sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Vale exorciza fantasma de Agnelli e paga à União mais do que FH cobrou por ela | TIJOLAÇO | “A política, sem polêmica, é a arma das elites.”

Vale exorciza fantasma de Agnelli e paga à União mais do que FH cobrou por ela | TIJOLAÇO | “A política, sem polêmica, é a arma das elites.”

Vale exorciza fantasma de Agnelli e paga à União mais do que FH cobrou por ela

28 de Novembro de 2013 | 08:28
Ironia do destino, a Vale vai pagar ao Governo brasileiro mais do que este recebeu quando Fernando Henrique vendeu o controle da companhia, por US$ 3 bilhões.
E, de quebra, jogar um balde de água fria sobre o tucanato que está gritando sobre o seu querido “superavit primário”, que é o único dinheiro que, na visão deles, não pode ser cortado nas despesas públicas.
É que a companhia resolveu ontem, antevéspera do prazo final, aderir ao Refis e acertar o pagamento de sua dívida de Imposto de Renda – acumulada desde 2003 – e que soma US$ 9 bilhões.
E não vai pagar por uma “vingança” do petismo.
A história, para quem não a conhece, é a seguinte.
Em 2001, Fernando Henrique Cardoso  baixou uma Medida Provisória, que virou a Lei Complementar 104, determinando o pagamento de Imposto de Renda sobre o lucro apurado por subsidiárias das empresas brasileiras no exterior, quando este fosse internalizado, independente de sua distribuição aos acionistas.
A Vale realiza boa parte de suas exportações de nosso minério triangulando contabilmente as operações com suas controladas no exterior.
A mineradora – veja no gráfico publicado em março pelo Valor, com números parciais que não incluem todas as dívidas  - era disparado a que mais se beneficiava deste artifício. Sozinha, detém mais da metade dos créditos devidos por este tipo de operações, avaliado em R$ 70 bilhões, incluídas as multas de 100% sobre o não-recolhimento.
O impasse se arrasta há mais de uma década e -mesmo com um placar de 5 a 4 para a União na ação de inconstitucionalidade movida contra a cobrança – ameaçava seguir por muitos anos mais, com o adiamento, na semana passada, de outra ação sobre o tema, no STJ.
Para evitar uma disputa interminável – e o risco de reversão das decisões judiciais, tamanho é o poder de “convencimento jurídico” das empresas – o Governo criou um programa – que despertou polêmica entre os auditores da Receita – liberando o crédito dos acréscimos sobre o principal devido – para o que for pago à vista – e, na parte parcelada, reduzindo em 80% o valor das multas e em 50% o dos dos juros.
Com isso, a Vale vai pagar à vista – hoje ou amanhã –  R$ 6 bilhões, ou US$ 2,6 bilhões.
Recorde, quase o mesmo  valor pelo qual Fernando Henrique a entregou.
E, ao longo de 15 anos, corrigidas pela taxa Selic, em 15 anos e mensalmente, outros R$ 16,3 bilhões,  ou US$ 40 milhões por mês.
Portanto, as receitas do leilão de Libra e só a parcela da Vale no Refis vão somar perto de R$ 21 bilhões no resultado do Tesouro Nacional em novembro – os números de outubro saem hoje e já devem ser positivos – alcançando a cifra estabelecida no planejamento econômico.
Mesmo com os gastos extras de R$ 15 bilhões provocados pela seca deste ano, a maior parte devido à compensação dos valores da energia que teve de ser gerado pelas usinas termelétricas, as metas – exageradas e socialmente injustas, mas nas regras do “jogo jogado” com o mercado – serão cumpridas.
E o catastrofismo dos jornais e seus analistas, que pulou para da “explosão inflacionária” para as “contas públicas” depois que aquela não aconteceu, sai mais uma vez falando no vazio.
E os “Velhos do Restelo”, mesmo quando de Minas e Pernambuco e jovens na aparência, vão continuar espalhando deu mau agouro em que só a mídia e os tolos acreditam.
PS. Para que ninguém fique com “peninha” de a Vale pagar tanto em impostos acumulados em uma década, uma informação. A empresa faturou com vendas nada menos que US$ 32 bilhões ano ano passado. E só pagou de royalties sobre o minério – que pertence à União e lhe foi concedido, carca de US$ 200 milhões.

Os analfabetos políticos das redações - Carta Maior

Os analfabetos políticos das redações - Carta Maior
Paulo Nogueira

Você certamente conhece os analfabetos políticos, os APs. Brecht dizia que nada havia de pior que eles, porque acabavam deixando a política nas mãos de pessoas como, bem, como Roberto Marinho, para trazer o assunto para um cenário brasileiro.

Os APs estão em toda parte, até mesmo nas redações de grandes jornais e revistas. Os leitores podem imaginar que as redações sejam compostas de pessoas altamente politizadas, a negação dos APs.

Mas não é assim.

Considere.

Recentemente, houve uma troca de tuítes entre Barbara Gancia e mim. A encrenca começou quando ela escreveu que estranhava Dirceu estar preso e Palocci não.

Respondi que estranho mesmo era a Folha não dar nada sobre o documentado escândalo da sonegação da Globo.

Primeiro, ela revelou ignorância sobre o caso. Atribuiu-o a uma “teoria da conspiração”, a despeito de todos os fatos amplamente comprovados.

Depois, disse, em tons heroicos, que em 30 anos de colunismo na Folha jamais foi censurada.

Respondi que isso se devia apenas a que ela jamais escrevera nada que incomodasse a família Frias.

Foi então que o analfabetismo político de Barbara Gancia gritou: ela citou, como evidência de que é independente, um texto em que dizia que nos protestos de fora as pessoas são chamadas de manifestantes e no Brasil de vândalos.

Bem, onde uma afirmação dessas poderia incomodar os Frias?

Somente o analfabetismo político poderia enxergar numa banalidade daquelas prova de independência editorial.

Coragem seria, para voltar ao caso, reclamar esclarecimentos sobre a sonegação da Globo.

Muitos leitores vêem coragem onde não há nada que mereça uma única palma.

Isso se manifesta com frequência entre os leitores de outro analfabeto político do jornalismo, Reinaldo Azevedo.

“Parabéns pela coragem, Tio Rei”, gostam de dizer os obtusos leitores dele.

Coragem?

Ora, ele está sempre defendendo os interesses das empresas para as quais trabalha. É um bajulador dos poderosos.

Coragem?

Se ele tivesse escrito qualquer coisa que contrariasse os interesses dos que lhe pagam, aí sim, ele seria corajoso.

É o famoso chapa branca vestido de rebelde, aspas e pausa para rir. Como todo chapa branca, ganha duas vezes: primeiro, indiretamente, do Estado, pelas mamatas desfrutadas por quem o emprega. Depois, pelas próprias empresas.

Faça um teste. Azevedo poderia - liberal que é, aspas novamente - questionar a reserva de mercado para as companhias de mídia.

Mas tente encontrar uma única linha sobre o assunto na vasta, tediosa, repetitiva obra de Azevedo.

Provavelmente ele ignore a reserva de mercado da mídia. E também não saiba das mamatas estatais concedidas às companhias jornalísticas.

Saberá Reinaldo Azevedo que o papel de cada página da Veja é imune de impostos? Saberá que o dinheiro público – empréstimos do BNDES e do Banco do Brasil a juros maternais, anúncios oficiais pagos com tabela cheia, lotes de assinaturas de governantes amigos – paga boa parte de seu salário?

Talvez não. Por isso ele é um AP, um analfabeto político.

O que ele sabe, quase certamente, é que nem o dinheiro dos anúncios de Alckmin bastaram para salvar a revista política na qual ele teve sua única experiência de comando.

Nela, ele aprendeu com seu mecenas na ocasião, Luís Carlos Mendonça de Barros, a arte da grosseria, da insolência e da mistificação.

A convivência entre os dois terminou na ruína de uma revista que, repito, não se sustentou sequer com dinheiro público.

Mendonça não pode ser acusado de AP. É esperto demais para isso. Mas ele não ensinou seu pupilo nesse quesito, e hoje o aprendiz nos atormenta com suas demonstrações cotidianas de analfabetismo político.

A opinião pública como gado - Carta Maior

A opinião pública como gado - Carta Maior

A opinião pública como gado

O documentado condomínio entre o PSDB, cartéis e a prática sistêmica de sobrepreço nas licitações do metrô paulista era do conhecimento da mídia desde 2009.

por: Saul Leblon

Arquivo

A régua seletiva da emissão conservadora vive mais uma quadra de exibição pedagógica.

Vísceras, troncos e membros do grupo proprietário do Hotel Saint Peter, em Brasília, no qual trabalhará o ex-ministro José Dirceu, por apreciáveis R$ 20 mil, diga-se  – se fossem R$ 5 mil ou R$ 10 mil as suspeitas seriam menores?--  estão sendo trazidos a público em cortes sugestivos.

Chegam desossados e moídos.

Salgados e pré-cozidos, basta engolir, sendo facilmente digeríveis em sua linearidade.

Sem guarnição, recomenda o chef.

Assim costuma ser, em geral, com as informações que formam o cardápio de  fatos ou acusações relacionados ao PT.

Uma farofa seca de areia com arame farpado.

E assim será com o exercício do regime semiaberto facultado ao ex-ministro.

A lente da suspeição equivale desde já a um segundo julgamento.

Com as mesmas características do primeiro.

Recorde-se o jornalismo associado ao crime organizado que  não hesitou em invadir o quarto de hotel do ex-ministro, em Brasília, para instalar aparelhos de escuta, espionar gente e conversas no afã de adicionar chibatadas ao pelourinho da AP 470.

O cenário esquadrejado em menos de uma semana  –o emprego foi contratado na última 6ª feira— diz que não será diferente agora.

O dono do hotel é filiado a partido da base do governo (PTN), revela a Folha. Tem negócios na área da comunicação. Uma de suas emissoras, a Top TV, com sede em Francisco Morato (SP), conquistou recentemente o direito de transferir a antena para a Avenida  Paulista.

Suspeita.

A Anatel informa que não, a licença foi antecedida de audiência pública. Sim, mas a Folha desta 5ª feira argui tecnicalidades, cogita riscos de interferência em outros canais etc

Não só.

Dono também de rádios, o empregador de Dirceu operou irregularmente uma antena instalada em terraço do Saint Peter, diz o jornal  ainda sem mencionar o andar.

Deve ser o 13º.

A mesma Folha investiga ainda encontros do empresário --membro de partido da base aliada--  com o ministro Paulo Bernardo. Da Comunicação. A esposa do ministro é pré-candidata ao governo do Paraná..

Vai por aí a coisa.

