segunda-feira, 29 de setembro de 2014

A caça aos indecisos

A caça aos indecisos - Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 29/9/2014 | Observatório da Imprensa |

A caça aos indecisos


Por Luciano Martins Costa em 29/09/2014 na edição 817







 Os principais jornais de circulação nacional entram na semana decisiva
da disputa eleitoral pressionados por uma realidade incômoda: sua
principal aposta para a Presidência da República, o senador mineiro
Aécio Neves (PSDB), precisaria aumentar em pelo menos 60% seu atual
patrimônio de votos e contar com uma complicada mudança de tendências
para voltar a ter chances.


Empenhada em interromper o domínio do Partido dos Trabalhadores na
política nacional, a imprensa deve recrudescer seus ataques ao governo
para tentar impedir uma vitória de Dilma Rousseff no primeiro turno. A
afirmação poderia parecer absurda, não fosse a escolha explícita feita
pela mídia tradicional, que se reflete nas edições de todos os dias e se
torna ainda mais escancarada nesta reta final.
Em todos os anos em que ocorrem eleições, os jornais dominantes no
cenário nacional e as principais publicações regionais anunciam planos
para uma cobertura equilibrada e equidistante. Em alguns casos, são
contratados consultores especializados e criadas planilhas sofisticadas
para análises mais rápidas e precisas dos dados que apontam a tendência
dos votos. No entanto, esses planos nunca passam das costumeiras
declarações a respeito do jornalismo de qualidade, com frases de efeito
sobre lugares-comuns como equilíbrio do noticiário, espaços e destaques
divididos de forma equânime e outras excelentes intenções.
Quando o jogo começa para valer, o que se vê é sempre o apoio pouco
disfarçado ao candidato que mais se aproxima do perfil desejado pelos
donos da mídia. No domingo (28/9), por exemplo, a Folha de S.Paulo
anunciou que iria ampliar a cobertura eleitoral, com um caderno
especial que agrega oito novos colunistas. Mas a estreia do suplemento
intitulado “Eleições 2014” traz apenas mais do mesmo, repetindo a
prática das análises que garimpam notícias desfavoráveis ao atual
governo.
A manchete sobre o cumprimento do programa registrado pela então
candidata Dilma Rousseff em 2010 é um primor de criatividade e
manipulação de dados. A base comparativa é o programa genérico que os
candidatos entregam à Justiça Eleitoral antes das eleições.
Boletim escolar
Alinhando citações colhidas aleatoriamente em frases “abrangentes, sem
prazo ou meta numérica”, como reconhece o texto explicativo, a suposta
reportagem submete esses planos a uma escala simplificada de quatro
notas, como num boletim escolar: “A” para metas cumpridas em sua
totalidade; “B” para objetivos parcialmente alcançados, mas com
resultados relevantes; “C” para casos em que foi obtido menos da metade
do anunciado e “D” para as propostas que foram abandonadas.
A ideia é tão primária que causa constrangimento, mas o título não
dissimula as intenções: “Dilma não cumpriu 43% das promessas de 2010”,
diz a manchete.
A participação de intelectuais respeitados tenta convencer o
leitor-eleitor da seriedade das análises que têm como base um apanhado
de pretensões que, como se sabe, não correspondem a compromissos reais
de governo. Mesmo porque os tais programas pré-eleitorais não têm força
de lei – são apenas declarações superficiais que cumprem uma exigência
burocrática e precisarão ser submetidas ao teste de realidade depois da
posse. Por exemplo, nenhum candidato previu, em 2010, que o tema da
mobilidade urbana dominaria os debates públicos a partir de junho de
2013.
Os editores da Folha incluíram no projeto humoristas e cronistas
da vida cotidiana, entre os quais um jornalista que escreve sob o
pseudônimo de “Rui Goiaba” – eles estão encarregados de oferecer uma
leitura mais leve ao material que normalmente é produzido pelo confronto
dos candidatos. Talvez esses venham a ser o melhor do novo suplemento,
porque não parecem se levar tão a sério quanto os cientistas sociais,
economistas e filósofos que costumam emprestar seus títulos para
referendar a opinião dos editorialistas.
As pesquisas de intenção de voto revelam o efeito do noticiário sobre a
escolha dos eleitores: o resultado mais evidente do partidarismo da
imprensa é a criação de um bloco compacto de opinião antipetista, que se
concentra nas cidades onde os grandes jornais têm maior presença. Esse
núcleo, tão avesso ao contraditório quanto os mais renhidos entre os
militantes petistas, precisa ser alimentado diariamente com sua cota de
certezas absolutas.
O último esforço da mídia tradicional se dirige a outro grupo, o dos
indecisos, que vão dizer nos próximos dias se haverá segundo turno.

Tetos, pisos e a avalanche

Tetos, pisos e a avalanche


Tetos, pisos e a avalanche

Jose Roberto de Toledo
29 setembro 2014 | 00:59

Os pilares da eleição de presidente do Brasil não mudam de
lugar há 25 anos. Desde o segundo turno de 1989, a disputa se estrutura
entre eleitores pró-PT, antiPT e volúveis. No domingo, será a décima
votação seguida comandada por essa lógica. A dúvida é quem representará o
antipetismo. O favoritismo de Marina Silva (PSB) para ganhar o papel é
cada vez menor.


O Ibope e o Estadão Dados elaboraram um modelo estatístico para medir
os três grupos de eleitores e identificar suas tendências. Após muitos
cálculos e comparações, chegaram a cinco respostas que separam
pró-petistas de antipetistas e demais. Se o eleitor concorda com ao
menos três, ele é pró-PT (é diferente de ser petista; só tem mais
probabilidade de votar no PT). Se não concorda com nenhuma, é antiPT.
Uma ou duas o tornam volúvel.


As respostas-chave são: 1) acha o governo bom ou ótimo, 2) aprova
Dilma Rousseff (PT), 3) diz que votaria com certeza ou poderia votar em
Dilma, 4) diz ter preferência partidária pelo PT, 5) é beneficiário do
Bolsa Família (ou mora com alguém que seja). Algumas delas podem parecer
redundantes, mas o seu cruzamento elimina inconsistências nas respostas
dos eleitores.


O modelo foi testado em três rodadas de pesquisas presidenciais e
mostrou-se quase imutável. Na mais recente, feita na semana passada, 39%
dos eleitores se encaixaram no grupo pró-PT. Os anti-PT, que não se
enquadram em nenhuma das cinco respostas, são 33% do eleitorado
nacional. Os 28% restantes podem ir para um lado ou para outro. Como
nenhum dos grupos antagônicos tem maioria absoluta, os volúveis acabam
decidindo a eleição.


Não basta, porém, ter metade mais um dos volúveis. Há nuances que
tornam a conta mais complexa. Por exemplo: como o grupo pró-PT é maior, o
candidato antipetista precisaria conquistar mais de 60% dos votos do
grupo volúvel para ser eleito. Isso se ele tivesse todos os eleitores
antiPT, e o candidato petista tivesse 100% dos votos pró-PT. O problema é
que eles nunca têm.


“Apenas” 82% dos pró-PT são eleitores de Dilma no primeiro turno. Há
quem caia nesse grupo e prefira outros candidatos. Afinal, a segunda
colocada é uma ex-petista: 8% dos pró-PT declaram voto em Marina Silva
(PSB), e 4%, em Aécio Neves (PSDB). É o grupo onde há menos eleitores
que vão anular ou votar em branco: só 1%. São também poucos os
indecisos: 5%.


Já entre os antiPT, só 1% dizem que vão votar na presidente. Também
há poucos indecisos (6%), mas abundam os que não estão satisfeitos com
nenhuma das alternativas e vão anular: 15%. Marina leva vantagem de 45% a
34% sobre Aécio nesse grupo.


A ex-petista vai ainda melhor do que o tucano entre os volúveis: 38% a
19%. E Dilma tem o suficiente para embolar a disputa entre os rivais e
manter-se com chances no turno final: 21%. Em nenhum outro grupo há
tantos indecisos: 14%. A taxa de branco/nulo entre eles se aproxima da
média histórica e não deve mudar: 8%.


Como o modelo ajuda a saber quem passará ao segundo turno? A partir
dele são estimados os tetos de votação dos candidatos, cruzando os
grupos com as taxas de rejeição e o potencial de voto. O modelo mostra
que, até a última pesquisa, Marina tinha teto e piso mais altos do que
os de Aécio. Era uma vantagem.


A análise combinatória das taxas a que Aécio e Marina poderiam
chegar, respeitados seus tetos e pisos, mostrava que há menos cenários
em que o tucano poderia chegar à frente da rival. Até a última pesquisa
divulgada pelo Ibope, a proporção era de 3 para 1 em favor da candidata
do PSB. Porém, sua curva descendente sugere que as chances do tucano
tenham aumentado desde então.


Se a perda de votos de Marina continuar acelerando e virar avalanche,
os pisos e tetos serão solapados. As pesquisas de terça, quinta e
sábado mostrarão o tamanho do estrago.




domingo, 28 de setembro de 2014

Xingado de escravo, cubano do Mais Médicos hoje reclama de falta de especialistas - BBC Brasil

Xingado de escravo, cubano do Mais Médicos hoje reclama de falta de especialistas - BBC Brasil

Xingado de escravo, cubano do Mais Médicos hoje reclama de falta de especialistas

  • 27 setembro 2014




'Para salvar e cuidar de qualquer vida não vemos as dificuldades', diz médico

O
médico cubano Juan Delgado, 40, que foi xingado de escravo e virou
símbolo do programa Mais Médicos, está tendo dificuldades para marcar
consultas com especialistas e agendar exames para seus pacientes no
interior do Maranhão.
"Demora muito tempo para conseguir exames
diagnósticos e consultas próprias das especialidades para definir um
tratamento adequado para o paciente", afirma o médico em entrevista à
BBC Brasil.

