domingo, 28 de setembro de 2014

A crítica covarde aos blogueiros



SQN

A crítica covarde aos blogueiros

Por Paulo Moreira Leite


Em vez de criticar grande mídia que faz cobertura dirigida contra
Dilma, medalhões do jornalismo falam mal de quem ajuda o país a respirar
um pouco de liberdade
Ricardo Noblat disse que os blogueiros que foram entrevistar Dilma são
pagos pelo PT. Paulo Nogueira, do site Diário do Centro do Mundo,
comentou o fato.
Eu acho que a crítica ao trabalho de blogueiros que têm um
posicionamento político favorável a Dilma e Lula seria menos covarde se
levasse o Manchetômetro em conta.
Explico.
Se você examinar a ultima edição do Manchetômetro, que contabiliza o
trabalho dos grandes jornais do país e também do tele-jornal de maior
audiência — empresas que remuneram os principais críticos dos blogueiros
— verá o seguinte resultado:
1) no Jornal Nacional, as notícias negativas contra Dilma atingiram 15
sobre um máximo de 20 possíveis. Dilma e Aécio não tiveram notícias
negativas.
2) na primeira página da Folha de S. Paulo, Dilma teve 8 negativas para
10 definidas como neutras. Marina não tem uma única notícia negativa.
Aécio recebeu 1 negativa para 3 neutras.
3) no Globo, Aécio recebeu duas neutras e duas negativas. Marina, 7
neutras e 1 negativa. Dilma recebeu 30 negativas e 9 neutras.
4) no Estado de S. Paulo, Aécio recebeu oito notícias neutras e quatro
negativas. Marina, 3 neutras e 9 negativas. Já Dilma ficou com 34
negativas para 16 neutras.
Estamos falando de um período da campanha no qual Dilma consolidou a
liderança nas pesquisas, cravando uma diferença de 13 pontos sobre a
segundo colocada. Chegará com folga no segundo turno e, se ocorrer um
terremoto na reta final, pode levar até no 1 turno. Enquanto isso, Aécio
e Marina brigam pelo osso.
Uma semana de notícias negativas para quem? Positiva para quem?
Eu acho estranho que, sempre a postos para criticar uma duzia e meia de
blogueiros, nossos críticos façam um silêncio encandaloso diante desses
números.
Não conseguem achar nada de errado aí, nada a comentar?
Esse é o significado da palavra “isento” em seus manuais de redação?
Será que é assim que eles acham que estão fazendo sua parte para
construir um Brasil melhor, como dizia dona Celina, minha inesquecível
professora de História no Guaracy Silveira, fazendo fé naquilo que lia
nos editoriais escritos pelos pais e avós dos jornalistas de hoje?
A crítica aos blogueiros é prova de uma imensa covardia.
Parte de profissionais que adoram criticar o que chamam de jornalismo chapa branca mas são pelegos de patrão.
Dão o braço a quem é forte — e paga seus vencimentos — para tentar atingir quem é fraco.
Perdidos numa vaidade imensa, estão sempre dizendo que a opinião
adversária não é legítima e foi comprada, sugerindo que os pagamentos
que eles próprios recebem por seu trabalho se justificam pelo “talento
imenso “, pela “profundidade de suas análises”, “pela qualidade de sua
informação” e outros meias-verdades (e meias-mentiras) do jornalismo
real.
Do ponto de vista da circulação de informações e debate de ideias numa sociedade, o Manchetômetro mostra só a ponta do iceberg.
Estamos falando de uma sociedade onde regras constitucionais que proibem
o monopolio e o oligopólio dos meios de comunicação aprovados na
Constituição de 1988 não foram regulamentadas e não são obedecidas, um
quarto de século depois.
O controle da informação, em nosso país, é muito mais amplo e profundo.
No conteúdo, o noticiário é só dirigido do ponto de vista do interesse
político. (Você não vai dizer que 30 a 9 ou 15/20 contra Dilma são
“expressão possível da verdade, ” a definição clássica para o
jornalismo, certo?)
Mas é este jornalismo pervertido que é reenviado para os sites de
jornais, revistas, canais de TV, que também possuem grandes audiências,
num processo de alavancagem mútua. Transfere-se depois para a TV e o
rádio, onde repórteres e colunistas do papel vestem a roupa de
comentaristas e apresentadores e atuam com as mesmas ideias, valores e
opiniões.
O debate, então, é outro.
A concentração política dos meios de comunicação atingiu um padrão
grotesco, irrespirável. Vinte e nove anos depois da ditadura militar,
temos um aparato de comunicação social que é privado, pelo regime de
propriedade, e autoritário, como instituição política.
É coerente com sua visão de mundo, extraída da mesma árvore política:
liberal no plano dos direitos individuais, reacionária na visão de
Estado e de proteção social aos fracos e excluídos.
São erros cometidos e repetidos com a certeza da impunidade, o veneno da arrogância.
Tenho críticas a determinados blogueiros e só posso fazer elogios a
outros. Mas, como regra, eles causam incômodo pelo lado certo. Arranham o
que precisa ser arranhado.
Falam por uma parte do país que não tem voz. E vamos combinar que, mais
uma vez, as pesquisas eleitorais mostram que é uma parte grande, certo?
Do ponto de vista da liberdade e da democracia, que é a substância do
jornalismo, o pior blogueiro faz um trabalho muito mais relevante para o
Brasil e os brasileiros do que o medalhão que regulado pelas mensagens
telepáticas enviadas pelo comando da empresa onde trabalha.
Eu sei disso, você sabe disso. Eles sabem disso.
É por isso que os blogueiros merecem respeito, e não críticas medrosas,
típicas de cães sabujos, que têm receio de perder o filé mignon do
pensamento único.
Paulo Moreira Leite é diretor do 247 em Brasília. É também
autor do livro "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em
Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA, IstoÉ e Época.
Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".

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