Alguém com o domínio de suas faculdades mentais imaginaria que o ex-ministro José Dirceu, um talismã eleitoral lixiviado há mais de cinco anos no cinzel conservador, obteria um emprego em qualquer latitude do planeta sem a ajuda de aliados ou amigos?

O ponto a reter é outro.

Avulta dessa  blitzkrieg  uma desconcertante contrapartida de omissão: quando se trata de cercar pratos compostos de personagens e enredos até mais explosivos, extração diversa, impera a inapetência investigativa.

O braço financeiro da confiança de José Serra, Mauro Ricardo, seria um desses casos de inconcebível omissão se as suas credenciais circulassem na órbita do PT?

A isso se denomina jornalismo de rabo preso com o leitor?

Tido como personalidade arestosa, algo soberba, Mauro Ricardo reúne predicados e rastros que o credenciariam a ser um ‘prato cheio’ do jornalismo investigativo.

O economista acompanha Serra desde quando o tucano foi ministro do Planejamento (1995/96); seguiu-o na pasta da Saúde (1998/2002), sendo seu homem na Funasa, de cujos funcionários demitidos Serra ganharia então o sonoro apelido de ‘Presidengue’, na desastrosa derrota presidencial de 2002.

Nem por isso Mauro Ricardo perdeu a confiança do chefe, sendo requisitado por Serra quando este assumiu a prefeitura de São Paulo, em 2004/2006, ademais de acompanha-lo, a seguir, no governo do Estado.

Quando o tucano foi derrotado  pela 2ª vez  nas eleições presidenciais de 2010, Mauro Ricardo voltou ao controle do caixa da prefeitura, sob a gestão Kassab.

Esse, o trajeto da caneta que mandou arquivar as investigações contra aquilo que se revelaria depois a maior lambança da história da administração pública brasileira: o desvio de R$ 500 milhões do ISS de São Paulo, drenados ao longo do ciclo Serra/Kassab por uma máfia de fiscais sob a jurisdição de Mauro Ricardo.

O que mais se sabe sobre esse centurião?

Muito pouco.

Seus vínculos, eventuais negócios ou sócios, círculos de relacionamento e histórias da parceria carnal com o candidato de estimação da mídia conservadora nunca mobilizaram esforço investigativo equivalente ao requisitado na descoberta de uma antena irregular  num terraço do Hotel Saint Peter, em Brasília.

Evidencia-se a  régua seletiva.

Que faculta ao tucano Aécio –e assemelhados-  exercitar xiliques de indignação ante as evidências de uma fusão estrutural entre o tucanato de SP,  cartéis multinacionais e a prática sistêmica de sobrepreço  nas compras do metrô paulista - desde o governo Covas.

Dados minuciosos do longevo,  profícuo matrimônio,  são conhecidos e circulam nos bastidores da mídia, de forma documentada, desde 2009.

Quem  confessa é o jornal Folha de SP desta 5ª feira.

Repita-se, o repórter Mario Cesar Carvalho admite, na página 11, da edição de 28/11/2003 do jornal, que se sabia desde 2009  da denúncia liberada agora pelo ‘Estadão’ –cujo limbo financeiro pode explicar a tentativa de expandir o universo leitor com algum farelo de isenção.

Por que em 2009 esse paiol não mereceu um empenho investigativo ao menos equivalente ao que se destina aos futuros empregadores de José Dirceu?

O calendário político da Folha responde.

Em 2010 havia eleições presidenciais; o jornal preferiu investir na ficha falsa da Dilma a seguir os trilhos do caixa 2 tucano em SP.

No seu conjunto, a mídia tocava o concerto do ‘mensalão petista’. Dissonâncias não eram, nem são bem-vindas.

Transita-se, portanto, em algo além do simples desequilíbrio editorial.

Temas ou versões conflitantes com a demonização petista mereceram, ao longo de todos esses anos, o destino que lhes reserva a prática dos  elegantes manuais de redação: ouvir o outro lado, sem nunca permitir que erga a cabeça acima da  linha da irrelevância.

Assim foi, assim é.

Só agora – picados e salgados os alvos em praça pública--  o pressuroso STF lembrou-se de acionar o Banco do Brasil para cobrar o suposto assalto aos ‘cofres públicos’ da AP 470.

Pedra angular das toneladas de saliva com as quais se untou os autos do maior julgamento-palanque da história brasileira, só agora,  encerrado o banquete, cogita-se do prato principal de R$ 70 milhões esquecido na cozinha?

O esquecimento serviu a uma lógica.

Até segunda ordem, perícia rigorosa providenciada pelo BB ofereceu uma radiografia minuciosa de recibos e provas materiais dando conta do uso efetivo do dinheiro nas finalidades de patrocínio e publicidade contratadas.

O documento capaz de trincar a abóboda da grande narrativa conservadora, nunca mereceu espaço à altura de seus decibéis no libreto dominante.

Ao mesmo tempo, o que a Folha admite agora, como se isso mitigasse o escândalo do metrô (‘Papéis que acusam o PSDB circulam há mais de quatro anos’) corrobora a percepção de que estamos diante de uma linha de coerência superlativa.

Ela traz a marca de ferro do que de pior pode ostentar quem se evoca a prerrogativa da informação isenta.

‘Cumplicidade’ diz o baixo relevo inscrito nas páginas e na pele daqueles que ironicamente, destinaram à  opinião pública, durante todos estes anos, o livre discernimento que se dispensa ao gado na seringa do abate.

Procurador Geral que livrou Dantas do mensalão ganhou contrato da Brasil Telecom

Procurador Geral que livrou Dantas do mensalão ganhou contrato da Brasil Telecom

Procurador Geral que livrou Dantas do mensalão ganhou contrato da Brasil Telecom

Do Jornal GGN - Em sua sabatina no Senado, o jurista Luiz Roberto Barroso  considerou o julgamento do chamado mensalão “ponto fora da curva”.  Barroso é considerado o maior constitucionalista brasileira, unanimidade, saudado tanto pela direita quanto pela esquerda. Sua opinião foi corroborada pelo Ministro Marco Aurélio de Mello, um dos julgadores mais implacáveis.
Externou o que todo o meio jurídico comenta à boca pequena desde aquela época: foi um julgamento de exceção. E não apenas pelo rigor inédito (para crimes de colarinho branco) das condenações, mas pela excepcional seletividade na escolha das provas, sonegando informações essenciais para a apuração completa do episódio.
Houve o pagamento de despesas de campanha dos novos aliados do PT. Utilizaram-se recursos de caixa dois para tal. Havia o intermediário das transações – o publicitário Marcos Valério e a agência DNA. Na outra ponta, os beneficiários. E, no comço do  circuito, os financiadores.
Se poderia ter se obtido a condenação fazendo o certo, qual a razão para tantas irregularidades processuais anotadas? Não se tratou apenas dos atropelos à presunção da inocência e outros princípios clássicos do ordenamento jurídico brasileiro. Há também a suspeita de ocultação deliberada de provas.
1. Ignorou-se laudo comprovando a aplicação dos recursos da Visanet.
2. Esconderam-se evidências de que o contrato da DNA com a Visanet era anterior a 2003.
3. Desmembrou-se o processo para que outros diretores do Banco do Brasil - que compartilharam decisões com o diretor de marketing Antonio Pizolato e assumiram responsabilidades maiores - não entrassem na AP 470.
4. Ignoraram-se evidências nítidas de que a parte mais substancial dos fundos do DNA foi garantida pelas empresas de telefonia de Daniel Dantas.
O contrato de Antonio Fernando
Aparentemente, desde o começo, a prioridade dos Procuradores Gerais da República Antônio Fernando (que iniciou as investigações), de Roberto Gurgel (que deu prosseguimento) e do Ministro do STF Joaquim Barbosa (que relatou a ação) parece ter sido a de apagar os rastros do principal financiador do mensalão: o banqueiro Daniel Dantas. Inexplicavelmente, ele foi excluído do processo e seu caso remetido para um tribunal de primeira instância.
Excluindo Dantas, não haveria como justificar o fluxo de pagamentos aos mensaleiros. Todos os absurdos posteriores decorrem dessa falha inicial, de tapar o buraco do financiamento, depois que Dantas foi excluído do inquérito.
Responsável pelas investigações, o procurador geral Antônio Fernando de Souza tomou duas decisões que beneficiaram diretamente  Dantas. A primeira, a de ignorar um enorme conjunto de evidências e  excluir Dantas do inquérito - posição mantida por seu sucessor, Roberto Gurgel e pelo relator Ministro Joaquim Barbosa. A segunda, a de incluir no inquérito o principal adversário de Dantas no governo: Luiz Gushiken. Aliás, com o concurso de Antonio Pizolatto - que acabou tornando-se vítima, depois de diversas decisões atrabiliárias dos PGRs.
Foi tal a falta de provas para incriminar Gushiken, que o PGR seguinte, Roberto Gurgel, acabou excluindo-o do inquérito.
Pouco depois de se aposentar, Antônio Fernando tornou-se sócio de um escritório de advocacia de Brasília - Antônio Fernando de Souza e Garcia de Souza Advogados -, que tem como principal contrato a administração da carteira de processos da Brasil Telecom, hoje Oi, um dos braços de Dantas no financiamento do mensalão. O contrato é o sonho de todo escritório de advocacia: recebimento de soma mensal vultosa para acompanhar os milhares de processos de acionistas e consumidores contra a companhia, que correm nos tribunais estaduais e federais.
Os sinais de Dantas
Qualquer jornalista que acompanhou os episódios, na época, sabia que a grande fonte de financiamento do chamado “valerioduto” eram as empresas de telefonia controladas por Dantas, a Brasil Telecom e a Telemig Celular. Reportagens da época comprovavam – com riqueza de detalhes – que a ida de Marcos Valério a Portugal, para negociar a Telemig com a Portugal Telecom, foi a mando de Dantas.
Dantas possuía parcela ínfima do capital das empresas Telemig, Amazônia Celular e Brasil Telecom. O valor de suas ações residia em um acordo “guarda-chuva”, firmado com fundos de pensão no governo FHC, que lhe assegurava o controle das companhias. Tentou manter o acordo fechando aliança com setores do PT – que foram cooptados, sim. Quando o acordo começou a ser derrubado na Justiça, ele se apressou em tentar vender o controle da Telemig, antes que sua participação virasse pó.
No livro “A Outra Historia do Mensalão”, Paulo Moreira Leite conta que a Polícia Federal apurou um conjunto de operações entre a Brasil Telecom e a DNA. A executiva Carla Cicco, presidente da BT, encomendou à DNA uma pesquisa de opinião no valor de R$ 3,7 milhões. Houve outro contrato, de R$ 50 milhões, a ser pago em três vezes. Era dinheiro direto no caixa da DNA - e nao apenas uma comissão de agenciamento convencional, como foi no caso da Visanet.. Pagaram-se as duas primeiras. A terceira não foi paga devido às denúncias de Roberto Jefferson que deflagraram o mensalão.
Apesar de constar em inquérito da Polícia Federal – fato confirmado por policiais a Paulo Moreira Leite – jamais esse contrato de R$ 50 milhões fez parte da peça de acusação. Foi ignorado por Antônio Fernando, por seu sucessor Roberto Gurgel e pelo relator Ministro Joaquim Barbosa. Ignorando-o, livrou Dantas do inquérito. Livrando-o, permitiu-lhe negociar sua saída da Brasil Telecom, ao preço de alguns bilhões de reais.

