e seu escudeiro Mourão, eu sou o típico sujeito que vai pro pau de arara ou “desaparece”. Como é extremamente difícil digitar de cabeça pra baixo e ter boas 
sacadas “desaparecido”, talvez seja de bom tom, enquanto ainda me encontro com os pés cravados no chão e sem balas cravadas na testa, sugerir que mudem de candidato —ou de cronista. 
Desenho em vermelho de homem pendurado
Adams Carvalho
Caso optem pela segunda opção, lá por 2020, 2021, quando o bicho
 estiver pegando, quando as atitudes autoritárias do governo houverem gerado protestos e os protestos derem a desculpa para revogarem os direitos individuais em nome da “restauração da ordem” contra as “forças da anarquia” —esse “Vale a Pena Ver de Novo” que reprisamos a cada três ou quatro décadas em nossa “democracinha”—, quando, enfim, eu, digamos, der uma morrida, vocês não perderão um colunista. 
O (e)leitor pode achar que exagero. Também acho absurdo, às vezes, pensar que eu poderia ser assassinado por uma ditadura em pleno século 21, no Brasil, mas aí ligo a TV, abro o jornal, atolo no Facebook e vejo as declarações do candidato. Lá está o Bolsonaro dizendo que esse país só vai dar certo quando fizermos “o trabalho que o regime militar não fez, matando uns 30 mil”. Se ele falasse em matar 3.000 eu me calaria, humildemente, ciente de que tem gente muito mais importante para ser assassinada antes de mim. Mas pra uma baciada de 30 mil sem dúvida eu me qualifico.
“Ah”, dirá o leitor, “é entrevista antiga, de 1999. O Bolsonaro já disse que mudou de ideia”. Bom, mês passado o candidato gritou num comício, usando um tripé de câmera como se fosse uma arma, “vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre!”. Eu não sou petista. Sou, como escrevi anos atrás, “meio intelectual, meio de esquerda”, hoje com inegável viés “meio coxinha, meio burguês”, mas neste tipo de noite que se aproxima todos os gatos são rubros e até explicar que focinho de porco não é tomada um fio desencapado já pode estar ligando meu intestino à hidrelétrica de Itaipu. 
“Ah”, dirá o leitor, “o ‘Mito’ não fala sério! É brincadeira!”. É? Em julho,
 no Roda Viva, Bolsonaro declarou que seu livro de cabeceira é “Verdade Sufocada”, de autoria do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o chefe
 da tortura no DOI-Codi. Em 1975, Vladimir Herzog, um jornalista sem qualquer ligação com a luta armada, um cara assim como eu, pai de um filho de nove e outro de sete, se apresentou voluntariamente ao DOI-Codi para “esclarecimentos” e foi “suicidado” na base da porrada e do eletrochoque
Não acredito que você, caro (e)leitor, cara (e)leitora que pretende votar no Bolsonaro, seja a favor dessa barbárie. Acredito que esteja desiludido, cansado, com raiva e coloque os abusos do passado na conta da Guerra Fria. Mas não estamos falando do passado. Estamos falando de hoje. De amanhã. Imagina eu, de cabeça pra baixo, nu, tomando choque, amanhã. Estranho, não é?
Você é de direita? Repudia o PT? Vote no Amoêdo. No Alckmin. No Meirelles. No Ciro. Na Marina. Em nenhum desses casos eu morro no final. Desculpa se pareço um pouco autocentrado, mas é que esta é a única vida que eu tenho; gostaria bastante de ver meus filhos crescerem e, se não for pedir muito, evitar choques em minhas partes pudendas. É um tanto incômodo, dizem os que sobreviveram ao ídolo do capitão.
Antonio Prata

