Em que momento ficou decretado que o burro do fundão tinha mais autoridade do que a professora?
Antonio Prata
Em que momento, exatamente, decidimos globalmente
que ser legal não era legal? Em que ano, que mês, que dia, ficou
decretado que o burro do fundão que bota tachinha na cadeira da
professora tinha mais autoridade do que a professora? Que mecanismo
esdrúxulo da psicologia social nos fez (e faz) crer que a busca pela
paz, pelo respeito, pela tolerância, pela preservação do meio ambiente e
contra a desigualdade são frescuras de gente fraca ou um complô
comunista para destruir a sociedade?
Pois são estas distorções mentais que a ascensão de Trump, Bolsonaro,
Orbán, Erdogan, Salvini e tantos outros ogros coroa, muito mais do que
uma onda da direita. Bolsonaro foi eleito repetindo vez após outra que
seu ídolo era o torturador Brilhante Ustra. Não Margaret Thatcher. Não Ronald Reagan. Não os economistas Mises ou Hayek.
Ustra. Um açougueiro que levou crianças de cinco anos para verem os
pais destruídos após uma sessão de tortura. (O menino não reconheceu a
própria mãe, desfigurada). Bolsonaro dedicou o voto do impeachment de
Dilma ao torturador e declarou no programa Roda Viva que seu livro de
cabeceira era a biografia do carrasco. Admiradores de ditaduras costumam
mentir para esconder a selvageria. Bolsonaro, não: parece ter uma
fixação justamente pelas sevícias. Fez da ação humana mais abjeta a sua
bandeira —e foi eleito.
Adams Carvalho/Folhapress
Ilustração em
estilo realista preta e branca. No primeiro plano, há um rato e, no
fundo, uma roda de exercícios para roedores parada no chão.
Como toleramos tamanha excrescência? Admitir que uma pessoa que aplaude
torturadores seja nosso presidente porque fará reformas econômicas
necessárias é como levar os filhos num pediatra sabidamente pedófilo
porque é um médico competente. “Abusou do meu filho? Sim, abusou, é o
jeitão dele, mas a febre, ó, baixou que é uma beleza!”.
A maior crise que enfrentamos, globalmente, não é a pandemia de
coronavírus e nem a recessão mundial que ela provavelmente trará, ambas
passarão: é uma crise de valores. Valores estes que os próprios
ostrogodos que nos desgovernam fingem defender. O sujeito que repete
como um papagaio “Brasil acima de tudo” incentiva manifestações no meio
de uma pandemia e mesmo estando em quarentena, sai do palácio e dá a mão
para centenas de aduladores. Coloca em risco, assim, a vida de milhares
de brasileiros. O mesmo sujeito que repete como um autômato “Deus acima
de todos” rasga os evangelhos toda vez que abre a boca ou faz arminha
com a mão.
Escrevi na última crônica que a quarentena, turbinada pelas redes sociais e suas fake news, iria mandar o mundo de vez para a cucuia.
Depois de dez dias em casa, porém, a sensação tem sido outra. É cedo
pra fazer qualquer previsão, as notícias mudam a cada hora e ninguém
sabe o que nos aguarda, mas existe uma chance de ouro de que este
circuit breaker global faça com que paremos de correr como ratinhos numa
roda de egoísmo e imbecilidade e nos dediquemos a alguma reflexão.
Precisamos repensar profundamente a sociedade. Não falo aqui da idade
mínima para aposentadoria de tal ou tal categoria ou das alíquotas de
imposto de renda desta ou daquela faixa de remuneração. Tais discussões
são importantes, é claro, mas antes delas temos que recriar uma linha
entre o que é tolerável e o que é intolerável. Antes dos marcos
regulatórios, temos que estabelecer os marcos civilizatórios.
Por tudo que nos ameaça, 2020 pode entrar para a história como o pior
ano das nossas vidas. O que significa que, depois dele, as coisas devem
melhorar. Não se trata de otimismo, mas de instinto de sobrevivência.
Se não trocarmos o ódio e a violência pela esperança e pelo amor, já, a
humanidade não chega até a esquina. Tá ok?
Torço para que o coronavírus, a exemplo da peste negra, abrevie o obscurantismo medieval em que nos metemos.
Fernanda Torres
Devo a João Ubaldo Ribeiro a indicação do livro “A Distant Mirror”, da historiadora americana Barbara Tuchman,
sobre o calamitoso século 14 na Europa. Trata-se do período da peste
negra, originada na Ásia central, que dizimou dois terços da população
europeia e deu um fim à Idade Média.
É uma leitura e tanto para a quarentena de agora.
A
Guerra dos Cem Anos, o príncipe negro e a Batalha de Crecy; os dois
papados, um romano e um francês empenhadíssimo no ignóbil mercado de
indulgências; a corrupção na Igreja e os primeiros cristãos indignados
que, décadas depois, influenciariam a reforma protestante de Lutero.