As gambiarras no inquérito

Sem Dantas, como justificar os recursos que financiaram o mensalão? Apelou-se para essa nonsense de considerar que a totalidade da verba publicitária da Visanet (R$ 75 milhões) foi desviada. Havia comprovação de pagamento de mídia, especialmente a grandes veículos de comunicação, de eventos, mas tudo foi deixado de lado pelos PGRs e pelo relator Barbosa.
Em todos os sentidos, Gurgel foi um continuador da obra de Antonio Fernando. Pertencem ao mesmo grupo político - os "tuiuius" - que passou a controla o Ministério Público Federal. Ambos mantiveram sob estrito controle todos os inquéritos envolvendo autoridades com foro privilegiado. Nas duas gestões, compartilhavam as decisões com uma única subprocuradora  - Cláudia Sampaio Marques, esposa de Gurgel. Dentre as acusações de engavetamento de inquéritos, há pelos menos dois episódios controvertidos, que jamais mereceram a atenção nem do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) nem da Associação Nacional dos Procuradores da República  (ANPR) - esta, também, dominada pelos "tuiuius": os casos do ex-senador Demóstenes Torres e do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda.
Tanto na parte conduzida por Antonio Fernando, quanto na de Gurgel, todas as decisões pareceram ter como objetivo esconder o banqueiro.
É o caso da  “delação premiada” oferecida a Marcos Valério. O ponto central – proposto na negociação – seria imputar a Lula a iniciativa das negociações com a Portugal Telecom. Sendo bem sucedido, livraria Dantas das suspeitas de ter sido o verdadeiro articulador das negociações. A "delação premiada" não  foi adiante porque, mesmo com toda sua discricionariedade, Gurgel não tinha condições de oferecer o que Valério queria: redução das penas em todas as condenações.
Quando iniciaram-se as investigações que culminaram na ação, Antônio Fernando foi criticado por colegas por não ter proposto a delação premiada a Marcos Valério. Acusaram-no de pretender blindar Lula. A explicação dada na época é que não se iria avançar a ponto de derrubar o presidente da República, pelas inevitáveis manifestações populares que a decisão acarretaria. Pode ser. Mas, na verdade, na época, sua decisão  blindou Daniel Dantas, a quem Valério servia. Agora, na proposta de "delação" aceita por Gurgel não entrava Dantas - a salvo dos processos - mas apenas Lula.
O inquérito dá margem a muitas inteerpretaçòes, decisões, linhas de investigação. Mas como explicar que TODAS as decisões, todas as análises de provas tenham sido a favor do banqueiro?

Os motivos ainda não explicados

Com o tempo aparecerão os motivos efetivos que levaram o Procurador Geral Roberto Gurgel e o relator Joaquim Barbosa a endossar a posição de Antonio Fernando e se tornarem também avalistas  desse jogo.
Pode ter sido motivação política. Quando explodiu a Operação Satiagraha – que acusou Daniel Dantas de corrupção -, Fernando Henrique Cardoso comentou que tratava-se de uma “disputa pelo controle do Estado”.
De fato, Dantas não é apenas o banqueiro ambicioso, mas representa uma longa teia de interesses que passava pelo PT, sim, mas cujas ligações mais fortes são com o PSDB de Fernando Henrique e principalmente de José Serra.
Uma disputa pelo poder não poderia expor Dantas, porque aí se revelaria a extensão de seus métodos e deixaria claro que práticas como as do mensalão fazem parte dos (péssimos) usos e costumes da política brasileira. E, se comprometesse também o principal partido da oposição, como vencer a guerra pelo controle do Estado? Ou como justificar um julgamento de exceção.
Vem daí a impressionante blindagem proposta pela mídia e pela Justiça. É, também, o que pode explicar a postura de alguns Ministros do STF, endossando amplamente a mudança de conduta do órgão no julgamento. Outros se deixaram conduzir pelo espírito de manada. Nenhum deles engrandece o Supremo.
Poderia haver outros motivos? Talvez. Climas de guerra santa, como o que cercaram o episódio, abrem espaço para toda sorte de aventureirismo, porque geram a solidariedade na guerra, garantindo a blindagem dos principais personagens. No caso de temas complexos - como os jurídicos - o formalismo e a complexidade dos temas facilitam o uso da discricionariedade. Qualquer suspeita a respeito do comportamento dos agentes pode ser debitada a uma suposta campanha difamatória dos “inimigos”. E com a mídia majoritariamente a favor, reduz a possibilidade de denúncias ou escândalos sobre as posições pró-Dantas.
É o que explica os contratos de Antonio Fernando com a Brasil Telecom jamais terem recebido a devida cobertura da mídia. Não foi denunciado pelo PT, para não expor ainda mais suas ligações com o banqueiro. Foi poupado pela mídia - que se alinhou pesadamente a Dantas. E foi blindado amplamente pela ala Serra dentro do PSDB.
Com a anulação completa dos freios e contrapesos, Antonio Fernando viu-se à vontade para negociar com a Brasil Telecom.
De seu lado, todas as últimas atitudes de Gurgel de alguma forma  vão ao encontro dos interesses do banqueiro. Foi assim na tentativa de convencer Valério a envolver Lula nos negócios com a Portugal Telecom. E também na decisão recente de solicitar a quebra de sigilo do delegado Protógenes Queiroz – que conduziu a Satiagraha – e do empresário Luiz Roberto Demarco – bancado pela Telecom Itália para combater Dantas, mudando completamente em relação à sua posição anterior.
A quebra do sigilo será relevante para colocar os pingos nos iis, comprovar se houve de fato a compra de jornalistas e de policiais e, caso tenha ocorrido, revelar os nomes ou interromper de vez esse jogo de ameaças. Mas é evidente que o o resultado  maior foi  fortalecer as teses de Dantas junto ao STF, de que a Satiagraha não passou de um instrumento dos adversários comerciais. Foi um advogado de Dantas - o ex-Procurador Geral Aristisdes Junqueira - quem convenceu Gurgel a mudar de posição.
Com seu gesto, Gurgel coloca sob suspeitas os próprios procuradores que atuaram não apenas na Satiagraha como na Operação Chacal, que apurava envolvimento de Dantas com grampos ilegais.
Em seu parecer pela quebra do sigilo, Gurgel mencionou insistentemente um inquérito italiano que teria apurado irregularidades da Telecom Itália no Brasil. Na época da Satiagraha, dois procuradores da República – Anamara Osório (que tocava a ação da Operação Chacal  na qual Dantas era acusado de espionagem) e Rodrigo De Grandis – diziam claramente que a tentativa de inserir o relatório italiano nos processos visava sua anulação.. Referiam-se expressamente à tentativa do colunista de Veja, Diogo Mainardi, de levar o inquérito ao juiz do processo. Anamara acusou a defesa de Dantas de tentar ilegalmente incluir o CD do relatório no processo.
Dizia a nota do MPF de São Paulo:
"Para as procuradoras brasileiras, a denúncia na Itália é normal e só confirma o que já havia sido dito nos autos inúmeras vezes pelo MPF que, a despeito dos crimes cometidos no Brasil por Dantas e seus aliados e pela TIM, na Itália, "a investigação privada parecia ser comum entre todos, acusados e seus adversários comerciais". Além disso, o MPF não pode se manifestar sobre uma investigação em outro país, por não poder investigar no exterior, e vice-versa.
 
Para o MPF, as alusões da defesa de que a prova estaria "contaminada" não passam de "meras insinuações", pois a prova dos autos brasileiros foi colhida com autorização judicial para interceptações telefônicas e telemáticas, bem como, busca e apreensão. Tanto é assim que outro CD entregue à PF, em julho de 2004, por Angelo Jannone, ex-diretor da TIM, também foi excluído dos autos como prova após manifestação do MPF, atendendo pedido da defesa de Dantas".
 
Agora, é o próprio PGR quem tenta colocar o inquérito no  processo que corre no Supremo e, automaticamente, colocando sob suspeição seus  próprios procuradores.. E não se vê um movimento em defesa de seus membros por parte da ANPR.
 
Quando a Satiagraha foi anulada no STJ (Superior Tribunal de Justiça), o Ministério Público Federal recorreu, tanto em Brasília quanto em São Paulo.  Na cúpula, porém, Dantas conseguiu o feito inédito de sensibilizar quatro dos mais expressivos nomes do MInistério Público Federal pós-constituinte: os ex-procuradores gerais Antonio Fernando e Aristides Junqueira (que ele contratou para atuar junto a Roberto Gurgel), o atual PGR e o ex-procurador e atual presidente do STF Joaquim Barbosa.
 
Levará algum tempo para que a poeira baixe, a penumbra ceda e se conheçam, em toda sua extensão, as razões objetivas que levaram a esse alinhamento inédito em favor de Dantas.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Joaquim Barbosa tropeça no mensalão do DEM - Carta Maior

Joaquim Barbosa tropeça no mensalão do DEM - Carta Maior

Quatro anos de impunidade do mensalão do DEM escracham o rigor seletivo de Joaquim Barbosa e o caráter da AP 470 como julgamento de exceção.


Antonio Lassance

Uma decisão de Sua Majestade, a Rainha de Copas do Supremo Tribunal Federal, que responde pela alcunha de Joaquim Barbosa, acaba de criar um grave problema. Ao fazer a troca do juiz que cuidava da execução penal dos condenados da AP 470, em busca de alguém "mais duro", Barbosa tropeçou na Caixa de Pandora do mensalão do DEM.

Ao escolher um juiz para chamar de seu, optou, por acaso,  por alguém que é filho de um alto dirigente do PSDB-DF. Pior: o pai desse juiz foi secretário do governo de José Roberto Arruda, no Distrito Federal, e é considerado por muitos como o mais fiel aliado do ex-governador após o escândalo que o derrubou. Arruda caiu flagrado na operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, que revelou o que se tornou conhecido como o "mensalão do DEM".

