sábado, 16 de julho de 2011

Folha de S.Paulo - Economia: O preço de tudo e o valor de nada - 03/04/2011

Folha de S.Paulo - Economia: O preço de tudo e o valor de nada - 03/04/2011: "O preço de tudo e o valor de nada

Como refundar o mercado no pós-crise

RESUMO
A partir da crise mundial e das noções de preço e valor, dois autores especulam sobre alternativas ao modelo econômico vigente: Eduardo Porter defende a incorporação de fatores humanos (como os impulsos irracionais) na formação dos preços; Raj Patel preconiza um sistema que incorpore o bem-estar e a 'socialização dos mercados'.

OSCAR PILAGALLO

A IMAGEM DO MERCADO como eficiente entidade reguladora de preços saiu bastante chamuscada da crise econômica internacional deflagrada pelo estouro da bolha imobiliária nos EUA em 2008.
Num primeiro momento, identificaram-se, à esquerda, claros sinais de que o capitalismo fora atingido em um de seus fundamentos, enquanto, à direita, admitia-se maior regulamentação dos agentes econômicos como forma de evitar novas bolhas. Passados mais de dois anos do início da depressão mundial, as primeiras reflexões sobre a extensão de suas consequências apontam para um consenso: preços nem sempre guardam uma relação próxima com valores.
Essa é a conclusão a que chegam dois pensadores de diferentes perspectivas ideológicas: Eduardo Porter, adepto do pensamento liberal, autor de 'The Price of Everything' (o preço de todas as coisas, a ser publicado em português neste ano pela Objetiva) , e Raj Patel, um crítico do fundamentalismo do mercado, que escreveu 'O Valor de Nada'.
As divergências entre os dois não são pequenas, nem estão limitadas aos efeitos da crise. É exemplar da distância entre eles a abordagem sobre um assunto aparentemente tão pouco econômico quanto o transplante de rins. Porter, fiel à ideia do título de seu livro, de que tudo tem um preço, avaliza a proposta do economista Gary Becker de que deveria haver um mercado que viabilizasse a venda do órgão. Becker, que ganhou o Nobel de economia por outras contribuições, chega até a calcular o preço do rim (US$ 15.200 ou R$ 24,8 mil), baseado no tempo de recuperação e risco do doador. Para Patel, tal noção é simplesmente 'muito perturbadora'.
Apesar dos enfoques discrepantes, Porter e Patel caminham lado a lado numa parte do trajeto que levaria a um novo modelo econômico. Em 'The Price of Everything' [ed. William Heinemann, 304 págs., R$ 20], Porter, jornalista do 'New York Times' e que morou em São Paulo nos anos 90, quando editava a edição brasileira da revista 'América Economia', defende que o egoísmo sobre o qual se ergueu o capitalismo deve dar lugar a um modelo que projete um mundo 'onde a distribuição relativa de prosperidade seja frequentemente mais importante do que a satisfação individual'.
Porter vai mais longe ao dizer que um novo modelo deveria considerar os impulsos irracionais na formação de preços, pois, afinal, 'as pessoas desejam não o querem comprar, mas o que pensam querer', vítimas que são de manipulações do mercado, cuja oferta atende mais aos interesses da indústria do que do consumidor.
Um modelo econômico que levasse em conta esse fator humano transformaria a economia numa 'disciplina matematicamente menos elegante', diz Porter, mas refletiria melhor o mundo real. Ele afirma que os dois anos desde a eclosão da crise são um tempo insuficiente para que se ache um novo equilíbrio entre a ação governamental e a iniciativa privada - até porque os cidadãos desconfiam tanto dos governos quanto dos banqueiros. De qualquer maneira, fica a lição pós-crise: 'Nunca mais deveremos aceitar sem questionamento a noção de que os preços determinados por mercados desregulados são inevitavelmente corretos'.

FÉ NO MERCADO
Raj Patel não apenas critica os mercados, mas propõe uma alternativa. Economista britânico naturalizado americano, Patel é consultor da ONU e ativista de causas populares como o direito dos povos à alimentação. Em 'O Valor de Nada' [tradução de Vania Cury, Editora Zahar, 240 págs., R$ 49], ele atribui a crise de 2008 à exacerbação do espírito do capitalismo. 'A ideia de que os mercados devem saber mais é um artigo de fé de certo modo recente, e foi necessária uma grande dose de trabalho ideológico e político para incluí-la na sabedoria convencional dos governos.'
Patel registra que a crise recente despertou o debate visando à regulamentação dos mercados. Mas não deixa de perguntar: 'Em nome de que interesses essa regulamentação deverá funcionar?'. Sem responder diretamente, o escritor suspeita, com desapontamento, que o eixo de um novo modelo continuaria privilegiando o lucro das corporações e o egoísmo dos agentes econômicos. Para ele, isso seria um equívoco na medida em que estariam sendo ignoradas as pesquisas que mostram que o bem-estar da sociedade depende também da valorização de virtudes como 'compaixão, equidade, confiança, altruísmo e reciprocidade'. Patel não tem dúvida: 'Quanto maior for o nosso bem-estar psicológico, maior será nossa felicidade'.
O reino budista do Butão, o primeiro país a criar o índice de Felicidade Interna Bruta (FIB), é sempre um parâmetro para o debate sobre felicidade. Eduardo Porter acredita que a felicidade no reino tem pouco a ver com os itens intangíveis do índice. 'O Butão pode ser feliz', afirma, 'mas isso tem a ver mais com sua riqueza material'.
O autor compara: o PIB per capita do Butão, que em 1980 era 10% maior do que o da Índia, hoje é 75% maior. Para Patel, porém, a felicidade butanesa é tributária daquelas virtudes decorrentes da generosidade. Nesse sentido, a recente queda do índice até corroboraria a tese, uma vez que ocorreu depois de autorizada a televisão via satélite, que expôs a população local ao mundo inacessível de bens de consumo, gerando 'profundo ressentimento'.
Qual a alternativa defendida por Raj Patel? O economista não propõe um modelo fechado, mas indica suas inclinações ao elogiar programas como o orçamento participativo, introduzido na prefeitura de Porto Alegre no final dos anos 80 na gestão do PT e que hoje ultrapassou a identidade partidária. Essa política, admirada pelo Banco Mundial, é atualmente implementada em mais de 300 cidades no mundo inteiro, contabiliza o economista. 'Pense nisso como um comunitarismo moderno', ele sugere.
Outra referência são as comunidades zapatistas do México, que ele visitou em 2009. Os zapatistas, conhecidos pelas máscaras escuras que usam para esconder o rosto, declararam guerra ao governo mexicano em 1994.
De lá para cá, os rebeldes construíram hospitais e escolas em seus territórios. 'Sua maior vitória, no entanto, foi ter arquitetado aquilo que já se aclamou como o experimento mais bem-sucedido de democracia e justiça', escreve Patel.
A base da democracia zapatista é o povoado, que em geral tem até cem famílias, as quais escolhem responsáveis para representá-las nas várias instâncias do governo. Os escolhidos servem no quartel-general da Junta do Governo por uma semana em cada seis, por um período de três anos, e não serão mais escolhidos, o que garante a rotatividade permanente. Ou seja, 'os povos indígenas estão se engajando na democracia sem o seu sintoma mais infeccioso -as eleições'.