Delgado atua em aldeias indígenas do interior do
Maranhão. Ele atende ao principal objetivo do projeto, que é levar
atendimento básico a locais com escassez de profissionais de saúde, mas
está esbarrando em um novo gargalo da saúde pública brasileira exposto
pelo Mais Médicos.

Em Cuba, segundo Delgado, não há "as
dificuldades que vemos no Brasil para realizar consultas com
especialistas e qualquer exame diagnóstico."

Ele afirma que um
exame de ultrassom, por exemplo, leva mais de um mês para ser agendado –
algo que diz ocorrer em todo o Brasil. Para contornar o problema, usa
as perguntas feitas aos pacientes e o exame físico.

O médico
também encontrou outras dificuldades no interior, como a ausência de
infraestrutura adequada para consultas e de remédios, que "escasseam às
vezes". Esses são argumentos frequentemente usados por entidades médicas
para justificar a rejeição de brasileiros a postos de trabalho nos
rincões do país.

Mas Delgado não pensa em desistir por causa
disso: "Supero esta dificuldade e realizo o atendimento. O médico cubano
vai ao lugar para onde mandarem. Para salvar e cuidar de qualquer vida
não vemos as dificuldades. Isso é parte de nossa formação", afirma.

Delgado
diz que não voltou a sofrer ataques como os que ocorreram em Fortaleza.
Logo após sua chegada, ele e outros médicos cubanos foram vaiados e
chamados de escravos por profissionais brasileiros.

As ofensas
foram baseadas no fato de que, ao contrário dos outros médicos que
participam do programa, os cubanos recebem apenas uma parte da bolsa de
R$ 10 mil. O convênio do governo brasileiro é com a Opas (Organização
Panamericana da Saúde), que repassa o pagamento ao governo de Cuba. Os
médicos cubanos ficam com US$ 1.245, ou cerca de R$ 3.000 -o que,
segundo Delgado, é suficiente para seus gastos.

À época, o então
ministro da Saúde, Alexandre Padilha, chamou o protesto de "corredor
polonês da xenofobia", e a presidente Dilma Rousseff pediu desculpas a
Delgado.

O médico diz acreditar que, passado um ano do início do programa, mesmo os que participaram do protesto "pensam de outra forma".

"Chegamos
aqui não para tirar os pacientes deles, mas para ir a outros lugares
onde a população não teria acesso a um médico. Acho que a relação dos
médicos brasileiros e cubanos deve ser próxima."

Gargalo

Desde
agosto do ano passado, o Mais Médicos distribuiu cerca de 14 mil
profissionais pelo interior do país e periferias de grandes cidades -
quase 80% deles, segundo o Ministério da Saúde, são cubanos.

O
programa ampliou o acesso ao atendimento básico, mas colocou em
evidência a falta de exames e profissionais especializados nestes
locais.

O Mais Médicos prioriza o atendimento primário de saúde,
que busca prevenir e resolver a maior parte dos problemas sem a
necessidade de encaminhamento para hospitais especializados. Com menos
gente nos hospitais, fica mais fácil atender a todos. Mas, quando o
problema exige, o atendimento especializado é necessário.

O
Ministério da Saúde atribui as críticas de Delgado ao fato de ele
trabalhar com saúde indígena, em local de difícil acesso, e afirma que
consultas e exames em polos indígenas costumam demorar até 15 dias para
serem realizados.

A demora para marcação de consultas e exames, no
entanto, já foi apontada também por profissionais do Mais Médicos que
trabalham em outros locais. O próprio ministro da Saúde, Arthur Chioro,
já disse que, em muitos locais, a expansão da atenção básica aconteceu
mas há um “estrangulamento” na atenção especializada.

Indígenas

Quando
os profissionais estrangeiros chegaram ao Brasil, também causou
polêmica a não exigência de fluência na língua portuguesa por parte dos
médicos.

Delgado diz que isso trouxe alguma dificuldade no início
mas que, agora, já não tem problemas com o português. Já a língua
indígena - ele trabalha com as etnias Ka'apoo e Awá- é "muito difícil".

"Conto com os índios que falam português para atender aqueles que não falam", diz.





Delgado diz que os indígenas
ficaram muitos felizes de ter um médico nas aldeias. Ele mora no
município de Zé Doca, a cerca de 300 km da capital do Estado, São Luís, e
passa dois dias em aldeias mais próximas e três nas mais distantes.

"Recebi
com muita surpresa [o trabalho com os índios], porque nunca pensei que,
no século em que vivemos, ainda havia pessoas vivendo nas condições
desfavoráveis em que vivem os indígenas, com muitos se alimentando do
que caçam ou pescam", afirma.

Delgado diz que vive como qualquer
outro brasileiro. Fala com sua família diariamente, usa a internet -
parte da entrevista à BBC Brasil foi concedida por meio do Whatsapp,
aplicativo que ele passou a usar no Brasil - e passou férias em Cuba.

Diz
que pretende cumprir seus três anos de contrato no Brasil - e, "com
muito interesse", gostaria de assinar outro contrato para ficar no país
até 2019.

Atendimento

Em
nota enviada à BBC Brasil, o Ministério da Saúde afirmou que consultas e
exames em polos indígenas costumam demorar no máximo 15 dias. A pasta
informou que o polo de saúde indígena em que Delgado trabalha possui
duas equipes com profissionais variados como médicos, dentistas,
enfermeiros e psicólogos.

Diz que há três postos de saúde na
região e que todas as aldeias possuem um local para atendimento, mas
destaca que a área é de difícil acesso, com pista de chão batido –quando
chove, às vezes o transporte é feito por rios-, o que dificulta a
distribuição de medicamentos.

Segundo o ministério, pacientes que
precisam ser atendidos em hospitais de referência têm veículos e horas
de voo para transporte.


A crítica covarde aos blogueiros



SQN

A crítica covarde aos blogueiros

Por Paulo Moreira Leite


Em vez de criticar grande mídia que faz cobertura dirigida contra
Dilma, medalhões do jornalismo falam mal de quem ajuda o país a respirar
um pouco de liberdade
Ricardo Noblat disse que os blogueiros que foram entrevistar Dilma são
pagos pelo PT. Paulo Nogueira, do site Diário do Centro do Mundo,
comentou o fato.
Eu acho que a crítica ao trabalho de blogueiros que têm um
posicionamento político favorável a Dilma e Lula seria menos covarde se
levasse o Manchetômetro em conta.
Explico.
Se você examinar a ultima edição do Manchetômetro, que contabiliza o
trabalho dos grandes jornais do país e também do tele-jornal de maior
audiência — empresas que remuneram os principais críticos dos blogueiros
— verá o seguinte resultado:
1) no Jornal Nacional, as notícias negativas contra Dilma atingiram 15
sobre um máximo de 20 possíveis. Dilma e Aécio não tiveram notícias
negativas.
2) na primeira página da Folha de S. Paulo, Dilma teve 8 negativas para
10 definidas como neutras. Marina não tem uma única notícia negativa.
Aécio recebeu 1 negativa para 3 neutras.
3) no Globo, Aécio recebeu duas neutras e duas negativas. Marina, 7
neutras e 1 negativa. Dilma recebeu 30 negativas e 9 neutras.
4) no Estado de S. Paulo, Aécio recebeu oito notícias neutras e quatro
negativas. Marina, 3 neutras e 9 negativas. Já Dilma ficou com 34
negativas para 16 neutras.
Estamos falando de um período da campanha no qual Dilma consolidou a
liderança nas pesquisas, cravando uma diferença de 13 pontos sobre a
segundo colocada. Chegará com folga no segundo turno e, se ocorrer um
terremoto na reta final, pode levar até no 1 turno. Enquanto isso, Aécio
e Marina brigam pelo osso.
Uma semana de notícias negativas para quem? Positiva para quem?
Eu acho estranho que, sempre a postos para criticar uma duzia e meia de
blogueiros, nossos críticos façam um silêncio encandaloso diante desses
números.
Não conseguem achar nada de errado aí, nada a comentar?
Esse é o significado da palavra “isento” em seus manuais de redação?
Será que é assim que eles acham que estão fazendo sua parte para
construir um Brasil melhor, como dizia dona Celina, minha inesquecível
professora de História no Guaracy Silveira, fazendo fé naquilo que lia
nos editoriais escritos pelos pais e avós dos jornalistas de hoje?
A crítica aos blogueiros é prova de uma imensa covardia.
Parte de profissionais que adoram criticar o que chamam de jornalismo chapa branca mas são pelegos de patrão.
Dão o braço a quem é forte — e paga seus vencimentos — para tentar atingir quem é fraco.
Perdidos numa vaidade imensa, estão sempre dizendo que a opinião
adversária não é legítima e foi comprada, sugerindo que os pagamentos
que eles próprios recebem por seu trabalho se justificam pelo “talento
imenso “, pela “profundidade de suas análises”, “pela qualidade de sua
informação” e outros meias-verdades (e meias-mentiras) do jornalismo
real.
Do ponto de vista da circulação de informações e debate de ideias numa sociedade, o Manchetômetro mostra só a ponta do iceberg.
Estamos falando de uma sociedade onde regras constitucionais que proibem
o monopolio e o oligopólio dos meios de comunicação aprovados na
Constituição de 1988 não foram regulamentadas e não são obedecidas, um
quarto de século depois.
O controle da informação, em nosso país, é muito mais amplo e profundo.
No conteúdo, o noticiário é só dirigido do ponto de vista do interesse
político. (Você não vai dizer que 30 a 9 ou 15/20 contra Dilma são
“expressão possível da verdade, ” a definição clássica para o
jornalismo, certo?)
Mas é este jornalismo pervertido que é reenviado para os sites de
jornais, revistas, canais de TV, que também possuem grandes audiências,
num processo de alavancagem mútua. Transfere-se depois para a TV e o
rádio, onde repórteres e colunistas do papel vestem a roupa de
comentaristas e apresentadores e atuam com as mesmas ideias, valores e
opiniões.
O debate, então, é outro.
A concentração política dos meios de comunicação atingiu um padrão
grotesco, irrespirável. Vinte e nove anos depois da ditadura militar,
temos um aparato de comunicação social que é privado, pelo regime de
propriedade, e autoritário, como instituição política.
É coerente com sua visão de mundo, extraída da mesma árvore política:
liberal no plano dos direitos individuais, reacionária na visão de
Estado e de proteção social aos fracos e excluídos.
São erros cometidos e repetidos com a certeza da impunidade, o veneno da arrogância.
Tenho críticas a determinados blogueiros e só posso fazer elogios a
outros. Mas, como regra, eles causam incômodo pelo lado certo. Arranham o
que precisa ser arranhado.
Falam por uma parte do país que não tem voz. E vamos combinar que, mais
uma vez, as pesquisas eleitorais mostram que é uma parte grande, certo?
Do ponto de vista da liberdade e da democracia, que é a substância do
jornalismo, o pior blogueiro faz um trabalho muito mais relevante para o
Brasil e os brasileiros do que o medalhão que regulado pelas mensagens
telepáticas enviadas pelo comando da empresa onde trabalha.
Eu sei disso, você sabe disso. Eles sabem disso.
É por isso que os blogueiros merecem respeito, e não críticas medrosas,
típicas de cães sabujos, que têm receio de perder o filé mignon do
pensamento único.
Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília. É também
autor do livro "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em
Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA, IstoÉ e Época.
Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".