A Caixa de Pandora, também por acaso, completa 4 anos exatamente nesta semana. Em 27 de novembro de 2009, a Polícia Federal expôs um farto conjunto de provas materiais do esquema de desvio de dinheiro público. O próprio José Roberto Arruda foi pego com a mão na cumbuca, em um vídeo no qual recebia dinheiro vivo - se Barbosa não sabe, é a isso que se chama propriamente de "domínio do fato".

O DEM ficou com a pecha daquele mensalão, mas é bom lembrar que Arruda era egresso do PSDB, tendo sido líder do governo FHC no Senado. Renunciou para não ser cassado por um outro escândalo, o do painel do Senado. Retornou à política como deputado federal e, depois, como governador, eleito pelo PFL (atual DEM) e trazendo seu querido PSDB para seu governo. Chegou a ser cogitado para vice de José Serra, nas eleições de 2010, não fosse a Federal ter estragado tudo.

O contraste é gritante. Arruda continua livre, leve e solto. Ficha limpa, ele pode inclusive concorrer às eleições do ano que vem. Filiado ao Partido da República (de Waldemar Costa Neto e Anthony Garotinho), Arruda conversa sobre alianças para 2014, no DF, com o PSDB, o PPS e, como não poderia deixar de ser, o DEM.

Detalhe: o processo do mensalão do DEM foi desmembrado. O único que responde atualmente em instância superior é um conselheiro do Tribunal de Contas do DF. Com isso, a maioria dos denunciados, a começar por Arruda, responde a processo em primeira instância, não recaindo na Lei da Ficha Limpa, que exige condenação pelo menos em segunda instância.

Nesse sentido, os quatro anos de impunidade daquele que foi apontado como chefe do mensalão do DEM escracham o rigor seletivo de Joaquim Barbosa e o caráter da AP 470 como julgamento de exceção.

(*) Antonio Lassance é doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB).

sábado, 23 de novembro de 2013

O anti-petismo e o cometa Ison « Sul 21 Sul 21

O anti-petismo e o cometa Ison « Sul 21 Sul 21

O anti-petismo e o cometa Ison

 Marcelo Carneiro da Cunha
Duas coisas brilham nos céus e nas capas da Veja, estimados sulvinteumenses. O cometa que ninguém sabe o tamanho que ainda vai ter, e a prisão dos acusados do tal mensalão, que também, no começo, ninguém sabia que tamanho iria atingir.
Agora sabemos.
Eu vejo várias coisas importantes acontecendo ao mesmo tempo, o que não quer dizer boas ou más, a priori, mas importantes.
Uma delas é a afirmação da autoridade suprema do Supremo, o que é essencial para que a gente saia das cavernas. O que pode ficar como questão é o que fazer para melhorar a qualidade institucional do STF, o que significa talvez mais reflexão ao indicar os juízes, e não apenas preencher cotas na hora da escolha. Acredito que futuros presidentes serão mais cuidadosos, o que será bom para o país.
Outra coisa que fica é a forte noção, compartilhada pelas pessoas de bem de que Genoíno pode ter sido condenado de acordo com leis e injustiçado no mesmo processo.
A outra coisa é o fato de que agora fica difícil explicar por que um Genoíno está preso e um Maluf está solto.
De qualquer maneira, o país avança.
Ao mesmo tempo, o que se ouve como pano de fundo, é o rosnado de gente que simplesmente odeia o PT e tudo que ele representa, mesmo que muito provavelmente não façam ideia do que isso seja.
Eu me pergunto as causas desse ódio, e lembro de uma ótima frase de alguém sobre a indignação. “O Indignado se sente moralmente superior pela sua capacidade de se indignar, que raramente se transforma em qualquer outra coisa que não ela mesma”.
São indignados, e muito, contra tudo isso que está aí. Curiosamente, não pensam que tudo isso que está aí esteve por 500 anos em construção, e por algo como 97% do tempo em mãos que não as do Lula ou da Dilma. A indignação não tem nada a ver com o que ocorre, com o que existe, mas com quem faz o que faz no Brasil de hoje.
Adorno disse, no Mínima Moralia, que “o burguês é  tolerante.  O seu amor pelas pessoas tais como são brota do ódio contra o homem reto”.
O PT não representa exatamente a retidão, mesmo que, como esquerda real, ela esteja presente em grande parte do que é e faz. Isso, estimados leitores, é exatamente o que incomoda tanto. Não é que o PT pareça ser diferente, mas o fato de que ele é diferente, mesmo quando faz o que aparentemente é igual. Não é. Pode ser tudo e pode ser ilegal, como deve ter sido. Mas, igual, não é. E esse é o espinho na pata da direita e dos indignados da turma do amendoim, na frase do cientista político Luiz Felipe Scolari.
Em momentos em que me encontro com representantes de uma autêntica direita, eu compreendo o que sentem pelo PT e o sentimento é real e faz sentido. É o PT quem impede a festa, e existem razões claras para o ódio. Quando ouço a turma do amendoim, sinto que os move a mágoa e incompreensão. O indignado tem somente a sua indignação, sem ela, ele é pouco, ou nada.
Eu acho que houve um julgamento real, e houve crimes reais. Portanto, estamos no caminho de entender que respostas ilegais podem ter sido dadas para problemas reais. O que não houve foi enriquecimento pessoal, e daí vem o ódio.
Como alguém pode ousar cometer um crime sem que isso seja em benefício do próprio bolso? Essa incompreensão atormenta e magoa. A ideia de que possam existir seres humanos diferentes, movidos por forças diferentes enlouquece de paixão a quem defende a tese de que todos os homens são igualmente cruéis e egoístas. Não são.
O que sabemos é que o governo FHC foi importante demais para o país para que se possa odiá-lo. Sabemos que existem motivos para ele ter sido ejetado do poder pelos últimos anos. Houve a privatização, do jeito que houve. Houve o congelamento do dólar com fins eleitorais, que quebrou o país. Houve a aliança com o PFL. Houve a reeleição, com tudo que isso implicou e houve o apagão, jamais esquecido, ainda mais no Sudeste.
Mas não existe ódio, que se veja, sinta, cheire, contra o governo FHC, como existe contra Lula, contra Dilma, e isso requer explicação.
Governos que trouxeram benefícios reais para o país, que foram ruptura com tudo, como o de Lula, como foi o de FHC, menos, merecem tratamento especial por parte da História e do povo consciente.
Dos demais não sei o que esperar. Gostaria que fosse algo que permitisse o debate e a compreensão. Não é, talvez nunca venha a ser. O PT magoa por ser, e isso, ao que me parece, não tem jeito. É ir em frente, e fim.
Marcelo Carneiro da Cunha é escritor.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Janio cobra punição de Barbosa no CNJ | Brasil 24/7

Janio cobra punição de Barbosa no CNJ | Brasil 24/7
Colunista da Folha diz que privação de Genoino de "cuidados específicos" representou irresponsável ameaça a uma vida; segundo ele, presidente do STF já conhecia a precariedade do estado do parlamentar quando determinou que o sujeitassem à viagem; além disso, Barbosa desrespeitou uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que ele mesmo preside, que determina que prisões devem ser feitas com cartas de sentenças e não apenas com mandados
21 de Novembro de 2013 às 05:07
247 – Joaquim Barbosa deve ser enquadrado pelo Conselho Nacional de Justiça, que ele mesmo preside. É o que diz o colunista da Folha Janio de Freitas. Segundo ele, o presidente do STF cometeu uma série de erros nas prisões dos réus da AP 470 e colocou a vida de Genoino em risco.
No momento em que determinou a execução de prisões de 12 condenados no mensalão durante feriado da Proclamação da República, Barbosa desrespeitou uma resolução do CNJ, expedida em 2010, que regulamenta o trâmite para o início do cumprimento das penas de prisão (Saiba mais).
Leia o artigo do Janio de Freitas:
O show dos erros
O estado de Genoino já era conhecido quando Joaquim Barbosa determinou que o sujeitassem à viagem
No primeiro plano, o espetáculo criado para a TV (alertada e preparada com a conveniente antecedência) mostrou montagem meticulosa, os presos passando pelos pátios dos aeroportos, entrando e saindo de vans e do avião-cárcere, até a entrada em seu destino. Por trás do primeiro plano, um pastelão. Feito de mais do que erros graves: também com o comprometimento funcional e moral de instituições cujos erros ferem o Estado de Direito. Ou seja, o próprio regime de democracia constitucional.
Os presos na sexta-feira, 15 de novembro, foram levados a exame de condições físicas pela Polícia Federal, antes de postos em reclusão. Exceto José Genoino, que foi dispensado, a pedido, de um exame obrigatório. Experiente, e diante de tantas menções à saúde inconfiável de José Genoino, o juiz Ademar Silva de Vasconcelos, a quem cabem as Execuções Penais no Distrito Federal, determinou exame médico do preso. Era já a tarde de terça-feira, com a conclusão de que Genoino é portador de "doença grave, crônica e agudizada, que necessita de cuidados específicos, medicamentosos e gerais".
José Genoino não adoeceu nos primeiros quatro dias de sua prisão. Logo, deixá-lo esses dias sem os "cuidados específicos", enquanto aqui fora se discutia se é o caso de cumprir pena em regime semiaberto ou em casa, representou irresponsável ameaça a uma vida --e quem responderá por isso?
A rigor, a primeira etapa de tal erro saiu do Supremo Tribunal Federal. A precariedade do estado de José Genoino já estava muito conhecida quando o ministro Joaquim Barbosa determinou que o sujeitassem a uma viagem demorada e de forte desgaste emocional. E, nas palavras de um ministro do mesmo Supremo, Marco Aurélio Mello, contrária à "lei que determina o cumprimento da pena próximo ao domicílio", nada a ver com Brasília. O que é contrário à lei, ilegal é. O Conselho Nacional de Justiça, que, presidido por Joaquim Barbosa, investe contra juízes que erram, fará o mesmo nesse caso? Afinal, dizem que o Brasil mudou e acabou a impunidade. Ou, no caso, não seria impunidade?
Do mesmo ministro Marco Aurélio, além de outros juristas e também do juiz das Execuções Penais, veio a observação que localiza, no bojo de mais um erro gritante, parte do erro de imprevidência temerária quanto a José Genoino. Foi a já muito citada omissão da "carta de sentença", que, se expedida pelo ministro Joaquim Barbosa, deveria anteceder o ato de reclusão. E só chegou ao juiz competente, para instruí-lo, 48 horas depois de guarda dos presos.
Com a "carta de sentença", outra comunicação obrigatória deixou de ser feita. Só ocorreu às 22h de anteontem, porque o destinatário dissera às TVs não ter o que providenciar sobre o deputado José Genoino, se nem fora comunicado pelo Supremo da decisão de prendê-lo. Presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves vai submeter a cassação do deputado ao voto do plenário, e não à Mesa Diretora como uma vez decidido pelo Supremo. Faz muito bem.
Mas o Ministério da Justiça tem mais a dizer. E sobretudo a fazer. O uso de algemas durante o voo dos nove presos transgrediu a norma baixada pelo próprio ministério, que só admite tal imobilização em caso de risco de resistência ou fuga. Que resistência Kátia Rabello, Simone Vasconcelos, José Genoino poderiam fazer no avião? E os demais, por que se entregariam, como fizeram também, para depois tentar atos de resistência dentro do avião? Além de cada um ter um agente no assento ao lado. O uso indevido de algemas, que esteve em moda para humilhar empresários, é uma arbitrariedade própria de regime policialesco, se não for aplicado só quando de fato necessário. Quem responderá pela transgressão à norma do próprio Ministério da Justiça?
Com a prisão se vem a saber de uma violência medieval: famílias de presos na Papuda, em Brasília, precisam dormir diante da penitenciária para assegurar-se, no dia seguinte, a senha que permita a visita ao filho, ao pai, marido, mulher. Que crime cometeram esses familiares para receberem o castigo desse sofrimento adicional, como se não lhes bastasse o de um filho ou pai na prisão?
Medieval, é isso mesmo a extensão do castigo à família. Na Brasília que diziam ser a capital do futuro. Assim até fazem sentido a viagem ilegal dos nove para Brasília, as algemas e outros castigos adicionais aplicados a José Genoino e outros. E que vão continuar.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Folha de S.Paulo - Colunistas - Janio de Freitas - Quando março chegar - 19/11/2013

