domingo, 30 de julho de 2017

Dívida pública e juros

Dívida pública e juros - Carta Maior



Dívida pública e juros

A maior parte do noticiário atual tem se ocupado dos
impactos políticos e econômicos derivados da mais recente decisão da
equipe comandada por Mirelles





Paulo Kliass *










A maior parte do noticiário
atual tem se ocupado dos impactos políticos e econômicos derivados da
mais recente decisão da equipe comandada por Henrique Meirelles.
Trata-se da opção por lançar mão do aumento de impostos para dar uma
maquiadazinha na calamitosa situação fiscal de nosso País. Na verdade, o
problema não está tanto na majoração dos tributos incidentes na cadeia
de combustíveis em si. Mas principalmente pelo fato de se tratar de mais
um evento de estelionato golpeachmental patrocinado por Temer.

Afinal
o bloco majoritário que promoveu a retirada ilegal e inconstitucional
da Presidenta legitimamente eleita foi useiro e vezeiro da ladainha
contra o uso de novas elevações de medidas de tributação como
instrumento de política econômica. Esse foi o caso da derrota da CPMF e
de todas as outras tentativas de recompor o equilíbrio fiscal a partir
de fontes de arrecadação. Afinal, o mote do Estado mínimo rima
perfeitamente com a negativa em pagar impostos.

Todas as vezes
que Lula e Dilma ousaram apresentar alguma opção nessa linha foram
severamente bombardeados como gastadores, populistas, irresponsáveis,
bolivarianos e por aí vai. O interessante é observar a mudança radical
dos analistas vinculados ao financismo e à equipe dos sonhos da
economia. O tom dos comentários e editoriais nos grandes órgãos de
comunicação é totalmente diferente. Agora, a decisão de elevar
PIS/COFINS incidente sobre diesel, gasolina e etanol é apresentada como
uma inevitabilidade, uma triste necessidade inescapável para fechar as
contas do governo federal. Coitado, em meio a tantas dificuldades a
serem enfrentadas, dá mesmo até dó do Ministro da Fazenda...

Até
então a turma do impostômetro era implacável na crítica a esse tipo de
possibilidade. Isso para não mencionar o bombardeio sistemático de
qualquer alternativa de uso de tributos para estabelecer um novo padrão
de justiça social e econômica, com maior incidência de impostos sobre a
renda e o patrimônio. O exemplo mais simbólico é a incansável luta
contra a regulamentação do dispositivo previsto na Constituição desde
1988. Trata-se do Imposto sobre Grandes Fortunas, que deveria já estar
definido em lei complementar específica há 29 anos, tal como determina o
inciso VII, do art. 153 da Carta Magna.

Pois bem, o foco do
debate na questão da arrecadação escamoteia a divulgação e análise das
informações relativas ao comportamento da dívida pública federal. Como
ocorre a cada mês, a Secretária do Tesouro Nacional (STN) divulga o relatório periódico com os dados relativos à evolução dessa importante referência de avaliação das condições macroeconômicas do País.

De
acordo com os números oficiais do próprio Ministério da Fazenda, o
estoque total da dívida pública federal em poder do público atingiu a
marca de R$ 3,36 trilhões em junho de 2017. Esse valor representou um
crescimento significativo ao longo de 12 meses. Há exatamente um ano, o
estoque dessa dívida estava no nível de R$ 2,96 tri. Isso significa que
houve um crescimento de R$ 400 bi no período. Antes de quaisquer
conclusões apressadas a respeito de um suposto gigantismo nos números, é
importante registrar que a existência de dívida pública não é nenhum
problema em si. Antes, pelo contrário, o processo de endividamento
público pode se traduzir em importante instrumento de política
econômica. O importante é entendermos os “comos”, os “quantos” e os
“porquês” de cada caso concreto a ser estudado.

Um aspecto
relevante a ser observado é que o crescimento do estoque da dívida
deu-se em período onde houve, também, o pagamento expressivo de juros
sobre esse mesmo montante de títulos emitidos sob a responsabilidade do
Tesouro Nacional. Ou seja, seguiu-se à risca o preceito da ditadura do
superávit primário e os resultados das contas orçamentárias de natureza
não financeira foram comprimidos para que sobrassem recursos para o
pagamento dos compromissos da dívida. E mesmo assim, tal esforço não foi
suficiente. Com isso, novos títulos foram emitidos e o estoque da
dívida cresceu.

Os dados disponíveis no Banco Central a respeito
do pagamento de juros mostram que no período maio de 2016 a maio de
2017 (12 meses) foram direcionados R$ 431 bi para esse fim. A tendência é
que seja observada uma ligeira piora quando forem divulgados os dados
de junho. O importante a reter é que houve um duplo movimento de
primazia do financismo sobre a chamada “economia real”. Além de sorver
essa parcela ponderável do orçamento da União com juros, o movimento
apresenta o já mencionado acréscimo de novos R$ 400 bi em títulos
públicos federais, provocando a elevação também no estoque da dívida.

Um
indicador bastante utilizado para avaliar a evolução do processo de
endividamento e a capacidade de cumprimento das obrigações no longo
prazo diz respeito à relação dívida bruta/PIB. No caso brasileiro,
estamos algo próximo a 73% para os dados de maio de 2017. Esse número é
bastante inferior a outras economias, como Japão (250%), Grécia (179%),
Itália (132%), Portugal (130%), Estados Unidos (106%), Canadá (92%) e
média da zona do euro (89%). Como se pode verificar, a dívida pública
mais ou menos elevada em si não é um problema. O que é relevante na
análise é a capacidade de o Estado do país considerado apresentar um
panorama futuro sustentável e capaz de assegurar o compromisso com tais
títulos.

Porém, vale observar a evolução recente desse indicador
brasileiro e associá-lo às opções de política econômica adotada ao
longo dos últimos anos. Um ponto de virada parece ter sido a opção
explícita pela política de austericídio a partir do final de 2014 e
início de 2015. Com a consequente queda brutal da capacidade
arrecadadora do Estado, as contas orçamentárias foram comprimidas pela
redução das despesas de forma obtusa. Com isso, um dos efeitos terríveis
foi a redução crescente das atividades econômicas em geral e a entrada
em recessão desde 2015. E a engrenagem do círculo vicioso entra em
operação, com queda ainda maior da arrecadação e mais recessão e assim
por diante.

A Tabela abaixo mostra o comportamento indicador
“dívida bruta/PIB” para o caso brasileiro o longo da última década.
Entre 2007 e 2013, observa-se uma tendência de estabilidade da relação,
com uma média de 55% ao longo do período. Como a recessão provoca a
redução do Produto Interno, a queda do denominador provoca uma elevação
na relação e o indicador cresce. Assim, a partir de 2014, o indicador
começa a apresentar uma tendência de alta, passando de 56% para os
atuais 73%.





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 Uma
conclusão a respeito desse processo refere-se à falácia do discurso do
financismo a respeito da importância de manter a política de geração de
superávit primário. O principal argumento preconizava que o esforço
fiscal era essencial para evitar o crescimento da dívida, uma vez que os
juros seriam pagos com esse saldo derivado da redução dos gastos de
natureza social e investimentos. Pois bem essa opção tem sido levada
acabo há muito tempo. Com isso, o Brasil destinou mais de R$ 2,7
trilhões de seu orçamento público para o sistema financeiro para esse
fim entre 2007 e 2017, por exemplo.

Ora, durante esse mesmo
período, ao invés de ser reduzida ou se estabilizar, o estoque da dívida
pública bruta saltou de R$ 1,5 trilhão para R$ 4,6 trilhões. Ou seja,
vivemos o pior dos mundos. Foi realizado um esforço fiscal
contracionista para pagar juros da dívida. E, simultaneamente,
assistimos ao aumento dos valores nominais do próprio estoque de títulos
emitidos. Uma loucura!

Mas na aprovação recente da Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2018 foi incluído um importante
dispositivo que pode auxiliar nesse problema. Ali está determinada a
realização de uma auditoria da dívida pública brasileira durante o
próximo ano. O artigo aprovado pelo Congresso Nacional diz o seguinte:

“Art.
91. Durante o exercício de 2018, será realizada auditoria da dívida
pública, com a participação de entidades da sociedade civil, no âmbito
do Ministério da Fazenda e do Banco Central do Brasil.”

Por mais
que a intenção não seja a criminalização da política fiscal e nem a
condenação do uso do endividamento como instrumento estratégico de uma
política desenvolvimentista, o fato é que há muitas dúvidas a serem a
esclarecidas a respeito do assunto. O debate amplo e aberto no
legislativo, com participação de analistas de fora da máquina pública,
pode contribuir para o aperfeiçoamento dos métodos e questionamento de
práticas.

sábado, 29 de julho de 2017

O procurador que usou o MPF como escada

O procurador que usou o MPF como escada, por Luis Nassif



A entrevista do procurador  Carlos Fernando dos Santos Lima à Folha
é significativa dos males que a Lava Jato causou ao Ministério Público
Federal pela falta de comando do PGR (Procurador Geral da República) e
do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público). E mostra como a
espetacularização do Judiciário prejudicou a Justiça, em benefício de
membros dos dois poderes.


Anos atrás participei de um debate sobre o tema no Encontro Nacional
dos Juízes Federais. Eugênio Bucci dizia que os holofotes sobre a
Justiça aumentariam a transparência do Judiciário. Eu rebati sustentando
que quem participasse desse show da vida acabaria se comportando de
acordo com as características do ambiente. Para se manter no show teriam
que ceder cada vez mais às exigências do público.


Do pré-mensalão para cá, o maior fator de estímulo à opinião pública –
especialmente dos executivos de mercado e de grandes empresas – foi a
anti-política, o anti-petismo radical. Tornou-se a bola da vez, abrindo
espaço para palestras, consultorias de toda espécie.