sábado, 22 de setembro de 2018

Palavras canalhas



Palavras canalhas, 


por Sergio Saraiva

Houve um tempo em que a dor era canalha, mas as palavras eram de luta e esperança. Hoje, vivemos um tempo de desesperança feito de palavras canalhas.
FHC
Palavras canalhas, por Sergio Saraiva
A carta aberta de Fernando Henrique Cardoso aos “eleitores e eleitoras”, vinda à luz na boca da noite de 20 de setembro de 2018, não deveria merecer maiores cuidados. Para pouco servirá, até porque, no mais, recheada de platitudes.
“Não é de estagnação econômica, regressão política e social que o Brasil precisa. Somos todos responsáveis ... É hora de juntar forças e escolher bem ... Pensemos no país e não apenas nos partidos ... A Nação é o que importa neste momento decisivo”.
Desimportante até pelo meio a que veio a público – um textão de Facebook.
FHC 1
Considerando ser FHC tratado como o principal líder do PSDB, considerando que a tal carta trata das eleições presidenciais de 2018 e que seu partido dispõe de 40% do tempo total de televisão do horário eleitoral, seria de esperar que parte desse tempo fosse empregado para um pronunciamento oficial de FHC.
Ocorre que FHC é escondido por seu partido há cinco eleições – e seu partido deve ter razões para isso. Restou-lhe as “mídias sociais”.
Mas a carta de FHC é paradoxalmente também muito importante. Vivemos um tempo canalha e poucos textos o traduzem tão bem quanto o de FHC. Poucas vezes li palavras igualmente tão canalhas – canalhas nas suas omissões, canalhas nas suas afirmações. Canalhas quando tomam seus pretensos destinatários – o povo brasileiro – por idiotas a ponto de crer que creríamos em um texto canalha.
Comecemos pelas omissões. FHC omite o nome de seu próprio candidato - o pressuposto beneficiário da missiva fernandina. Nenhuma novidade, em se tratando de FHC. Só há um candidato possível para FHC; o próprio FHC. Eis um dos porquês de seu partido o esconder. Claro, há outros. Os oitos anos dos governos FHC.
Esses, no entanto, até FHC os omite em sua carta – lembra-nos de seus dois anos como de ministro da Fazenda de Itamar Franco:
“Fui ministro de um governo fruto de outro impeachment, processo sempre traumático. Na época, a inflação beirava 1000 por cento ao ano. ...Com meu apoio e de muitas outras pessoas, lançou-se a estabilizar a economia. Criara as bases políticas para tanto”.
E, escudado nisso, foi eleito presidente. E comprou no Congresso os votos necessários para permitir sua candidatura à reeleição. Dois mandatos nos quais o país foi vendido no limite da irresponsabilidade a troco de moeda podre. As relações trabalhistas foram precarizadas. Os banqueiros socorridos com bilhões, enquanto o povo empobrecido voltou a cozinhar com lenha e o salário mínimo jamais atingiu o valor de 100 dólares. A taxa de desemprego era de mais de 12%. O FMI nos humilhava a pagarmos os juros por um empréstimo que ficava em seus cofres. Era a garantia aos credores que não acreditavam nas "cartas de intenções" dos governos FHC. Quem acreditaria? Era nos recomendado que esquecêssemos o que antes escreveram - sofreríamos menos com o engodo.
Eis o porquê o PSDB esconde e FHC omite. FHC é o Temer de ontem. Até em suas traições.
E o que dizer quando FHC afirma: em plena vigência do estado de direito, nosso primeiro compromisso há de ser com a continuidade da democracia. Ganhe quem ganhar, o povo terá decidido soberanamente o vencedor e ponto final. A democracia para mim é um valor pétreo”?
Afirma e omite que foi seu partido que se insubordinou contra os resultados das urnas de 2014 e buscou nas extravagâncias do poder judicial reverter o que o povo havia decidido soberanamente. Que valor pétreo é esse que não o fez impedir Aécio Neves e suas pautas bombas?
FHC 6
Quanto há de calhorda nas palavras daquele que aponta o dedo para o líder preso por acusações de corrupção” e seu “representante”, mas omite que foram, ele próprio e seu partido, dispensados de dar explicações sobre as acusações que lhes pesavam?
FHC 3
Quem é o desonesto? O que foi preso baseado apenas em “acusações de corrupção” e nenhuma prova, ou aquele a quem a Justiça não se interessou em investigar, mesmo havendo motivos para fazê-lo? Um dossiê completo, vindo do Ministério Público da Suíça, dormitou por dois anos na gaveta de um procurador da República, até começar a andar a passos de cágado para chegar a lugar nenhum.
FHC 4
FHC se omite da resposta. Toma-nos por idiotas que não lhe questionaríamos.
Por fim, a afirmação canalha de que “basta de pregar o ódio. Canalha não a afirmação em si, canalha a omissão de que o ódio é a herança maldita e consequente da pregação política de FHC – por suas afirmações e omissões. Que se alternam segundo seus interesses.
Quem ainda acredita nas suas orações?
Com a palavra, os seguidores de FHC.
FHC 2

PS: Oficina de Concertos Gerais e Poesia - mantendo a vela acesa que é para a bruxa não voltar.

