O anti-petismo e o cometa Ison
Duas coisas brilham nos céus e nas capas da Veja, estimados sulvinteumenses. O cometa que ninguém sabe o tamanho que ainda vai ter, e a prisão dos acusados do tal mensalão, que também, no começo, ninguém sabia que tamanho iria atingir.
Agora sabemos.
Eu vejo várias coisas importantes acontecendo ao mesmo tempo, o que não quer dizer boas ou más, a priori, mas importantes.
Uma delas é a afirmação da autoridade suprema do Supremo, o que é essencial para que a gente saia das cavernas. O que pode ficar como questão é o que fazer para melhorar a qualidade institucional do STF, o que significa talvez mais reflexão ao indicar os juízes, e não apenas preencher cotas na hora da escolha. Acredito que futuros presidentes serão mais cuidadosos, o que será bom para o país.
Outra coisa que fica é a forte noção, compartilhada pelas pessoas de bem de que Genoíno pode ter sido condenado de acordo com leis e injustiçado no mesmo processo.
A outra coisa é o fato de que agora fica difícil explicar por que um Genoíno está preso e um Maluf está solto.
De qualquer maneira, o país avança.
Ao mesmo tempo, o que se ouve como pano de fundo, é o rosnado de gente que simplesmente odeia o PT e tudo que ele representa, mesmo que muito provavelmente não façam ideia do que isso seja.
Eu me pergunto as causas desse ódio, e lembro de uma ótima frase de alguém sobre a indignação. “O Indignado se sente moralmente superior pela sua capacidade de se indignar, que raramente se transforma em qualquer outra coisa que não ela mesma”.
São indignados, e muito, contra tudo isso que está aí. Curiosamente, não pensam que tudo isso que está aí esteve por 500 anos em construção, e por algo como 97% do tempo em mãos que não as do Lula ou da Dilma. A indignação não tem nada a ver com o que ocorre, com o que existe, mas com quem faz o que faz no Brasil de hoje.
Adorno disse, no Mínima Moralia, que “o burguês é tolerante. O seu amor pelas pessoas tais como são brota do ódio contra o homem reto”.
O PT não representa exatamente a retidão, mesmo que, como esquerda real, ela esteja presente em grande parte do que é e faz. Isso, estimados leitores, é exatamente o que incomoda tanto. Não é que o PT pareça ser diferente, mas o fato de que ele é diferente, mesmo quando faz o que aparentemente é igual. Não é. Pode ser tudo e pode ser ilegal, como deve ter sido. Mas, igual, não é. E esse é o espinho na pata da direita e dos indignados da turma do amendoim, na frase do cientista político Luiz Felipe Scolari.
Em momentos em que me encontro com representantes de uma autêntica direita, eu compreendo o que sentem pelo PT e o sentimento é real e faz sentido. É o PT quem impede a festa, e existem razões claras para o ódio. Quando ouço a turma do amendoim, sinto que os move a mágoa e incompreensão. O indignado tem somente a sua indignação, sem ela, ele é pouco, ou nada.
Eu acho que houve um julgamento real, e houve crimes reais. Portanto, estamos no caminho de entender que respostas ilegais podem ter sido dadas para problemas reais. O que não houve foi enriquecimento pessoal, e daí vem o ódio.
Como alguém pode ousar cometer um crime sem que isso seja em benefício do próprio bolso? Essa incompreensão atormenta e magoa. A ideia de que possam existir seres humanos diferentes, movidos por forças diferentes enlouquece de paixão a quem defende a tese de que todos os homens são igualmente cruéis e egoístas. Não são.
O que sabemos é que o governo FHC foi importante demais para o país para que se possa odiá-lo. Sabemos que existem motivos para ele ter sido ejetado do poder pelos últimos anos. Houve a privatização, do jeito que houve. Houve o congelamento do dólar com fins eleitorais, que quebrou o país. Houve a aliança com o PFL. Houve a reeleição, com tudo que isso implicou e houve o apagão, jamais esquecido, ainda mais no Sudeste.
Mas não existe ódio, que se veja, sinta, cheire, contra o governo FHC, como existe contra Lula, contra Dilma, e isso requer explicação.
Governos que trouxeram benefícios reais para o país, que foram ruptura com tudo, como o de Lula, como foi o de FHC, menos, merecem tratamento especial por parte da História e do povo consciente.
Dos demais não sei o que esperar. Gostaria que fosse algo que permitisse o debate e a compreensão. Não é, talvez nunca venha a ser. O PT magoa por ser, e isso, ao que me parece, não tem jeito. É ir em frente, e fim.
Marcelo Carneiro da Cunha é escritor.
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