É só conferir aquele economista que participa do Manhatan Connection.
No início, era um sujeito de bom senso e conhecimento técnico, em meio a
colegas jejunos no assunto. Hoje em dia, no Twitter, suas mensagens são
do nível de um Lobão. E sempre acompanhadas de mensagens
autopromocionais.


O primeiro a surfar nessas ondas do ódio à política foi Joaquim
Barbosa, que trocou o cargo de Ministro do Supremo por uma banca de
advocacia à qual recorrem grandes empresas que não querem dificuldades
com a lei. Nem se diga que o radicalismo de Barbosa foi ensaiado. É de
nascença mesmo.


Não se trata meramente da crítica à política, mas da propagação do ódio em todos os níveis como ferramenta de marketing.


Se esse marketing rentável pegou até quem galgou todos os degraus da
carreira de procurador, o que não dizer de procuradores que fizeram toda
sua carreira em centros menores, como é o caso de Curitiba.


Em todos esses momentos, exercitaram, por palavras e atos, o exercício do ódio mais visceral.


É só conferir as declaração de Carlos Fernando, sobre as fraquezas de
Sérgio Moro de absolver socialites cariocas claramente envolvidas e
beneficiadas com os golpes dos maridos:


- Ele tende a ser mais brando com as mulheres, mesmo. Nós pedimos
autorização para condução coercitiva de Marisa Lula e ele não concedeu.


Ou seja, não bastava invadir a casa de Lula, revirar camas e quartos,
conduzi-lo coercitivamente com toda a imprensa avisada. Tinha também
que submeter a esposa ao mesmo rito de humilhação.


E contou isso, em uma entrevista, com a mesma naturalidade de
qualquer frequentador de boteco contando as últimas machezas para a
roda.


Em seu perfil ataca os “inimigos da operação” e adota frases como
"vamos acreditar que podemos ser livres, que podemos escolher pessoas
íntegras, que existe esperança".


Na entrevista à Folha, Carlos Fernando conta, de passagem, o final da
grande encenação: aposentadoria do MPF e montagem de um escritório de
advocacia que se especializará em ... compliance, é claro.


Com a quantidade de empresas envolvidas devida ou indevidamente com a
Lava Jato, é previsível o sucesso do futuro escritório. Afinal, não
contratará apenas um escritório especializado em compliance
mas um escritório especializado em uma ciência à parte: o que o MPF,
mais especificamente, o MPF brasileiro, mas especificamente, as Forças
Tarefas, entendem por compliance. Contratar o futuro advogado significará percorrer o caminho das pessoas íntegras e descobrir que existe a esperança. Amém!


Seu poder não deriva mais do cargo, nem ele está mais submetido às
regras disciplinares do MPF. Agora, o procurador está dotado da Força: a
capacidade de cada pum no Facebook se tornar manchete em jornais que
perderam totalmente a capacidade de avaliar as notícias pela relevância.
Com o Poder, ele se considera mais forte que o próprio PGR.


Na entrevista, critica os erros de comunicação do PGR no acordo com a
JBS, critica a decisão do TRF4 de absolver Vaccari, ensina
jurisprudência ao Judiciário. Critica tudo. Os únicos que têm o
monopólio do acerto são eles, da Lava Jato. E se a Justiça não aceita
apenas indícios como prova, é porque o Judiciário está desatualizado.
Não se conhece um trabalho de fôlego do procurador sobre o tema.


Indagado sobre a falta de isenção de quem se manifesta politicamente na rede, é taxativo


“Se eu estivesse fazendo consideração político-partidária, eu estaria
realmente vinculado a certos posicionamentos. Se você defende
princípios que estão na Constituição, esse argumento é absurdo. Eu vou
falar. Não posso deixar de falar. Eu tenho uma obrigação de falar”.
Obviamente, do PT e do PMDB, sem nenhuma menção ao PSDB. Durante toda a
entrevista fala dos processos. E, obviamente, aproveita para anunciar
seu futuro escritório de advocacia especializado em compliance.


Não se pode negar que ambos – ele e Deltan Dallagnol – tem o faro
apurado do investidor de oportunidades. Aproveitaram ao máximo os
holofotes da mídia, exercitaram com maestria o discurso do ódio,
forneceram carne fresca à vontade para um mercado sedento de sangue, e
fincaram as bases para o salto profissional. Mas é piada falar em
meritocracia. Por mérito, Carlos Fernando jamais passaria de procurador
regional no Paraná.


À Folha ele afirmou que seu objetivo, com as catilinárias nas redes
sociais, é inspirar os procuradores que combatem a corrupção Brasil
afora.


Aliás, um bravo procurador, envolvido com a Lava Jato e com outras
grandes operações, dia desses se queixava da tendência das novas
gerações, de usarem o MPF como trampolim para carreiras no setor
privado. Esta é a parte pior da herança deixada por por Janot: a
leniência com o protagonismo excessivo da Lava Jato, que escancarou a
falta de isenção e, agora, a falta de disciplina e de discrição que
deveria caracterizar a carreira de procurador.


domingo, 23 de julho de 2017

O Brasil precisa, sim, de reformas

O Brasil precisa, sim, de reformas. Para fazer que pobres paguem menos impostos que os ricos, por exemplo - Viomundo - O que você não vê na mídia



O Brasil precisa, sim, de reformas. Para fazer que pobres paguem menos impostos que os ricos, por exemplo

23 de julho de 2017 às 09h55









O BRASIL PRECISA DE REFORMAS 


por Aldemario Araujo Castro*



29.04.2017


“O Brasil precisa de reformas”. A frase foi proferida pelo senhor
Michel Temer, triste ocupante do Palácio do Planalto. “Reformas [no
Brasil] são claramente necessárias”. Essa frase foi proferida pela
senhora Christine Lagarde, diretora-gerente do FMI – Fundo Monetário
Internacional. O homem das mesóclises sofríveis e a mulher das certezas
incertas estão com a razão?


Os contínuos escândalos de corrupção criam a falsa impressão de que a honestidade (ela, e só ela) daria “jeito” neste país.


Felizmente, ou infelizmente, nossas profundas mazelas, notadamente a
construção e manutenção de uma das sociedades mais desiguais,
discriminatórias e violentas do planeta, resultam da existência de
instrumentos ou mecanismos socioeconômicos que precisam de profundas
transformações.


Essas transformações, se adotada a denominação de “reformas” neste momento histórico, devem seguir em qual rumo ou sentido?


O caminho apontado pelo governo Temer-Meireles-Padilha, mergulhado em
corrupção e fisiologismo, é aquele a ser trilhado e apoiado pela
maioria da população brasileira?


A resposta pode ser encontrada, entre outros, na Constituição de
1988. Esse documento, fundador do atual Estado Democrático de Direito,
fixa os seguintes objetivos fundamentais para a República Federativa do
Brasil:


a) construir uma sociedade livre, justa e solidária;


b) garantir o desenvolvimento nacional;


c)  erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais


e d) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.


Para que os fins destacados sejam alcançados, o constituinte definiu
os traços mais relevantes dos instrumentos fundamentais a serem
utilizados.


Assim, conformou o modelo de Estado e sociedade a serem desenvolvidos no Brasil. Entre outros pontos relevantes:


a) indicou a educação e a saúde como direitos de todos e deveres do Estado;


b) desenhou um avançado sistema de seguridade social, incluídas as proteções previdenciárias e assistenciais


e c) cuidou de estabelecer importantes mecanismos de financiamento das políticas públicas nessas e outras áreas.


A ambiciosa rede de proteção social concebida e organizada pelo
constituinte, baseada na solidariedade social e visando o bem-estar de
todos, está centrada na titularidade e efetiva fruição de uma série de
direitos sociais, qualificados constitucionalmente como fundamentais.


Exatamente no dispositivo que enuncia os direitos fundamentais dos
trabalhadores, a Constituição afirma categoricamente que outros
direitos, além dos listados, deverão ser adotados para “a melhoria de
sua condição social” (artigo sétimo).


Resta, portanto, fora de dúvida que vivemos numa sociedade (e Estado)
onde os direitos, notadamente sociais fundamentais, devem ser
assegurados e ampliados. A Constituição não tolera o retrocesso social. O
constituinte não admitiu a degradação da condição social dos
trabalhadores com limitações e restrições de seus direitos.


O governo Temer-Meireles-Padilha, como claro instrumento dos
interesses mais mesquinhos do empresariado do agronegócio, da indústria,
do comércio e da área financeira, adota rumo diametralmente oposto ao
indicado pelo constituinte de 1988.


A busca frenética pela eliminação e restrição de direitos sociais está presente:


a) na proposta (aprovada) de fixação de um teto draconiano de gastos
primários (e ausência de limites para as despesas financeiras);


b) na nova legislação sobre terceirização (e precarização) da força de trabalho;


c) na reforma trabalhista (parcialmente aprovada) que, entre outras
maldades, determina a prevalência do negociado sobre o legislado (“para
pior”)


e d) na reforma previdenciária, que contempla um festival de redução de direitos.


As verdadeiras reformas, aquelas de caráter democrático e popular,
devem buscar, como dito, a manutenção e ampliação de direitos, em
especial os sociais fundamentais.