Está tudo lá.
Mas nada, no relato de Tuchman, se compara às procissões de
penitentes em meio à peste. “Monty Python em Busca do Cálice Sagrado”,
do Monty Python,
e “O Incrível Exército de Brancaleone”, de Mario Monicelli, têm cenas
impagáveis sobre o tema. A diferença é que a autora descreve o caos com
realismo e minúcia desoladora.
Clamando pela proteção do Senhor, os tementes se juntavam às romarias
ainda sãos, caíam doentes no decorrer do trajeto e terminavam o périplo
em covas rasas. Foi necessário o alarmante milagre da multiplicação de
óbitos para que a Igreja suspendesse missas, procissões e aglomerações
de fiéis.
Sete séculos depois, Edir Macedo solta um vídeo na internet afirmando que o medo da Covid-19 é obra de Satanás.
Não satisfeito, procura fundamentar a tese com o depoimento de um patologista, doutor Beny Schmidt, que deveria ter o registro de CRM cassado.
“Morrer é o destino humano”, diz o doutor. “A gente morre de
hipertensão, de diabetes, de câncer e de hemorragia, mas de coronavírus a
gente não morre, porque Deus não quis.”
Sete séculos depois da disseminação da peste, Jair Bolsonaro desce a rampa do Planalto para trocar gotículas com seus seguidores como se não houvesse amanhã
O Posto Ipiranga da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, preferiu não
comentar a indiferença do superior à curva exponencial de contágio pela
Covid-19. O ministro tem crédito, estaríamos perdidos na mão do
Weintraub. E os panelaços falaram por ele.
Jair governa para o próprio gueto. Se reinasse na Europa do século
14, pregaria o Apocalipse e incitaria o autoflagelo em cortejos
suicidas. Janaina Paschoal pediu a cabeça do presidente
depois do abraça e beija dominical. Arrependida confessa do voto que
concedeu ao capitão, a deputada representa uma fatia considerável de
eleitores conservadores que começam a perceber que o ódio ao PT não pode
servir de justificativa para o apoio a um furioso.
A aliança entre o ultraliberalismo econômico e o populismo de extrema
direita enfrenta seu primeiro desafio com uma crise que mais parece
lição divina.
A iniciativa privada será incapaz de substituir o Estado no atual
salve-se quem puder. Todos os países do mundo estão abrindo as
torneiras. Paulo Guedes será obrigado a agir na direção contrária de
tudo o que aprendeu em Chicago e sonhou e planejou e prometeu. Duro
acaso.
Torço para que o centro ressurja dessa emergência. E que o
coronavírus, a exemplo da peste negra na Europa do século 14, venha
abreviar o obscurantismo medieval travestido de liberal em que nos
metemos.
É isso ou a procissão do “FODA-SE” dos possuídos do domingo passado,
dispostos a se imolar pelo capitão. Na Europa trecentista, pelo menos,
morria-se por Deus.
Há método na loucura de Macedo e de Messias. Quanto mais fatalidades,
mais temor ao Altíssimo e mais Altíssimo para confortar. O bispo tem
razão, o medo é a arma de Satanás.
No lado pagão, é preciso reconhecer, nota-se o mesmo estado de
negação. Por não se sentirem ameaçados pela doença, os jovens descumprem
o resguardo e lotam praias, bares e baladas. O egoísmo também serve de
instrumento para o Capeta.
Ninguém sairá o mesmo desta quarentena. Daqui a quatro meses
atingiremos, dizem, a imunidade de rebanho. Enterrados os mortos, espero
que voltemos às ruas mais humanos e menos afeitos a fundamentalismos
religiosos, políticos e econômicos.
Talvez esse vírus seja mesmo o recado de Deus. Deus natureza cansado
do ódio, da ignorância, da irracionalidade, da brutalidade, da violência
e da vileza dos mitos e profetas. Um Deus farto das trevas e ansioso
por um Renascimento.
Aconteceu na Europa, 700 anos atrás.
Fernanda Torres
Atriz e roteirista, autora de “Fim” e “A Glória e Seu Cortejo de Horrores”.
O coronavírus retira a máscara da ideologia neoliberal
Hoje com a crise sanitária provocada pelo Coronavírus, tanto o
sistema econômico neoliberal como a sua ideologia não podem ser
sustentáveis
Atualizado em 17 de março de 2020, 06:51
Vou ousar uma reflexão sobre a relação da pandemia mundial do
Coronavírus com a crise da globalização econômica. Sabe-se que a
organização da governança mundial hoje se funda sobre a economia, que
passa a ser predominante e prioritária acima do interesse do bem comum,
tendo em vista que este modo imposto de governança provocou a morte
brutal do Estado Providência.
Vou iniciar este texto de reflexão com algumas questões: Por que se
fala que a pandemia vai afetar a economia mundial, no lugar de dizer que
ela afetará a vida de milhares de humanos no planeta terra?