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No universo das corporações, Patel valoriza iniciativas como a do Creative Commons, que privilegia a propriedade comum em vez da propriedade privada. Elogia igualmente a Wikipédia, a enciclopédia disponível na internet. O economista vê no movimento pelo software livre e na Wikipédia 'um modo de socialização e comunhão que nos encoraja a compartilhar'.
Raj Patel diz não ser contra a propriedade. 'A propriedade pessoal é importante, e, de acordo com parâmetros razoáveis, ninguém deveria ser negado a isso.' Também afirma não ser contra o mercado. Eles representam uma boa maneira de 'descentralizar a tomada de decisões, e fica difícil imaginar uma democracia saudável na qual as pessoas possam ser livres sem mercados'. Para ele, o que precisa acabar é a crença 'de que os mercados são a única forma de avaliar o nosso mundo'.
Patel adverte que o que propõe não é um 'socialismo de mercado'. Prefere o termo 'mercados socializados'. O economista adverte: 'A concentração de recursos e poder nas mãos de poucas pessoas e entidades econômicas milita contra o sucesso da democracia'. Para ele, propriedades e mercados deveriam sempre estar subordinados 'às considerações democráticas de igualdade e sustentabilidade'.
Embora haja muito de utópico no pensamento de Raj Patel, suas ideias, como possibilidade de horizonte, não deixam de ter serventia para o debate sobre o preço do capitalismo e o valor da democracia.

Raj Patel pergunta: 'Em nome de que interesses a regulamentação dos mercados deverá funcionar?' Ele suspeita que continuaria privilegiando o lucro e o egoísmo

Dois anos após o início da depressão mundial, as primeiras reflexões sobre suas consequências sugerem um consenso: preços nem sempre guardam uma relação próxima com valores

Eduardo Porter diz que um novo modelo deveria considerar os impulsos irracionais na formação de preços, pois 'as pessoas desejam não o que querem comprar, mas o que pensam querer'

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Saúde, valor e preço « Blog Direito Sanitário: Saúde e Cidadania

Saúde, valor e preço « Blog Direito Sanitário: Saúde e Cidadania: "Saúde, valor e preço

Lenir Santos[1]

Lendo, o artigo da Folha de S.Paulo de 3 de abril de 2011 da autoria de Oscar Pilagallo[2] “O preço de tudo e o valor de nada”, lembrei-me que numa sociedade que tende a ter como valor supremo o consumo de bens e serviços, tudo acaba por ser “precificado”. Tanto que Eduardo Porter[3] afirma que as pessoas desejam não o que querem comprar, mas o que pensam querer.

Recentemente, num artigo que escrevi, no sentido de demonstrar que saúde não tem preço por ser o corolário da vida, ficou, contudo, com uma pergunta: a saúde escapa da precificação e do desejo? O desejo de ter saúde leva ao desejo de consumir tudo aquilo que possa preveni-la, como o próprio excesso de diagnóstico, denunciado na obra Overdiagnosed, do médico americano Reshma Melwani.

A cada dia enfrentamos o dilema de uma saúde de alto padrão, que, muitas vezes, mantém pessoas vivas em razão de custosas tecnológicas que fatalmente garantem lucro (e até fama aos seus médicos, conforme o paciente) e nem sempre a qualidade de vida ou a própria vida.

Dois pesos, duas medidas fundados num mesmo paradigma que, no fundo, é o da banalização da vida em nome do lucro ou da falta dele, porque se o prolongamento da vida fosse um valor indiscutível todos deveriam ter direito a ele. Pode parecer um paradoxo, mas a mesma vertente que se centra na manutenção de vidas a qualquer preço sem pensar na qualidade de vida da pessoa humana é a mesmo que banaliza a pessoa na falta de garantia mínima de serviços. Em ambos os casos, a pessoa e seu direito à liberdade são ignorados. De um lado, pelo excesso de ofertas tecnológicas que mais confundem do que apóiam, e de outro, pela escassez de mínimos essenciais para a proteção da saúde. Em ambos os casos, o preço da saúde está em jogo.

No excesso, o lucro subtendido nas ofertas de manutenção da vida, que muitas vezes, é apenas de dias. De outro lado, o custo da saúde interferindo todo o tempo, seja nas políticas públicas seja na saúde privada. Em ambos os casos o custo da saúde está presente, seja pelo lucro que pode gerar, seja pelo custo nos orçamentos.

Por que os grandes problemas de escassez na saúde afetam sempre os mais pobres? Além do mais, como retirar a saúde do conceito de produto que custa? Custo sempre existirá. A questão está em como vamos combinar preço com ética, conferindo valor ético à saúde.

Pensamos que o primeiro ponto está na própria saúde pública que por ter custo e estar vinculada ao orçamento (receitas e despesas que devem ser equalizadas) se cerca de limites; o segundo ponto, sendo a saúde de acesso universal e igualitário, como garantir a 183 milhões de pessoas uma saúde igualitária? Ou será que vamos aceitar ferir o princípio da igualdade e garantir para alguns tudo e para a maioria apenas algumas coisas?

Como garantir saúde a todos, igualmente? Por isso é necessário definir quais serviços de saúde o poder público vai garantir a todos, sem exceção. Se a saúde não consegue fugir da precificação, mesmo sendo um direito fundamental, como definir o que cabe e o que não cabe no conceito de ações e serviços de saúde?

A saúde pública é fortemente fundada na precificação. Qualquer ação ou serviço que se pretenda garantir ao cidadão é tido como um procedimento que deve ser incluído numa tabela de preço. Esta inversão demonstra que o conceito de saúde está fundado mais em preço do que em valor. Assim é importante tentar combinar o valor intrínseco da saúde com o seu preço de mercado.

[1]Coordenadora do Instituto de Direito Sanitário Aplicado – IDISA; Coordenadora do Curso de Especialização em Direito Sanitário da UNICAMP-IDISA; ex-procuradora da UNICAMP.

[2]Folha de S.Paulo, Caderno Ilustríssima. P.7, 3.4.2011

[3]Eduardo Porter. The Price of Everything, ed. William Heinemann (citação de Oscar Pilagallo no artigo em referencia).

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Motivos econômicos pelo transporte público gratuito | BRASIL de FATO

Motivos econômicos pelo transporte público gratuito | BRASIL de FATO: "Motivos econômicos pelo transporte público gratuito

Análise

Uma sociedade que depende de automóveis individuais como meio de transporte principal tem custos sociais e ecológicos elevados

15/07/2011



João Alexandre Peschanski





A criação de um sistema de transporte público gratuito universal no capitalismo soa como uma fantasia inatingível. Tal sistema, à primeira vista, seria economicamente ineficiente, na medida em que oneraria demais o Estado.

Mas, do ponto de vista econômico, criar um sistema de transporte público gratuito é vantajoso para o Estado. Uma sociedade que depende de automóveis individuais como meio de transporte principal tem custos sociais e ecológicos elevados. É preciso levar em conta esses custos no cálculo da eficiência de qualquer sistema de transporte.

Uma sociedade dependente de automóveis individuais tem altos níveis de poluição -- muito mais do que teria se o principal meio de transporte fosse coletivo. A contaminação do ar leva a doenças respiratórias e, consequentemente, gastos médicos, para o cidadão e o Estado. Na medida em que tais doenças respiratórias incapacitam os membros de uma sociedade levam a uma possível desaceleração econômica -- trabalhadores sem saúde não produzem no mesmo nível do que trabalhadores com saúde. Há outros gastos relacionados ao uso do automóvel em massa, como a manutenção de uma rede de fiscais de trânsito, fundamental para organizar cidades com tráfego intenso, e o tempo -- produtivo -- perdido em engarrafamentos. Quem paga a conta pelo trânsito são, de novo, o cidadão e o Estado.