Para tanto, as seguintes e perversas (em função das consequências sociais produzidas) realidades nacionais reclamam “reformas”:


a) a sonegação tributária, estimada em R$ 500 bilhões anuais, precisa de atenção e ataque planejado e organizado;


b) a Dívida Ativa da União e de suas autarquias, mediante uma
recuperação progressiva decorrente do adequado aparelhamento dos órgãos
públicos envolvidos, notadamente a Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional e a Procuradoria-Geral Federal. O estoque
dessa dívida ultrapassa a cifra de R$ 1,5 trilhão;


c) os benefícios (ou exonerações) tributárias. Segundo levantamento
especializado, “as desonerações de tributos concedida pelo governo da
presidente Dilma desde 2011 somarão cerca de R$ 458 bilhões em 2018”;


d) a Seguridade Social, por intermédio de uma ampla e democrática
auditoria que aponte as reais necessidades de modificações (envolvendo o
financiamento segundo os parâmetros constitucionais, as desonerações
tributárias, a sonegação, a inadimplência em razão da crise econômica,
as fraudes, os privilégios, a pertinência de alterações nas idades
mínimas e outros aspectos relevantes);


e) a dívida pública, via auditoria conforme exige o art. 26 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e implementação de
uma administração transparente e com controle social, inclusive com a
supressão de mecanismos indevidos que viabilizam o seu contínuo
crescimento (como a atualização monetária do montante e o seu
financiamento por intermédio do lançamento de novos títulos em flagrante
violação à “regra de ouro” inscrita no art. 167, inciso III, da
Constituição). Observe-se que a evolução da dívida pública mobiliária
federal interna não encontra nenhuma explicação nas diferenças positivas
e negativas do resultado primário (desconsiderada a parte financeira)
nos últimos vinte anos. O patamar desse endividamento saiu de R$ 61,7
bilhões em 1994 para R$ 2.753,4 bilhões em março de 2016. O problema
da dívida pública monumental e crescente não tem fundamento na vertente
fiscal da economia brasileira, como pretende o discurso oficial e da
grande imprensa;


f) a política monetária. Compreendendo uma regulamentação ampla e
social: f.1) da fixação da taxa de juros SELIC; f.2) do nível e
administração das reservas monetárias internacionais (admitindo a venda
do excesso, inclusive); f.3) do tamanho da base monetária e f.4) das
operações compromissadas e todas as formas de “ajuste de liquidez”.
Segundo dados do Banco Central do Brasil, as operações compromissadas
representavam R$ 528,7 bilhões da dívida pública em dezembro de 2013, R$
809,06 bilhões em dezembro de 2014, R$ 913,28 bilhões em dezembro de
2015 e R$ 1.113,97 bilhões em agosto de 2016;


g) a política cambial. Envolvendo uma regulamentação ampla e social:
g.1) do câmbio; g.2) do fluxo de capitais e g.3) das operações de swap
cambial;


h) o sistema tributário, mediante a drástica redução da tributação
sobre o consumo e aumento das tributações sobre a propriedade, capital e
aplicações financeiras, inclusive com a eliminação de privilégios
fiscais;


i) a concentração de mídia, por intermédio de uma profunda
democratização econômica (sem interferência na “redação” ou linha
editorial) da propriedade das empresas de comunicação;


j) a estrutura fundiária, na linha de sua radical desconcentração;


k) a reorganização administrativa do Estado que viabilize: k.1) a
profissionalização do serviço público; k.2) a quase extinção de cargos
comissionados; k.3) o atingimento de níveis satisfatórios de qualidade
na prestação dos serviços públicos; k.4) o controle social sobre o
funcionamento e os resultados da atuação administrativa; k.5) a fixação
de padrões remuneratórios compatíveis com a realidade socioeconômica;
k.6) o combate as diversas formas de privilégios espúrios e k.7) a
construção e fortalecimento de mecanismos efetivos e preventivos de
combate à corrupção;


l) a organização político-eleitoral em novas bases, contemplando:
l.1) a manutenção da impossibilidade de financiamento de campanhas e
partidos por empresas; l.2) a adoção do financiamento público de
campanhas em patamares espartanos, incluídas nessas restrições o fundo
partidário; l.3) a definição clara, sem anistias, da criminalização do
caixa 2 em campanhas eleitorais; l.4) a eliminação das coligações nas
eleições proporcionais, inclusive mediante formas disfarçadas (como na
federação de partidos e assemelhados); l.5) a adoção de fórmulas de
revogação de mandatos por parte dos eleitores; l.6) a democratização do
cálculo do coeficiente eleitoral e a distribuição dos restos nas
eleições proporcionais; l.7) a adoção do procedimento de voto
proporcional primeiro no partido e, depois, num dos candidatos do
partido e l.8) a democratização da distribuição de tempo na propaganda
eleitoral e a participação em debates.


Observe-se que quase todas as questões destacadas não são veiculadas
pela grande mídia. Todos os problemas nacionais parecem concentrados e
limitados aos aspectos estritamente fiscais dos gastos com a previdência
social e remunerações de servidores públicos e aos escândalos de
corrupção.


Opera-se, notadamente nas telas dos televisores, uma engenhosa
redução do mundo percebido pela quase totalidade da população. Afinal,
se quase todos sequer tomam conhecimento das questões antes levantadas,
as mazelas e suas soluções devem ser buscadas no universo parcial,
cuidadosamente recortado e apresentado pelos grandes meios de
comunicação.


O único caminho factível, mesmo lento e trabalhoso, reside na
intervenção popular (não confundir com a tresloucada intervenção
militar). Somente a  mobilização e conscientização populares, em torno 
de medidas efetivamente transformadoras, mudará o Brasil. Trata-se de
atuação que não pode, nem deve, ser terceirizada (para representantes de
qualquer tipo, líderes “esclarecidos” ou “salvadores da Pátria’).


A força motriz das mudanças de fundo, sem prejuízo de combativos e
comprometidos representantes e lideranças políticas como seus
instrumentos, deve estar centrada na cidadania ativa, no protagonismo da
atuação de cada cidadão nos mais variados espaços sociais.

A guerra dos tronos no Brasil

A guerra dos tronos no Brasil - Viomundo - O que você não vê na mídia



A guerra dos tronos no Brasil

18 de julho de 2017 às 10h15









por Marco Aurélio Mello


A notícia não é nova. Tem quase um ano.


Mas é tão assombrosa, tão assombrosa, que deveríamos ensinar na escola para todas as nossas crianças.


Apesar do Brasil ter uma população estimada em mais de 200 milhões de
pessoas, quinze famílias, apenas quinze, detêm 5% de toda riqueza
nacional.


Isso mesmo, cinco por cento de toda riqueza de um dos 10 países mais
ricos do planeta está nas mãos de quinze famílias, um escândalo!


A informação é de fonte que rico nenhum questiona, a revista Exame, e
se baseia num levantamento feito por outra revista que eles tanto
reverenciam, a americana Forbes.


É tanto poder econômico, tanto poder econômico, que políticos – de
qualquer partido – e funcionários públicos facilmente se curvam aos
interesses deles.


Esta é a verdadeira guerra dos tronos do Brasil.


Em que setores estes grupos atuam? Duas famílias estão ligadas às
comunicações: Marinho (número um da lista) e Civita (décima-primeira).


Outras cinco famílias estão ligadas aos bancos: Safra, Itaú-Unibanco e Bradesco.


Duas famílias operam em construção civil: Camargo Corrêa e Odebrecht.


Uma no cartel do cimento: Ermírio de Morais; uma na monocultura da
soja: Maggi; uma no cartel da carne: Batista; uma em papel e celulose:
Feffer (que também atua em petróleo) e duas em petróleo e derivados:
Igel e Penido.


Portanto, somos controlados por conglomerados que disputam espaço, não entre si, mas na política.


Neste intincado jogo de interesses duas famílias caíram em desgraça recentemente: os Odebrecht e os Batista.


A família Odebrecht por causa do escândalo de corrupção na Petrobras e
os Batista, primeiro por denúncias de adulteração de carne bovina e, em
seguida, pela divulgação de áudios que denunciam políticos em crimes de
corrupção, entre eles, o presidente em exercício, Michel Temer.


Mas o que existe por trás desta disputa vai além, muito além de quem vai governar ou não o Brasil.


O que há de realmente importante é: quem pode influenciar o Estado a
transferir recursos públicos para estes grandes conglomerados?


São estes os grupos que mais nos exploram e que, em vez de tomar o
país de assalto, como sempre fizeram, teriam que devolver aos mais
pobres bens e serviços na forma de impostos.


Vejamos os bancos. Faça ou não crise seu faturamento é recorde a cada novo balanço trimestral.


Eles operam com juros da dívida pública e spread bancário (o risco dos clientes darem calote).


Eles odeiam pagar impostos.


À beira das crises apelam para o “risco sistêmico” e para o colapso
no “balanço de pagamentos” e são sempre socorridos imediatamente.


Os bancos não perdem nunca!


Reparem que cinco das quinze famílias da lista são banqueiras: os Safra, os Moreira Salles, os Villela, os Aguiar e os Setubal.


Estes você não vê reclamar, não é?


Claro, não precisam, eles têm um exército de economistas e consultores que fazem isso por eles, sutilmente.


Afinal, são os bancos que controlam “os mercados”, o Banco Central e, claro, o noticiário econômico.


Vale lembrar também que são os bancos que operam transferências em
paraísos fiscais e que, portanto, podem ter ligações com o crime
organizado.


Estruturalmente o que estava acontecendo no Brasil?


O poder econômico estava migrando das mãos desses grupos para outros.


Vejamos:


Os programas de transferência de renda tiram poder dos bancos ao aumentar o poder de compra da população por vias diretas.


A construção foi muito beneficiada pelos programas de infra-estrutura apoiados pelo BNDES.


A ponto de a construção civil brasileira passar a operar em vários países da América do Sul, Caribe, África e Oriente Médio.


O agronegócio – que navegou em mar calmo nos tempos de boom das commodities – internamente passou a disputar crédito com pequenos e médios produtores.


Já a mídia estava deixando de concentrar publicidade oficial em seus
veículos, depois de uma política de diversificação que ampliou os atores
no mercado de informação, notícias e entretenimento.


Apesar de não ter havido coragem de impor uma reforma tributária
capaz de taxar as grandes fortunas, uma transferência de renda
silenciosa estava modificando a estrutura econômica da nossa sociedade.


E foi isso que os o poder econômico percebeu antes de todo mundo.


E foi contra isso que eles se uniram, ainda que tivessem que jogar dois de seus “marujos” ao mar: os Odebrecht e os Batista.