Folha de S.Paulo - Colunistas - Janio de Freitas - Quando março chegar - 19/11/2013

Quando março chegar

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Na conturbada sessão do Supremo Tribunal Federal de quarta passada, quando decididas as prisões do mensalão sem esperar pelo fim dos recursos de defesa, um dos vários incidentes surgiu e repicou insistentemente sem sequer indício de algo que o explicasse. A ocorrência das prisões no 15 de novembro não só o explicou, como explicou muito mais. E com mais importância.
Já a antecipação das prisões entrava em discussão. Ricardo Lewandowski ponderou que, tendo o procurador-geral da República entrado com novo documento no processo, do qual o ministro recebera cópia e notara o despacho "Junte-se" assinado por Joaquim Barbosa, cabia à defesa pronunciar-se a respeito. Marco Aurélio Mello endossou de pronto a ponderação, pronunciamento de uma parte chama o da outra. O documento propunha as prisões imediatas.
Joaquim Barbosa desfechou, com raiva, um ataque súbito ao procurador-geral Rodrigo Janot, sentado à sua direita, por lhe mandar o documento na véspera, o qual nem ao menos lera antes de despachar. Do seu teor só tomava conhecimento ali, naquela hora.
Não precisaria dizer, aqui, que Marco Aurélio Mello se esbaldou em gozações ao presidente do tribunal que confessava assinar e despachar documentos sem os ler. Barbosa repetiu, e repetiu mais, o ataque à atitude de Janot, no entanto adotada com perfeita formalidade e no seu direito funcional.
Também não precisaria dizer que Joaquim Barbosa atropelou a ponderação sobre um direito de defesa e um dever de juízo, e aparentemente foi acompanhado pela maioria (com a intensidade da balbúrdia, o presidente não conseguiu formular o sentido e a forma da decisão do tribunal; adiou-a, e não a expôs na sessão seguinte).
Mas toda a crítica raivosa, que o procurador-geral Rodrigo Janot ouviu como um soldado ao tenentinho que experimenta o seu recente poder de humilhar, ficou explicada no feriado. Já em meio à exaltação com Marco Aurélio e Janot, aliás, Joaquim Barbosa dissera que já tinha preparada a medida quando o procurador-geral a pedira. Mas, na sessão, isso não pareceu importante porque nada levava a prever-se a intenção de Joaquim Barbosa de determinar as prisões para 15 de novembro.
Claro, com seu pedido, o procurador-geral pôs-se na iminência de se apropriar das prisões e dos efeitos promocionais decorrentes de providenciá-las. Mesmo não sendo esse o propósito de Rodrigo Janot, foi até manchete de primeira página com o que pedia. A intenção marqueteira pulou-lhe na garganta.
A ida dos presos de São Paulo, Belo Horizonte e Goiânia, cidades de suas residências, para cadeias injustificáveis em Brasília foi, mais do que sem sentido, por isso mesmo sem amparo legal. Mas proporcionou um espetáculo de marketing político extraordinário pelo alcance, social e geográfico, e pela concentração precisa sobre o beneficiário. Se apenas para colher palmas em lugares públicos ou para mais que isto, saberemos quando março encerrar o prazo especial de inscrições partidárias-eleitorais. Mas a convicção de que não será preciso esperar até lá, com as indicações dadas pelo espetáculo fabricado para o 15 de novembro, já supera as prisões como assunto na política.
janio de freitas Janio de Freitas

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Greenhalgh denuncia Barbosa e cobra Cardozo | Brasil 24/7

Greenhalgh denuncia Barbosa e cobra Cardozo | Brasil 24/7

Em entrevista ao 247, o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, que defendeu perseguidos políticos durante a ditadura militar, diz estar vivendo uma experiência ainda pior do que a do passado; "hoje, direitos da cidadania duramente conquistados estão sendo estraçalhados em plena democracia"; segundo ele, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, agiu de modo "deliberado" para impor um constrangimento ilegal dos réus condenados ao regime semiaberto; Greenhalgh também demonstra preocupação com o estado de saúde de José Genoino: "Eu o vi muito doente"; em Brasília, ele revela bastidores do caso e cobra uma atitude do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo: "um ministro da Justiça não pode se calar diante do arbítrio"
18 de Novembro de 2013 às 10:04
Brasília 247 - Advogado de vítimas da ditadura militar, Luiz Eduardo Greenhalgh, que já foi deputado federal pelo PT, desembarcou em Brasília no fim de semana para acompanhar de perto o tratamento que seria dado aos réus José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares, que foram condenados à prisão em regime semiaberto, mas que, na prática, estão submetidos a um regime fechado, em razão de decisões – segundo ele, ilegais – tomadas justamente por quem deveria zelar pelo cumprimento das leis: o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. "Estou estarrecido", disse Greenhalgh ao 247. "Hoje, em plena democracia, direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros estão sendo estraçalhados".
Segundo Greenhalgh, Barbosa a transferência dos presos para Brasília foi a primeira ilegalidade, uma vez que a lei determina que o regime semiaberto seja cumprido onde os réus trabalham e têm residência, ou seja, São Paulo, no caso dos três ex-dirigentes do PT. "Colocá-los naquele avião foi um gesto desnecessário, midiático, oneroso para os cofres públicos e que será revertido, uma vez que eles não poderão permanecer em Brasília".
Em seguida, segundo Greenhalgh, Barbosa encaminhou as ordens de prisão não ao juiz titular da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal, Ademar Silva Vasconcelos, mas ao juiz Bruno Silva Ribeiro, que estava de férias. "Tudo isso foi deliberado e milimetricamente calculado para que os presos ficassem mais tempo submetidos a um regime de prisão ilegal", diz Greenhalgh. Ele afirma ainda que, enquanto Dirceu, Genoino e Delúbio estavam submetidos a um constrangimento irregular, Barbosa foi ao Rio de Janeiro, a um clube, e depois embarcou para um congresso.
Por que razão as cartas de sentença não caíram nas mãos do juiz titular? Na visão de Greenhalgh, isso impediu que a defesa tivesse acesso aos documentos e a qualquer possibilidade de defesa. Durante quatro horas, relata Greenhalgh, os presos ficaram em frente à Papuda porque as autoridades de Brasília não poderiam acolhê-los. O impasse só foi resolvido quando se decidiu que eles seriam transferidos para uma área, dentro do presídio, que fica sob responsabilidade do Ministério da Justiça e da Polícia Federal.
Greenhalgh afirma ainda que Ademar Silva Vasconcelos decidiu não abrigar os presos na Papuda porque não tinha acesso às cartas de sentença. Por isso mesmo, eles dormiram nessa ala do presídio que ainda fica sob a custódia da Polícia Federal – uma espécie de área de transição.
Greenhalgh não poupa as palavras ao se referir a Joaquim Barbosa. "Ele fez uma suprema lambança", afirma. "Agiu de modo ilegal, arbitrário e movido por desejo de vingança, o que será ainda mais grave se ficar confirmado seu projeto de se tornar candidato". O advogado ecoa as palavras de Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e diz que os demais ministros do STF devem agir rapidamente para restaurar a dignidade da casa.
O que Greenhalgh define como "suprema lambança" ainda criou uma situação inusitada. Ele lembra que a Constituição brasileira determina que nenhuma violação de direitos fundamentais deixará de ser apreciada pelo Poder Judiciário. No entanto, os ministros do STF já decidiram que decisões da corte não são passíveis de revisão. "Estamos diante de uma situação surreal e esdrúxula, onde quem viola a lei é quem deveria zelar por ela, o presidente do STF, Joaquim Barbosa".
Após visitar os três, Greenhalgh afirmou que todos mantêm bom estado de espírito, mas se disse muito preocupado com José Genoino. "Eu o vi muito doente". Ele afirmou que ouviu de todos que nenhum deles quer qualquer privilégio. "Mas todos exigem que sejam respeitados integralmente os seus direitos", afirma. "Dirceu e Delúbio devem cumprir o semiaberto em São Paulo e o Genoino, diante do seu estado de saúde, tem direito à prisão domiciliar".
Por fim, o advogado cobra uma posição do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. "Ele não pode se calar diante do arbítrio", afirma. "É ministro da Justiça de um país onde estão sendo cometidas sérias arbitrariedades contra os direitos dos seus cidadãos". Ou seja: segundo Greenhalgh, não se trata de uma questão partidária, mas de defesa da própria cidadania. "O ministro tem que vir a público urgentemente".

A segunda tortura de José Genoíno - Carta Maior

A segunda tortura de José Genoíno - Carta Maior

A segunda tortura de José Genoíno

Genoíno foi torturado na ditadura e seus torturadores seguem impunes, abrigados por decisões deste mesmo tribunal que condena sem provas militantes do PT.


Tarso Genro (*) Arquivo

Ernst Bloch, na sua crítica aos princípios do Direito Natural sem fundamentação histórica, defendeu que não é sustentável que o homem seja considerado,  por nascimento, "livre e igual", pois não há "direitos inatos, e sim que todos são adquiridos em luta".  Esta categorização, "direitos adquiridos em luta", é fundamental  para  compreender as ordens políticas vigentes como Estado de Direito, que proclamam um elenco de princípios contraditórios, que ora expressam com maior vigor as conquistas dos que se consideram oprimidos e explorados no sistema de poder que está sendo impugnado, ora expressam  resistências dos privilegiados, que fruem o poder real: os donos do dinheiro e do poder.