Por que não nos aproveitamos da expansão do Coronavírus para analisar
a crise humanitária que estamos vivendo e suas causas? Como reagir
diante dos riscos ambientais e sociais que impactam hoje o nosso modo de
vida?
Por que não associamos a crise presente à governança mundial
neoliberal e à globalização econômica desenfreada que ela provocou? Por
que o Coronavírus expôs as dificuldades do Estado em proteger seus
concidadãos?
Por que a rica Europa, que no passado construiu um Estado Providência
dotado de um serviço público de saúde superior aos Estados Unidos, hoje
se sente desmuniciada diante do Coronavírus?
Se o debate político pudesse ser ampliado fora da consequência
econômica do Coronavírus e dos parâmetros que a globalização econômica
impõe, talvez, as respostas nos levassem a repensar o nosso modo de
produção, rever o sistema econômico e redesenhar um projeto de sociedade
face à ameaça ambiental, de epidemias e de paz social, tendo em vista, a
explosão das desigualdades sociais no mundo. Infelizmente, esses
questionamentos parecem ainda fora da pauta dos fabricantes de opinião:
jornalistas e comentaristas da grande mídia, analistas econômicos,
políticos, executores que governam os países ricos e ditos emergentes.
Se ligamos a televisão podemos passar de um canal para outro em
qualquer lugar do mundo, já que a internet permite essa interconexão
entre diversos países. A abordagem sobre o Coronavírus é idêntica! O que
prevaleceu como manchete foi a queda na bolsa de valores provocado pelo
Coronavírus. A Bolsa se tornou o termômetro da governança mundial e a
queda de seus valores apavora os adeptos do neoliberalismo mais que a
própria pandemia hoje declarada pela OMS- Organização mundial de Saúde.
Lendo os principais jornais na França e no Brasil e assistindo os
debates nos canais de televisão, os ângulos de análises são idênticos
quanto às consequências econômicas. Por exemplo: a epidemia de
coronavírus de Wuhan veio colocar os ponteiros na hora certa de modo
drástico, as consequências econômicas dessa triste situação já são
observáveis: uma recessão histórica na China, que infelizmente se
espalhará por todo o planeta. Mudo de canal e leio um artigo na
internet: "Essa crise demonstra a extrema vulnerabilidade de um sistema
no qual a participação da China hoje atinge 20% da produção industrial
mundial", confirma Daniel Cohen, chefe do departamento de economia da
Normal Sup.
O deslocamento de grandes multinacionais, dos grandes grupos
industriais para a China mostraram o cinismo do mundo dos negócios,
isento de qualquer patriotismo. Pouco lhes importava a destruição das
indústrias locais, nem tão pouco o desemprego de massa provocados pela
desindustrialização de seus países. O cinismo desses grandes
capitalistas chega a esquecer o passado político da China e eles
passaram a saudar o pragmatismo do capitalismo de Estado!
Quando houve a crise de 2007/2008, pela primeira vez as grandes
potências perceberam que a bola especulativa navegava pela rede mundial
de computadores numa velocidade tal que os trilhões de dólares e euros
se evaporam em segundos! Por falta de regulação mundial a economia
virtual se entupiu de vírus e os Bancos pediram a intervenção do Estado!
Só o doutor Estado podia curar a insanidade dos mercados especulativos.
Seus dirigentes na época pareciam ter consciência da desordem mundial,
onde eles foram os principais protagonistas. Todavia, depois de injetar
recursos públicos para recuperar os Bancos, os governos sucessivos foram
contaminados por outro vírus muito mais potente: O neoliberalismo
econômico se transformou em ideologia neoliberal! As instituições do
Estado há décadas fragilizadas permaneceram imóveis diante de uma
sociedade em plena mutação e em um mundo globalizado. Anticorpos contra o vírus da ideologia neoliberal: Solidariedade e Fraternidade
Hoje com a crise sanitária provocada pelo Coronavírus, tanto o
sistema econômico neoliberal como a sua ideologia não podem ser
sustentáveis.
Apresentam um grande risco de desestabilização da nossa sociedade.
Torna-se imperativo mudar esse sistema e colocar o ser humano no centro
de tudo. Tanto por razões éticas como por razões de sustentabilidade da
nossa sociedade. Os poderes políticos podem e devem agir nessa direção.
Daí torna-se urgente redefinir o papel do Estado que nos últimos anos na
Europa e América Latina foi enfraquecido pelo lobby da governança
mundial das agências internacionais. O Estado deve se fortalecer para
responder aos desafios da crise estrutural deixada pela ideologia
neoliberal. Esta pandemia revela a necessidade de restaurar o Estado
Providência diante da crise humanitária que hoje estamos vivendo.