As montadoras conseguem vender a preços mais baratos os automóveis que produzem porque repassam ao cidadão e ao Estado os custos sociais do sistema de transporte que patrocinam. Nos primeiros meses de 2011, o aumento na venda de automóveis chegou a 8% em comparação com o ano anterior. As montadoras exigem do governo redução de impostos e mais facilidade no crédito para compradores, isto é, querem se livrar ainda mais dos custos sociais relacionados a seus carros. Mas o imposto deveria aumentar, não diminuir.

O imposto deveria aumentar sobre as montadoras que lucram com a produção de um bem com alto custo social, como acontece com outros produtos nocivos (cigarro, bebida). Mas também deveria aumentar, paulatinamente, sobre o consumidor, à medida que se consolide um sistema de transporte coletivo funcional. Numa sociedade onde o transporte público é bom, um cidadão pode querer ou precisar de um carro, por conforto ou por qualquer outro motivo, mas como sua decisão tem repercussões sociais -- o custo social relacionado ao uso do automóvel -- cabe também a ele pagar por isso.

Até agora, a argumentação nos levou à necessidade social de substituir o uso em massa dos automóveis pelo transporte público, mas por que este teria de ser gratuito? Por justiça econômica. Os usuários de transporte público beneficiam toda a sociedade, pois mantêm baixos os custos sociais relacionados ao transporte (poluição, trânsito). Beneficiam até mesmo as pessoas que não usam o transporte público. Cobrar tarifas pelo uso do transporte público é, então, uma injustiça econômica: por mais que o serviço beneficie a todos, só uma parcela dos beneficiados paga por ele. De certo modo, cobrar pelo transporte público se torna uma exploração dos usuários pelos não-usuários. Os gastos do sistema de transporte coletivo têm de ser partilhados pelos beneficiados, ou seja, divididos entre todos os cidadãos.

A gratuidade do transporte público pode ser defendida por dois outros aspectos econômicos. Por um lado, cobranças de tarifas envolvem custos de operação e fiscalização; um sistema de transporte público gratuito os elimina. Por outro lado, a gratuidade funciona como um incentivo aos cidadãos para que usem meios públicos de locomoção, aumentando os benefícios sociais.

Um sistema de transporte público gratuito é eficiente, do ponto de vista econômico, e compatível em teoria com uma sociedade capitalista. Os obstáculos à criação desse sistema não são de ordem econômica, mas política. As montadoras têm, evidentemente, interesse em manter a sociedade dependente dos carros que fabricam. Para garantir seus lucros, precisam manter essa dependência e investem para pressionar os governos local e federal a manter seu controle sobre o sistema de transporte. No Brasil, têm alta capacidade de pressão, pois contam com políticos aliados com posições-chave, na Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados, e potencial de chantagem sobre o governo, ameaçando demitir trabalhadores se seus interesses não forem atendidos.

A reivindicação por transporte público gratuito é, portanto, realista e justa. Organiza-se no Brasil, principalmente, pelo Movimento Passe Livre, criado em 2005, que mobiliza jovens e trabalhadores de baixa renda em diversas capitais sob a bandeira da tarifa zero. Enfrenta, nas ruas, uma visão atrasada e ineficiente da vida em sociedade. E tem a lógica econômica de seu lado.

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O combate ao crack | Brasilianas.Org

O combate ao crack | Brasilianas.Org: "O combate ao crack
Enviado por luisnassif, sab, 16/07/2011 - 14:00

Por Alexandre Vasilenskas Gil

Comentário ao post Combate ao crack, por Dráuzio Varella

Sou psicólogo, mestre e doutor em saúde coletiva e trabalho na rede de saúde mental de Macaé/RJ, mais especificamente na unidade de emergência psiquiátrica do município. Além de ter sido membro do conselho municipal de políticas sobre drogas. O que acho que me habilita para falar do assunto com um pouco mais de propriedade que o festival de senso comum que o Dr. Draúzio Varela explicita (parece entender do assunto tanto quanto eu entendo de câncer).

As pessoas precisam ser informadas de alguns dados básicos para uma discussão mais qualificada desse tema:
ospitais psiquiátricos eram e são cenários de filmes de terror onde pacientes vagavam como zumbis, sendo periodicamente torturados por práticas como eletrochoques (usando na sua esmagadora maioria nesses lugares como técnica de tortura e não tratamento) e toda série de maus tratos que se pode imaginar, tudo fartamente financiado com dinheiro público. É preciso que se lembre a classe média (se funcionar) o que eram esses lugares que eles querem reativar para ver longe de seus olhos esse problema;

- Internação compulsória já foi tentada nesses casos no mundo inteiro com resultados insuficientes. Aliás apenas 30% dos casos parecem ter como resultado a abstinência completa. A suíça 'não acabou' com as experiências de redução de danos, como diz o texto, apenas as aprimorou, utilizando agora as 'narcosalas' onde tolera-se o uso de drogas desde que os usuários sejam acompanhados por uma equipe interdisciplinar de saúde;

- O crack é a pasta base de cocaína misturada com bicarbonato de sódio, o que possibilitou pela primeira vez termos uma droga pesada acessível aos pobres. Antes era cachaça... Tal foi o fruto da política de repressão aos insumos do refino da cocaína, principalmente o éter. E quem diz isso é a direção da polícia federal e não nenhum militante pela legalização das drogas. Não teríamos o crack sem a política proibicionista;

-Recebo a todo momento pedidos de internação para usuários compulsivos de drogas ilegais, de fato as mães chegam desesperadas. Mas na primeira conversa, descobre-se que muitas vezes o paciente já foi internado inúmeras vezes, inclusive por períodos longos. Não é liberalismo político acreditar que sem o componente da vontade esses tratamentos não costumam funcionar, é fato.

- Existe atualmente um movimento corporativo de cunho conservador que tenta voltar atrás nas políticas de reforma psiquiátrica usando o crack como pretexto. Aliás curiosamente costumam se aliar aos defensores de clínicas de cunho religioso (que querem ter financiamento do SUS para fazer seu proselitismo, usuários de drogas são ótimos 'alvos' tendo em vista sua fragilidade emocional). Tal movimento é liderado hoje pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria). É preciso esclarecer que eles estão muito longe de representar hoje consenso técnico com relação ao assunto, vide a posição contrária da ABRASME (associação brasileira de saúde mental), também dirigida por um psiquiatra e defensora da reforma psiquiátrica e das políticas de redução de danos.