Agora a famiglia da Vez pode ser os Marinho.


É difícil.


Seu exército é numeroso e sua tática de “assassinato de reputação” é sutil e muito eficiente.


Ao que parece trata-se de mais uma tormenta que, cedo ou tarde, vai passar.


E quando isso acontecer os ricos vão continuar mais ou menos no mesmo lugar.


Quem perderá com o descrédito que a mídia propaga dia e noite, sem dó?


1. A classe política;


2. Os aparelhos de Estado, incluindo a Justiça;


3. A classe média;


4. O povão em geral.


E se o poder econômico tomar o lugar do poder político, sem intermediários, caminhamos para a barbárie.


Se o viés for fundamentalista religioso então vai ficar ainda pior…


Por isso, minha gente, se nos intervalos desta luta der para fazer um pouco de amor, aproveitem!

Economistas preferidos da mídia e aumento de impostos:

Economistas preferidos da mídia e aumento de impostos: quem execrou Dilma agora compreende Temer. Por Joaquim de Carvalho




Economistas preferidos da mídia e aumento de impostos: quem execrou Dilma agora compreende Temer.


















Os economistas sabem melhor do que qualquer outro profissional que
gastos acima da arrecadação produzem ruína. Numa família, o resultado é o
endividamento. No governo, o descontrole das contas públicas. Sabem,
mas, em geral, calibram sua análise de acordo com os interesses do
mercado. Ou políticos. No final, interesses de mercado e interesses
políticos acabam sendo a mesma coisa.


O exemplo perfeito desse comportamento é o aumento dos impostos
decretado pelo governo de Michel Temer, que poderá resultar na gasolina
mais cara do Brasil nos últimos treze anos. Professor da FGV em São
Paulo e sócio da consultoria GO Associados, Gesner Oliveira avaliou
assim a medida do governo:


“O aumento de impostos não é ideal, mas é necessário.”


Muito diferente da análise que o economista Gesner fez em 2015,
quando Dilma Rousseff propôs a recriação da CPMF temporária para
equilibrar as contas:


“Não tem sentido. A sociedade não aguenta mais esse tipo de asfixia tributária”.


Gesner tem um currículo com serviços prestados aos governos tucanos,
como ex-presidente da Sabesp em São Paulo, no governo de José Serra, e
ex-secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, no
governo de Fernando Henrique Cardoso. Mas não é nenhum desqualificado.
 É doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley).


O ex-diretor do Banco Central Carlos Eduardo de Freitas, presidente
do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon/DF), não
disse nada a respeito do pacote tributário de Temer/Meirelles. Mas foi
implacável quando Dilma tentou sanear as contas públicas:


“O governo petista é socialista, defende a distribuição de renda e
quer fazer ajuste apenas com aumento de impostos. A sociedade quer ver
as contas públicas em dia com redução de gastos. Ele não fez nenhuma
outra proposta para aumentar a renda e arrecadar mais, gastando menos.”


O maior aumento da carga tributária foi no governo tucano de Fernando
Henrique Cardoso – passou de 20 para 34% do PIB e, no governo do PT,
ficou em torno disso.




A jornalista Miriam Leitão noticiou em primeira mão que haveria
aumento de impostos. Em sua coluna, fez um comentário neutro –
 neutralidade, nesse caso, pode interpretada como algo positivo.
Explicou que o governo estava com dificuldade de fechar as contas.


Imagine-se qual seria o comentário no jornal O Globo, TV Globo Globo,
CBN e G1 (ela é quase onipresente) se o aumento fosse anunciado pela
equipe de Dilma Rousseff.


O PSDB é o principal aliado de Temer e também não criticou o aumento
de impostos. Seu presidente nacional (licenciado), Aécio Neves, dizia o
seguinte a respeito da proposta de Dilma de recriar a CPMF:


“Somos contra o aumento de impostos. O ajuste rudimentar que esse
governo vem propor se sustenta em dois pilares: o primeiro deles é a
supressão de direitos e o segundo, o aumento da carga tributária. [O
governo] deveria estar sustentado em dois outros pilares: a redução de
despesas, requalificação do estado e a retomada do crescimento, pois é
aí que se arrecadará mais. E o governo me parece não ter condições de
fazer nem uma coisa e nem outra – nem diminuir suas despesas tampouco
fazer a retomada do crescimento. Nós do PSDB não apoiaremos nenhuma
proposta que puna ainda mais os já tão punidos cidadãos e contribuintes
brasileiros.”


Quem suprimiu direitos foi o atual governo, com a criação do teto dos
gastos públicos e a reforma trabalhista, medidas que Aécio e o PSDB
apoiaram, com entusiasmo.


E agora?


O G1, do Grupo Globo, publicou a reportagem “Com inflação fraca, aumentar impostos foi decisão acertada, dizem economistas”.


A presidente deposta Dilma Rousseff se manifestou no Twitter sobre o festival de contradição:


“Impressiona a naturalidade com que colunistas de economia acolhem a
decisão do governo de aumentar impostos, como o PIS/Cofins e a Cide. O
governo golpista alega que, sem aumentar impostos, não cumprirá a meta
fiscal, e muitos colunistas e analistas apenas dizem amém.”


Ela continua:


“Nem parece que são os mesmos analistas que, quando meu governo
considerou a necessidade de recriar a CPMF, reagiram com indignação.
Pelo jeito, para tais ‘especialistas’, só governo ilegítimo e sem voto
tem direito de aumentar tributos, até por decreto, como anunciado.”


Aumento de impostos nunca é bem recebido, mas a CPMF tem uma
característica que incomoda especialmente sonegador, corrupto,
traficante e outros agentes econômicos que precisam ocultar patrimônio.
Na transação por movimentação bancária, até a venda de cocaína acaba
sendo tributada.


O ex-ministro da Saúde Adib Jatene fez esse comentário comigo, depois
que deixou o governo de Fernando Henrique Cardoso. Ele havia lutado
pela criação da CPMF como fonte exclusiva para a saúde.


Ficou irritado quando percebeu que tomou um chapéu da equipe
econômica: a CPMF foi para a saúde, como prevista em lei, mas o governo
reduziu as transferências de outras fontes. No fim das contas, ficou
quase tudo a mesma coisa.


Mesmo assim, não se arrependeu da guerra que liderou pelo imposto. “É
um tributo mais democrático que os outros e também atinge a economia
subterrânea. Vimos que esse mercado paralelo era muito maior do que
imaginávamos e a arrecadação foi o dobro do que a equipe econômica
previa”, afirmou, num fim da tarde, em seu gabinete no Incor.


Águas passadas.


O que move o governo hoje são outras forças. Mas, para
dimensioná-las, não se deve levar a sério o que dizem os economistas.
Eles são quase todos comprometidos. E não é com o interesse público.

sábado, 22 de julho de 2017

Do 'domínio do fato' a 'propriedade de fato' - Carta Maior

Do 'domínio do fato' a 'propriedade de fato' - Carta Maior



Do 'domínio do fato' a 'propriedade de fato'

As considerações fornecidas sobre a sentença condenatória
do juiz Sergio Moro, de Curitiba, no caso do ex-presidente Lula, são de
Egas Moniz-Bandeira





Egas Moniz-Bandeira










As considerações fornecidas com exclusividade para Carta Maior
sobre a sentença condenatória do juiz Sergio Moro, de Curitiba, no caso
do ex-presidente Luis Inácio da Silva, são de autoria do advogado
brasileiro Egas Moniz-Bandeira, 31, há seis anos integrante da
equipe de um dos mais conceituados escritórios de Zurique, na Suíça, o
Baumgarten Machler, apontado como uma das bancas de maior prestígio em
Direito penal e Direito penal econômico.
 
Egas
se encontra licenciado temporariamente da firma, para se dedicar ao seu
doutorado sobre História Chinesa, na Universidade de Heidelberg e na
Universidade de Tohoku (Japão).
 
 Em
Baumgarten Machler, Moniz-Bandeira faz parte do grupo de advogados da
área de Direito civil e comercial embora o escritório seja mais
conhecido pela sua atuação em Direito penal, nos casos de corrupção e
lavagem de dinheiro.
 
Estas são as considerações do advogado brasileiro sobre alguns pontos polêmicos da sentença do juiz Moro:
 
Sobre a instituição da delação.
‘’Quanto à delação premiada, a sentença declara: ‘Quem, em geral, vem
criticando a colaboração premiada é, aparentemente, favorável à regra do
silêncio, a omertà das organizações criminosas, isso sim reprovável. ’
(p. 47).  Ora, de lege facta, a colaboração premiada foi
permitida pela lei 12850, de 02 de agosto de 2013. Mas a frase do juiz
Moro não cabe na sentença e chega a ser ofensiva contra muitos juristas
de sólida reputação que criticam a colaboração premiada. Os sistemas
jurídicos continentais, em geral, prevêem a possibilidade de levar em
consideração, em sentença penal, a conduta do réu após cometer o crime.
Mas o que é alheio aos sistemas de Direito continental é o poder de se
negociar a pena de antemão, inclusive por colaboração premiada. Sob
influência do Direito anglo-americano, negociações sobre a pena têm sido
introduzidas às leis de vários países, mas em todos eles a mudança
legal é controversa e alvo de muitas críticas. Na Alemanha, a regra
existia entre 1989 e 1999. Após troca de governo, foi reintroduzida em
2009. Na Suíça, uma norma muito limitada foi introduzida no Código Penal
em 1994: de acordo com o art. 260B, o juiz pode mitigar (mas não
completamente perdoar) a pena pelo crime de "participação em
organizações criminosas" (não por outros) se o autor do crime "buscar
evitar que a organização continue a atuar". Há dois meses, o governo
suíço decidiu expandir a regra para organizações terroristas. No Japão,
negociações sobre a pena foram introduzidas à lei em 2016 e serão
permitidas a partir de 2018. Em todos os países, as colaborações
premiadas, especialmente quando permitem a absolvição de quem cometeu a
pena, sofrem severas críticas por várias razões. Entre elas, podem
facilitar falsas acusações e ferem o princípio de igualdade e/ou a pena
pode se tornar incalculável e não representar mais a culpa individual.’’
 