A semântica das urnas — CartaCapital

A semântica das urnas — CartaCapital

A semântica das urnas

Você é um marciano recém-chegado? Descubra aqui como
separar o joio do trigo – ou entender o que é verdade e o que é só
interesse no calor da temporada eleitoral





por Nirlando Beirão







publicado
28/09/2014 07:48













Chico Bela
Desde
a primeira eleição de lula, em 2002, o discurso político ganhou um
léxico próprio. Vários conceitos dos tempos da Guerra Fria foram
reciclados, outros claramente copiam a retórica da neodireita
norte-americana reunida no Tea Party. O objetivo central dessa linguagem
é tirar o PT do poder a qualquer custo. A cada campanha, o rosário de
termos se renova, embora certas palavras nunca percam sua importância
(corrupção, aparelhamento do Estado etc.). A seguir, como distinguir no
palavrório que aquece as campanhas a verdade factual do discurso criado
para escamotear os interesses, a fraude e a má-fé.
Alternância do poder
• Você passa a defendê-la com convicção
religiosa, quando o partido do qual é inimigo permanece no poder, ao
longo de reeleições sucessivas, ainda que avalizadas democraticamente
pelo voto. O primeiro passo é atacar a reeleição, instituída, aliás,
criada de uma maneira bem marota pelo ex-presidente Fernando Henrique ,
na esteira do projeto de 20 anos de poder do PSDB e à base da compra de
votos no Parlamento. Um golpe constitucional sem nenhuma sutileza
democrática a beneficiar o mandatário em exercício, o qual, por mera
coincidência, você apoia. Alternância só é necessária quando se está
fora do poder. Caso contrário, atrapalha o aperfeiçoamento da
democracia. Em São Paulo, ela é especialmente execrada. Os paulistas
preferem perpetuar um mesmo grupo político, enquanto bradam contra o
risco de uma ditadura em nível federal.
Aparelhamento do Estado
• Quem aparelha o Estado são os
adversários. Duvida? Basta ler jornais e revistas, sempre muito zelosos
em fiscalizar os adversários, ainda que só a eles, e acusar o partido no
poder, desde que não seja o de sua preferência, de “aparelhar o
Estado”. Isso significa, basicamente, o seguinte: o partido no poder
nomeia para os cargos de confiança pessoas... de sua confiança. Você
reclama, iracundo: o Estado faz a festa da “companheirada”. A imprensa
partidariamente engajada trata de denunciar a “farra das nomeações”. Dá
para imaginar a perplexidade do leitor: o que queriam os jornalões? Que o
partido no poder nomeasse adversários?
A vigilância ética é de mão única: se um
presidente da República simpático a você nomeia para um importante cargo
na área de energia um genro, não é por nada, seus maldosos, apenas uma
coincidência. Quando o partido que você apoia aparelha o Estado com a
sua companheirada, tenha certeza: os apadrinhados são gente de bem, de
notório saber e reputação ilibada. Se aquele diretor da estatal nomeado
por você ou pelos seus for pego mais tarde com a mão na botija, é um
caso de cooptação estimulado pelo clima corrupto instaurado por seus
adversários.
Bolivariano
• Se você se interessa pela sorte dos
pobres, excluídos e vítimas de discriminação, a ponto de criar programas
sociais compensatórios de emergência, é bolivariano. Se a política
externa que você defende não se rebaixa aos ditames da Casa Branca,
busca parcerias com nações fora da órbita imperial do dólar e do euro e
chega ao cúmulo de lançar as bases de um FMI dos emergentes, trata-se de
“ilusão bolivariana”. Bolivariano é o neocomunista. O comunismo morreu,
mas o anticomunismo continua a gerar bons negócios. Embora o termo seja
démodé, um bolivariano pode ser chamado de populista, na falta
de termo melhor. Antônimo: Racionais. São os almofadinhas da Escola de
Chicago e da PUC-Rio que não ligam para a sorte da maioria, mas se
apegam fervorosamente a crenças que a realidade teima em desmentir.
Estado mínimo, por exemplo.
Choque de gestão
• Significa cortar salários, promover
demissões em massa e diminuir o investimento público, com base na teoria
de que Estado mínimo é Estado eficiente. Faz muito sucesso entre
aqueles que não sofrem os seus efeitos imediatos. No choque de gestão
não cabem as migalhas assistencialistas do Bolsa Família, um jeito de
perpetuar a miséria, não de reduzi-la, conforme a tese. Recomenda-se,
porém, não ser explícito. Melhor dizer que os programas sociais “serão
aperfeiçoados”.
Deus
Entidade
abstrata, costuma irromper muito concretamente na cena política em anos
eleitorais. Todo mundo simula acreditar em Deus, em especial quem não
crê. A história da humanidade mostra, porém, que piores costumam ser
aqueles que acreditam. Relegar a fixação da meta de inflação e a taxa de
juros às interpretações de um I Ching errático que tenha na Bíblia uma
plataforma não parece combinar com as práticas de um Estado leigo e não
confessional. Bíblia na qual se confia cegamente, mesmo quando se
afronta o conhecimento adquirido pelos seres humanos ao longo dos
tempos. Ela é sempre propícia a uma leitura seletiva, que permite pular
os versículos sobre os fariseus.
Crises e bonanças internacionais
• As crises servem de justificativa para
governos amigos. Se uma administração aliada vai mal, a culpa é do
cenário externo. Inverte-se a lógica no caso dos adversários. Se a
gestão inimiga vai bem, as condições internacionais a favoreceram. Caso
se saia mal, é resultado exclusivo da incompetência de quem está no
poder, que mente descaradamente ao evocar os efeitos deletérios globais,
mesmo quando se trata da maior debacle planetária desde o início do
século XX.
Coligações e governabilidade
• Seu partido, no poder ou quando em
disputa eleitoral, consegue seduzir legendas de aluguel para uma teia de
alianças convenientes para garantir a governabilidade ou engrossar o
tempo no horário eleitoral gratuito? Parabéns, você é uma figura de
aguda sensibilidade política, negociador de fino trato. Seu adversário
fez o mesmo? Denuncie a falta de escrúpulos, a atroz barganha de
princípios por conveniências, da honradez pela ambição. Conte sempre com
os amigos na mídia para corroborar a sua tese. Aquele seu ex-ministro
do PMDB que era honrado, mas mudou de lado, será descrito como um homem
desprezível.
Corrupção
• Prática entranhada nos governos... dos
outros. Infelizmente, a corrupção às vezes ganha fatos comprovados e
nomes ilustres de aliados seus. Mas não se preocupe. Vale o mesmo do
item Coligações. A mídia amiga estará a postos para jogar esse tipo de
acusação, obviamente gratuita e injusta, para debaixo do tapete. Há
corruptos e corruptos. Aqueles do partido adversário expõem uma
maquinação coletiva, um assalto aos cofres públicos, uma quadrilha
organizada e perene, destino manifesto da tal legenda e da administração
partidária. Os seus representam casos isolados, sem nenhuma relação com
as práticas e princípios de sua agremiação. Também vale dizer que a
corrupção desenfreada dos adversários é um mal tão grande que afeta até
gente da sua base. É a tal falta de exemplo “de cima”.
Corruptores
• Sem eles não existe corrupção. Como
alguns podem eventualmente (ou frequentemente) financiar candidaturas
amigas, melhor esquecer o assunto.
Delação premiada
• Ela só tem valor se for vazada
cirurgicamente para atingir os nossos concorrentes. Se, no meio do
lamaçal, surgir o nome de um aliado, diga que as revelações são açodadas
e precisam ser apuradas a fundo, doa a quem doer. Quanto ao fato de o
vazamento ser também um crime, de responsabilidade, inclusive, do
ministro da Justiça, caso envolva a Polícia Federal, bem… esqueça.
Dossiês
• Se a mídia está do seu lado, fique
tranquilo. O esforço de reportagem visará descobrir quem produziu
dossiês caluniosos contra você e os seus. Editoriais e colunistas vão
denunciar as “baixarias” de campanha (ver o próximo item). Não
importa se o dossiê não é um dossiê, mas denúncias comprovadas e
comprováveis. Mas, se a imprensa te enxergar como inimigo, se cuide.
Tudo poderá ser usado contra você, de declarações sem lastro de notórios
bandidos a contas falsas no exterior ou fichas “frias” na polícia.
Marqueteiros
Se um adversário sobe nas pesquisas de
intenção de voto, é hora de atribuir o preocupante sucesso à ação
mistificadora dos marqueteiros. Vale dizer, eles são capazes de botar em
pé um pacote vazio de ideias e até eventualmente eleger “um poste”.
Nesse caso, não convém lembrar que o seu candidato igualmente possui um
exército de experts em bruxarias político-eleitorais, pois isso
comprometeria o argumento de que o candidato, aquele que você e a
imprensa do privilégio apoiam, apenas expõe suas ideias reais, é de uma
espontaneidade radical e nunca se deixaria manipular por técnicas
artificiais de persuasão ou pela maquiagem mercadológica. Os
adversários, estes sim, fazem o que for preciso para chegar ao poder, ou
para mantê-lo (verbete Alternância de Poder). Você e os seus nunca
participam de uma eleição para ganhar, mas em nome de um bem maior.
Mensagens subliminares são a maior especialidade dos inimigos. Uma
doutora em semi-óptica, perdão, semiótica, alerta a respeito das novas
ciclovias, traçadas pelo prefeito inimigo de São Paulo, para “o efeito
das cores sobre o nosso sistema nervoso central” e sugere que a cor
escolhida “não passa de uma descarada propaganda vermelha do PT”. Em
todo o mundo, as faixas para bicicletas costumam ser vermelhas, mas não
importa.
Liberdade de expressão
É o direito inapelável, intocável,
irreversível dos meios de comunicação de exprimir o pensamento único de
seus proprietários, em consonância com seus interesses pecuniários e sua
pauta eleitoral. É facultado o direito de mentir e distorcer. Em
temporadas eleitorais, a toada de uma nota só torna-se uma obsessão, de
forma a impedir que vaze para o noticiário algum acorde dissonante por
parte da ralé das redações ou dos candidatos do outro lado. Quando os
adversários pretendem exercer, eles também, a liberdade de expressão,
valem-se de um eufemismo: quem responde a seus desmandos defende a
censura.