- Boa parte dos problemas decorrentes da 'epidemia de crack' estão relacionados não tanto com a droga em si, mas com a miséria urbana associada ao uso da substância. Existem usuários de crack por ex. no Canadá, sem que se veja as cenas lamentáveis de metrópoles como São Paulo ou Rio. Atualmente a facudade de Medicina da UFRJ faz parte de uma pesquisa nacional sobre usuários de crack, a Dra. Erotildes Legal faz parte da equipe e seria uma boa fonte para desfazer os mitos sobre o assunto;

-Por último é díficil não ver na defesa desse tipo de política repressiva um sintoma da facistização avançada da classe média tradicional que vem se dando já faz alguns anos. 'Crackeiros' incomodam? que os prendam e coloquem em algum depósito longe das vistas das 'pessoas de bem'. Se esses lugares se mostrarem pouco tempo depois sucursais do inferno aí não é mais problema nosso.... No artigo de Draúzio Varela não faltou nem mesmo aquele tradicional apelo emocional usado normalmente na defesa da pena de morte ou redução da maioridade penal (queria ver se fosse seu filho!). Não é 'hipocrisia' que usuários de drogas devam ser alvos de repressão policial apenas se cometerem crimes... é simplesmente um principal básico do Estado de Direito, que para o sr. Draúzio Varela e parte de nossa classe média não deve se aplicar a pobres, negros, homossexuais e afins... apenas para 'gente diferenciada'.

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O combate ao crack, por Drauzio Varella | Brasilianas.Org

O combate ao crack, por Drauzio Varella | Brasilianas.Org: "Craqueiras e craqueiros

A CONTRAGOSTO, sou daqueles a favor da internação compulsória dos dependentes de crack.

Peço a você, leitor apressado, que me deixe explicar, antes de me xingar de fascista, de me acusar de defensor dos hospícios medievais ou de se referir à minha progenitora sem o devido respeito.

A epidemia de crack partiu dos grandes centros urbanos e chegou às cidades pequenas; difícil encontrar um lugarejo livre dessa praga.

Embora todos concordem que é preciso combatê-la, até aqui fomos incapazes de elaborar uma estratégia nacional destinada a recuperar os usuários para reintegrá-los à sociedade.

De acordo com a legislação atual, o dependente só pode ser internado por iniciativa própria. Tudo bem, parece democrático respeitar a vontade do cidadão que prefere viver na rua do que ser levado para onde não deseja ir. No caso de quem fuma crack, no entanto, o que parece certo talvez não o seja.

No crack, como em outras drogas inaladas, a absorção no interior dos alvéolos pulmonares é muito rápida: do cachimbo ao cérebro a cocaína tragada leva de seis a dez segundos. Essa ação quase instantânea provoca uma onda de prazer avassalador, mas de curta duração, combinação de características que aprisiona o usuário nas garras do traficante.

Como a repetição do uso de qualquer droga psicoativa induz tolerância, o barato se torna cada vez menos intenso e mais fugaz. Paradoxalmente, entretanto, os circuitos cerebrais que nos incitam a buscar as sensações agradáveis que o corpo já experimentou permanecem ativados, instigando o usuário a fumar a pedra seguinte, mesmo que a recompensa seja ínfima; mesmo que desperte a paranoia persecutória de imaginar que os inimigos entrarão por baixo da porta.

A simples visão da droga enlouquece o dependente: o coração dispara, as mãos congelam, os intestinos se contorcem em cólicas e a ansiedade toma o corpo todo; podem surgir náuseas, vômitos e diarreia.

Quebrar essa sequência perversa de eventos neuroquímicos não é tão difícil: basta manter o usuário longe da droga, dos locais em que ele a consumia e do contato com pessoas sob o efeito dela. A cocaína não tem o poder de adição que muitos supõem, não é como o cigarro cuja abstinência leva o fumante ao desespero esteja onde estiver.

Vale a pena chegar perto de uma cracolândia para entender como é primária a ideia de que o craqueiro pode decidir em sã consciência o melhor caminho para a sua vida. Com o crack ao alcance da mão, ele é um farrapo automatizado sem outro desejo senão o de conseguir mais uma pedra.

Veja a hipocrisia: não podemos interná-lo contra a vontade, mas devemos mandá-lo para a cadeia assim que ele roubar o primeiro transeunte.

A facção que domina a maioria dos presídios de São Paulo proíbe o uso de crack: prejudica os negócios. O preso que for surpreendido fumando apanha de pau; aquele que traficar morre. Com leis tão persuasivas, o crack foi banido: craqueiras e craqueiros presos que se curem da dependência por conta própria.

Não seria mais sensato construirmos clínicas pelo país inteiro com pessoal treinado para lidar com dependentes? Não sairia mais em conta do que arcar com os custos materiais e sociais da epidemia?

É claro que não sou ingênuo a ponto de acreditar que, ao sair desses centros de tratamento, o ex-usuário se tornaria cidadão exemplar; a doença é recidivante. Mas pelo menos ele teria uma chance. E se continuasse na cracolândia?

E, se ao receber alta contasse com apoio psicológico e oferta de um trabalho decente, desde que se mantivesse de cara limpa documentada por exames periódicos rigorosos, não aumentaria a probabilidade de permanecer em abstinência?

Países, como a Suíça, que permitiam o uso livre de drogas em espaços públicos, abandonaram a prática ao perceber que a mortalidade aumenta. Nós convivemos com cracolândias a céu aberto sem poder internar seus habitantes para tratá-los, mas exigimos que a polícia os prenda quando nos incomodam. Existe estratégia mais estúpida?

Faço uma pergunta a você, leitor, que discordou de tudo o que acabo de dizer: se fosse seu filho, você o deixaria de cobertorzinho nas costas dormindo na sarjeta?

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quinta-feira, 14 de julho de 2011

Notícias - NOTÍCIAS - Nova cepa de E.coli pode ter surgido pelo uso inadequado de antibióticos

Notícias - NOTÍCIAS - Nova cepa de E.coli pode ter surgido pelo uso inadequado de antibióticos: "Há cerca de um mês, um surto de E.coli, originado em brotos vegetais na Alemanha, provocou a morte de mais de 40 pessoas na Europa, além de ter causado enormes prejuízos a agricultores. No artigo abaixo, Cynthia Rubião, especialista em bacteriologia e segurança alimentar, explica detalhes sobre a bactéria.

A Escherichia coli é uma bactéria encontrada comumente no intestino de humanos e animais de sangue quente, sendo que a maioria das cepas desta espécie é inofensiva. A que está sendo implicada neste surto de imensas proporções na Europa possui genes dos tipos (patotipos) Escherichia coli enteroagregativa (EAEC) e Escherichia coli enterohemorrágica (EHEC), que é produtora de toxinas shiga ou verotoxinas. A EAEC é mais encontrado em seres humanos, enquanto a EHEC é mais observada em ruminantes, mais especificamente em bovinos. A nova cepa, que é um híbrido dos dois patotipos, parece ter mais genes da EAEC (93% de similaridade) de origem humana.

A infecção por este tipo de bactéria pode provocar diarreia de aquosa a sanguinolenta, distúrbios em células do sangue, lesão grave nos rins e, em alguns casos, lesões no sistema nervoso. Para o tratamento, não se recomenda o uso de antibióticos ou de drogas antidiarreicas. O uso de antibióticos, na maioria dos casos, provocou o agravamento do quadro clínico, pois estimulou a liberação de mais toxinas shiga pelas bactérias; e o de antidiarreicos piora o quadro, pois impede a excreção da bactéria pelas fezes, o que é uma das formas de defesa do nosso organismo.

O sorotipo do surto é o O104:H4. Trata-se de um sorotipo muito raro, mas que já foi identificado em outros casos de toxinfecção alimentar (na República da Georgia em 2009, na Coreia em 2005 e na Alemanha em 2001). Este surto é bastante incomum pela rapidez com que está se espalhando, pelo elevado índice de casos severos (Síndrome Hemolítica Urêmica – SHU) e pelo grupo de pessoas que está atingindo (adultos jovens, na maioria mulheres). Normalmente, o grupo mais atingido são as crianças muito jovens e os idosos. Além disso, esta cepa é multirresistente a antibióticos, o que pode ser explicado pelo uso inadequado por leigos e até por profissionais de saúde.