A recessão econômica (2008/2009) teve sua origem na especulação do
capital financeiro, hoje a crise ataca a economia real, a vida de
milhares de pessoas que correm rico de serem contaminadas por um vírus e
o risco de morte por falta de atendimento médico necessário, tanto na
Europa, Estados Unidos como na América latina. Esperamos que o
continente Africano seja poupado desta catástrofe humana.
Na França o número de leitos e serviços de urgência dos hospitais
foram afetados pela diminuição drásticas de recursos públicos. Aliás, a
França que detém um modelo social ímpar na Europa, infelizmente, vem
sofrendo ataques permanente nesses últimos anos, que ameaçam a
manutenção de seus serviços públicos fundamentais, principalmente, na
área de saúde. Já há mais de um ano os médicos, enfermeiras,
pesquisadores se mobilizam para protestar contra a política neoliberal
do governo Macron e denunciam a deterioração dos hospitais públicos!
Assim, os funcionários dos hospitais ficaram incrédulos com as
contradições do discurso solene de Macron e o resultado prático de suas
políticas:
Diante da "mais grave crise de saúde que a França conheceu em um
século", Emmanuel Macron elogiou, quinta-feira, 12 de março, o Estado de
Providência e, mais particularmente, o hospital público. E diz sem
piscar: “O que essa pandemia já está revelando é que a saúde gratuita,
independentemente de renda, carreira ou profissão, nosso estado
providência de bem-estar não são custos ou encargos, mas nosso bem
precioso, ativos essenciais quando o nosso destino é atacado ".
Em nome da eficácia econômica muitos hospitais na França foram
fechados, as verbas para o funcionamento dos hospitais foram reduzidas,
assim como foram cortados recursos para as pesquisas científicas. Há
pouco meses todos os chefes de serviços dos hospitais públicos na França
se demitiram coletivamente em protesto às políticas neoliberais do
governo Macron.
Vale lembrar que o neoliberalismo como ideologia vê a competição como
a principal característica das relações humanas. Ao apostar no
individualismo essa ideologia retira a noção do dever coletivo e dos
valores comuns. De um modo frontal, esta ideologia afirma a supremacia
da economia e do mercado sobre os valores humanos. Valoriza o interesse
egoísta em detrimento do dever coletivo. O egoísmo prevalece face à
solidariedade.
Hoje, a angústia do futuro se alimenta dos problemas reais que todos
sentem, as epidemias que se proliferam, o desemprego, o aumento de
precariedade, a diminuição do poder de compra, o colapso da ascensão
social, a aposentadoria, a falta de moradia para as camadas mais pobres,
e todos os demais problemas causados pela globalização exclusiva. Nesse
sentido, a esquerda humanista deve se unir para buscar respostas para
essas angústias que hoje são também globalizadas! A esquerda deve se
articular mundialmente, voltar ao internacionalismo, no sentido de
traçar estratégias conjuntas levando em conta essas mudanças, adaptar-se
constantemente às novas demandas e aspirações de nossos concidadãos,
orientando-as ao progresso, à justiça, à fraternidade, à igualdade.
[resumo] Em meio a resultados
ruins da economia e ao pânico do coronavírus, André Lara Resende lança
livro com teses inovadoras, critica a política econômica e afirma que o
debate macroeconômico no país está superado.
Atropelada pela pandemia do novo coronavírus, a recente divulgação do PIB brasileiro de 2019
(1,1%), que selou uma sequência de três anos de crescimento irrisório,
após dois de recessão, levantou questões incômodas para os defensores do
atual receituário econômico. O fiasco não foi nenhuma surpresa para o
economista André Lara Resende:
“A atual política econômica baseia-se num liberalismo primitivo, o
‘laissez-faire’ de Milton Friedman dos anos 1960/70”, diz em entrevista à
Folha, concedida em São Paulo.
Com passagem pela vida acadêmica e experiência como diretor do Banco
Central, negociador da dívida externa, presidente do BNDES e um dos
formuladores do Plano Real,
ele considera um erro acreditar que basta retirar o Estado da economia e
equilibrar as contas públicas para que a confiança dos investidores
privados seja recuperada e a economia volte a crescer.
“Não há recuperação possível nessas condições”, afirma.
Se a situação da economia já se mostrava desalentadora, a ameaça do novo coronavírus tornou o cenário dramático. O pânico nos mercados financeiros e a possível recessão mundial suscitam apelos de ação dos governos —proposta que encontra eco nas ideias do economista.
“Está claro que o coronavírus vai provocar uma parada brusca da
economia mundial”, diz Lara Resende, que vê pouco espaço para a ação
dos bancos centrais em relação às taxas de juros, mas prescreve atuação
“inteligente” do Estado. “O tema do coronavírus ressalta a imperiosa
necessidade de aprovar verbas emergenciais para a saúde. Cortar num
momento como esse, ‘para compensar as perdas de receitas do petróleo’
[como foi aventado], beira o surto psicótico”, diz.