Melancólico fim da revista “Veja”, de Mino a Barbosa

blog Balaio do Kotscho,

Melancólico fim da revista “Veja”, de Mino a Barbosa

Ricardo Kotscho,

Uma das histórias mais tristes e patéticas da história da imprensa
brasileira está sendo protagonizada neste momento pela revista semanal
"Veja", carro-chefe da  Editora Abril, que já foi uma das maiores
publicações semanais do mundo.


Criada e comandada nos primeiros dos seus 47 anos de vida, pelo
grande jornalista Mino Carta, hoje ela agoniza nas mãos de dois
herdeiros de Victor Civita, que não são do ramo, e de um banqueiro
incompetente, que vão acabar quebrando a "Veja" e a Editora Abril
inteira do alto de sua onipotência, que é do tamanho de sua
incompetência.


Para se ter uma ideia da política editorial que levou a esta
derrocada, vou contar uma história que ouvi de Eduardo Campos, em 2012,
quando ele foi convidado por Roberto Civita, então dono da Abril, para
conhecer a editora.


Os dois nunca tinham se visto. Ao entrar no monumental gabinete de
Civita no prédio idem da Marginal Pinheiros, Eduardo ficou perplexo com o
que ouviu dele. "Você está vendo estas capas aqui? Esta é a única
oposição de verdade que ainda existe ao PT no Brasil. O resto é bobagem.
Só nós podemos acabar com esta gente e vamos até o fim".


É bem provável que a Abril acabe antes de se realizar a profecia de
Roberto Civita. O certo é que a editora, que já foi a maior e mais
importante do país, conseguiu produzir uma "Veja" muito pior e mais
irresponsável depois da morte dele, o que parecia impossível.


A edição 2.393 da revista, que foi às bancas neste sábado, é uma
prova do que estou dizendo. Sem coragem de dedicar a capa inteira à
"bala de prata" que vinham preparando para acabar com a candidatura de
Dilma Rousseff, a uma semana das eleições presidenciais, os herdeiros
Civita, que não têm nome nem história próprios, e o banqueiro Barbosa,
deram no alto apenas uma chamada: " EXCLUSIVO - O NÚCLEO ATÔMICO DA
DELAÇÃO _ Paulo Roberto Costa diz à Polícia Federal que em 2010 a
campanha de Dilma Rousseff pediu dinheiro ao esquema de corrupção da
Petrobras". Parece coisa de boletim de grêmio estudantil.


O pedido teria sido feito pelo ex-ministro Antonio Palocci, um dos
coordenadores da campanha da então candidata Dilma Rousseff, ao
ex-diretor da Petrobras, para negociar uma ajuda de R$ 2 milhões junto a
um doleiro que intermediaria negócios de empreiteiras fornecedoras da
empresa.


A reportagem não informa se há provas deste pedido e se a verba foi
ou não entregue à campanha de Dilma, mas isso não tem a menor
importância para a revista, como se o ex-todo poderoso ministro de Lula e
de Dilma precisasse de intermediários para pedir contribuições de
grandes empresas. Faz tempo que o negócio da "Veja" não é informar, mas
apenas jogar suspeitas contra os líderes e os governos do PT, os grandes
inimigos da família.


E se os leitores quiserem saber a causa desta bronca, posso contar,
porque fui testemunha: no início do primeiro governo Lula, o presidente
resolveu redistribuir verbas de publicidade, antes apenas reservadas a
meia dúzia de famílias da grande mídia, e a compra de livros didáticos
comprados pelo governo federal para destinar a esc0las públicas.


Ambas as medidas abalaram os cofres da Editora Abril, de tal forma
que Roberto Civita saiu dos seus cuidados de grande homem da imprensa
para pedir uma audiência ao presidente Lula. Por razões que desconheço,
 o presidente se recusava a recebe-lo.


Depois do dono da Abril percorrer os mais altos escalões do poder, em
busca de ajuda, certa vez, quando era Secretário de Imprensa e
Divulgação da Presidência da República, encontrei Roberto Civita e
outros donos da mídia na ante-sala do gabinete de Lula, no terceiro
andar do Palácio do Planalto."


"Agora vem até você me encher o saco por causa deste cara?", reagiu o
presidente, quando lhe transmiti o pedido de Civita para um encontro,
que acabou acontecendo, num jantar privado dos dois no Palácio da
Alvorada, mesmo contra a vontade de Lula.


No dia seguinte, na reunião das nove, o presidente queria me matar,
junto com os outros ministros que tinham lhe feito o mesmo pedido para
conversar com Civita. "Pô, o cara ficou o tempo todo me falando que o
Brasil estava melhorando. Quando perguntei pra ele porque a "Veja"
sempre dizia exatamente o contrário, esculhambando com tudo, ele me
falou: `Não sei, presidente, vou ver com os meninos da redação o que
está acontecendo´. É muita cara de pau. Nunca mais me peçam pra falar
com este cara".


A partir deste momento, como Roberto Civita contou a Eduardo Campos, a
Abril passou a liderar a oposição midiática reunida no Instituto
Millenium, que ele ajudou a criar junto com outros donos da imprensa
familiar que controla os meios de comunicação do país.


Resolvi escrever este texto, no meio da minha folga de final de
semana, sem consultar ninguém, nem a minha mulher, depois de ler um
texto absolutamente asqueroso publicado na página 38 da revista que
recebi neste final de semana, sob o título "Em busca do templo perdido".
Insatisfeitos com o trabalho dos seus pistoleiros de aluguel, os
herdeiros e o banqueiro da "Veja" resolveram entregar a encomenda a um
pseudônimo nominado "Agamenon Mendes Pedreira".


Como os caros leitores sabem, trabalho faz mais de três anos aqui no
portal R7 e no canal de notícias Record News, empresas do grupo Record.
Nunca me pediram para escrever nem me proibiram de escrever nada. Tenho
aqui plena autonomia editorial, garantida em contrato, e respeitada
pelos acionistas da empresa.


Escrevi hoje apenas porque acho que os leitores, internautas e
telespectadores, que formam o eleitorado brasileiro, têm o direito de
saber neste momento com quem estão lidando quando acessam nossos meios
de comunicação.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Uma aula: as pesquisas do PiG são manipulação! | Conversa Afiada

Uma aula: as pesquisas do PiG são manipulação! | Conversa Afiada

Uma aula: as pesquisas do PiG são manipulação!

As pesquisas demitem os repórteres e trocam fato por dado que elas mesmas criam


Nenhum país do mundo se deixa aprisionar em só dois institutos nacionais de pesquisa eleitoral.

Nenhum país do mundo tem uma rede de televisão que:

– contrata as duas pesquisas;

– fixa a data de coleta das informações;

- e decide quando, como e se vai exibir os resultados

(Sim, porque, muitas vezes, as pesquisas chegam a uma conclusão e sai outra no PiG…)

Em
nenhum país do mundo existe uma rede de televisão como essa, que detém
80% da receita publicitária da tevê aberta, com menos de 40% da
audiência.

E a tevê aberta ainda é 50% de toda a publicidade brasileira.

Logo, essa rede fica com R$ 0,40 de cada R$1 investido em publicidade em todo país.

Do
tijolinho para vender moto em Brumadinho (onde mora o Governador Aécio
Neves, que, nos dois dias da semana em que vem aqui, não dorme em BH), a
um outdoor na Avenida Antônio Carlos.

(Aplausos frenéticos !, modestamente,)


Nenhum país do mundo põe resultado de pesquisa em manchete de jornal impresso.

Nenhum país do mundo põe resultado de pesquisa em manchete de telejornal.

E nenhum país do mundo os jornalistas e articulistas de “Política” se dedicam a “analisar” essas duas pesquisas, meses a fio.

Em nenhum país do mundo a imprensa divulga tantas pesquisas nos dias que precedem a eleição: não há dinheiro para isso !

Em muitos países do mundo – como na Inglaterra – é proibido fazer pesquisa “boca de urna”.

Nos Estados Unidos, calcula-se que, numa eleição presidencial, existam cerca de CEM pesquisas de âmbito nacional diferentes.

E os programas de computador que tentam ponderar as cem pesquisas para chegar a um resultado só … ERRAM.