Ao que parece, esta bactéria deve ter sido um habitante normal do intestino humano ou dos de animais de produção, que teve a chance de se multiplicar quando o uso de vários antibióticos foi eliminando outras bactérias não resistentes que competiam com ela dentro do intestino. Em número elevado, ela foi capaz de causar infecção e se espalhar. Este surto não é só preocupante pela transmissão através dos alimentos, mas também por estar espalhando uma bactéria altamente agressiva e resistente com capacidade para passar estes genes a outras bactérias, até de outras espécies ou gêneros que poderão causar outros tipos de infecção.

Provavelmente estas bactérias foram selecionadas pelo uso inadequado de antibióticos. Quando se torna multirresistente, ou não se dispõe de medicamentos capazes de controlar as infecções ou os mesmos são muito tóxicos, gera uma série de reações adversas severas para o organismo humano. Com a racionalização do uso de antibióticos, o equilíbrio onde as bactérias benéficas competem inibindo o crescimento daquelas causadoras de doenças dentro do nosso organismo poderá ser restaurado.

Para evitar a contaminação da plantação, os órgãos de saúde dão algumas recomendações com relação às boas práticas agrícolas:
· Evitar o acesso dos animais da fazenda (em particular dos ruminantes) ao ambiente onde os produtos frescos são cultivados ou armazenados;
· Controlar a fonte, o manuseio e o tratamento do adubo e do iodo utilizados para fertilizar os campos onde serão cultivados produtos para o consumo humano;
· Utilizar água de boa qualidade microbiológica para a irrigação e outras práticas agrícolas.

Cynthia Rubião é química e médica veterinária, especializada em bacteriologia e segurança alimentar. Desde 2009, é diretora técnica da BioSafe, empresa de consultoria em segurança de alimentos.

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Ha 30 anos nascia o Movimento Anti-Utilitarista nas Ciências Sociais- MAUSS | Brasil Autogestionário

Ha 30 anos nascia o Movimento Anti-Utilitarista nas Ciências Sociais- MAUSS | Brasil Autogestionário: "Ha 30 anos nascia o Movimento Anti-utilitarista nas Ciências Sociais

Por Paulo Marques.

Foi no ano de 1981,durante um colóquio sobre o Dom no Centro Thomas-More, em Arbresle, próximo à Lyon,na França que Alain Caillé percebe a recorrência de um discurso dominante, de que apenas o cálculo do interesse,consciente e racional para uns, escondido nos recônditos do inconsciente para outros, que prevalecia em todas as disciplinas das ciências sociais.

Decide então criar uma associação sem fins lucrativos e dispor de um órgão de difusão das ideias contrárias a essa lógica dominante. Buscava estimular um pensamento “antiutilitarista”. Surgia assim o Movimento anti-Uitilitarista nas Ciências sociais-, cuja sigla MAUSS é uma homenagem a principal referência teórica do movimento, o antropólogo MArcel Mauss.

Marcel Mauss,foi o autor do clássico “Ensaio sobre a dádiva” (1925)que apresenta a tese segundo qual as sociedades arcaicas não se baseiam na troca mercantil – que elas simplesmente ignoram -, mas sobre qualquer coisa muito mais complexa, que ele chama de a tripla obrigação: dar, receber, retribuir. Como toda dádiva obriga, o dom se torna um poderoso operador social. O dom em questão, é preciso lembrar, não advém da caridade. Ele não é o efeito de um altruísmo oposto ao egoísmo econômico.

Como explica o própio Caillé, trata-se de um dom “agonístico”, “uma forma de guerra”, mas de uma guerra “de generosidade”. O mais importante, todavia, e que, segundo o reconhecimento dos membros do movimento resume melhor seu projeto, está na conclusão o pai da antropologia moderna: o homem não foi sempre um animal econômico. O Homo oeconomicus seria então uma invenção moderna.

Uma tese igualmente partilhada pelo economista e antropólogo de origem húngara Karl Polanyi (1886-1964), outra figura de referência do movimento. Contrariamente ao que pensa a maioria dos historiadores, sublinha, “o mercado é uma instituição recente”. Na maior parte das sociedades, o econômico está “encravado” no social, impedindo toda autonomização do Homo oeconomicus. E assim ele se mantém sob controle.

Antigo assistente de Claude Lefort, cofundador, junto com Cornelius Castoriadis, da revista Socialismo ou Barbárie, Alain Caillé é hoje o principal teórico e militante do chamado Anti-utilitarismo.

Mas o que é o anti-utilitarismo?

Como seu nome indica, o movimento anti-utilitarista é, desde o princípio, um movimento de oposição. O antiutilitarismo é primeiramente um antieconomismo. Ele recusa a generalização do Homo oeconomicus como modelo explicativo de toda ação humana. Ele contesta a ideia de que não haveriam nem sociedades nem grupos, mas apenas indivíduos animados por seus interesses egoístas.

E qual o espaço dessa teoria no campo anticalitalista? O que tem de diferença em relação às teorías revolucionárias do século XIX como o socialismo, comunismo, o anarquismo, que pautaram o movimento social e pautam até hoje?

O que Alain Caillé quer dizer quando defende uma “democracia asociacionista”, e o que seria o “convivialismo”?

Todas estas questões, certamente, não estarão isentas de críticas por parte dos mais ortodoxos, e como antes de tudo somos anti-ortodoxos, acreditamos que é importante conhecer essa contribuição teórica que vem adquirindo grande espaço, principalmente a partir de estudos sobre a prática da Outra Economia na América Latina.

Com este objetivo publicamos uma entrevista com Alain Caillé que de forma muito clara e objetiva, apresenta os pressupostos do anti-utilitarismo.

10 questões à Alain Caillé [Entrevista]

Publicado na Revista do MAUSS em 24 março 2011 por Valéry Rasplus*

Meu quarto convidado é Alain Caillé, professor de sociologia e economista da Universidade de Paris X, onde dirige a especialização Sociedade, Economia, Política e Trabalho (SEPT) do Mestrado em Ciências Sociais e Sociologia (escola doutoral “Economia, Organizações e Sociedade”, da qual é membro do diretório) e anima o GÉODE (Grupo de estudos e de observação da democracia), laboratório de sociologia política que se fundiu ao laboratório de filosofia política contemporânea de Paris X – Nanterre, para constituir o SOPHIAPOL (sociologia, filosofia e antropologia políticas), do qual é co-diretor, junto à Christian Lazzeri. É o fundador do movimento anti-utilitarista nas ciências sociais e dirige a Revue du MAUSS.

Valéry Rasplus: Desde 1981 seu nome está associado à revista do Mauss (inicialmente, Le bulletin do MAUSS [1981-1988], em seguida La Revue du MAUSS trimestrielle [1988-1993] e finalmente La Revue du MAUSS semestrielle). Como surgiu a ideia de criar esta revista que hoje está plenamente inserida no cenário intelectual francês e internacional?