Pintado por guardiões do “status quo” econômico como uma caricatura
de defensor quase incondicional do gasto público, ele expõe em seu
recém-lançado “Consenso e Contrassenso: Por uma Economia não Dogmática”
teses que questionam os mitos da austeridade inscritos nas tábuas da
teoria hegemônica. Em seus textos, traça uma história crítica do
pensamento e de fatos econômicos e explica por que a disciplina precisa
ser repensada a fundo. Não são teses inventadas por ele, mas que teriam
sido silenciadas e agora retornam ao debate internacional.
Na visão do autor, Estados que emitem a própria moeda não têm, sob
determinadas condições, restrições financeiras. Podem gastar quanto
quiserem, por meio de emissão monetária ou por endividamento a uma taxa
de juros que têm como controlar. Pergunta-se: em decorrência, não
haveria inflação, disparadas de juros e fugas de credores do governo,
que deixariam o país ou buscariam outros ativos que não títulos da
dívida pública?
Não, dentro de certos limites, responde o economista, que fez seu doutorado no MIT, na mesma turma de Ben Bernanke,
presidente do Fed à época da crise de 2008. O governo —argumenta—
poderia gastar até o limite em que consumo e despesas de investimento
não pressionassem a capacidade de produção.
O país também teria de limitar com muita prudência o endividamento
externo, pois não poderia emitir para cobrir esse passivo. De resto, o
gasto tem de ser eficiente, definido talvez por uma agência
independente. “O que desancora a inflação é crise, o Estado se
desorganizar, tanto financeira quanto politicamente, o déficit em conta
corrente, o aumento populista do salário mínimo, os choques de preço de
energia”, diz.
E os credores, “o mercado”, não cobrariam mais para financiar a
parte da despesa coberta por endividamento, com o que a dívida pública
cresceria sem limite? Não. O Banco Central tem o poder de definir a taxa
de juros abaixo da taxa de crescimento econômico. Com isso, a dívida
cresceria menos do que a economia, e os donos do dinheiro não teriam
para onde fugir, a bom preço.
De onde saiu a intuição ou a demonstração para a tese de que não
haveria inflação? Da reação dos BCs à quebradeira de 2008. Na sequência
do desastre, observou-se uma gigantesca expansão monetária nos EUA e na
Europa, quando os bancos centrais, na prática, direta ou indiretamente,
financiaram intuições e financistas quebrados e, a seguir, empresas e
mesmo seus governos, com emissão de moeda. O resultado de tal política
não foi inflacionário.
Segundo Lara Resende, há um ponto cego na teoria econômica, incapaz,
há décadas, de explicar as relações entre moeda e atividade econômica. A
sombra se tornou um mito, em parte por interesse, em parte por
incompreensão do caráter histórico da teoria econômica. Na verdade, a
história mudou faz alguns séculos, com a criação da moeda fiduciária. E
os bancos criam moeda ao concederem empréstimos.
Se haveria tantos ganhos e tão poucos perdedores, porque a
resistência à mudança? O establishment da teoria econômica resiste, bem
como os emissores de moeda privada, ou seja, o sistema financeiro.
Lara Resende evita entrar em detalhes sobre como poderia ocorrer na
prática a mudança para um tal regime de política econômica, transição
que no caso do Brasil teria de superar traumas históricos de
endividamento hiperinflacionário, um quase consenso prático e teórico a
favor da austeridade e um edifício constitucional e legal em tese
erigido para promovê-la, aliás sem muito sucesso, para dizer o menos.
Um problema seria que o “país vive um estresse pós-traumático com os
planos de investimento do período do PT”,
diz o economista.
Acredita, no entanto, que a mudança de visão é inevitável, tanto por
pressão da quarta revolução tecnológica quanto pela previsível absorção
do debate internacional mais atualizado, “como costuma acontecer em
praças colonizadas”.
Certamente que tal projeto exige tempo e um debate que não interdite a
divergência —ele acredita que ocorra hoje um obstáculo para tal,
inclusive na mídia, “que subscreve a política em vigor”.
O economista não se mostra disposto a assumir funções públicas, mas
se sabe que tem mantido conversas com lideranças políticas, em especial o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
Leia trechos da entrevista.
A atual política econômica preocupa-se com o aspecto fiscal,
mas na sua visão está orientada por pressupostos equivocados, como a
expectativa de que o crescimento virá como consequência de um ajuste das
contas públicas. Formou-se, no entanto, um certo consenso de “liberais”
em torno do ministro Paulo Guedes. O que isso nos diz sobre o estágio do debate macroeconômico no Brasil? A
política econômica atual baseia-se num liberalismo primitivo, o
“laissez-faire” de Milton Friedman dos anos 1960/70, no qual o
monetarismo simplório da Teoria Quantitativa da Moeda foi substituído
pela tese da “austeridade fiscal expansionista”. Sustenta-se que basta
retirar o Estado da economia e equilibrar as contas públicas para que a
confiança dos investidores privados seja recuperada, e a economia volte a
crescer. Trata-se de um duplo equívoco.