Em nenhum país do mundo os institutos de pesquisa chegam na véspera da eleição e dizem que há “empate técnico”.

Em nenhum país do mundo se manipula a opinião publica com pseudopesquisas quanto no Brasil !

(Aplausos frenéticos, modestamente.)


E por que os jornais fazem tantas pesquisas ?

Porque eles demitem os repórteres e passam a “cobrir” as suas próprias pesquisas.

Sai mais barato.

E é mais fácil manipular.

Trocam informação por “pesquisa”.

Trocam “fato” por “dado” que elas mesmas produzem.

Ou seja, criam a sua própria realidade para “cobrir”.

E dizem que é a realidade do espectador, do leitor.

Em
São Paulo, por exemplo, o PiG praticamente ignorou – quando não
boicotou – a política do prefeito Haddad de cortar a cidade com
ciclovias.

(São Paulo não tem o MOVE http://www.bhtrans.pbh.gov.br/move de Belo Horizonte, que, de forma exemplar, transporta uma massa de passageiros de bairros pobres para o centro.)

Um dia desses, uma dessas “pesquisas” descobriu que noventa por cento dos paulistanos aprovam as ciclovias.

Mas, como se esse mesmo jornal não contou aos leitores que elas existiam ?

Como diz o meu blog Conversa Afiada,
essas duas pesquisas tupiniquins tem uma margem de “erro” ou “de
acerto” tão flexível quanto bum-bum de assistente de palco: aumentam ou
diminuem com as necessidades.

(Aplausos frenéticos !, modestamente.)

No
inicio das campanhas, as pesquisas e, não, os bumbuns,  ajudam os
candidatos que precisam largar acelerados, vigorosos, para demonstrar
invencibilidade.

Em São Paulo, o Cerra sempre larga imbatível.

Ele é amigo da casa.

Como o Aécio é do jornal O Estado de Minas …

(Aplausos frenéticos !, modestamente.)

No meio das campanhas, as pesquisas são muito úteis a candidatos que precisam mostrar aos financiadores que são viáveis.

No finalzinho da campanha, o objetivo é manipular a opinião, mesmo !

Como agora, por exemplo.

Esses
institutos pigais precisam demonstrar, por “a” mais “bê”, que vai ter
segundo turno, quando elas e a rede de televisão que as divulga poderão
continuar a … manipular !

Mas é que em nenhum país (sério) do mundo se permitiu não fazer uma Ley de Medios !

(Aplausos frenéticos,  modestamente.)

(Trechos de uma palestra do ansioso blogueiro em Belo Horizonte, na Uni BH, nesta terça-feira, 23/09.)

domingo, 21 de setembro de 2014

BC independente de quem, cara pálida?

BC independente de quem, cara pálida?


No mundo real, a política monetária
afeta preços, mas também, e principalmente, níveis de emprego e renda.
São os agentes privados os responsáveis pelo investimento e pelo
crescimento econômico. Um BC independente, que prescinda da articulação
com o Tesouro, torna-se independente apenas dos eleitores, mas não do
mercado financeiro


A proximidade das eleições trouxe à tona o tema da independência do
banco central (BC), há tempos guardado nas prateleiras dos economistas
liberais. O baixo crescimento nos dois últimos anos, com inflação
próxima do teto da meta, acabou por ressuscitar um assunto já antigo e, a
nosso juízo, ultrapassado.



Seria a panaceia para uma política monetária adequada para trazer a
inflação mais rapidamente ao centro da meta, ao lado de uma política
fiscal de equilíbrio intertemporal e o fim das intervenções do Banco
Central do Brasil (BCB) no mercado cambial. Enfim, os elementos para
retomar a confiança, os investimentos e o crescimento no Brasil.



A teoria por trás da tese de independência do BC vem do fim dos anos 1970, notadamente a partir de dois artigos.



O primeiro, de Finn Kyndland e Edward Prescott, trouxe um argumento
importante na macroeconomia convencional: os agentes têm expectativas
racionais, logo, não cometem erros sistemáticos de previsão, e
antecipam-se às decisões de política de curto prazo do governo.



Se este resolve estimular a demanda via política monetária
expansionista, o resultado será apenas mais inflação, pois os agentes
conhecem as decisões “inflacionistas” do governo, razão pela qual BC
deve buscar exclusivamente a estabilidade de preços.



O segundo, de autoria de Robert Barro, trata do problema da
credibilidade em política econômica: o governo deve manter a política
fiscal equilibrada e uma política monetária que minimize a inflação. Não
obstante, a política fiscal deve realizar superávits primários para
custear gastos com juros da política monetária e, portanto, aquela
política está subsumida a esta.



Basicamente, credibilidade tem a ver com política econômica
independente de decisões políticas, pois sem interferências
desestabilizadoras que subvertam o equilíbrio de curto prazo, os agentes
tomam decisões sem ruídos e a economia tende à estabilidade com uma
taxa de desemprego compatível com a estabilidade inflacionária.



Logo, a tese de independência do BC surge como solução para
interferências políticas de governantes inflacionistas que querem manter
seu partido no poder. Neste caso, um BC independente e de preferência
com mandato fixo do seu presidente, permite que a autoridade monetária
cuide só da estabilidade de preços.



Assim, o governante não estaria tentado a praticar políticas de
estímulo à demanda no curto prazo e, com isso, gerar inflação. Ora, se a
política monetária expansionista só for capaz de produzir mais
inflação, dado que os agentes se antecipam ao viés inflacionário, nada
mais adequado do que tornar o BC imune ao governante.



Com efeito, qualquer governante é inflacionista por hipótese, pois
insistirá em política monetária expansionista para aumentar a demanda
agregada e manter seu partido no poder. Nada mais falso.



No mundo real, a política monetária afeta preços, mas também, e
principalmente, níveis de emprego e renda. São os agentes privados os
responsáveis pelo investimento e, por conseguinte, pelo crescimento
econômico.



Portanto, a política monetária deve ajudar as demais políticas a
constituírem um cenário favorável ao investimento, criador de emprego,
renda e de riqueza social e efetivamente cumpre várias metas: promover o
investimento produtivo, estabilizar os preços e, como deixou claro a
crise internacional, buscar a estabilidade financeira.



Múltiplos objetivos exigem múltiplos instrumentos e coordenação de
políticas. A independência implica o BC tornar-se um órgão de Estado
cujas ações não precisam de aval. Se o BC tiver uma institucionalidade
que o permita prescindir da articulação com o Tesouro, como será a
coordenação de política econômica?



No Brasil, os desequilíbrios fiscais decorrem do custo financeiro
(juros e amortizações) das operações de mercado aberto da política
monetária. Imagine-se tal situação com a independência do BC.



Ademais, um BC independente colide com os interesses dos eleitores,
pois ao reduzir-se a política monetária a uma questão meramente técnica,
retira-se o poder decisório do governo em influenciar a política
econômica de curto prazo.



Não é verdade que qualquer emissão de moeda eleve a inflação por
pressões de demanda (note-se a deflação em meio à abundância de moeda
com os quantitative easing na Zona do Euro), ou que os políticos
sofram viés inflacionário, ou que a sociedade queira apenas a
estabilidade de preços. Mas é verdade que a independência afasta o BC da
possibilidade de seguir as diretrizes de um governo democraticamente
eleito.



Há ainda outro problema, qual seja, a questão da credibilidade.
Credibilidade não são os agentes estarem num jogo repetitivo sem fim
definido, como supõe a tese da independência. Ela reside naqueles que
têm poder de construção de discursos. Veja-se o Relatório Focus do BCB,
que captura as perspectivas acerca da economia brasileira, e entrevista
somente agentes do mercado financeiro e de consultorias
especializadas. Não há empresários industriais, acadêmicos ou
sindicatos de trabalhadores.



Porém, os agentes no sistema financeiro são os mais interessados nos
efeitos da política monetária, dada a natureza dos ativos que negociam.
Se conseguem pautar a grande imprensa, e isto não é difícil, pois são
seus grandes patrocinadores, a perda de credibilidade do BCB é um
resultado possível, uma profecia autorrealizável. Logo, o BC torna-se
independente apenas dos eleitores, mas não do mercado financeiro.



Vale aqui uma ilustração: dados do Relatório Focus mostram que a alta
recente dos juros no Brasil acompanhou a piora das expectativas. Ou
seja, o discurso de ser o BCB irresponsável ecoou e acabou por dominar a
ação da autoridade monetária.



Afinal, com a economia em estagnação, não seria a demanda a razão para
se elevarem os juros. O motivo é a condução de expectativas,
condicionadas pelos discursos vencedores. A discussão sobre
credibilidade não está no nível individual, mas no âmbito político em
seu sentido clássico, nas relações de poder, das determinações das
classes e grupos vencedores e perdedores.



Finalmente, tese de independência do BC desconsidera a criação de moeda
pelos bancos. Quando o BC faz política monetária, ele não está
exercendo o viés inflacionário, mas limitando a multiplicação de moeda
dos bancos.



A política monetária não é a contribuição da autoridade monetária para
agentes que tudo sabem e sempre promovem o bem público. Ela é, de fato,
uma atividade pública para regular a ação privada dos bancos e demais
agentes financeiros para que suas operações empresariais gerem mais
proveitos públicos do que individuais.



A crise econômica recente deixa claro que os advogados das finanças
livres estavam errados. Enfim, é sem sentido qualquer proposta de
independência do BCB, a não ser para que se tenha a benção do mercado
financeiro, do qual o BC definitivamente não é independente.