Alain Caillé: O ponto de partida foi o seguinte: em 1981 eu vi o anúncio de um colóquio sobre a dádiva em L’Arbresle, que reuniria filósofos, economistas, psicanalistas etc. Fascinado há anos pelo Ensaio sobre a dádiva de Mauss (e por Karl Polanyi), principalmente porque ele parecia refutar tudo o que me haviam ensinado nas ciências econômicas (à época eu era doutor em ciências econômicas, mas igualmente assistente de sociologia na Universidade de Caen), resolvi comparecer ao colóquio. Alguns de nós se surpreenderam ao perceber que nenhum dos palestrantes parecia ter lido Mauss. E mais ainda, com a convergência entre economistas e psicanalistas sobre a ideia de que o dom não existe, que não passa de ilusão e ideologia, uma vez que não se tem nada sem nada. Esta forma de pensar era perfeitamente congruente com a evolução recente da sociologia, sobre a qual alertei em um artigo de Sociologia do trabalho: “A sociologia do interesse é interessante?” (1981), no qual apontei a surpreendente convergência, ao menos em um ponto essencial, entre autores aparentemente diametralmente opostos: Raymond Boudon e Michel Crozier, do lado liberal; Pierre Bourdieu, do lado neomarxista. Para uns, como para outros, a integralidade da ação social se explicava por cálculos de interesse, conscientes para os dois primeiros, inconscientes para o terceiro. Todos os três, para além de suas diferenças gritantes, comungavam assim do que eu chamei de axiomática do interesse, tão bem representada em L’Arbresle. Para esta sociologia então dominante, o homo sociologicus era, no fundo, apenas uma variante, um avatar ou um disfarce do homo oeconomicus. De acordo com o que alguns de nós constataram em L’Arbresle decidimos, Gerald Berthoud, professor de antropologia da Universidade de Lausanne, e eu, criar uma espécie de boletim informativo ou uma coleção periódica de working papers capaz de favorecer os intercâmbios entre economistas, antropólogos, sociólogos, filósofos etc. que partilhavam deste espanto e desta inquietude face à evolução do pensamento nas ciências sociais e na filosofia política. Realmente, em toda parte – nós o descobriríamos pouco a pouco –, passou-se de uma perspectiva abertamente holística, que havia dominado durante os Trinta Gloriosos[1], a um individualismo tanto ontológico quanto metodológico. E esta visão hiper-individualista caminhava junto ao triunfo generalizado da axiomática do interesse. As mudanças se viam tanto em filosofia política, seguindo o turbilhão de A teoria da justiça de John Rawls (1971) – questionando-se como “homens econômicos ordinários”, mutuamente indiferentes, podem definir as normas de justiça – quanto em biologia, onde floresciam a teoria do gene egoísta ou a sociobiologia. Em economia, os “novos economistas” trilhavam seus avanços e a nova microeconomia, baseada na teoria dos jogos, oferecia ao modelo econômico generalizado sua lingua franca. Em resumo: durante dois séculos os economistas haviam afirmado que o modelo do homo oeconomicus, o indivíduo calculador racional, apreensivo em relação aos seus próprios interesses, era notoriamente irrealista – apesar de permitir ao menos explicar o que acontece no mercado de bens e serviços –, relegando o estudo das outras facetas do humano e do social a outras disciplinas. A partir dos anos 70, eles começaram a proclamar que o modelo econômico permite também explicar a totalidade da ação social – o amor, o crime, a fé, a relação do saber etc. E, em suma, sociólogos, biólogos ou filósofos lhes davam razão. Nós iniciávamos então uma revolução no campo do pensamento. Ou melhor, uma contra-revolução intelectual que andava ao lado de uma revolução na divisão do trabalho intelectual e científico. Foi apenas após esse movimento que compreendemos que esta evolução intelectual contra-revolucionária havia antecipado e legitimado o triunfo da globalização neoliberal. Se os homens não são mais que homo oeconomicus, então, de fato, todas as esferas da sociedade deveriam ser organizadas segundo as regras do mercado e submetidas à lei do rendimento financeiro máximo. E todo o resto é literatura. Todo o trabalho do MAUSS durante estes trinta anos consistiu em buscar nas ciências sociais e na filosofia moral e política por fundamentos que escapassem à axiomática do interesse, i.e., não utilitaristas. Ou, mais precisamente, anti-utilitaristas. Nós acreditamos tê-los encontrado na descoberta de Mauss: todas as sociedades primeiras, arcaicas e tradicionais, mutatis mutandis, se basearam naquilo que Mauss chamava a tríplice obrigação de dar, receber e retornar. Nesse processo ele identificava igualmente, e corretamente, creio eu, “a rocha da moral eterna”. Todavia, é necessário precisar este ponto, uma vez que somos constantemente obrigamos a aí retornar. Se opor à axiomática do interesse, ser anti-utilitarista, não significa desdenhar das considerações da utilidade, pôr em dúvida a força dos interesses e, menos ainda, postular que os humanos são “altruístas” (basta ler Ensaio sobre a dádiva para se convencer do contrário). Porém, o interesse, que prefiro chamar de o interesse por si, é apenas um dos quatro motores principais da ação – e não o único motivo –, ao lado da obrigação (social ou biológica), do interesse pelos demais (da empatia) e da liberdade-criatividade. O interesse por si não explica tudo e não deve dominar tudo. É preciso saber a parte que lhe cabe, mas também as partes que cabem a outras considerações, ou até se opor completamente, em último caso. Daí a dimensão “anti” do anti-utilitarismo.



Valéry Rasplus: O que me tocou – guardadas as devidas proporções – quando da leitura dos números e dos autores, foi o interesse que esta revista poderia suscitar tanto em alguém íntimo das teorias situacionistas como Jean-Pierre Voyer, quanto em um “neodireitista” como Alain de Benoist – ambos já escreveram na Revista do MAUSS. Como você explica esta grande diferença de atração?





Alain Caillé: É que a história do anti-utilitarismo é tão antiga quanto a do utilitarismo (cf., por exemplo, Le bonheur et l’utile. Histoire raisonné de la philosophie morale et politique, sob a direção de A. Caillé, Ch. Lazzeri e M. Senellart, Champs/Flammarion, 2 tomos). Há, portanto, tantas variedades dentro do anti-utilitarismo quanto dentro do utilitarismo (cf., por exemplo, a diferença entre um R. Boudon e um P. Bourdieu). O MAUSS pôde então servir de atrator, mais ou menos estranho, a autores de fronteiras bem diferentes. Hoje nós ecoamos, entre outros e, por exemplo, tanto do lado católico – daquilo que resta –, quanto do que resta do comunismo! Mais geralmente, e mais profundamente, o que nós fazemos e ensaiamos pensar se dirige à todos que não se resignam ao não-sentido, à insignificância, como dizia Castoriadis, e que recusam a redução da vida em sociedade a um conjunto de procedimentos formais: o mercado financeiro, o Direito, as regras administrativas, a avaliação quantificada do mérito ou da utilidade social etc. Porém, a tradição de pensamento político na qual nos inserimos, de nossa parte, é aquela de um socialismo associacionista e liberal, ou democrático, aquele que se estende de Leroux à Jaurès (de quem Mauss era um dos companheiros mais próximos) e que nós tentamos atualizar.



Valéry Rasplus: Você explica que a concepção maussiana da dádiva é propriamente política. Como você concebe uma boa política?