A guerra após as eleições



A guerra após as eleições. 

Por Nilson Lage

Há pouco mais de dois séculos, confrontando o exército de Napoleão, o prussiano Carl Von Clausevitz observou que a guerra era claramente continuação da política “por outros meios”. Isso foi verdadeiro por muito tempo. No entanto, o presidente que assumir o governo após as próximas eleições no Brasil fará bem se, pelo contrário, entender a política como continuação da guerra “por outros meios”, e perceber o quanto ela está ameaçada.
A guerra, escreve Clausevitz, é fruto do ódio que espera o acaso (ou a oportunidade) para impor sua razão estratégica. O que ocorre na atualidade é que o ódio ameaça extinguir a política, sublimação da guerra, e, no vácuo, ocupar o espaço das instituições públicas com a lógica insensível das empresas.
O ódio prevalece quando a motivação principal da disputa não é tal ou qual objetivo social – uma linha de ação, uma projeto de sociedade –, mas o esmagamento do adversário, a que se atribuem condições degradantes sem relação necessária com a realidade. Estamos vendo isso.
A própria noção de guerra se transformou desde que se desenvolveram armas – nucleares e biológicas – tão poderosas que não podem ser usadas. Apoiados em métodos estatísticos e na manipulação de grandes dados, os senhores da guerra passaram a priorizar estratégias alternativas ao confronto militar; buscam colocar a seu serviço corporações que dispõem de poder e promovem operações cada vez mais complexas de domínio da consciência e da opinião pública através do controle dos sistemas de educação e informação.
Pode-se dizer que o conflito que se trava aqui e por toda parte descende do confronto entre Oriente e Ocidente após a derrota do nazismo alemão, mas é fato que se transformou a partir do momento em que, nos anos 1970. a moeda em que se processam os negócios internacionais despregou-se de qualquer referência (o ‘lastro em ouro’) e passou a ser emitida caudalosamente, gerando mercado diversificado de esperanças quanto a lucros futuros.
Na aparência, reproduzem-se eventos heroicos – os da expansão do império anglo-saxão como, antes, dos impérios persa ou romano. No entanto, a essência, menos evidente, é inovadora, radical e perversa: reside na submissão de todos os bens e serviços de que dispõe a humanidade a valores em moeda convencional (a “caudalosa”), desconsiderando os demais aspectos ambientais, sociais e humanos.
Diante desse quadro e na particularidade da situação brasileira – a de um país que é, no momento, mais campo de disputa do que combatente apto –, o novo governo que (e se) sobreviver ao ódio, deverá promover a unificação das forças políticas capazes de resistir ao processo destrutivo das instituições, com vista aos objetivos nacionais comuns. Para isso, será necessário confrontar ou silenciar os mecanismos de monopolização do discurso público já estruturados.
A sociedade brasileira está “condenada” a ser multirracial e multicultural – portanto, tolerante. Não descende exclusivamente do patrimonialismo português, como difunde a História escrita há décadas pela USP, nem do escravismo, como querem os críticos de matriz europeia. É mais complicada: forjou-se em lutas de classes que transcorreram de maneira distinta nos vários núcleos coloniais do vasto território, cuja unificação se fez por obra dos exércitos do Império e, após o interregno oligárquico da República Velha, reconstitui-se na ideologia oriunda do movimento dos tenentes. Vem daí a presença marcante do conceito de nação que se firmou na era Vargas.
As pesquisas pré-eleitorais atestam o quanto ainda está presente no sentimento do povo e porque é nele que se pode apoiar a restauração da normalidade.