Esta dupla possibilidade de uma ordem política,  inscrita em todas as constituições, mais ou menos democráticas, às vezes revela-se mais intensamente no contencioso político, às vezes ela bate à porta dos Tribunais. A disputa sobre o modelo de desenvolvimento do país, por exemplo, embora em alguns momentos tenha sido judicializada, deu-se até agora, predominantemente, pela via política, na qual o PT e seus aliados de esquerda e do centro político foram vitoriosos, embora com alianças pragmáticas e por vezes tortuosas para ter governabilidade.

Já a disputa sobre a interpretação das normas jurídicas que regem a anistia em nosso país e a disputa sobre as heranças dos dois governos do presidente Lula tem sido, predominantemente,  judicializadas. São levadas, portanto, para uma instância na qual a direita política, os privilegiados, os conservadores em geral (que tentaram sempre fulminar o Prouni, o Bolsa Família, as políticas de valorização do salário mínimo, as políticas de discriminação positiva, e outras políticas progressistas), tem maior possibilidade de influenciar.

Quando falo aqui em "influência" não estou me referindo a incidência que as forças conservadoras ou reacionárias podem ter sobre a integridade moral do Poder Judiciário ou mesmo sobre a sua honestidade intelectual. Refiro-me ao flanco em que aquelas forças - em determinados assuntos ou em determinadas circunstâncias-  podem exercer com maior sucesso a sua hegemonia, sem desconstituir a ordem jurídica formal, mantendo mínimos padrões de legitimidade.

O chamado processo do "mensalão" obedeceu minimamente aos ritos formais do Estado de Direito, com atropelos passíveis de serem cometido sem maiores danos à defesa, para chegar a final previamente determinado, exigido pela grande mídia, contingenciado por ela e expressando plenamente o que as forças mais elitistas e conservadoras do país pretendiam do processo: derrotados na política, hoje com três mandatos progressistas nas costas, levaram a disputa ao Poder Judiciário para uma gloriosa “revanche”: ali, a direita derrotada poderia fundir  (e fundiu) uma ilusória vitória através do Direito, para tentar preparar-se para uma vitória no terreno da política. As prisões de Genoíno e José Dirceu foram celebradas freneticamente pela grande imprensa.

Sustento que os vícios formais do processo, que foram corretamente apontados  pelos advogados de defesa  - falo dos réus José Genoíno e José Dirceu - foram  totalmente secundários para as suas condenações. Estas, já estavam deliberadas antes de qualquer prova, pela grande mídia e pelas forças conservadoras e reacionárias que lhe são tributárias, cuja pressão sobre a Suprema Corte  - com o acolhimento ideológico de alguns dos Juízes-  tornou-se insuportável para a ampla maioria deles.

Lembro: antes  que fossem produzidas quaisquer provas os réus já eram tratados diuturnamente como “quadrilheiros”, “mensaleiros”, “delinquentes”, não somente pela maioria da grande  imprensa, mas também por ilustres figuras  originárias dos partidos derrotados nas eleições presidenciais e pela banda de música do esquerdismo,  rapidamente aliada conjuntural da pior direita nos ataques aos Governos Lula. Formou-se assim uma santa aliança,  antes do processo, para produzir  a convicção pública que só as condenações resgatariam a “dignidade da República”, tal qual ela é entendida pelos padrões midiáticos dominantes.

Em casos como este, no qual a grande mídia tritura indivíduos, coopta consciências e define comportamentos,  mais além de meras convicções jurídicas e morais, não está em jogo ser corajoso ou não, honesto ou não, democrata ou não. Está em questão a própria funcionalidade do Estado de Direito, que sem desestruturar a ordem jurídica formal pode flexioná-la  para dar guarida a  interesses políticos estratégicos  opostos aos que “adquirem direitos em luta”. Embora estes direitos sejam conquistas que não abalam os padrões de dominação do capital financeiro, que tutela impiedosamente as ordens democráticas modernas, sempre é bom avisar que tudo tem limites.   O aviso está dado. Mas ele surtirá efeitos terminativos?

Este realismo político do Supremo ao condenar sem provas, num processo que foi legalmente instituído e acompanhado por todo o povo - cercado por um poder midiático que tornou irrelevantes as fundamentações dos  Juízes - tem um preço: ao escolher que este seria o melhor desfecho não encerrou o episódio. Ficam pairando, isto sim, sobre a República e sobre o próprio prestígio da Suprema Corte, algumas comparações de profundo significado histórico, que irão influir de maneira decisiva em nosso futuro democrático.

José Genoíno foi brutalmente torturado na época da ditadura e seus torturadores continuam aí, sorridentes, impunes e desafiantes, sem  qualquer ameaça real de responderem, na democracia, pelo que fizeram nos porões do regime de arbítrio, abrigados até agora por decisões deste mesmo Tribunal que condena sem provas militantes do PT. José Dirceu coordenou a vitória legítima de Lula, para o seu primeiro mandato e as suas “contrapartes”,  que compraram votos para reeleger Fernando Henrique (suponho que sem a ciência do Presidente de então), estão também por aí,  livres e gaudérios.

O desfecho atual, portanto, não encerra o processo do “mensalão”, mas reabre-o em outro plano: o da questão democrática no  país, na qual a “flexão” do Poder Judiciário mostra-se unilateralmente politizada  para “revanchear” os derrotados na política. Acentua, também, o debate sobre o  poder das mídias sobre as instituições. Até onde pode ir, na democracia, esta arrogância que parece  infinita de julgar por antecipação, exigir condenações sem provas e  tutelar a instituições através do controle e da manipulação da informação?.

Militei ao lado de José Genoíno por mais de vinte anos, depois nos separamos por razões políticas e ideológicas,  internamente ao Partido. É um homem honesto, de vida modesta e honrada, que sempre lutou por seus ideais com dignidade e ardor, arriscando a própria vida, em momentos muito duros da nossa História. Só foi condenado porque era presidente do PT,  no momento do chamado “mensalão”.

Militei sempre em campos opostos a José Dirceu em nosso Partido e, em termos pessoais, conheço-o muito pouco, mas não hesito em dizer que foi condenado sem provas,  por razões eminentemente políticas, como reconhecem insuspeitos juristas, que sequer tem simpatias por ele ou pelo PT.

Assim como temos que colocar na nossa bagagem de experiências os  erros cometidos que permitiram a criação de um processo  judicial ordinário,  que se tornou rapidamente um processo político, devemos tratar, ora em diante, este processo judicial de sentenças tipicamente políticas, como uma experiência decisiva para requalificar, não somente as nossas instituições democráticas duramente conquistadas na Carta de 88, mas também para organizar uma sistema de alianças que dê um mínimo respaldo, social e parlamentar,  para fazermos o dever de casa da revolução democrática: uma Constituinte, no mínimo para uma profunda reforma política, num país em que a mídia de direita é mais forte do que os partidos e as instituições republicanas.

(*) Governador do Rio Grande do Sul

Quem vai pagar por essa dor? | O Cafezinho

Quem vai pagar por essa dor? | O Cafezinho

A Globo, a Folha e a Veja versus Genoino

A Globo, a Folha e a Veja versus Genoino
Paulo Nogueira
Brecht, num de seus melhores momentos, falou que o pior analfabeto é o analfabeto político, que aqui vou tratar por AP, por razões de espaço e de facilidade.
O AP, como sublinhava Brecht, facilita a vida da direita predadora, da plutocracia empenhada apenas em acumular moedas. O AP é facilmente manipulado pelos poderosos.
No Brasil, como se fosse miolo de pão para pombos, a direita – pela sua voz, a mídia corporativa – arremessa ao AP denúncias de corrupção, quase sempre infladas ou simplesmente inventadas.
E o AP é assim manipulado como se estivesse com uma coleirinha. Veja, Globo e Folha são mestras na arte de manobrar o AP.
Penso nisso tudo ao ver o drama pelo qual passa José Genoino. Mal saído de uma cirurgia delicada no coração, Genoino foi preso por um capricho de Joaquim Barbosa, um heroi do AP.
A filha de Genoino, Miruna, numa entrevista ao blogueiro Eduardo Guimarães, fez um pedido singelo. Pediu aos brasileiros que não se deixassem contaminar pela trinca suprema da canalhice jornalística brasileira – Veja, Globo e Folha.
Miruna, 32 anos, é uma professora. Herdou do pai a simplicidade. É quase que o contrário de Verônica Serra, a multimilionária filha de Serra.
“Tudo que meu pai fez, desde que saiu do Ceará, foi lutar por justiça social”, disse Miruna.
Compare isso ao que vem fazendo, sistematicamente, Veja, Globo e Folha. É o oposto. A mídia corporativa teve e tem uma contribuição bilionária na construção de um país abjetamente desigual.
Em 1964, a mídia tramou contra a democracia e saudou entusiasmadamente a ditadura que mataria tantos brasileiros e colocaria no topo da lista dos ricos as famílias que controlam o noticiário que chega à sociedade.
Dez anos antes, a mídia levou Getúlio Vargas ao suicídio. Nas duas ocasiões, e em várias outras, o AP foi brutalmente manipulado pela imprensa.
O apelo falacioso, cínico e indecente da “corrupção” sempre funcionou. Repito: era e é o miolo de pão atirado aos pombos, ou ao AP.
Agora, vejo na internet alguns leitores dizerem o seguinte: “Pela primeira vez os poderosos estão na cadeia.”
Pobres APs.
Genoino poderoso? Ora, basta olhar seus bens: uma casa modesta no Butantã, bairro classe média de São Paulo.
Poderosa é a Globo, poderosa é a Veja, poderosa é a Folha, mas o AP é enganado, intoxicado mentalmente por elas.
A Globo, por exemplo, deve bilhões à Receita Federal, um crime que dá cadeia e repulsa coletiva em países socialmente avançados.
E o que acontece com ela? Seus acionistas não são presos, e sequer quitam as contas na Receita.
Pior: os múltiplos veículos da Globo cobrem a “corrupção” como se a empresa fosse São Francisco de Assis.
O mesmo vale para a Veja e para a Folha. Seus jornalistas rottweilers fingem desconhecer que o dinheiro público é que ergueu a fortuna assombrosa de seus patrões.
Os cofres do BNDES e do Banco do Brasil sempre foram frequentados pelas empresas de mídia como se fossem lupanares.
Os jornalistas fingem desconhecer também – ou é ignorância apenas – que vigora na mídia uma absurda reserva de mercado que veda a empresas estrangeiras entrar no Brasil.
Pesquise na Veja, na Folha e na Globo o número de reportagens que clamam por mercado aberto. Mas para os outros. Na sombra, elas conseguiram manter um privilégio inacreditável: a reserva.
Vou contar um pequeno exemplo de assalto ao dinheiro público por parte da mídia. Na era de FHC, quando todos os anunciantes obtinham descontos enormes das empresas de mídia, apenas as estatais pagavam a tabela cheia.
Importante: estatais federais, estaduais e municipais.
Dinheiro – muito dinheiro — que deveria construir hospitais e escolas acabava na Globo, na Veja, na Folha etc.
Isso é poder. Isso é corrupção.
E então o pobre Genoino, com sua casa que é menor que a sala dos Marinhos, dos Civitas e dos Frias, é o “corrupto”.
Miruna pede que as pessoas não acreditem na Globo, na Veja e na Folha.
O AP acredita.
Mas eles são cada vez menos, como se pode ver pelos resultados das eleições, e pelas sistemáticas quedas de audiência da Globo, da Veja e da Folha.
O brasileiro acordou, e a internet tem um papel decisivo nisso, ao oferecer visões alternativas à voz rouca das ruas.
O AP é um ser extinção, como a própria mídia que o manipula.
E isso é uma notícia extraordinariamente boa para os brasileiros que, como o DCM, querem que o Brasil seja tão avançado socialmente como a Escandinávia.
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Por que a direita odeia tanto Zé Dirceu? | Diário do Centro do Mundo