Alain Caillé: A concepção maussiana da dádiva é de fato política. Dar é o ato político por excelência, uma vez que permite transformar os inimigos em aliados, fazendo com que haja algo ao invés de nada, vida ao invés de morte, ação ou obra ao invés de vazio. Mas, reciprocamente, o político é propriamente “donatista”. O político pode ser considerado como a integral das decisões pelas quais os membros de uma comunidade política aceitam dar e se dar uns aos outros, ao invés de se afrontar; se confiar ao invés de se desafiar. A política é apenas a interpretação, mais ou menos correta, fiel e bem-sucedida do político. Uma comunidade política pode ser concebida como o conjunto daqueles que recebem e a quem se dá. E uma comunidade democrática, como aquela na qual as dádivas entre cidadãos são feitas primeiramente enquanto dons ao espírito da democracia (e não aos ancestrais, a Deus ou a qualquer entidade transcendente). A boa política é, antes de tudo, aquela que favorece o desenvolvimento da democracia desejada primeiramente por ela mesma – e não por razões instrumentais –, enquanto permite à maioria se ver reconhecida como doadora ou como tendo doado qualquer coisa. O que supõe que ela esteja capacitada a fazê-lo e que suas “capacidades” sejam então maximizadas. Concretamente, a boa política é aquela que contribui para instilar e instituir a autonomia política da sociedade civil associacionista, que não é naturalmente dada e não é auto-explicativa. A filosofia republicana francesa, solidária, tomava o indivíduo não como um ponto de partida – diferentemente do liberalismo econômico, o liberismo –, mas como um objetivo, e aspirava a educá-lo de forma que ele conquistasse sua autonomia face ao Estado instituidor. Essa palavra de ordem é sempre atual, mas deve ser completada pela instituição da autonomia do mundo das associações. Se vamos entrar em mais detalhes, então me sinto tentado a retomar um fragmento do “Manifesto por uma economia política institucionalista” (publicado em La Revue Du MAUSS semestrielle nº 30, 2007), na qual transparecia um grande acordo entre os animadores de diversas escolas econômicas heterodoxas sobre os seguintes pontos (que aqui cito):



“Não pode haver eficácia econômica durável sem que seja edificada uma comunidade política e ética durável, forte e viva. E não pode haver comunidade política durável e viva que não partilhe de certos valores centrais e da mesma noção de o que é justo. Se não for assim, ela não é também uma comunidade moral. Nenhuma comunidade política moderna pode ser edificada sem se referir a um ideal de democracia. A característica de um regime e de uma sociedade democrática é que eles se preocupam de forma efetiva em dar poder (empowerment) ao maior número de pessoas possível e que o provam ajudando-lhes a desenvolver suas capacidades. Nenhuma comunidade política pode ser edificada e perdurar se não partilhar de certos valores centrais, e não pode ser viva se a maioria de seus membros não estiver persuadida – através de qualquer forma de common knowledge e de convicção partilhada – que o maior número dentre eles (e especialmente os líderes políticos e culturais) os respeita de fato. É a partilha mais ou menos maciça dos valores comuns que torna mais ou menos forte o sentimento de que a justiça reina, este sentimento que é o cimento primeiro da legitimidade política. Se a existência, a durabilidade e a sustentabilidade da comunidade política não são consideradas evidentes, mas, ao contrário, como alguma coisa que deve ser produzida e reproduzida, então parece imediatamente necessário estender a Teoria da justiça de John Rawls. Porque não basta dizer que as desigualdades só são justas à medida que contribuem para a melhoria de vida dos mais mal colocados (mesmo que isto seja importante). Convém acrescentar que as desigualdades apenas são suportadas quanto não são excessivas ao ponto de explodirem e despedaçarem a comunidade moral e política. Se a democracia não é vista apenas como um sistema político e constitucional; se, de forma geral, a pensamos em relação à dinâmica do empoderamento (empowerment) das pessoas, então não basta imaginar um sistema de divisão de poderes e de contra-poderes dentro de um sistema político (ainda que seja absolutamente necessário), entre o executivo, o legislativo e o judiciário (ao que seria necessário acrescentar o quarto poder, o da mídia). É igualmente necessário instaurar um sistema de equilíbrio dos poderes entre o Estado, o Mercado e a Sociedade, assim como, do estrito ponto de vista econômico, entre a troca mercantil, a redistribuição estatal e a reciprocidade social.”





Valéry Rasplus: Você se encontra próximo a atores políticos ou partidos políticos com visões semelhantes e possíveis soluções evocadas pelo MAUSS?





Alain Caillé: Infelizmente, não. Ou quase. O MAUSS se coloca à esquerda, ou no turbilhão ou na tradição da esquerda. Mas temos muitos problemas em encontrar atores políticos que exprimam o que nós tentamos pensar. Dito isto, não somos os únicos; este é o caso de um grande número de franceses. Ou ainda, digamos que existe hoje uma grande distância entre o político e a política. Mais precisamente, me parece que existe um enorme espaço não ocupado, não pensado, não formulado, não representado à esquerda do PS e à direita da esquerda de esquerda onde me parece que potencialmente nos situamos – estando entendido que a representação bi-dimensional da política, sobre o único eixo direita/esquerda é infinitamente muito simples. Ao eixo da igualdade é preciso acrescentar aquele da liberdade e, diagonalmente, aquele do espaço e do tempo da solidariedade[2]. Ora, não podemos excluir a possibilidade de que este espaço ainda tão virgem não esteja em pouco tempo bastante povoado. Por exemplo: nós defendemos há muito tempo (em harmonia com a concepção da democracia exposta neste momento) a idéia de que é preciso instaurar conjuntamente um rendimento mínimo incondicional e um rendimento máximo (ainda que elevado). A primeira proposta passa com dificuldade; a segunda, em hipótese alguma. Apresentando esta idéia há alguns anos ao PS ou à ATTAC, eu a vi ser escanteada nos dois casos. Depois de alguns meses, ela se tornou uma proposição cada vez mais partilhada.



Valéry Rasplus: Muitas pessoas públicas (políticos, economistas etc.) evocam a moralização mais ou menos crítica da economia mercadológica capitalista. A moral e a economia podem realmente entrar em acordo?





Alain Caillé: Desde Mandeville e Adam Smith (apesar de suas críticas à Mandeville) a legitimidade da economia de mercado se destina a residir em seu amoralismo, i.e., no fato de que ela pode e deve funcionar sem que os agentes econômicos se preocupem com a sorte de seus congêneres ou concidadãos. Mas este amoralismo se faz passar por um moralismo superior. Se todo o mundo se comporta assim, de forma amoral, então deve resultar – nos ensina a ciência econômica padrão – a maior prosperidade possível e, logo, a maior felicidade da maioria. O que há de mais moral e mais altruísta, em suma, do que o egoísmo generalizado? Ora, nós sabemos bem, nós vemos bastante bem que não é assim que isso funciona. Podemos reintroduzir na economia a moral que daí foi expulsa? Esta questão levanta duas respostas principais: a primeira, que faz apelo aos bons sentimentos e à filantropia e, hoje, ao empreendedorismo social. A segunda, que confia apenas nas regulações políticas do mercado. Pessoalmente, aceito as duas, acrescentando, como muitos outros, uma terceira solução: a economia social e solidária, esta vertente econômica da sociedade civil associacionista elevada ao seu mais alto grau.



Valéry Rasplus: Existe uma relação entre o anti-utilitarismo e o decrescimento?