Frederico G. Jayme Jr.
Professor do Cedeplar-UFMG e pesquisador visitante do Downing College e
do Departamento de Land Economy, Universidade de Cambridge

Fábio Bittes Terra — Professor do IE-UFU e pesquisador visitante do Departamento de Land Economy, Universidade de Cambridge




Maus modos

Maus modos



SQN

Se fossem os índios que tivessem desembarcado em Portugal e ficado,
pode-se imaginar o que estaria acontecendo por lá hoje, 500 anos depois.
A irritação dos portugueses com os visitantes teria chegado ao máximo, e
ninguém disfarçaria seu descontentamento. "Mas esses gajos não vão
embora?" Passados 500 anos, e não havendo mais dúvidas de que os
visitantes não eram turistas, só a boa educação explicaria que a visita
se prolongasse sem protestos, sem nem uma indireta.
Foi a boa educação dos nativos daqui que permitiu aos portugueses e a
outros europeus se estabelecerem no Brasil. Houve revoltas esparsas, é
verdade, mas foram exceções. Em geral, os índios foram amáveis com os
visitantes. Gostaram dos brancos e até comeram alguns, no que podem ser
descritas como provas de afeição extrema. É possível que a tolerância
com os "descobridores" se devesse a, mais do que bons modos, um
mal-entendido. Haveria a expectativa entre os nativos de que os
portugueses cedo ou tarde iriam embora. Quem fica na terra dos outros
durante tanto tempo sem ser convidado?
O mal-entendido e os bons modos atravessaram a história da conquista do
Novo Mundo, que só era novo para os conquistadores, pois estava aqui, e
habitado, há séculos. Roubo, genocídio catequese forçada, tudo teria
sido tolerado com o pressuposto de que era temporário. Afinal, por pior
que uma visita se comporte em sua casa, existem os deveres da
hospitalidade. Vá que a visita se sinta ofendida por alguma reação
impensada e decida ficar ainda mais tempo.
Finalmente, 500 e tantos anos depois, não parece haver mais dúvida de
que não era apenas uma visita e os invasores não eram turistas. Acabou o
mal-entendido e acabaram os bons modos. A nova insubmissão às mentiras
da História oficial é uma insubmissão a todas as versões oficiais de
todas as histórias de subjugação e exploração neste lado do mundo e
serve como padrão para a revolta contra qualquer tipo de "bullshit", ou
bosta de touro, vigente, como a da nossa velha e conveniente
cordialidade e nossa harmonia racial.
Negros brasileiros - para pegar apenas um exemplo de maus modos - se
revoltam contra antigos estereótipos, levantam a voz contra uma história
decididamente mal contada e pedem justiça mesmo que tardia. Já os
índios, se pudessem, proporiam aos portugueses devolver os espelhinhos e
as miçangas e receberem de volta o Brasil. Mas isso seria,
literalmente, pedir demais.