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

A verdadeira corrupção


A verdadeira corrupção -


 VLADIMIR SAFATLE

Enquanto polemiza, Bolsonaro espera esconder a corrupção final do Estado brasileiro

Os eleitores do sr. Bolsonaro gostam de se ver no interior de uma cruzada redentora contra a corrupção centenária do Estado brasileiro. Mas há de se perguntar se isso não é apenas um conhecido capítulo do sistema de autoengano que acomete setores da sociedade do país.
Afinal, seria bom começar por se perguntar sobre o que significa, de fato, corrupção. Se aceitarmos que estamos a falar dos processos de apropriação privada do bem comum, teremos que admitir que se pratica corrupção de várias formas. Há os casos nos quais a corrupção será o desvio de fundos públicos por agentes privados, sejam eles indivíduos, associações ou partidos.
No entanto, há ainda dois casos mais brutais de corrupção, casos nos quais a apropriação privada do bem comum é ainda mais explícita. O primeiro é o exemplo privilegiado de corrupção no interior da filosofia política. Trata-se da tirania e do autoritarismo. A tirania é a pior forma de corrupção porque ela é a apropriação violenta da força do estado e de sua soberania por grupos particulares. Vimos como isso funciona na ditadura militar, a mesma ditadura que o sr. Bolsonaro e seus seguidores admiram e da qual eles louvam as práticas.
O autoritarismo corrompe o bem comum não apenas porque permite aos ocupantes do Estado desviarem fundos públicos (lembre-se dos casos Capemi, Coroa Brastel, Projeto Jari, Brasilinvest, Petropaulo, entre tantos outros que marcaram a ditadura).
Ele corrompe o bem comum não apenas por fazer do Estado agente de assassinato, estupro, ocultação de cadáveres e tortura perpetrada por bandidos como o sr. Ustra, que Bolsonaro canoniza.
Ele corrompe o bem comum porque saqueia a soberania popular. Para quem não sabe o que é saque da soberania popular, pergunte ao vice do sr. Bolsonaro, o general Mourão. O mesmo que sonha com uma nova constituição escrita não por representantes do povo, mas por "notáveis". Ou perguntem ao general Villas Bôas, que costuma chantagear a sociedade civil a propósito de suas escolhas eleitorais enquanto aponta um revólver em nossa direção.
Mas, além da tirania, há outra forma insidiosa de corrupção, a saber, a plutocracia, o governo dos ricos para a defesa incondicional de seus próprios interesses. A mesma plutocracia que Bolsonaro e seu "cérebro" Paulo Guedes querem implementar de vez no Brasil.
Enquanto cria polêmicas criminosas com homossexuais, negros e mulheres, Bolsonaro espera esconder que seu "governo" será a corrupção final do Estado brasileiro, pois será a entrega final do bem comum à mesma elite que sempre governou o país, mas agora sem necessidade de intermediários e de negociação com outros setores.
Há dias descobrimos que o sr. Guedes pretende reduzir o imposto de renda dos mais ricos, de 27% para 20%. Uma proposta obscena dessa natureza demonstra para quem essas pessoas querem realmente governar.
Em terras liberais como o Reino Unido, os impostos são progressivos até 50%, o que permite ao Estado oferecer serviços públicos aos mais pobres.
No mundo de Guedes, esses serviços inexistirão. O SUS (um sistema que garante saúde gratuita para 206 milhões de pessoas) será sucateado até sua morte, as agências de pesquisa e tecnologia serão letra morta, as universidades públicas deixarão de ser gratuitas, os museus queimarão e tudo o que ouviremos é o sr. Bolsonaro a dizer: "Já foi, o que você quer que eu faça?".
Sua proposta pueril de "privatizar tudo" para amortizar até 20% da dívida pública significa destruir todo bem comum de empresas estatais estratégicas para o país, que produzem tecnologia nacional e garantem que dividendos não sejam remetidos para fora do Brasil, a fim de entregar o resultado do saque aos detentores de títulos da dívida pública, ou seja, em sua grande maioria bancos, especuladores, rentistas.
Sua defesa da reforma trabalhista significa quebrar toda força de defesa da classe trabalhadora contra a espoliação a que ela está normalmente submetida em suas "negociações" com o patronato. Negociações nas quais os trabalhadores verão, de forma cada vez mais abertas, contratos que diminuem salários, benefícios, férias e direitos. Enquanto isso, o governo comandará caças a "kits gay" inexistentes e organizará lutas contra "comunistas" imaginários. Diante de corrupção dessa natureza, o que vimos até agora é nada.