Primeiro, porque no mundo contemporâneo, mais do que nunca, um Estado
competente é condição para o crescimento. Tanto para garantir serviços
públicos de qualidade, como para o bom funcionamento da economia
competitiva, a ação do Estado é indispensável. Segundo, porque a
tentativa de equilibrar as contas públicas, a curto prazo e a qualquer
custo, asfixia o setor privado com impostos distorcidos, inviabiliza os
investimentos públicos e paralisa serviços básicos. Não há recuperação
possível nessas condições. O pânico gerado pelo novo coronavírus agrava o cenário. O que esperar? Está
claro que o coronavírus vai provocar uma parada brusca da economia
mundial. Os bancos centrais não têm mais muito espaço com a taxa básica
de juros, mas podem minorar uma nova crise de contração do crédito
privado, através de recursos para compra de dívidas privadas.
Mais uma vez, o que faria diferença seria a ação coordenada das
políticas monetária e fiscal. É imperiosa a necessidade de aprovar verbas emergenciais para a saúde.
Cortar, num momento como esse, “para compensar as perdas de receitas do
petróleo” [como foi aventado], beira o surto psicótico. Em sua visão, a reação dos bancos centrais à crise de 2008
demonstrou que as visões macroeconômicas em vigor no Brasil estão
ultrapassadas. Por quê? A reação à crise de 2008 deixou patente
que não existe uma restrição natural para a emissão de moeda. Ao menos
quando há capacidade ociosa e o crédito bancário (isto é, a emissão de
moeda privada) está contido, a emissão de base monetária não provoca
inflação. Os principais bancos centrais emitiram como nunca,
multiplicando a base monetária por fatores superiores a 15 vezes, sem
provocar vestígio de inflação. Pelo contrário, mais de uma década
depois, as economias avançadas continuam perigosamente próximas da
deflação. Não pode haver prova mais cabal de que a emissão de moeda não
provoca inevitavelmente inflação. O experimento do chamado “quantitative
easing” salvou o sistema financeiro e implodiu a macroeconomia
estabelecida.
A restrição à emissão de moeda pelo Estado sempre foi uma restrição
política. Trata-se de uma opção política por restringir os gastos
públicos e abrir espaço para os gastos privados. O comércio e a
indústria sempre pressionaram pela expansão da liquidez na economia, mas
ao mesmo tempo procuraram impor freios aos gastos considerados
conspícuos e ilegítimos do Estado.
Enquanto prevaleceu o padrão-ouro, resolvia-se o problema sem liberar
o Estado para emitir sem lastro. Com o fim do padrão-ouro e a
desmoralização definitiva da Teoria Quantitativa da Moeda, depois de
2008, uma nova restrição para os gastos públicos precisava ser criada.
Os economistas passaram, então, a defender que haveria um limite
superior para a relação entre a dívida pública e o PIB.
O livro de Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff, “This Time Is
Different”, de 2009, sustenta que, a partir de uma dívida equivalente a
70% do PIB, a economia se desorganizaria. Inúmeros países, entre eles o
Japão, os EUA, e mesmo o Brasil, já passaram desse limite, sem qualquer
sinal de apocalipse econômico.
Alberto Alessina, da Universidade Harvard, cunhou a expressão
“austeridade expansionista” para defender, contra toda a evidência
histórica, que o corte das despesas públicas e do aumento dos impostos
não seria recessivo, mas ao contrário, estimularia os investimentos e a
economia. Agências internacionais, como a Comissão Europeia e o FMI,
subscreveram a nova tese e passaram a prescrever os programas de ajustes
fiscais como o único caminho para a retomada do crescimento.
Suas teses parecem não evidenciar um perdedor, embora
atinjam o establishment científico da economia e assustem quem teme
populismos. Quais os motivos para tamanha resistência? Toda
mudança de paradigma enfrenta grandes resistências. Ordenamos o mundo
segundo as histórias que contamos e que se tornam de aceitação
generalizada. A disrupção, para usar um termo em moda, das narrativas
estabelecidas é profundamente perturbadora e ameaça seus titulares e
beneficiários. Reconhecer que o governo não tem restrição financeira e
que deveria fazer uso dessa faculdade para investir, de forma
inteligente e produtiva, quando há desemprego, capacidade ociosa e uma
flagrante carência de todo tipo de serviços públicos não é exatamente
uma pauta revolucionária. Muito pelo contrário, é a receita keynesiana
clássica, que pautou a política econômica do pós-guerra.