Banqueiro em política é véspera de bancarrota

Banqueiro em política é véspera de bancarrota

Banqueiro em política é véspera de bancarrota


Por Palmério Doria, especial para o 247
Nos Estados Unidos o respeitado Riggs Bank, de Washington, conhecido
pela tradição de ser o banco oficial de todos os presidentes, sucumbiu
ao ser descoberto numa indesculpável travessura: abrigava contas
milionárias de Augusto Pinochet, o ditador chileno, abertas com
passaportes e nomes falsos. Obviamente o dinheiro sujo do genocida
andino chegou aos seus cofres com a conivência da diretoria. Deixaram,
assim, os banqueiros do Riggs de frequentar o Salão Oval para o amargor
de depoimentos em chefaturas policiais e audiências nos tribunais de
justiça.
Na Argentina, dois bancos mantiveram relações carnais com os milicos
golpistas pós-1976, o ano da derrubada da viúva de Perón e instauração
do regime cruel que sequestrou, matou e desapareceu com cerca de 30 mil
pessoas. O Banco de Intercâmbio Regional (BIR) e o Banco Oddone tinham
tentáculos dentro dos quartéis e passe livre na Casa Rosada, ocupada
alternadamente por generais ladrões e assassinos. Mas suas
contabilidades – escondidas pela profusão de patrocínios culturais,
badalações no society platino e eventos no exclusivo Jockey Club
portenho – estavam podres. Nem os militares ousaram salvar os banqueiros
falidos quando Jose Alfredo Martinez de Hóz, o czar da economia,
decretou as quebras.
Enquanto milhares de correntistas iam do escândalo nas portas (cerradas)
das agências ao “simples” suicídio, os banqueiros fugiram para o
exterior ou acabaram nos calabouços do regime. A influência política de
nada valeu diante da revolta popular e da comoção causada pela debacle
sistêmica provocada pela quebra do BIR e do Oddone. E eram todos bancos
presumivelmente “sadios” e com forte proteção política.
José Rafael Trozzo, o presidente do BIR, era a voz de apoio ao regime
entre o empresariado mais saliente, e Luis Alberto Oddone, dono do banco
que levava seu sobrenome, chegou mesmo a custear do próprio bolso a
fortuna de US$ 700 mil (valores de 1976) pagos à agências internacionais
de relações públicas e lobby para que propagandeassem os feitos do novo
regime argentino. Trozzo, avisado por um general camarada, fugiu para
Miami. Oddone resolver peitar Martinez de Hóz e passou longa temporada
numa masmorra nos arredores de Buenos Aires.
Mais curioso foi o final do banqueiro Ruben Beraja, do Banco Mayo,
presidente da DAIA (Delegación de Asociaciones Israelitas Argentinas) e
destacado membro da corte de Menem, nos anos infames do neoliberalismo
platino. Diante de uma fraude monstruosa, um rombo que atravessava a
casa das centenas de milhões de dólares, o BCRA (o Banco Central de lá)
simplesmente decretou a liquidação do Mayo. Beraja se encontrava em
Washington, como feliz e prestigiado integrante da comitiva do
presidente Carlos Menem. No hall do hotel, a caminho da Casa Branca,
Carlos Korach, mafioso chefe-de-gabinete da Casa Rosada, o desconvida na
frente dos presentes e lhe dá com crueza a notícia do estouro de seu
banco: “Te jodeste, hermano”. Nem sempre a proximidade com o poder e a
intimidade com os poderosos consegue segurar um banco quebrado. Dinheiro
é coisa séria.
Ricardo Espirito Santo Salgado comandou por muitos com mão-de-ferro o
banco que leva o sobrenome da família materna. Ganhou o popular apelido
de “o-dono-disto-tudo” e recebia presidentes, primeiros-ministros e
autoridades monetárias em sua deslumbrante casa nos arredores de Lisboa,
talvez uma das mais lindas da Europa. Elegante e arrogante, impôs-se na
política portuguesa, na de Moçambique, na de Angola e, também, recebeu
Marcos Valério e uns sôfregos emissários do delator Roberto Jefferson,
então influente dono do PTB, para negociações mirabolantes acerca de
aplicações das reservas do tesouro brasileiro. Que, é claro, jamais
foram feitas.
O sólido banco de Ricardo E. S. Salgado não era tão sólido quanto
parecia, e seu espírito como banqueiro estava longe de ser santo. Hoje,
depois de apeado da presidência do antigo colosso lusitano, espera em
prisão domiciliar a decisão da Justiça sobre propinas pagas, propinas
recebidas, desvios de fundos e balancetes dignos de Ionesco. Não sem
antes ter deixado nas burras do tesouro a bagatela de três milhões de
euros - valor arbitrado como fiança pelo direito de não ir (por
enquanto) mofar num cárcere lisboeta qualquer. Sabe o que aconteceu ao
ex-dono-disto-tudo? Encontrou pela frente um primeiro-ministro corajoso,
um ministro da Fazenda sério e um juiz imparcial. O futuro do
ex-banqueiro que comandou governos e tratava dignatários por “tu” não é
nada alvissareiro.
Voltemos ao patropi.
Ângelo Calmon de Sá despachava em histórico edifício na Cidade Baixa, em
Salvador, sede do então centenário Banco Econômico. Não fitava as
pessoas, mal as cumprimentava e um dos seis elevadores estava
permanentemente interditado. Só o “doutor Ângelo” podia usá-lo. Estava
em Paris, numa suíte do George V, tomando champanhe Cristal Rosé Brut
Imperial com dona Ana Maria, mas o “seu” elevador, lá no centro
histórico lindo e fétido de nossa primeira capital, estava fechado aos
mortais. Ele era uma semidivindade baiana. Não estava entronizado no
altar da Igreja do Bonfim nem flutuava entre os imensos Orixás do genial
escultor Tati Moreno nas águas escuras do Dique do Tororó.
Os governadores da Bahia passavam pela opulenta casa, majestosamente
plantada entre mangueiras frondosas, lá no alto de um dos vales rasgados
no ventre soteropolitano, prestando-lhe vassalagem e os salamaleques de
praxe. Muitas e muitas vezes o “doutor Ângelo” viajava ao Rio, São
Paulo ou Brasília, sozinho, aboletado em um de seus dois jatos Falcon,
enquanto seus assessores diretos, velhos diretores e gerentes fiéis o
seguiam como mortais que eram em voos comerciais. Ministro da ditadura
militar e de Collor, presidente do Banco do Brasil, nome sempre lembrado
para concorrer ao governo da Bahia, industrial com várias fábricas da
Coca-Cola, imenso plantador de cacau, criador de gado da melhor raça,
latifundiário de terras que se perdiam no horizonte. Financiou
pesadamente todos os partidos, com preferência pela Arena, PDS e PFL,
sem se esquecer de encher os cofres de FHC em 94. Pois meses depois - e
com dezenas de deputados e senadores comandados pelo inefável ACM
atravessando a rua e invadindo o Palácio do Planalto para pressionar em
favor do “doutor Ângelo” e do seu agonizante bancão – o mesmo FHC foi
obrigado a decretar o fim do Econômico. Estava podre.
Do “doutor Ângelo” sobrou uma dívida imensa, recordações cinzentas e uma
pasta rosa, providencialmente deixada em sua mesa na presidência do
Econômico, com a contabilidade paralela onde constavam generosos aportes
aos políticos de suas relações, de ACM a FHC, passeando por todo o
abecedário.
José Eduardo Andrade Vieira era o quarto dos filhos do velho Avelino, o
mais destacado banqueiro paranaense. Dois irmãos morreram no mesmo
acidente aéreo. O terceiro, de enfarte fulminante. Sobrou ele, a quem
não estava destinada a tarefa de comandar o império iniciado pelo pai.
Como o J. Pinto Fernandes, do poema do mestre Drummond, “Zé do Banco”
não tinha entrado na história, mas com o Bamerindus ficou.
Com muito trabalho e muita simpatia o patriarca havia feito de um
tamborete (o Banco Mercantil e Agrícola do Norte do Paraná) nascido em
Tomazina, uma pobre cidadezinha, o portentoso Bamerindus, um dos maiores
bancos do Brasil nas décadas de 50, 60, 70, 80 até sua quebra na metade
dos anos 90. Zé Eduardo até que se saiu bem. Liberal, generoso,
recrutou executivos respeitados no mercado, jamais teve seu nome
envolvido em negociatas ou corrupção, investiu no marketing e fez de seu
Bamerindus uma marca moderna, simpática. Surpreendeu os que dele pouco
esperavam. Mas se meteu na maldita da política, comprou um partido, o
PTB, comprou um mandato de senador pelo Paraná, virou ministro de Itamar
Franco, financiou pesadamente FHC (que fez sua campanha nos jatinhos do
banco), virou ministro do governo do tucano e quebrou bonito.
De uma casa bancária, o extinto Banco Nacional, Paulo Henrique Cardoso
sacou a herdeira, Ana Lúcia Magalhães Pinto, com quem manteve casamento
de 17 anos, do qual nasceram filhas gêmeas. Viajavam Brasil e mundo
afora num jatinho da Líder mantido à disposição, mantendo imensa
distância de qualquer coisa que lembrasse trabalho. Os cunhados pagavam
as contas e ajudaram o pai do cunhado diletante a eleger-se presidente,
sendo um de seus maiores doadores. Até que em 1994, com milhares de
empréstimos a clientes fictícios gerados pelo contador Clarimundo
Sant’Anna na tentativa de salvar a casa já em escombros, o Banco
Nacional já dava mostras de sua precariedade.
No réveillon de 1994, véspera de assumir o Palácio do Planalto, o
recém-eleito presidente aparece ao lado de Marcos Magalhães Pinto,
presidente do Nacional e irmão de sua nora Ana Lúcia, risonhos numa
opípara festança de réveillon da família. Eles, os discretos banqueiros
de Minas Gerais, já viviam o outono de uma antiga opulência. Em 1995,
ainda no primeiro mandato de FHC, o Banco Central decreta a liquidação
do Nacional (o Unibanco, hoje Itaú, pegou o filé da massa falida,
deixando a “banda podre” para o contribuinte). Nem o futuro das netas,
nem o farto dinheiro recebido pelo PSDB na campanha, conseguiram impedir
a ação saneadora do Banco Central. Contrafeito, a FHC só restou assinar
a sentença de morte.
Dois meses depois, PHC deixa Ana Lúcia e suas gêmeas e se instala num
hotel da grã-finíssima Avenida Vieira Souto, de frente para o mar de
Ipanema. O rombo bilionário, que extinguiu o Banco Nacional - do qual a
mulher de PHC era herdeira e acionista igualzinho a “educadora” Neca
Setúbal - é tido como a maior fraude financeira da história do Brasil,
pois, ao que se sabe, atingiu quase um terço do dinheiro circulante.
Sejamos mais didáticos: o rombo deixado pelos então parentes de FHC
equivalia a mais de R$ 3,00 de cada R$ 10,00 em circulação no país!
Vamos passear de novo pelo mundo.
Nélson Mezerhane é um judeu venezuelano, elegante e simpático. Homem de
coragem, financiou a oposição e resolveu enfrentar o regime do coronel
Hugo Chávez. Seu Banco Federal não era o maior da Venezuela, mas estava
entre os melhores, com centenas de milhares de clientes e uma rede de
agências espalhadas por todo o país, investimentos em outras empresas e
boa fama no mercado. A colônia judaica local não entendeu o que achou
ser “loucura” do seu mais destacado integrante e benfeitor. O problema é
que a carta-patente, aquela autorização de funcionamento de uma
instituição financeira, é dada pelo Banco Central, a autoridade
monetária do país. Preciso contar o resto da história? Mezerhane teve
sorte. Sorte e um jatinho. Está em Miami, sem banco, porém livre de uma
série de “boletos de captura”, as temidas ordens de prisão.
Outros banqueiros já se envolveram na política e são testemunhos do que,
sempre e inevitavelmente, acontece aos que confundem o ronco da
história com o tilintar das moedas. Quando financiam candidatos, pagam
contas de campanha, participam diretamente do movimento eleitoral, é
sinal de que estão com algum grave problema, algo muito sério a ser
escondido. Quando se imiscuem na vida pública e no processo eleitoral o
fazem em busca de proteção política e salvação imediata. Ou são autores
de rombos colossais ainda não revelados ao “mercado” ou pressentem o
estouro próximo da boiada, por conta de multas, sonegações,
contabilidades paralelas, perdas maquiadas em balanços fictícios,
negócios mal feitos, fusões ou incorporações que não geraram o ganho de
competitividade e de caixa esperados.
O espanhol Mário Conde, do Banesto (Banco Español de Crédito), era
locomotiva da alta sociedade madrilena e banqueiro da família real. Na
lista dos 10 homens mais elegantes da Espanha, dos 10 homens mais
admirados da Espanha, dos 10 homens mais respeitados da Espanha, dos 10
homens mais influentes da Espanha, dos 10 maiores filantropos da
Espanha, dos 10 maiores mecenas da Espanha, dos 10 maiores financiadores
de partidos e políticos da Espanha. E o seu banco, um dos 10 maiores da
Espanha, não tinha caixa 2, mas tantas contabilidades paralelas a
esconderem sua situação pré-falimentar, que passavam das 10. Quebrado em
1993, preso e condenado, pegou 10 anos de cadeia.
Mas, também, há banqueiro que fica bem na história.
O embaixador Walther Moreira Salles foi um dos grandes brasileiros do
seu tempo. Iniciador de grandes negócios, visionário, serviu aos
governos de Getúlio, JK e Jango. Foi ministro da Fazenda, duas vezes
embaixador em Washington, negociador de nossa dívida externa (na melhor
das negociações que já fizemos). Angariou imenso prestígio e multiplicou
a fortuna iniciada pelo pai no sul de Minas Gerais, na cidade de Poços
de Caldas, com um armazém de secos e molhados. Mas nunca foi político,
tendo até rechaçado um convite de JK para ser o candidato do PSD ao
governo de seu Estado. Apesar disso, atuou com desenvoltura nos
bastidores do poder, sem jamais tornar-se um operador político ou o
impulsionador de candidaturas ou candidatos.
O ditador Costa e Silva lhe devotava verdadeiro horror. O motivo era
prosaico: levou um chá-de-cadeira de Jânio Quadros (a quem mandou cassar
em 64 para depois assumir a autoria da violência às gargalhadas) e,
incomodado, viu que era Moreira Salles quem saia da sala do então
presidente eleito. Em 68, com o AI-5, resolveu cassar o elegantíssimo e
educadíssimo banqueiro. Delfim Netto, consultado acerca da estultice já
transformada em ato prestes a ser assinado, fez o chefe mudar de idéia:
“Tudo bem, presidente. Mas o Walther tem mais crédito que o Brasil”.
Olavo Setúbal, um engenheiro cartesiano e formal, conhecido pela
aplicação nos negócios e pela inegável inteligência, construiu um
império baseado no trabalho e em golpes da boa sorte. Herdou do tio um
banco sem maior expressão, o Federal de Crédito, e o fez crescer à custa
de fusões e incorporações, dezenas delas, particularmente ao longo das
décadas de 50, 60 e 70. Com o regime militar seus negócios floresceram.
Contou com o apoio da ditadura para assumir outro grande banco, o Banco
União Comercial (BUC), de propriedade da família do milionário Soares
Sampaio, à beira da quebra por conta de uma desastrada gestão de Roberto
Campos, seu presidente e verdadeiro mito do liberalismo econômico
brasileiro. O genro de Soares Sampaio, o industrial Paulo Geyer, não
aceitou as condições de-pai-para-filho com que o Banco Central doava o
BUC a Setúbal, e resolver não assinar a transferência de suas ações.
“Perguntem ao Geyer se ele vai assinar logo ou se eu vou precisar mandar
dois sargentos irem buscá-lo em casa?”, foi a reação do general Ernesto
Geisel.
Além do BUC, a ditadura presenteou Setúbal com a prefeitura de São
Paulo, onde ele se saiu bem. Deu conta do recado e protagonizou um
episódio decente: recusou-se a demitir o secretário de Cultura, o
respeitado dramaturgo Sábato Magaldi, apontado como “comunista” pelo
execrável general Silvio Frota, um monstrengo da linha mais que dura.
Picado pela mosca azul, “Olavão” foi preterido pelos milicos na sucessão
de Paulo Egydio ao governo de São Paulo e se preparou para disputar o
Palácio dos Bandeirantes pelo PFL em 1986. Na convenção do partido, um
grupo de malandros tirou o tapete do dono do Itaú e impediu sua
candidatura, substituída pela de Paulo Maluf. Desiludido, Olavo nunca
mais confundiu as urnas eleitorais com os caixas do Itaú.
Recordo essas histórias, ao alcance de qualquer um, para declarar meu
espanto com a participação ativa e exótica de bancos e banqueiros – a
começar pelo Itaú de Roberto Setúbal e Pedro Moreira Salles – no
financiamento e sustentação da candidatura de Marina Silva à presidência
da República. Custo a crer que essa aventura surpreendente, atentatória
aos bons manejos bancários, às boas práticas empresariais, seja um
biombo desesperado para evitar o pagamento de multa no valor
impressionante de R$ 18 bilhões e 700 milhões devidos à Receita Federal
em impostos não recolhidos na fusão Itaú-Unibanco. Mas, também, não
creio que tais banqueiros sejam ingênuos, inocentes ou desavisados.
Creio que a arrogância e o desespero, quem sabe, formaram um caldo de
cultura que os fará se arrepender mais cedo que tarde da aventura em que
se meteram, fazendo de uma despreparada evidente uma candidata com um
Itaú de vantagens para eles, os banqueiros, e de desvantagens, para o
país.
A ingerência de um colosso bancário na vida pública do país protagonizou
até uma festa-fraude. A dos 90 anos de fundação do Itaú-Unibanco. Ora,
quem completaria 90 anos não existe mais, o banco dos Moreira Salles. O
Itaú foi fundado em 1945, com outro nome, e veio crescendo como já se
relatou aqui. Mas esse pretexto serviu para colocar centenas de alegres
convivas do society paulistano, gente do mercado financeiro e alguns
empresários ligados à oposição num regabofe onde o presidente executivo
do Itaú fez um pavoroso discurso político-eleitoral, atacando o governo e
deixando claro o seu apoio à mutante candidata acreana, claramente
desqualificada para a missão de comandar um país como o Brasil. Da
dívida bilionária, não se falou nada. Sem trocadilho, necas.
Não é preciso ser futurólogo. O suave embaixador Walther e o objetivo
Olavo não ousaram tanto e, no entanto, não saíram incólumes.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