Sobre o domínio de fato.
‘’Quanto à teoria do domínio de fato, é interessante que a sentença nem
mencione Claus Roxin. Na realidade, ela não é aplicável no caso. A
teoria foi desenvolvida por Roxin e Friedrich-Christian Schroeder para
os casos do holocausto. Em 1963,  Roxin proferiu uma palestra, ‘Crimes no âmbito de aparatos de poder’ na qual concordou com Schroeder em seu livro de 1965, ‘O autor atrás do autor do crime’.
Os dirigentes nazistas haviam planejado os crimes do holocausto, mas
não os haviam executado pessoalmente. De acordo com a teoria de Roxin e
Schroeder, não eram meros participantes, mas autores. O debate sobre
esse tipo de caso tem sido extremamente intenso e produziu uma vasta
literatura acadêmica. De qualquer modo, a teoria de Roxin não é
aplicável aos casos em pauta, e foi aplicada erroneamente nos casos do Mensalão, como o próprio Roxin constatou quando da sua visita ao Brasil.
A teoria do "domínio de fato" não afeta a necessidade de provas. Quem
está no topo de uma organização não se torna automaticamente criminoso
porque algum subordinado tenha cometido um crime. Pelo contrário; é
necessário provar o domínio sobre o crime em questão e como os crimes
foram organizados e "orquestrados" pelo "autor atrás do autor". 
 
Sobre grampos em telefone de escritório da defesa do réu.
“’O juiz mandou grampear o telefone da banca de advogados de Lula como
se fosse o telefone da empresa de palestras usada pelo ex-presidente.
Depois, ignorou vários ofícios da operadora de telefonia avisando que o
número não pertencia à empresa de palestras e sim ao escritório dos seus
advogados, fato pelo qual teve que se explicar ao STF. Mesmo se
aceitarmos a afirmação do juiz de que ele não agiu de má fé, o fato de
ter ignorado os documentos (não só um) no seu caso principal, levanta
dúvidas sobre os métodos de trabalho e o profissionalismo dele e da sua
equipe. ’’
 
A autodefesa de um suposto partidarismo político do juiz.
‘’Moro
incluiu esse ponto na sentença; é claro que não acusaria a si próprio
de ser partidário. Mas pouco importa essa auto-avaliação; o que importa é
o seu comportamento de fato.  Eu assisti a uma palestra de Moro na
Universidade de Heidelberg onde foi questionado sobre a sua foto com
Aécio Neves. Ele se defendeu ao  dizer que se tratava de um evento
público e que o senador não é réu em nenhum dos seus processos. Ora,
mesmo que Aécio Neves não seja seu réu, as fotos mostram um forte viés
partidário da parte do juiz. Se realmente não fosse partidário, ele
evitaria tais contatos políticos. E esse é só um exemplo relativamente
inocente. Mais grave é o seu comportamento jurídico, inclusive em
relação às delações premiadas. ’’



 

Sobre reação do juiz às alegações da defesa de Lula.
‘’Para não ferir o princípio de ampla defesa, o juiz reagiu às
alegações feitas pela defesa. Mas outra questão é: se as defesas do
autor são convincentes. ’’ 
 
Sobre a repercussão do caso na Europa.
‘’Não
percebi muita repercussão entre colegas europeus. Os jornais noticiaram
o caso, muitos sendo bastante críticos. O  jornal Spiegel, por exemplo,
escreve: ‘Em seu julgamento, Moro confirma aquilo pelo que há muito
tempo é criticado: o desdobramento jurídico do maior escândalo de
corrupção da história do Brasil segue critérios políticos e não
jurídicos. ’ Os jornais, de modo geral, têm escrito mais sobre a
Venezuela do que sobre o Brasil.’’
 
Sobre o processo em outras cortes.
‘’É
possível que a defesa de Lula leve o caso para a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, em Washington, que pode examiná-lo.
Ao contrário do sistema europeu de proteção dos Direitos Humanos,
pessoas naturais não podem levar o caso diretamente à Corte
Interamericana de Direitos Humanos, em San José. Isso só ocorrerá se a
Comissão submeter o caso à Corte. Alternativamente, a defesa de Lula
também pode levá-lo ao Comitê de Direitos Humanos, em Genebra, como já
fez no ano passado. ’’ 
 
Sobre a comparação com  Eduardo Cunha. “Moro diz o seguinte:
‘Ele
[Cunha] também afirmava como álibi que não era o titular das contas no
exterior que haviam recebido depósitos de vantagem indevida, mas somente
'usufrutuário em vida'.
Obviamente, ser
‘usufrutuário em vida’ já é uma grande (!) vantagem.  Lula, por
contrário, não só nega a titularidade, mas qualquer tipo de vantagem,
até mesmo a posse.
Além disso, são duas
situações juridicamente diferentes. No caso do Lula, trata-se de um
imóvel; no caso de Cunha, contas bancárias. As regras para aquisição de
imóveis diferem das regras para aquisição de contas bancárias A
comparação realmente não procede. No caso de imóveis, a propriedade é
registrada em registro público. Não há registro com o nome de Lula.
Seria, em tese, mesmo possível que o proprietário, para disfarçar-se e
não aparecer no registro, registrasse o imóvel no nome de uma empresa
por ele controlada. No caso do Lula, não há indício para tal. A mera
posse (domínio de fato) também seria uma vantagem relevante, mas não
vejo provas suficientes que comprovem a posse. No caso de contas
bancárias, como a de Cunha, não há registro público sobre a propriedade.
Há sim, formulários do banco onde aparecem as assinaturas do próprio
Cunha. A interpretação de tais formulários depende das circunstâncias e
pode ser difícil (bem mais do que a interpretação do registro público de
imóveis), mas no caso dele, as provas que temos deixam bem claro que
ele era o beneficiário efetivo da conta. Logo, se compararmos os dois
casos, temos que chegar à conclusão de que há provas no caso de Cunha e
não há no caso de Lula. 
Sobre ‘’a propriedade de fato’’. “Este ponto é muito importante: a ‘propriedade de fato’. Tal categoria jurídica não existe no Brasil - ou alguém é proprietário ou não é.
A propriedade é uma categoria jurídica e não de fato. É o direito do
dono de fazer o que bem achar com a coisa (art. 1228 do Código Civil).
Em geral, a aquisição da propriedade se dá por registro de título
(existem algumas outras formas, como a usucapião, que não são aplicáveis
aqui).  Aqui, não houve registro de título. A categoria factual correspondente é a posse, norma no art. 1196 do Código Civil. De acordo com a norma, o possuidor tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à  propriedade. ’ Quer dizer, o possuidor é aquele que tem as chaves do apartamento e o usa de fato.
O proprietário pode ser o possuidor, ou pode ser outra pessoa (no caso
de aluguel, por exemplo). Não vejo provas suficientes de que o Lula
tenha possuído o apartamento em algum momento. ’’
Sobre a cronologia do caso.
“ O caso se deu, realmente, após o fim do mandato de Lula. Crime de
corrupção pressupõe uma vantagem de cada lado. Como a Lava Jato não
encontrou indícios de uma contrapartida da parte de Lula, o juiz
argumenta que ‘é suficiente que o agente público entenda que dele ou
dela era esperado que exercitasse alguma influência em favor do pagador
assim que as oportunidades surgissem’. Fala claramente de uma
contrapartida a ser dada no futuro. Acontece que, segundo a denúncia,
Lula recebeu a obra em 2009, três meses antes do fim do seu mandato. A
obra só foi concluída em 2013, vários anos depois de Lula deixar a
presidência. Em 2013, Lula não era mais agente público e não tinha mais
poder de decisão direto. Como é que a construtora esperava que Lula, no
futuro, exercitasse alguma influência em seu benefício? O juiz omite
completamente uma discussão desse assunto.’’
 
Sobre parcialidade na avaliação da prova testemunhal. ''Um
ítem importante que se vê nos embargos é a parcialidade do juiz no
ponto da avaliação da prova testemunhal. Segundo o princípio da ampla
defesa, o juiz teria que ter discutido todos os testemunhos colhidos,
mas escolheu ignorar aqueles que se alinhavam à posição da defesa,
somente considerando outros, aqueles que convêm à sua posição. Cabe
ressaltar que a sentença baseia-se, principalmente, no depoimento de Léo
Pinheiro, que é corréu. O corréu não é testemunha e portanto não tem
obrigação de falar a verdade.
 
Sobre o sequestro de bens de Lula.
“ Foi um sequestro cautelar. Medidas cautelares têm como requisito que
haja um ‘perigo na demora’, ou seja, o perigo de que algum dano aconteça
caso a medida não seja tomada imediatamente. O juiz parece ter ignorado
esse requisito fundamental uma vez que não justificou a possível
dilapidação do patrimônio. O juiz simplesmente ‘reputou prudente
sentenciar o caso antes’. O juiz gosta de falar de ‘prudência’ em vez de se basear nos requisitos legais.’’

domingo, 16 de julho de 2017

O mercadismo

O mercadismo que quer operar acima das tensões sociais e políticas, por André Araújo | GGN



Por André Araújo
 
 
Samuel Pêssoa virou uma espécie de
guru intelectual do mercadismo radical que pretende operar acima das
tensões sociais e políticas, algo hoje inteiramente fora de moda nas
grandes nações pós-crise de 2008.
 
Nos EUA, catedral mundial do
pensamento econômico aplicado à realidade, foi o ESTADO de corpo e alma
quem salvou o mercado em 2008, salvou da crise PROVOCADA PELOS EXCESSOS
DO MERCADO. 
 
Se não fosse o Tesouro dos EUA, a
crise de 2008 seria infinitamente maior. Foi o Tesouro dos EUA,
autorizado pelo Presidente Obama, quem sacou dinheiro de seu caixa no
importe nada desprezível de US$778 bilhões dentro da autorização do
programa TARP para salvar o Citigroup, a General Motors, a seguradora
AIG e mais 200 outras corporações e bancos, decisão tomada de forma
ultrarrápida, engenhosa, eficiente e sem pruridos ideológicos, no
incêndio não se pergunta de onde vem a água e SALVOU O MERCADO. 
 
Depois disso as teses do
neoliberalismo puro FORAM ENTERRADAS nos EUA, o "mercado" perdeu tanto
prestígio político que Trump, um aventureiro anti-mercado, no qual deu
muitos tombos a ponto de não ter mais crédito nos EUA desde o começo da
última década e ter que se financiar em paraísos fiscais com dinheiro de
origem suspeita, seu maior financiador são bancos de Chipre, que operam
100% com dinheiro russo, a entidade "Wall Street" não é mais o farol do
mundo, as universidades do "mainstream" monetarista já não pregam mais o
credo de Friedman mas esqueceram de avisar os "economistas de mercado"
do Brasil e seus apoiadores intelectuais como Samuel Pessoa e Mansueto
Almeida, que continuam com a velha e desmoralizada cartilha do
"ajustismo", mas sempre esquecendo de sequer mencionar a incongruência
dos super-juros que se paga aos credores do Estado, isso não consideram
despesa porque do outro lado dela está a receita dos bancos e
rentistas. 
 
O ajuste então tem que ser feito em
cima de remédios e merenda, prebendas de pobres folgados. Acho estranho
intelectuais que acredito não serem bilionários defenderem banqueiros e
financistas. Deixe que eles se defendam, quem está do outro lado da
cerca deve defender o povo e suas carências e não o financismo. 
 
Nada mais natural que Armínio Fraga,
que vendeu sua gestora para o Morgan por 700 milhões de dólares ou
Roberto Setúbal, que preside um banco que vale na bolsa US$ 72 bilhões
ou Henrique Meirelles, que tem apartamento luxuoso e aposentadoria
garantida em Nova York, defendam o financismo com legitimidade, mas acho
incrível professores de universidade defenderem nababos do
neoliberalismo, não fica bem. 
 
Lembremos que bilionários americanos,
muitos deles, se dedicaram a causas sociais como resgate de uma dívida
pela sua riqueza, o símbolo deles são os Rockefeller, que doaram a boas
causas o grosso de sua fortuna, incluindo-se aí o prédio da Faculdade de
Medicina da USP e a sede das Nações Unidas em Nova York.
 
A filha de David Rockefeller, Peggy,
morou dois anos na favela da Rocinha trabalhando em assistência social, e
ia ao centro do Rio de ônibus coletivo, herdeira de uma fortuna símbolo
da história do capitalismo, aqui no Brasil há pobres que prestam
homenagem a banqueiros com apartamento em Paris e torcem o nariz para as
periferias carentes.
 
A defesa do neoliberalismo no Brasil é
incompatível com a situação política e social atual do Brasil, nosso
estágio exige a presença do Estado em larga escala, assim como na Índia,
na China e na Rússia, o mega capitalismo só funciona em outro estágio
da organização social de um País, com mais de 100 milhões de pobres e
miseráveis nas periferias das grandes e médias cidades, com desemprego
de 30% entre os jovens, o neoliberalismo não vai resolver graves
problemas nem em cem anos, a economia é parte do tecido social, não está
fora dele, o neoliberalismo pode ser eficiente para si mesmo mas não é
eficiente se na sua escalada produz um imenso exército de miseráveis sem
futuro. 
 
Economista desligado da realidade
social, além de ser uma anomalia por definição, é um perigo para a
política e para a definição de políticas com verniz intelectual.

Sentença reforça semelhança de ‘triplex do Lula’ com ‘apartamento do JK’ - Notícias - UOL Notícias

Sentença reforça semelhança de ‘triplex do Lula’ com ‘apartamento do JK’ - Notícias - UOL Notícias



Sentença reforça
semelhança de ‘triplex do Lula’ com ‘apartamento do JK’
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Mário Magalhães
13/07/2017 10:54
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A leitura das 92.742 palavras da sentença assinada ontem pel... - Veja
mais em
https://blogdomariomagalhaes.blogosfera.uol.com.br/2017/07/13/sentenca-reforca-semelhanca-de-triplex-do-lula-com-apartamento-do-jk/?cmpid=copiaecola

Cresce a arrecadação do Sistema S que não passa por controle do fisco

Cresce a arrecadação do Sistema S que não passa por controle do fisco - 16/07/2017 - Mercado - Folha de S.Paulo



Cresce a arrecadação do Sistema S que não passa por controle do fisco



















A maior parte do dinheiro recolhido pelas empresas para os cofres do
Senai e do Sesi, duas das principais entidades do Sistema S, não é
arrecadada pela União, o que dificulta o controle e a transparência
sobre esses recursos e é alvo de controvérsia jurídica.





Esse dinheiro que sustenta o sistema -conhecido por contribuição compulsória
ou contribuição social- tem amparo em legislação dos anos 1940, no
Governo Vargas, e corresponde a um percentual da folha de pagamento de
empresas de vários setores. Conforme o setor, o percentual varia de 0,2%
a 2,5% sobre o montante da remuneração paga aos empregados.





Criados com a função de qualificar trabalhadores da indústria (Sesi e
Senai) e do comércio (Sesc e Senac) e lhes prover atividades de educação
e cultura, os chamados serviços sociais autônomos são entidades de
direito privado sem fins lucrativos, mas que administram bilhões em
recursos semipúblicos -são tributos que têm de ser aplicados em favor da
sociedade, mas não são incluídos no Orçamento da União.





Ao longo dos anos, para atender a interesses de outras indústrias e
setores que pleiteavam recursos do sistema, o escopo da contribuição
cresceu, e hoje o Sistema S contempla transportes (Sest e Senat), micro e
pequenas empresas (Sebrae), setor rural (Senar), cooperativismo
(Sescoop), exportação (Apex) e desenvolvimento (ABDI).





Por ano, os repasses rendem às entidades patronais cerca de R$ 20 bilhões.





Enquanto o imposto sindical, que beneficia sindicatos de trabalhadores e patronais,
foi extinto pela reforma trabalhista -o governo estuda compensar de
alguma forma parte da arrecadação-, a contribuição compulsória, cujo
montante é bem maior, segue intocável.





Cabe ao TCU (Tribunal de Contas da União) e a CGU (Controladoria Geral
da União) fiscalizar as contas dos filiados ao sistema, mas os próprios
órgãos apontam lacunas (a maioria das entidades não publica
demonstrações contábeis consolidadas nem passa por auditoria externa,
por exemplo). Dados problemas de transparência e controle, os críticos
do sistema se referem a ele como uma "caixa-preta".





Na maioria das entidades, essa taxa é cobrada pela Receita Federal. Mas
Senai (Serviço Nacional da Indústria) e Sesi (Serviço Social da
Indústria) podem recolher a contribuição compulsória diretamente dos
seus filiados, sem acompanhamento do Fisco.





Embora a prática suscite questionamentos tanto pelo aspecto legal quanto
pela transparência, a arrecadação direta vem crescendo a cada ano, e em
2016 chegou a R$ 4,2 bilhões, superando o valor recolhido via Receita,
R$ 3,8 bilhões.





DECRETOS X LEI





Dois decretos dos anos 1960 permitem que Sesi e Senai façam a cobrança
diretamente a seus filiados. Mas a lei federal 11.457, que dispõe sobre a
administração tributária federal, determina que a tarefa cabe à
Receita.





Em relatório de 2013 para embasar um processo sobre a legalidade da
arrecadação direta, a Semag (Secretaria de Macroavaliação Governamental)
do TCU considerou a modalidade ilegal à luz de várias normas vigentes
no país (incluindo, além da lei 11.457, a Constituição e o Código
Tributário Nacional) e recomendou ao tribunal a sua extinção.




O relator do processo, ministro José Múcio, ignorou os argumentos
técnicos e votou pela legalidade da arrecadação direta, no que foi
seguido pelos colegas. Em seu voto, anotou "a total ausência de
interesse da Receita Federal em assumir a arrecadação dessas
contribuições" e publicou a justificativa do órgão para abrir mão de sua
prerrogativa no caso de Sesi e Senai:





"(...) A despeito de tais instrumentos [os decretos] não serem lei em
sentido estrito, habilitaram as entidades ao exercício da capacidade
tributária ativa por mais de quarenta anos e teriam, portanto, se
convalidado pelo tempo, suprindo assim o requisito".





Múcio registrou ainda, em seu voto, que a mudança no modelo de
arrecadação "implicaria, para sua implementação, considerável ônus aos
agentes envolvidos, sem que haja vantagens do ponto de vista do
interesse público".





Dois anos depois, em 2015, o TCU voltou ao tema, alertando para a falta
de transparência da arrecadação direta. O documento aponta que o
controle sobre os valores arrecadados fica comprometido, por não passar
pela Receita.





O mesmo TCU considerou a modalidade "antieconômica para o Sistema
Indústria", graças a descontos concedidos pelas entidades aos afiliados
que optam pela arrecadação direta ("superiores à taxa de 3,5% paga à
Receita para realizar o trabalho de arrecadação") e a despesas maiores
(para manter "estrutura de controle, fiscalização e cobrança, que não
seria necessária caso a receita fosse totalmente arrecadada pela RFB").





Relator deste processo no tribunal, o ministro Marcos Bemquerer afirma
que "o problema [da arrecadação direta] é saber se o que é devido é
devidamente recolhido". "Não temos um órgão público que faça esse
trabalho. É um ponto confuso no controle."





Em suma, argumenta, não há como os órgãos de fiscalização terem a
certeza de se o valor declarado por Sesi e Senai corresponde àquele que
foi arrecadado. Nem o Estado poderá cobrar ou punir a inadimplência, já
que o controle é do Sistema Indústria.





Bemquerer considera que, "se os valores com arrecadação direta estão
crescendo, se [Sesi e Senai] estão incentivando as empresas a arrecadar
de maneira direta, é porque é vantajoso para eles".





'GUERRA'





Crítico contumaz da contribuição compulsória e da arrecadação direta,
que define como "crime", o senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), reclama
também que o dinheiro do Sistema S, mesmo sendo um tributo e tendo
destinação social, não entre no Orçamento da União.





O senador apresentou duas emendas ao projeto de LDO (Lei de Diretrizes
Orçamentárias) para 2018 propondo incluir as receitas do Sistema S na
LOA (Lei Orçamentária Anual) e aprimorar as regras de transparência das
entidades, mas ambas foram rejeitadas.




Oliveira também apresentou emenda ao projeto da reforma trabalhista para
acabar com a obrigatoriedade da contribuição. Como de costume, a
proposta não prosperou.





"Alguns dirigentes desses entidades são mais poderosos do que muito
político. Há um silêncio que protege o sistema", resume o deputado
federal Miro Teixeira (PDT-RJ). Ele relata que na Constituinte de 1988
começou a tentar mexer no modelo e que já naquela época o poderoso lobby
empresarial no Congresso impediu.





Os dois eixos mais poderosos do Sistema S -indústria e comércio- operam
num esquema semelhante: no âmbito nacional, a CNI (Confederação Nacional
da Indústria) também administra Senai e Sesi, assim como a CNC
(Confederação Nacional do Comércio) com Sesc e Senac. O modelo se
reproduz regionalmente -em São Paulo, o presidente da Fiesp, por
exemplo, lidera o Sesi e o Senai no Estado.





A contribuição compulsória é defendida com fervor por dos dirigentes do setor, que em geral são perpetuados no cargo.





Em São Paulo, Abram Szajman está há mais de 30 anos no comando da
Fecomércio, e Paulo Skaf, que deverá ser reeleito para mais um mandato
como presidente da Fiesp (até 2021) -é candidato único na eleição
marcada para agosto- poderá ficar no cargo por pelo menos 17 anos.





Em nível nacional, Antonio Oliveira Santos preside a CNC, a Confederação Nacional do Comércio, há 38 anos.





Sem controle do Estado sobre a inadimplência de Sesi e Senai, nada
impede que um dirigente perdoe dívidas de filiados com a contribuição em
troca de apoio político em eleições, por exemplo.





Governos recentes tentaram mexer nas verbas públicas do Sistema S, sem
sucesso. Ministro da Fazenda de Dilma Rousseff em 2015, Joaquim Levy
incluiu, num pacote de ajuste fiscal, proposta de reduzir em 30% os
repasses ao Sistema S para cobrir o rombo da Previdência. Skaf disse que
os empresários iriam "para a guerra". O plano de Levy fez água.





Representantes do Sistema Indústria defendem a necessidade dos recursos
da contribuição compulsória e a competência do Sesi e Senai de fazer
arrecadação direta desses tributos.





Segundo o presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Robson
Andrade, "a única maneira de formar mão de obra qualificada é aprimorar
o trabalhador". "Como as empresas fariam essa qualificação sem esse
recurso?", questiona.





Sobre a arrecadação direta, Andrade argumenta que o Sistema Indústria
está amparado nos decretos dos anos 60 e em autorização da Receita e que
tem um controle interno mais rigoroso que o do Fisco.





Ele nega que a modalidade seja antieconômica para o setor, pois as
empresas que recebem desconto ao optar pela arrecadação direta -de 3,5%,
mesmo percentual cobrado pela Receita- "assumem o compromisso de
investir esses 3,5% em programas de formação profissional".





O diretor-geral do Senai e diretor-superintendente do Sesi, Rafael
Lucchesi, ressalta o mesmo aspecto: "A retenção feita pelas empresas se
reverte em ações executadas por elas na missão do Sesi e do Senai [de
educação, saúde e segurança do trabalho]. Já a retenção feita pela
Receita é uma contraprestação à arrecadação por ela realizado".




Lucchesi diz que a arrecadação direta e a indireta "tiveram movimentos
convergentes e harmônicos ao longo dos últimos anos" e levanta duas
hipóteses para o crescimento da primeira: 1) a crise fiscal e econômica;
2) uma instrução normativa da Receita, de 2014, que retirou "parcela
significativa" da base de contribuintes da agroindústria do Sesi e do
Senai e redirecionou os recursos para o Incra.





"Como a maior parte das empresas desse setor estava na arrecadação
indireta, isso pode ter gerado um impacto diferenciado entre as bases de
arrecadação", diz.





Segundo ele, não há uma avaliação precisa sobre inadimplência das duas bases de arrecadação.





"Um dado objetivo é que 23,3% da arrecadação direta provêm de empresas
públicas, que estão menos sujeitas às oscilações do ciclo econômico
quanto à variação do emprego. A arrecadação indireta tem perfil
distinto, com maior participação de pequenos negócios, que tiveram forte
contração do nível agregado de emprego."





Lucchesi afirma que Sesi e Senai esclareceram ao TCU as questões
levantadas pelo tribunal e que Sesi e Senai cumprem a determinação do
tribunal para divulgar em seus sites os valores arrecadados com a
contribuição.





O diretor de Sesi e Senai afirma que a arrecadação direta está amparada
no arcabouço jurídico do país. "Não se deve confundir competência
tributária, que é indelegável, com a função de arrecadar que pode ser
consentida a entidades privadas, conforme estabelecido pelo artigo 7º do
Código Tributário Nacional."





E lembrou decisão de 2007 do STJ que negou um recurso especial contestando a competência do Senai para arrecadar.





Por fim, Lucchesi considerou a proposta de incluir os recursos do
Sistema S no Orçamento como "totalmente inconstitucional, pois a
Constituição reconhece o caráter privado dos serviços sociais autônomos e
assegura que as contribuições a eles devidas estão ressalvadas das
contribuições destinadas à seguridade social".





"Como Sesi e Senai não pertencem à administração pública, os seus
recursos, incluindo as suas contribuições compulsórias, não podem estar
previstos em nenhum desses três orçamentos: fiscal da União, das
estatais e da seguridade social."



MORO E A MORTE DO DIREITO - WADIH DAMOUS

WADIH DAMOUS: Lula deveria ter sido condenado por corrupção? NÃO - 15/07/2017 - Opinião - Folha de S.Paulo




WADIH DAMOUS





Lula deveria ter sido condenado por corrupção?




MORO E A MORTE DO DIREITO





A decisão judicial que condenou o ex-presidente Lula pode ser analisada
por três aspectos: o técnico-jurídico, o histórico e o psicanalítico. Os
dois primeiros absolvem o acusado, o terceiro ajuda a explicar aquilo
que, na lição do jurista italiano Franco Cordero, se denominou quadro
mental paranoico do juiz.





Do ponto de vista do rigor técnico-jurídico é importante afirmar que a
sentença afronta a exigência constitucional de que fundamentadas sejam
todas as decisões judiciais, ainda mais quando está em jogo a vida e a
liberdade alheias. Só é legítima e válida a decisão judicial que
indicar, concretamente, as suas premissas lógicas e o caminho racional
percorrido pelo magistrado para resolver a contradição entre acusação e
defesa.





Resolver essa dialética implica, portanto, em trabalho rigoroso de
análise da prova colhida durante o processo e se ela seria suficiente
para comprovar o quanto alegado na denúncia.





Alguns dados ajudam a compreender a absoluta nulidade da sentença que
condenou o ex-presidente Lula. Cerca de 60 páginas, 30% da sentença, são
utilizadas pelo juiz para se defender de acusações de arbitrariedades
por ele praticadas contra o acusado e nos processos em que atua. Só 8%,
cerca de 16 páginas, são utilizados para rebater e se contrapor ao que o
acusado afirmou em seu interrogatório, e apenas 0,4% é dedicado às
testemunhas da defesa, menos de uma página de um total de 218.





A questão central do processo, a titularidade do imóvel que teria sido
recebido em contrapartida aos atos que beneficiariam empresas, é tratada
pelo juiz com absoluto desdém, a ponto de dizer que no processo "não se
está, enfim, discutindo questões de direito civil, ou seja, a
titularidade formal do imóvel, mas questão criminal".





Ora, para resolver o processo era fundamental que o Ministério Público
provasse ter o ex-presidente recebido o referido imóvel em troca de
favorecimentos a terceiros e, para o Código Civil, a única forma disso
acontecer é com a transferência da sua titularidade.





Em resumo, a sentença pode ser caraterizada como uma expiação narcísica
de atos autoritários do juiz, preenchida pelo profundo desprezo aos
argumentos da defesa e pela miséria jurídica e intelectual. Lula estava
condenado antes mesmo de ser julgado.





A ânsia em condenar a maior liderança popular do Brasil fez com que o
juiz furasse uma fila de quatro processos de outros acusados que estavam
prontos para sentença desde o ano passado. Tudo isso pela vaidade de
tentar recuperar um protagonismo perdido, fruto do crescimento das
críticas de setores sociais que antes o apoiavam.





O juiz que já havia favorecido Michel Temer ao criminosamente gravar a
presidenta Dilma Rousseff e depois divulgar o conteúdo da gravação,
novamente o faz, proferindo sentença absolutamente ilegal, em meio ao
julgamento pela Câmara dos Deputados da admissibilidade de denúncia
oferecida perante o STF.





É simbólico que a sentença contra Lula tenha sido proferida no dia
seguinte à criminosa condenação dos direitos trabalhistas pelo governo
ilegítimo que Moro ajudou a estabelecer e agora ajuda a se manter com
suas estapafúrdias, ilegais e atabalhoadas decisões judiciais.





A esperança é que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região possa, de
forma imparcial, reformar a sentença e corrigir essa injustiça manifesta
contra o ex-presidente e sua família. No julgamento da história, no
entanto, Lula já foi absolvido.




WADIH DAMOUS, deputado federal (PT-RJ), é vice-líder do partido na Câmara e ex-presidente da OAB/RJ

Jornal do Brasil - Sociedade Aberta

Jornal do Brasil - Sociedade Aberta - Condenação de Lula: sem fundamento legal



Condenação de Lula: sem fundamento legal

Dalmo de Abreu Dallari
A
condenação de Lula pelo Juiz Sérgio Moro em processo criminal, sem que
na sentença tenha sido apontada a prática de qualquer crime, é
manifestamente ilegal, não devendo prevalecer. Além disso, a condenação
sem fundamento legal deixa também evidente a motivação política da
decisão, o que configura um comportamento inconstitucional do Juiz
Sérgio Moro, sujeitando-o a uma punição pelos órgãos superiores da
Magistratura.

Numa decisão longuíssima, absolutamente
desnecessária quando a acusação especifica o crime cometido pelo
acusado, o Juiz Moro dá muitas voltas, citando fatos e desenvolvendo
argumentos que não contêm qualquer comprovação da prática de um crime
que teria sido cometido por Lula. E sem qualquer base para uma
fundamentação legal chega à conclusão condenando o acusado.
Evidentemente, a base para a condenação não foi jurídica e um conjunto
de circunstâncias leva inevitavelmente à conclusão de que a motivação
foi política, o que configura patente inconstitucionalidade.

Dalmo Dallari
Dalmo Dallari

Quanto ao  enquadramento do acusado na prática de um crime, o que
existe é a afirmação feita por um denunciante de que Lula,  quando no
exercício da Presidência da República, teria recebido como propina um
apartamento de luxo, um triplex, no Guarujá, que lhe teria sido dado
pela grande empresa de engenharia OAS em troca de privilégio ilegal para
contratação com a Petrobras. Se realmente isso tivesse ocorrido haveria
um fundamento jurídico para o enquadramento de Lula como autor de um
crime e para sua consequente condenação juridicamente correta. Ocorre,
entretanto, que nos registros públicos competentes não consta que Lula
tenha sido ou seja proprietário do mencionado apartamento, nem foi
exibido qualquer documento em que ele figure como tal, ou mesmo como
compromissário comprador. Obviamente, o ato indicado como fundamento
para a incriminação e condenação de Lula simplesmente não existe e nunca
existiu. Assim, pois, sua condenação foi baseada num falso fundamento,
sendo, portanto, ilegal.

Da decisão condenatória cabe recurso para
o Tribunal Regional Federal da 4a.Região, sediado em Porto Alegre, que é
o Tribunal competente. Como foi informado pelo jornal « O Estado de S.
Paulo », aquele Tribunal já decidiu dando provimento a 38% (trinta e
oito por cento) dos recursos interpostos contra decisões do Juiz Moro.
Assim, pois, existe grande possibilidade de que a condenação de Lula
seja anulada por aquele Tribunal. Aliás, o elevado percentual de
acolhimento dos recursos permite concluir que não é raro que aquele Juiz
profira decisões contrariando as provas dos autos, ou seja, sem
fundamento legal.

 O dado fundamental é que a condenação de Lula
pelo Juiz Sérgio Moro não teve fundamentação jurídica, restando, então,
como justificativa, a motivação política. E aqui vem muito a propósito
lembrar que a Constituição brasileira, no artigo 95, parágrafo único,
estabelece, textualmente, que aos juízes é vedado : « III. Dedicar-se à
atividade político-partidária ». Evidentemente, essa atividade pode ser
exercida, e estará sendo exercida, quando alguém praticar atos tendo por
motivação um objetivo político, seja o favorecimento de um candidato ou
de uma corrente política, seja a criação de obstáculos para integrantes
de uma orientação política contrária às preferências do Juiz. Ora,
proferindo uma decisão desprovida de fundamento jurídico, visando criar
obstáculos para um político de destaque oposto às suas convicções e aos
candidatos de sua preferência, o Juiz está participando de atividade
político-partidária. Foi precisamente o que fez o Juiz Sérgio Moro, que,
além de proferir sentença desprovida de fundamento jurídico, ofendeu
disposição expressa da Constituição.

Por tudo isso, adotando
fundamentação estritamente jurídica, os defensores do acusado Lula devem
recorrer para o Tribunal superior, existindo grande possibilidade de
que seja dado provimento ao recurso anulando-se a decisão condenatória.  


* jurista

Sobre condenados e esquecidos

Sobre condenados e esquecidos. Por Celso Vicenzi - TIJOLAÇO



Sobre condenados e esquecidos. 

por Celso Vicenzi

rafaelfalco


Veja se você consegue lembrar quem condenou Tiradentes à forca? Quem
condenou Sócrates a beber a taça de cicuta? Quem executou Che Guevara?


O juiz vaidoso que não esconde suas frustrações pessoais nos mínimos
gestos e comportamentos, é mais um condenado a desaparecer na história
enquanto a figura de Luis Inácio Lula da Silva irá permanecer para
sempre nos livros de história, de ciência política, de sociologia, em
biografias, em poesias, na literatura de cordel, em peças de teatro e
tantas outras formas de imortalidade. Verdade ou mito, não importa, Lula
será símbolo. De um Brasil que ousou retirar milhões da miséria e
sonhar com mais igualdade, alçar voo entre os maiores do mundo, antes de
ser abatido por mais um golpe.


É assim com os grandes personagens da história da humanidade. Já aos
seus algozes, que cumpriram papéis ordinários, coube o esquecimento. Ou,
talvez, para que não esqueçamos jamais, figurem como exemplos de
injustiça e ignomínia.


Moro agiu em fina sintonia com os mais potentes veículos de
comunicação do país, sob o manto da cumplicidade de seus superiores,
para torturar um cidadão e sua família diuturnamente com injúrias,
calúnias e difamações.


À história caberá demonstrar, com mais clareza, o que significou a
Operação Lava Jato para consumar o golpe no Brasil. Da mesma forma que,
passadas algumas décadas, hoje sabemos muito sobre os bastidores do
golpe de 64. Para quem gosta tanto de “indícios”, são fartos aqueles que
nos levam a suspeitar de um golpe
jurídico-midiático-parlamentar-policial-empresarial contra a presidenta
Dilma. Com know-how (tudo indica) de quem fala muito bem essa língua.


O golpe, que ainda prossegue, destituiu uma presidenta sem crime para
promover um assalto ao poder que consuma o maior retrocesso aos
direitos trabalhistas da história nacional e que deve completar-se com
outros ataques: aos direitos humanos, à soberania do país, à educação,
às mulheres, aos negros, à população LGBT, aos movimentos sociais e à
população mais pobre.


Que Moro não se engane. A história é pródiga em transformar heróis em
vilões e vice-versa. O golpe avança para entronizar duas das forças
mais nefastas que tomaram conta do país: a de pastores políticos de
igrejas que, se não fosse o álibi da religião poderiam ser enquadrados
como estelionatários, e a do fascismo liderado por Bolsonaro, capaz de
capitalizar o ódio de milhões de brasileiros que foram às ruas e às
janelas bater panelas contra Dilma, Lula e o PT pelo que representavam
como projeto de país, porque a corrupção nunca os incomodou, como agora,
aumentada e escancarada, não provoca nenhuma reação.


Que Moro não se iluda com o brilho fugaz das telas de TV e com a sua
aparente fama, porque será lembrado como infame. Ao condenar Lula a nove
anos e meio de prisão, numa alusão aos nove dedos do ex-presidente,
Moro prova que é um juiz perverso. E medíocre. Produziu uma sentença que
será objeto de estudo e escárnio, um case do que a justiça não pode
ser. A condenação de Lula é mero pretexto, porque a sentença é contra um
projeto de nação, que aos poucos vai sendo subjugada em sua soberania,
entregue às forças do mercado, ávidas por lucros obscenos no país que já
é um dos 10 piores em distribuição de renda.


Há muitos casos na história de acusações e condenações espúrias, como
as de Nicolas Sacco e Bartolomeo Vanzetti, nos Estados Unidos, a do
capitão Alfred Dreyfus, na França, ou a de Nelson Mandela, na África do
Sul. Condenações que sempre serviram a propósitos políticos.


Luis Inácio Lula da Silva, que já colocou o seu nome na história por
promover a maior ascensão social da população mais miserável do país,
que liderou – com todos os problemas – um projeto de inserção do Brasil
entre as maiores nações do planeta, terá seu nome ainda mais cultuado
diante da injusta perseguição que sofre. A tortura a que é submetido,
por acusações não comprovadas que contra ele e seus familiares foram
engendradas em dezenas de capas de revistas e jornais, e incontáveis
minutos em emissoras de rádio e TV, certamente o alçarão à condição
também de perseguido político. De uma nova forma de perseguição
política, mais sofisticada, nem por isso menos cruel.


Moro condenou Lula, mas condenou-se também. Lula permanecerá uma
lenda viva na história do Brasil. Tanto maior quanto mostrarem-se
infundadas, no futuro, as acusações e as manobras que certamente vão
impedi-lo de ser candidato e derrotar o golpe pela via democrática, se
eleições houver em 2018.


Moro, o juiz que se comporta muito mais como um acusador seletivo,
que é moroso com corruptos golpistas e sem morosidade com quem apoiou
Lula, Dilma e o PT, condenou-se a ser, muito em breve, um nome a ser
esquecido no pé de página da história, um mero instrumento de forças
maiores que consumaram o golpe. Alguém, no máximo, a ser lembrado de
forma pouco digna como exemplo do que a justiça não pode ser, caso
queira ter esse nome.


*Celso Vicenzi é  jornalista, ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas/SC e publicou este texto em seu blog.