Nova é a consciência de que a taxa de juros básica está sob controle
dos bancos centrais e que pode ser fixada abaixo da taxa de crescimento
da economia, garantindo assim que a relação dívida/PIB não irá explodir,
ainda que haja déficits fiscais a curto prazo. Nova é a evidência de
que a dívida interna pode ser emitida com juros muito baixos ou até
mesmo negativos.
Grande parte das teses que sustento tem longa tradição na história do
pensamento econômico. Embora intelectualmente superiores, foram
politicamente derrotadas e relegadas ao esquecimento. Diferentes
concepções do que é a moeda e de como controlar os gastos do Estado
estão por trás das duas grandes vertentes da teoria monetária ao longo
dos últimos séculos. Schumpeter, em sua história do pensamento
econômico, chamou a primeira dessas vertentes de teorias monetárias do
crédito e a segunda de teorias creditícias da moeda. Enquanto as
primeiras sustentam que a moeda é uma mercadoria com valor intrínseco,
as segundas argumentam que é uma unidade abstrata de crédito.
A vitória política das teorias monetárias do crédito foi uma vitória
política da necessidade de impor uma restrição ao financiamento do
Estado. Como disse Keynes, no seu clássico “Teoria Geral”, a vitória dos
metalistas, liderados por David Ricardo, nas controvérsias monetárias
do século 19, conquistou “a Inglaterra tão completamente quanto a Santa
Inquisição conquistou a Espanha”. A sua aceitação pelos homens públicos e
pela academia suprimiu a controvérsia.
As teorias alternativas deixaram de ser ensinadas e foram de tal
forma esquecidas que, ao serem trazidas de volta à discussão, justamente
quando toda moeda é fiduciária e está a caminho de se tornar apenas
escritural, parecem revolucionárias.
Reação tão virulenta é evidência de que o tema é, como sempre foi,
politicamente carregado. O espaço para o gasto público e o gasto privado
não é ilimitado, está condicionado à capacidade produtiva da economia.
Quando há desemprego e capacidade ociosa, o aumento do gasto público não
compete com o gasto privado, pelo contrário, pode levar à recuperação
do emprego e da renda. Essa é a essência da tese de Keynes na “Teoria Geral”. Nesse caso, não há efetivamente perdedores, todos teriam a ganhar.
Infelizmente, isso não é verdade quando a economia se aproxima do
pleno emprego e o gasto público compete efetivamente com o gasto
privado. Além de competir pela capacidade produtiva, o gasto público
beneficia setores diferentes da sociedade. É, portanto, uma opção
política. Abrir espaço para os gastos privados, pautados pela busca de
resultados financeiros, também é uma opção política, mas que a teoria
econômica pretende transformar numa opção científica. Como lembra Robert
Skidelsky em seu último livro, “Money and Government: The Past and
Future of Economics”, nada mais agradável aos homens práticos do que
encontrar os seus preconceitos travestidos de ciência. Para deixar
claro, os perdedores seriam os emissores privados de moeda, o sistema
financeiro. Essas ideias pedem um aggiornamento da profissão e da opinião
pública tamanho que pode parecer prematuro perguntar sobre os problemas
operacionais de uma mudança desse porte. Parece necessário que esse
programa venha com um novo governo, com credibilidade e robustez
política. Como você vê essa perspectiva? Para o aggiornamento
da profissão e da opinião pública, é preciso antes de mais nada que o
debate não seja interditado. Diante do questionamento do velho
paradigma, a reação da maioria dos economistas tem sido a de
desqualificar a priori as críticas. Sem contestá-las racionalmente,
esperam que, com o silêncio dos cardeais, as críticas aos dogmas sejam
desconsideradas e acabem esquecidas.
Por isso é tão importante que novas lideranças, tanto acadêmicas
quanto políticas, entendam e divulguem a crítica à macroeconomia
convencional. A apresentação de um programa coerente de revisão teórica e
institucional, baseado no novo paradigma, seria fundamental para
dar-lhe visibilidade e credibilidade. Quais os requisitos econômicos e institucionais para dar início a um plano tal qual o senhor propõe? A
consciência de que o Estado não tem restrição financeira deve vir
acompanhada da imperativa necessidade de torná-lo competente. O Estado
não precisa, necessariamente, levantar recursos, via impostos ou emissão
de dívida, para gastar. Esta é uma decorrência lógica da moeda
fiduciária. É ao mesmo tempo liberadora e assustadora.
Liberadora porque deixa claro que gastos, desde que justificados pelo
aumento da produtividade e do bem-estar, podem ser feitos sem a
preocupação de equilibrar o Orçamento a curto prazo. Perigosa porque sem
a disciplina do Orçamento equilibrado, a vocação patrimonialista do
Estado, a tentação populista para gastar de forma irresponsável,
corporativista e corrupta, pode se tornar incontrolável.
Por isso é tão importante estabelecer limites rígidos para o gasto na
operação do próprio Estado e critérios racionais para os investimentos
públicos. A tecnologia já permite criar um Estado desburocratizado, com
um custo de operação muitíssimo mais baixo.