Por que a direita odeia tanto Zé Dirceu? | Diário do Centro do Mundo
 Paulo Nogueira

Por que Zé Dirceu é tão odiado pela direita?
Ele é ainda mais odiado que Lula, o que não é pouco.
Tenho minha tese.
De Lula era esperado, mesmo, que estivesse do lado oposto ao da direita. Operário, nordestino, nove dedos, pouca oportunidade de estudar.
Seria uma aberração Lula se alinhar ao 1%, para usar a grande terminologia do movimento Ocupe Wall Street.
Mas Dirceu não.
Ele tinha todos os atributos para figurar no 1% que fez o país ser o que é, um dos campeões mundiais de iniquidade, a terra das poucas mansões e das tantas favelas.
Articulado, inteligente, dado a leituras. Bem apessoado. Na ótica do 1%, pessoas como Zé Dirceu são catalogadas como traidoras, e devem ser punidas exemplarmente para que outras do mesmo gênero, ou se preferirem da mesma classe, não sigam seu exemplo.
Na França revolucionária, a aristocracia entendia que os Marats, os Desmoullins, os Héberts  pregassem a morte do velho regime, mas jamais conseguiu compreender o que levou o Duque de Orleans a também lutar pela liberdade, pela igualdade e pela fraternidade.
O 1% brasileiro, na história recente, soube sempre atrair equivalentes a Dirceu. Carlos Lacerda, por exemplo, era de esquerda na juventude.
Depois, se tornou um direitista fanático. Segundo relatos de quem o conheceu, ele se cansou da vida dura reservada aos esquerdistas em seus dias e foi para onde o dinheiro estava.
O 1% recompensa bem. Nos dias de hoje, se você defende os privilégios, acaba falando na CBN, aparecendo em entrevistas na Globonews, tendo coluna em jornais e revistas, dando palestras muito bem pagas. E, com a carteira abastecida, ainda pode posar de ‘corajoso’ defensor da ‘imprensa livre’.
Dirceu não fez a trajetória de Lacerda. Não abjurou suas crenças.
E então virou o demônio.
Quem o demonizou foram exatamente aqueles que o adulariam se ele se vendesse. A imagem que a mídia construiu de Zé Dirceu concentrou num único homem todos os defeitos possíveis: vaidoso, arrogante, corrupto, inescrupuloso, maquiavélico.
Um monstro, enfim.
Pegou essa imagem? Menos do que o 1% gostaria, provavelmente. Quem não se lembra de Serra, num debate com Haddad, repetidas vezes tentar encurralar seu oponente com a acusação de que era “amigo do Dirceu”?
Haddad reconheceu tranquilamente a amizade, e quem terminou eleito não foi Serra.
Na mídia tradicional, a campanha contra Dirceu desconhece limites jornalísticos e, pior que isso, legais.
Um repórter tenta invadir criminosamente o quarto do hotel que ele ocupa, e ainda assim é Dirceu que aparece como o vilão do caso.
Quem conhece o Dirceu real, com seus defeitos e virtudes, grandezas e misérias, são aqueles poucos de seu círculo íntimo. Para eles não faz efeito o noticiário que o sataniza. (Caso interesse a alguém, nunca votei em Dirceu e não o conheço pessoalmente.)
De resto, esse noticiário – ou propaganda – não é feito para eles, mas para os chamados ‘inocentes úteis’, aqueles que em outras épocas acreditaram no “Mar de Lama” de Getúlio Vargas ou no “perigo comunista” representado por João Goulart.
É a imagem demoníaca de Dirceu construída pela mídia que, nestes dias, é utilizada pela maioria dos juízes do Supremo no julgamento do Mensalão.
Não chega a ser surpresa. A justiça brasileira tradicionalmente foi uma extensão do 1%.
Estudiosos já notaram a diferença da atuação da justiça no Brasil e na Argentina na época das duas ditaduras militares.
No Brasil, a justiça foi servil aos militares. Na Argentina, a justiça desafiou frequentemente os militares ao declarar inocentes muitos acusados de “subversivos”.
Isso acabou levando os militares argentinos a simplesmente matar milhares de opositores sem que fossem julgados.
Fundamentalmente, Dirceu paga o preço de sua opção teimosa pelo 99%.
Mas quem vai julgá-lo perante a história não é o 1%, representado por uma mídia que defende seus próprios privilégios e finge se bater pelo interesse público. E nem uma corte em cuja história a tradição é o alinhamento alegremente pomposo com o 1%.
Ele deve saber disso, e imagino que isso o conforte em horas duras como esta.
Sobre o Autor
O jornalista Paulo Nogueira, baseado em Londres, é fundador e diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.

domingo, 17 de novembro de 2013

Desvendando a espuma: o enigma da classe média brasileira

Desvendando a espuma: o enigma da classe média brasileira

Folha de S.Paulo - Colunistas - Janio de Freitas - Um nome guardado - 17/11/2013

Folha de S.Paulo - Colunistas - Janio de Freitas - Um nome guardado - 17/11/2013

Um nome guardado

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No dia em que for contada a história verdadeira dos fatos cuja versão predominante prestou-se ao chamado julgamento do mensalão, entre outros possíveis personagens novos estará ao menos um que, por si só, muda a configuração e a essência da história conhecida.
Duas observações urgentes aqui. A primeira é de que não me refiro a Lula, como o personagem de relevância especial.
A outra é a de que não conheço os fatos completos. A partir de duas inserções breves e bastante sutis, que me foram dirigidas em conversas diferentes há poucos meses, passei a rever muitas anotações feitas desde o começo do caso mensalão, interrogatórios, depoimentos e conversas memorizadas ou com pontos focais por mim registrados. Nada de excepcional no trabalho de jornalismo.
Como também consigo ser sutil às vezes, foi desse modo que testei minha constatação com um dos que poderiam derrubá-la. Sobreviveu. E, se não posso expô-la por motivo legal, basicamente falta de prova objetiva e firme, posso dizer com convicção: a cada vez que cruzarem a porta de sua reclusão, José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares estarão levando o segredo de um nome e de fatos que não quiseram mencionar. Ou, na linguagem vulgarizada pela ditadura, não quiseram entregar ou dedurar.
Os ministros do Supremo, como todos os juízes, julgaram o que foi submetido ao seu conhecimento jurídico e, mais ainda, às suas consciências. O mesmo não pode ser dito sobre a Procuradoria-Geral da República, que teve a responsabilidade de reunir e passar ao STF as informações e comprovações apuradas, as conclusões e suas acusações no caso. Ficou muito por apurar e muito por provar. A quem tiver curiosidade e paciência, sugiro começar pela leitura dos interrogatórios da CPI dos Correios, onde se encontra, ligeira e não explorada, uma pista (a primeira, creio) do que veio a ser um segredo por amizade, ou por companheirismo, ou por ética pessoal, com os mesmos ônus nas três hipóteses.
Civilização
Por falar no Supremo, sua sessão da semana passada sobre o mensalão não foi apenas uma das mais tensas nesse processo de divergências tensionantes. Voltou a ter ocasiões de hostilidade que desmoralizam o Judiciário e sobretudo o próprio Supremo. Além de não menos desmoralizantes posições como a recusa, com o argumento de que "é preciso acabar com este julgamento", a reexaminar um erro grave: o réu Jacinto Lamas foi condenado a pena maior do que o chefe dos seus atos, este também autor de maior número das condenadas lavagens de dinheiro. Isso pode ser justiça emanada do Supremo? E aquele é à altura de ministros do Supremo?
Tão grande foi a balbúrdia da sessão do outrora dito "vetusto tribunal" que ao fim o ministro Joaquim Barbosa não conseguiu dizer o que fora decidido, e precisou adiar a proclamação. Impossibilidade e causa, provavelmente, sem ocorrência, jamais, no velho Supremo.
Nada disso sequer motivado por questões relativas a petistas, como em tantas vezes. Foi só desinteligência mesmo, em qualquer sentido da palavra. Com os níveis de civilidade, entre a melhor educação e o seu oposto absoluto.
OLÍMPICA
Uma exibição de eficiência real no Supremo. Na quarta-feira, a ministra Cármen Lúcia movimentou o processo penal movido contra Fernando Collor, passando-o ao revisor Dias Toffoli. Era um recorde. Na manhã daquele dia, o "Globo" publicara a manchete "Collor está próximo de se livrar da última ação no STF". Isto porque "o processo está parado no gabinete da ministra Cármen Lúcia desde outubro de 2009 sem qualquer movimentação". De quatro anos a algumas horas.
Tofolli não precisou de manchete, liberando prontamente o processo para votação. Mas a verdade é que a sem-cerimônia com que alguns ministros guardam determinados projetos, bem determinados, só é proporcional à rapidez com que as manchetes os apressam.
(A manchete do "Globo" por certo contrariou um terceiro ministro).
IMPUNES
Os comentaristas que veem, no caso mensalão, "o fim da impunidade" e outras maravilhas nacionais poderiam explicar o que se passa, então, com o mensalão do PSDB, que se espreguiça desde 1998, já com prescrições havidas e outras iminentes para seus réus. Também serve uma explicação sobre o jornalismo e aquele processo.