O “Pessimildo” e os urubólogos da mídia

O “Pessimildo” e os urubólogos da mídia











Por Altamiro Borges
O programa de rádio e tevê da campanha de Dilma Rousseff, agora mais
politizado e aguerrido, criou um personagem que expressa bem o que é a
mídia nativa. Ele se chama “Pessimildo”, um típico rabugento. Com seu
cenho franzido e os olhos esbugalhados, ele acha que tudo está errado no
Brasil. “Viu que os empregos continuam subindo?”, indaga o locutor.
“Tudo o que sobe desce”, responde o ranzinza. “O mundo está em crise,
Pessimildo, e o Brasil está protegendo salários"; o boneco-catástrofe
discorda. O marqueteiro João Santana, responsável pela peça, até poderia
ser mais direto. Ao invés de “Pessimildo”, poderia chamar o personagem
de Miriam Leitão ou de Carlos Alberto Sardenberg, os dois mais famosos
urubólogos da TV Globo.
Nos últimos doze anos, eles e outros “analistas do mercado” – nome
fictício dos porta-vozes dos agiotas financeiros – sempre esbravejaram
que o país rumava para o caos por culpa das “incompetentes” gestões de
Lula e Dilma. Quase diariamente, eles usaram o espaço de uma concessão
pública de televisão para garantir que a inflação iria explodir; que o
Brasil ficaria isolado na economia internacional; que o desemprego
dizimaria milhares de famílias; e que as contas públicas estavam à beira
da falência. Os seus diagnósticos e prognósticos nunca deram certo.
Mesmo assim, eles nunca fizeram qualquer autocrítica. A cada erro, os
“Pessimildos” radicalizavam ainda mais o seu discurso.
Duas razões explicam esta ranzinze – um politico e outro econômico. Até
por uma questão de classe social, os barões da mídia nunca aceitaram a
chegada ao Palácio do Planalto de um operário, de um sindicalista. Para
eles, trabalhador é para trabalhar e não para pensar – menos ainda para
comandar o país. Na sua visão elitista, eles sempre torceram contra o
que rotularam de “lulopetismo”. Na ditadura, os barões da mídia apoiaram
os generais golpistas; na redemocratização, eles apostaram suas fichas
em Collor de Mello; no reinado neoliberal, eles torceram por FHC, “o
príncipe da Sorbonne”. Com a vitória de Lula, eles investiram tudo no
pessimismo, seja para enquadrar o governante ou mesmo para derrubá-lo.
Além do motivo político, há as razões mais mundanas, econômicas. A mídia
monopolista, parte dela totalmente endividada, hoje está associada ao
capital financeiro. Para os banqueiros, a presidenta Dilma é um estorvo.
No início do seu governo, ela reforçou os bancos públicos e adotou
medidas de estímulo ao crédito. Já o Banco Central reduziu as taxas de
juros. Os rentistas, que adoram juros altos e o famoso superávit
primário – nome fictício da reserva de caixa para pagar os bancos – não
gostaram e fizeram terrorismo. O governo até recuou, mas não
reconquistou a confiança. Como disse Neca Setubal, a herdeira do Itaú
que “educou” Marina Silva, “o mercado é contra Dilma”. A mídia amplifica
esta visão.
O “Pessimildo” é realmente uma desgraça para o Brasil. Ele serve aos
interesses mesquinhos da elite e prejudica a sociedade. Para derrotá-lo,
porém, não basta vencer o pleito de outubro. Ele não é um personagem
apenas do período das campanhas eleitorais. Ele manipula a informação e
deforma os comportamentos no cotidiano – seja nos programas de TV e
rádio ou nas “reporcagens” da mídia impressa. O novo governo deveria
enfrentar este rabugento empedernido sem medo ou vacilações. O
boneco-catástrofe ajuda a confirmar a urgência de uma regulação
democrática da mídia no Brasil. Do contrário, o “Pessimildo” continuará a
infernizar nossas vidas depois de outubro.

Quando o meio vira mensagem

Quando o meio vira mensagem - Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 18/9/2014 | Observatório da Imprensa | Observatório da Imprensa - Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito

Quando o meio vira mensagem


Por Luciano Martins Costa em 18/09/2014 na edição 816
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 18/9/2014











Colunistas de alguns dos principais jornais do país celebram sem
disfarces o soluço registrado na mais recente pesquisa do Ibope, que dá
ao candidato do PSDB, Aécio Neves, uma esperança de recuperar em 18 dias
um lugar no eventual segundo turno das eleições presidenciais. Um deles
faz contas de padeiro para concluir que, se acelerar seguidamente, com
um novo salto na semana que vem, o ex-governador de Minas Gerais pode
chegar ao dia 5 de outubro em condição de empate com a ex-ministra
Marina Silva, do PSB. A partir daí, calcula o jornalista, fazendo coro
com representantes oficiais do PSDB, a militância trataria de trabalhar o
argumento do chamado “voto útil” contra a reeleição da presidente Dilma
Rousseff, para ocupar o vazio deixado pela queda da candidata do PSB.
A matemática é linear e simplista, mas é o que basta para animar o
tucanato, entre os quais se aninham nove entre dez colunistas e
articulistas dos diários de circulação nacional.
Nas fileiras do PSB, a convicção, pelo menos nas declarações diante de
jornalistas, é de que Marina Silva já está no segundo turno. Por esse
motivo, segundo a imprensa, representantes do partido já buscam
potenciais desertores do PMDB para acertar detalhes de uma futura
aliança.
A frase do dia afirma que “ninguém governa sem o PMDB”. Por extensão,
pode-se dizer, também, que ninguém governa sem o PDT, o PTB, o PSD e
toda a floresta das siglas que balançam de lá para cá a cada eleição.
Essa prática desmoraliza o discurso da “nova política”. Por outro lado,
a movimentação da imprensa em favor da candidatura de Aécio Neves é
desautorizada pela iniciativa de economistas ligados ao PSDB que,
segundo o Globo, tratam de modelar uma série de propostas que
poderiam aproximar os tucanos da candidatura de Marina Silva, no caso de
haver um segundo turno.
Mais pragmáticos, os economistas tucanos tratam de enxertar no ideário
do PSB os princípios do liberalismo econômico que norteiam o PSDB.
Consideram que o PSDB não teria alternativa num segundo turno a não ser
apoiar a ex-ministra do Meio Ambiente, e a iniciativa busca estabelecer o
preço desse apoio.
Manobrando no vácuo
Enquanto, de um lado, os porta-vozes da campanha ajustam as mensagens
que podem definir o curso final dos votos ainda voláteis, a imprensa faz
o que tem feito nas eleições dos últimos 12 anos: tenta manter no páreo
seu candidato predileto, sem queimar as pontes que podem uni-lo à
alternativa menos indigesta. Assim, uma página critica os ataques da
campanha do PT a Marina Silva, enquanto outra página observa que, ao
chorar diante das câmeras, a ex-ministra mostra uma fragilidade
inaceitável em quem pretende se tornar chefe de Estado.
A análise do noticiário que se segue à divulgação da pesquisa mais
recente mostra um padrão recorrente da mídia tradicional: trata-se de
interpretar os números sempre num sentido favorável à candidatura que a
imprensa apoia sem disfarces. Os jornais não querem, em nenhuma
hipótese, a reeleição da presidente da República, e tentam manobrar a
candidatura do PSB na medida certa para que funcione como um instrumento
contra a adversária comum. Quando, circunstancialmente, se percebe que o
candidato predileto tem um fio de esperança, cresce o viés negativo da
imprensa contra Marina Silva.
A situação lembra as cenas finais do filme “Gravidade”, quando a
astronauta interpretada por Sandra Bullock usa um extintor de incêndio
como foguete para navegar até uma estação orbital, de onde pode voltar à
Terra. Como a doutora Ryan Stone do filme, a imprensa tenta se
direcionar no vácuo de credibilidade em que se meteu desde que passou a
se comportar como uma agremiação partidária.
Acontece, que, sem a densidade necessária, um impulso a mais para lá ou
para cá pode produzir um desastre, do ponto de vista do interesse
específico das empresas de comunicação.
A expressão “o meio é a mensagem”, criada em 1964 pelo teórico da
comunicação Marshall McLuhan, sintetiza a ideia de que os controladores
da mídia procuram dar ao público o que o público deseja, usando o poder
do meio para condicionar a mensagem.
A mídia tradicional do Brasil subverte esse princípio, sessenta anos
depois, e tenta dar ao público o que seus controladores desejam.
Será que funciona?