A plataforma digital nacional, que proponho no meu livro e que já existe na Estônia e na Índia,
é o caminho a ser seguido. Deve-se manter, de toda forma, a exigência
de que os gastos correntes do Estado sejam sempre cobertos por receitas
tributárias, mas abrir exceção para que os investimentos públicos possam
ser aprovados fora do Orçamento. Para isso, deveriam ser avaliados e
ordenados por uma agência independente, com base em critérios técnicos
de retorno. O problema é que o o país vive um estresse pós-traumático
com os planos de investimento do período do PT.
O temor de que a democracia representativa não seja capaz de lidar
com o fato de que o Estado não tem restrição financeira é compreensível.
Por isso, é preciso adaptar as instituições e rever as regras para a
aprovação de gastos públicos. BC e Tesouro devem ser mantidos como agências à parte, mas
teriam de ser coordenados. Como se resolve essa coordenação na
manutenção da estabilidade de preços? O senhor poderia precisar qual
seria o papel de uma autoridade monetária nessa nova configuração? Está
comprovado que a taxa de juros é menos eficaz do que se imaginava para o
controle da inflação. Quando sistematicamente mantida acima da taxa de
crescimento da economia, transforma-se num dos principais fatores de
desequilíbrio fiscal. Juros mantidos acima do crescimento potencial da
economia são um equívoco de graves consequências.
As políticas monetária e fiscal não são independentes, são intimamente interligadas. Um BC independente
que ponha a taxa de juros sistematicamente acima do crescimento
potencial da economia sabota o equilíbrio fiscal. O BC é, antes de mais
nada, o banqueiro do Tesouro e precisa trabalhar a favor e não contra o
Tesouro. Com mercados financeiros líquidos e juros próximos de zero, a
distinção entre moeda e dívida pública é menos importante do que parece.
Tanto a moeda como a dívida interna são passivos financeiros do Tesouro
que requerem uma gestão coordenada.
O controle da inflação é essencialmente uma questão de coordenação
das expectativas. A desancoragem das expectativas é quase sempre
decorrência da combinação de grandes desvalorizações cambiais, quando o
financiamento externo é bruscamente interrompido, com ajustes populistas
de salários e a desorganização recessiva da economia. Também do
controle artificial de preços, como os de energia. Déficits fiscais
transitórios, ainda que expressivos, não provocam necessariamente
inflação.
O Tesouro poderia gastar, atendidos os pressupostos de
eficiência etc., até o limite em que sua despesa não pressione além da
conta a capacidade de produção, que não provoque excesso de demanda.
Como se verifica esse limite? O principal sinal de que a
economia está superaquecida e de que há pressão excessiva da demanda é o
desequilíbrio das contas externas. Enquanto houver superávit comercial,
há espaço para o crescimento da demanda. O senhor observa os riscos do capitalismo de Estado, do
corporativismo, do patrimonialismo, da corrupção etc. As agências seriam
instrumento suficiente para conter o esbulho da nova política? A
experiência demonstra que o Estado é mau empresário, e as empresas
estatais, ainda que possam começar bem, sempre envelhecem mal. Por outro
lado, acreditar que seja possível ter uma economia capitalista
competitiva sem um Estado competente é uma ilusão. Exatamente porque o
setor privado procurará sempre capturar o Estado e as agências
reguladoras é que o Estado precisa ser competente em todas as suas
dimensões. O Estado despreparado, inchado e corporativista é presa fácil
dos interesses específicos e dos “rent-seekers”.
Como diz David Graeber,
antropólogo da London School of Economics, em seu “Dívida: Os Primeiros
5.000 Anos”, a ideia do mercado sem o Estado é o mito fundador da
teoria econômica. A história da moeda-mercadoria, como uma geração
espontânea dos mercados, ensinada nas escolas, não tem fundamento.
O Estado deve ser voltado para o bem-estar da sociedade, não um
criador de benesses para os seus ocupantes e de dificuldades para o
cidadão. Esta não é, como se sabe, uma tarefa fácil. O Estado
brasileiro, apesar de ainda ter alguns focos de excelência, é inchado,
burocrático e patrimonialista. Mas asfixiá-lo não é a solução. Acreditar
que o Estado jamais poderá ser competente, que deva ter as suas mãos
atadas, é um grave equívoco. Trata-se de uma visão forjada durante os
anos da Guerra Fria, hoje flagrantemente anacrônica.
No Brasil corremos o risco de um processo de “failed state”.
Presenciamos uma situação em que o crime se politiza e a política se
criminaliza. Podemos caminhar para uma Venezuela.
Vinicius Torres Freire, mestre em administração pública pela Universidade Harvard e colunista da Folha;
Marcos Augusto Gonçalves, editor da Ilustríssima e editorialista da Folha