Janio de Freitas,

Ação Penal 470: uma exceção para a história - Carta Maior

Ação Penal 470: uma exceção para a história - Carta Maior
Wanderley Guilherme dos Santos Arquivo

Ao bem afamado Péricles, o ateniense, é atribuída a opinião de que, embora sendo certo que nem todos têm sabedoria para governar, a capacidade de julgar um governo em particular é universal. A observação parece valer com razoável generalidade. Por exemplo: nem por faltar um diploma em medicina está um adoentado impedido de avaliar a competência do profissional que o assiste. Assim, ainda que não portadaor de títulos ou conhecimentos para ocupar assento no Supremo Tribunal Federal, tenho como direito constitucional e recomendação de um clássico grego inteira liberdade para opinar sobre a Ação Penal 470.

Posso dispensar a cautela de não me indispor com aquele colegiado, pois não tenho licença para advogar oficialmente ou não a causa de quem quer que seja. E contrariando desde logo o juízo de algumas pessoas de bem, não enxergo qualquer efeito pedagógico nesse julgamento e não desejo em hipótese alguma que se repita em outros processos. Falacioso em seu início, enredou os ministros em pencas de distingos argumentativos e notória fabricação de aleijados fundamentos jurídicos. Não menciono escandalosos equívocos de análise com que a vaidade de alguns e a impunidade de todos sacramentaram, pelo silêncio, o falso transformado em verdadeiro por conluio majoritário. Vou ao que me parece essencial.

A premissa maior da denúncia postulava a existência de um plano para a perpetuação no poder arquitetado por três ou quatro importantes personagens do Partido dos Trabalhadores. Até aí nada, pois é aspiração  absolutamente legítima de qualquer partido em uma ordem democrática. Não obstante, é também mais do que conhecido que o realismo político recomenda, antes de tudo, a busca da vitória na próxima eleição. Não existe a possibilidade logicamente legítima de extrair de uma competição singular, exceto por confissão dos envolvidos, a meta de perpetuação no poder de forma ilegal ou criminosa. Pois o procurador-geral da República pressupôs que havia um plano transcendente à próxima eleição, a ser executado mediante meios ilícitos.

A normal aspiração de continuidade foi denunciada como criminosa, denúncia a ser comprovada no decorrer do julgamento. E aí ocorreu essencial subversão na ordem das provas. Ao contrário de cada conjunto parcial de evidências apontar para a solidez da premissa era esta que atribuía a frágeis indícios e bisbilhotices levianas uma contundência e cristalinidade que não possuíam. Todos os ministros engoliram a pílula da premissa e passaram a discutir, às vezes pateticamente, a extensão de seus efeitos. Dizer que a mídia reacionária ajudou a criar a confusão, que, sim, o fez, não isenta nenhum dos ministros da facilidade com que caíram na armadilha arquitetada pelo procurador geral e pelo ministro relator Joaquim Barbosa.

Era patético, repito, o espetáculo em que cada ministro procurava nos textos legais quer a inocência, quer a culpabilidade dos acusados. Em momentos, fatos que eram apresentados por um ministro como tendo certa significação, derivada da premissa, e por isso condenava o acusado pelo crime supostamente cometido, os mesmos fatos eram apresentados como significando o oposto e, todavia, servindo de comprovação da culpabilidade do acusado. Exemplo: a ministra Carmem Lucia entendeu que o fato de a mulher de João Paulo Cunha ter ido descontar ou receber um cheque em gerência bancária no centro de Brasília comprovava a tranqüilidade com que os acusados cumpriam atos criminosos à luz do dia, desafiadoramente. Já a ministra Rosa Weber interpretou o mesmo fato como uma tentativa de esconder uma ação ilegal e, portanto, João Paulo Cunha, seu marido, era culpado. Uma ação perfeitamente legal, note-se, o desconto de um  cheque, sofreu dupla operação plástica: uma transformou-o em deboche à opinião pública, outra o encapotou como um pioneiro ato blackbloc. Dessas interpretações contraditórias, seguiu-se a mesma conclusão condenatória, pela intermediação da premissa maior, segundo a qual qualquer ato dos indiciados estava associado àquele desígnio criminoso.

Estando os acusados condenados conforme tal rito subversivo, o julgamento de outras acusações (sendo o julgamento “fatiado” como bem arquitetou o relator Joaquim Barbosa, enfiando-o aos gritos pela goela de nove dos 11 ministros) se iniciava assim: tendo ficado provado que o réu cometeu tal e tal crime, lá se ia nova acusação como se se tratasse de um reincidente no mundo do crime em momentos diferentes no tempo. E mais, como se a condenação já estabelecida houvesse confirmado a veracidade da premissa maior sobre a existência de um plano político maligno. Pois assim foi até o fim: a premissa caucionando indícios frágeis – e até mesmo a total ausência de indícios como na fala da ministra Rosa Weber explicando que aceitava a culpabilidade de José Dirceu justamente pela inexistência de provas – e os indícios frágeis, convertidos em condenações, emprestando solidez a uma estapafúrdia premissa.

Foi igualmente lamentável o espetáculo da dosimetria. Como calcular penas segundo a extensão e intensidade do agravo, se a existência do agravo pendia de farrapos de indícios? E como calcular se o que sustentava os indícios era uma conjetura dialeticamente tornada plausível por esses farrapos e para a qual não há pena explícita consignada?

Todos os ilícitos comprovados, e vários o foram, se esclarecem e adquirem sentido terreno quando se aceita o crime confesso de criação e utilização de caixa dois.
Esta outra acusação foi desvirtuada pela mídia e pelos ressentidos de derrotas eleitorais, apresentando-a como tentativa de inocentar militantes políticos.
Notoriamente, buscou-se punir de qualquer modo os principais nomes do Partido dos Trabalhadores. A seguir, sucederam-se os contorcionismos para a montagem de um roteiro em que se busca provar o inexistente.

Não há nada a copiar neste julgamento de exceção – a Ação Penal 470.

Ativistas do Occupy compram dívidas pessoais no mercado e perdoam endividados - BBC Brasil - Notícias

Ativistas do Occupy compram dívidas pessoais no mercado e perdoam endividados - BBC Brasil - Notícias

Occupy Wall Street fez aniversário de dois anos em setembro. Foto: Getty Images
Occupy Wall Street culpa setor financeiro por desigualdades sociais
O movimento Occupy Wall Street luta contra distorções sociais e econômicas provocadas, na visão do grupo, pela ganância do mercado financeiro, mas ativistas do grupo resolveram entrar justamente no mercado que criticam para defender pessoas consideradas em situação vulnerável.
Um grupo de ativistas do movimento está comprando papéis no mercado secundário de dívidas nos Estados Unidos e perdoando os endividados.
"Nos Estados Unidos, muitas pessoas estão se endividando para lidar com as necessidades básicas da vida", explica Ann Larson, ativista do grupo Strike Debt, formado a partir do Occupy Wall Street.
"Por exemplo quando as pessoas são hospitalizadas e não possuem plano de saúde, ou sem cobertura boa o suficiente, elas recebem uma conta. E se elas não conseguem pagar essa conta, o credor vende esta dívida em um mercado secundário de dívida."
É nesta transação que grandes lucros são realizados, diz Larson. As dívidas são vendidas por valores muito pequenos – em uma proporção que chega a cinco centavos por cada dólar devido.
Com isso, o credor original – como o hospital, ou o banco que o representa – recebe apenas uma fração do que é devido, mas o dinheiro é pago imediatamente. Para lucrar, o novo credor cobra a dívida no seu valor original diretamente da pessoa que não conseguiu pagar suas contas.
"Um coletor da dívida aparece e começa a assediar a pessoa, para fazê-la pagar a dívida", diz a ativista.
"O que nós fazemos: nós entramos neste mercado de dívidas e compramos as dívidas. Mas em vez de assediar os devedores, nós perdoamos a dívida."
O dinheiro foi arrecadado pelo Strike Debt através de uma campanha pedindo doações. A meta original do grupo para o mês de novembro de 2012 era juntar US$ 50 mil, que seriam suficientes para perdoar cerca de US$ 1 milhão em dívidas pessoais.
Larson conta que a meta foi cumprida em apenas um dia. Desde então, eles arrecadaram dez vezes este valor. Com os US$ 400 mil já somados, ela diz que foram quitadas e perdoadas dívidas pessoais no valor de US$ 14 milhões, muitas delas no setor de saúde.
Como as dívidas são vendidas por valores muito baixos no mercado secundário, uma pequena quantia em doações é suficiente para perdoar altas somas emprestadas.
Inicialmente o cálculo feito pelo Strike Debt é de que cada dólar arrecadado perdoaria US$ 20 em dívidas. Mas em muitos casos, eles conseguiram proporções ainda mais favoráveis.
"Nós não tínhamos ideia de que seríamos tão bem-sucedidos", diz Larson.

'Brilhante'

A ideia faz parte de um dos conceitos do movimento Occupy em todo o mundo – o de "Jubileu da Dívida", que consiste em fazer campanha para que empréstimos tomados por pessoas e instituições mais frágeis na sociedade não precisem ser devolvidos a credores ricos.
A iniciativa do Strike Debt recebeu elogios até mesmo no mercado financeiro – tido como alvo principal dos ativistas.
Para o diretor de renda fixa do Banco de Investimentos Espírito Santo em Londres, Marcus Ashworth, a ideia é "brilhante".
Mas ele faz uma ressalva sobre a escala e os efeitos de longo prazo desta iniciativa.
"Quando o mercado perceber que existe um comprador lá fora, infelizmente os preços [das dívidas] vão se ajustar [e subir]. Mas se isso for mantido em uma escala relativamente pequena [como agora], isso pode ser muito útil", disse Ashworth à BBC.
"Como tem funcionado até este momento, a ideia é brilhante."
Ele também acredita que a iniciativa está funcionando bem nos Estados Unidos porque o mercado secundário usado para negociar dívidas pessoais é bem-estabelecido no país, e com regras sólidas.
Lá, este tipo de empréstimo é conhecido como "Ninja Loans" – ninja é uma abreviatura de "No Income, No Job, (No) Assets" (sem renda, sem emprego e sem ativos). São empréstimos de alto risco, e que justamente por isso produzem taxas de retorno enormes.
Para o endividado, esse tipo de renegociação permite que as pessoas mantenham um certo padrão de vida relativamente confortável enquanto trabalham para sair da situação de insolvência.
Mas segundo Ashworth, esse tipo de mercado não se desenvolveu tão bem em outros lugares, como na Europa, e por isso a iniciativa pode não ser bem-sucedida se exportada para outros países.
"As leis aqui na Grã-Bretanha e na Europa são muito mais duras, então é mais difícil deixar suas dívidas simplesmente para trás. Portanto o valor da dívida aqui é maior."