Alain Caillé: Sim, muitas e complexas relações. Um dos defensores mais conhecidos do decrescimento é meu amigo Serge Latouche, membro do MAUSS desde o princípio, e que apresentamos freqüentemente no movimento, de forma amical e humorística, como o anti-papa do MAUSS. Recentemente ele fez a honra de me nomear, reconvencionalmente, o anti-papa do decrescimento. Para ele, o anti-utilitarismo leva necessariamente ao decrescimento. Esse não é meu sentimento. Eu não acredito de fato nesse slogan. E acredito menos ainda que se trate, de fato, de um verdadeiro slogan, cujo conteúdo concreto é dos mais obscuros. Ou ainda, naquilo que os próprios decrescentes chamam de um “mot-obus”, uma palavra de ordem, cujo mérito principal é provocar e incitar a discussão, mas donde não é preciso realmente pesquisar o conteúdo. S. Latouche, aliás, se apresenta como “a-crescente”, agnóstico da questão do crescimento, mais que decrescente. Apesar desta evolução, eu tenho contra a corrente do decrescimento duas objeções principais: 1. Só se pode propor aos humanos que renunciem a crescer economicamente se lhes sugerirmos outras vias de expansão de sua capacidade de viver e de agir. Quais? 2. O decrescimento não sabe o que fazer com a base do ideal democrático moderno. A idéia de auto-organização em pequenas entidades auto-suficientes é totalmente ilusória. Dito isto, ao contrário, dois pontos me parecem extremamente evidentes e seguem na mesma direção do que buscam os decrescentes. 1. O consenso democrático não poderá mais se apoiar, nos países ricos, em fortes taxas de crescimento. 2. E eles não poderão durar muito tempo nos países emergentes sem devastar definitivamente a Natureza. É preciso então buscar por fundamentos pós-utilitaristas – pós-crescentistas – à democracia. Uma outra maneira de viver juntos. Nós nos encontramos então, S. Latouche, Patrick Viveret (defensor dos novos indicadores de riqueza e da simplicidade voluntária) e eu, para defender em um livro recente (“De la convivialité. Dialogues sur la société conviviale à venir”. La Découverte, 2011) a idéia de que após o liberalismo, o socialismo ou o comunismo era chegado o tempo do “convivialismo”.



Valéry Rasplus: Retornemos a uma problemática talvez mais antropológica. Os homens e as sociedades podem dispensar os ritos (de iniciação, de passagem, de agregação, de instituição etc.)?





Alain Caillé: Eu, digo, nós, infelizmente não desenvolvemos ainda uma reflexão sobre este ponto essencial. Me parece que os rituais devem ser considerados como formas de encenação e visibilidade da tripla obrigação de dar, receber e retornar que insistem sobre a dimensão da obrigação e sua necessária repetitividade. Se tal é o caso, então a sobrevivência do espírito e da efetividade da dádiva passam de fato pelos ritos, que não saberíamos suprimir sem causar danos. Resta refletir sobre o que poderiam e deveriam ser rituais adaptados ao espírito da democracia, que não se afundem nem em um ritualismo artificial e antiquado, nem no ritualismo do anti-ritualismo e da desritualização obrigatória.



Valéry Rasplus: Eu evoquei há alguns meses a tentativa de David Graeber de traçar um paralelo entre antropologia e anarquismo. Você pensa em publicar um número sobre “anarquia e anti-utilitarismo”?





Alain Caillé: Eu não conhecia esse livro de D. Graeber, de quem já publicamos vários artigos e que considero como um companheiro de estrada precioso para o MAUSS. Seu “Towards an Anthropological Theory of Value”, que tenta pensar ao mesmo tempo o valor no sentido econômico, no sentido lingüístico e no sentido antropológico, é absolutamente admirável. Descobri por acaso, há uns dez anos, que ele tinha publicado em uma revista online americana, In There Times, um artigo intitulado “The New Maussketeers”, “Os novos Maussqueteiros”, que explicava que após o desaparecimento dos grandes nomes da French Theory a única coisa interessante que subsistia na França era… o MAUSS (este artigo se encontra, em francês e em inglês, no site www.revuedumauss.com). Evidentemente, era bastante agradável de ler. E, além disso, Graeber conhecia incrivelmente bem o início, a concepção, portanto algo confidencial, do MAUSS (descobri mais tarde que ele tinha sido assistente de Marshall Sahlins, a quem tínhamos enviado todos os nossos primeiros manuscritos). Menos anedoticamente: Junto a MAUSS, claro, e Karl Polanyi, Pierre Clastres é sem dúvida um dos principais inspiradores do MAUSS. Me parece que seu trabalho foi particularmente bem desenvolvido por Catherine Alès, autora de L’ire et le désir (Karthala), de quem podemos ler um artigo neste mesmo número. Nesse artigo, Graeber mostra como toda sociedade combina diversos modos de distribuição de bens e, logo, diferentes tipos de poder: reciprocitário, comunista, autoritário. Linda demonstração, mas que me parece limitar o alcance do ideal anarquista uma vez que indica que nos seria necessário aprender a combinar diversas lógicas. Mas por que não, realmente, um número sobre antropologia e anarquismo que permitisse medir o que nos resta de Clastres e aquilo que é preciso atualizar?



Valéry Rasplus: Você publicou em 2009 um número especial sobre a universidade em crise, mas o que acontece com a pesquisa?





Alain Caillé: Eu acredito que ela também está em crise. E notadamente no domínio que nos concerne, das ciências humanas e sociais. A hiper-especialização leva, nesse domínio, a um insignificante crescimento (no sentido de Castoriadis) e esta hiper-especialização e esta insignificância são ainda mais acentuadas pela lógica devastadora da avaliação bibliométrica quantitativa do valor das pesquisas. Lógica fortemente contraproducente.



Valéry Rasplus: Com mais de trinta anos de reflexão sobre a dádiva e a contra-dádiva, o que podemos retirar de “útil”, hoje, desta prática de reciprocidade para nossa sociedade?





Alain Caillé: Voltando à questão precedente, o principal problema que se abate sobre nossas sociedades não é apenas a privatização generalizada, i.e., a submissão de todas as esferas de atividade a uma norma mercadológica e financeira hegemônica, mas, no turbilhão desta omnimercantilização e omnifinanceirização, a subordinação de todos os nossos atos a uma lógica da avaliação quantificada. Ora, esta lógica leva sistematicamente à concessão de um privilégio absoluto àquilo que os economistas chamam de as motivações extrínsecas, sobre as motivações intrínsecas. Motivações extrínsecas, aquelas que são indiferentes às especificidades da ação particular: a busca de uma remuneração, do poder ou do prestígio. Motivações intrínsecas, aquelas que dependem da especificidade do domínio da atividade: tudo aquilo que se faz pelo senso de dever, por amizade ou compaixão, por prazer pela ação em questão (fazer pesquisa, escrever, brincar etc.), ou seja, pelo espírito da dádiva. Se esta evolução chegasse ao fim, então nada mais teria sentido. Tudo aquilo que dá valor à vida, i.e., as coisas sem preço, seria reabsorvido e dissolvido em utilidade e instrumentalidade. Que podemos reter dessas considerações para nossas sociedades? O sentido de utilidade do inútil, sem dúvida. Mais especificamente: nossa democracia terá se baseado em fundamentos utilitaristas – os indivíduos se agrupando em sociedade apenas em vista de sua própria vantagem – e sobre a perspectiva de um crescimento econômico infinito. