domingo, 9 de julho de 2017

Sobre comportamentos técnicos de heróis e políticos de "inimigos do Brasil"

Métodos da Lava Jato desmoralizam o direito — Conversa Afiada



Métodos da Lava Jato desmoralizam o direito

Aragão: argumentar nunca foi o forte de Janot…









O Conversa Afiada publica texto de Eugênio Aragão, ministro da Justiça do governo Dilma (ela acertou por último...):


Sobre comportamentos técnicos de heróis e políticos de "inimigos do Brasil"


Até há pouco era assim: criticar a Lava-Jato era atitude política,
participar do golpe fingindo que as instituições estavam a funcionar era
técnico. Agora, é difícil definir se ter náuseas e ânsia de vômito é
técnico ou político. O momento é oportuno para produzir clareza sobre a
obtusidade dessa ideológica distinção entre o técnico e o político. É
evidente que o primeiro se subordina ao segundo e acaba tudo por ser
político.

O Ministério Público Federal gosta muito desse jogo de
palavras. Recentemente, em entrevista ao "Estado de São Paulo", seu
chefe foi incisivo: "os que querem frear a Lava Jato são inimigos do Brasil". E concluiu com a pérola: "...não
concordo que existam abusos por parte do Ministério Público. Temos como
ponto basilar da atuação a observância à Constituição Federal e nos
pautamos por ela. Nossa atuação é técnica, apolítica e responsável
".
Tive que ouvir bobagem similar quando, há mais de ano, despedi-me da
amizade de Janot. Mas o tempo não era de risadas. Mais recentemente ouvi
essa mesma troça de seu assistente, o importador xinguelingue da teoria do domínio do fato que foi desmentido por Claus Roxin, o criador da teoria.

Agora dá vontade de apor um "smiley" de gargalhada. Argumentar nunca foi o forte de Rodrigo e nem de seu entourage.
O chefe prefere se gabar, deblaterar, xingar ou fazer piada. E o
entorno aplaude. Ao agasalhar esse velho bordão da atuação técnica que
distinguiria os membros "patrióticos" do MPF dos "inimigos" do outro
lado, o PGR ou é tolinho ou acha que nós o somos.

O direito é um
instrumento de legitimação de decisões. Nem o instrumento e nem a
legitimação em si seguem regras objetivas que correspondam a esforço de
precisão lógica. Decisões não são redutíveis a cálculos sentenciais sem
graves problemas de consistência.

Toda tomada de decisão jurídica
comporta dois ou mais caminhos de legitimação, que, de regra, são
contraditórios. Simplificando, pode-se dizer que um juiz tem que optar
entre a tese do autor e a do réu. Tem a sua disposição um espectro
relativamente largo de alternativas, sempre dentro desse intervalo.
Todas são juridicamente igualmente sustentáveis (e, portanto, ao ver dos
juristas "legítimas"), mesmo que fundamentem pretensões opostas. Dizer
que o réu ou o autor tem razão não é um resultado inexorável, com
precisão da conclusão de um silogismo em Bar-ba-ra! É resultado
de uma escolha que corresponde melhor às convicções subjetivas do
julgador. No fundo, para tudo ficar como está. A única coisa que o juiz é
obrigado a fazer é motivar essa escolha, de modo que possa ao menos ser
criticada e contestada e, com isso, ganhar um brilhozinho de falsa
falseabilidade.

A "técnica" não está na opção, que, quase sempre,
é a priori e política, mas na motivação. Esta trata de travestir de
"exato" um conteúdo que nada tem de exato. Oferece à opção a aparência
de um resultado científico. É só casca, não é essência. É um acessório
apenas e, como tal, tem a mesma natureza do principal. É um instrumento
da política.

E quando operadores perdem a paciência, seja por
náuseas, seja porque o bambu para fabricar flechas está acabando, não
coram ao mandarem a técnica para aquele lugar. Fazem hashtags nos seus perfis de Facebook, lembrando que #2018tachegando
e tornam públicas gravação de Geddel Vieira Lima a chorar para
humilhá-lo. Fazem seus troféus humanos desfilarem algemamos, de Baraço e
pregão pelas ruas da vila. Anunciam à “IstoÉ” a sentença condenatória
contra Lula e dizem que delações contra o PSDB não vêm ao caso. Fazem
estardalhaço com diálogo ilicitamente captado entre Dona Marisa e Fábio,
recheado de linguagem coloquial, só para refratar a imagem da primeira
dama que foi. E depois dizem que sentem náuseas...

Não é sua
"técnica" que faz esses energúmenos melhores. Ledo engano. A técnica
somente lhes penteia a vaidade. E olha que às vezes penso (só penso) que
alguns deles estudaram no exterior não foi direito, mas culinária,
tamanha a gula pelo poder.

Não quero afirmar aqui que a técnica
só é engodo. É, na verdade, como uma chave de fenda. Serve para apertar
parafusos ou para estocar alguém num acesso de raiva. Depende como a
manuseamos, com que índole, com que objetivo político. Se a usarmos para
abraçar e acolher os filhos pródigos que à casa do Pai retornam, está
valendo! Se for para castigar, maltratar, expor e arruinar a esmo e, com
isso, se exaltar com inexistentes virtudes a si mesmo atribuídas, passa
a ser uma arapuca "satânica" (ou será diabólica, que nem a prova
impossível, Senhor PGR?).

Uma boa técnica usada por um operador
politicamente consciente enaltece a Justiça. Legitima a decisão, porque
lhe oferecerá a roupagem em que todos se espelham. Mas isso não funciona
com quem a usa orgulhosamente apenas para se distinguir daqueles que,
sem moral, desqualifica, para lograr apoio de uma sociedade doente pelo
ódio disseminado por instituições e mídia deformadas. Esse é apenas o
caminho mais seguro para desacreditar o direito e seus profissionais,
procuradores lavajateiros ou não. E aí não adiantam as mais pontudas flechas de bambu. Não serão elas que redimirão os vaidosos arqueiros.

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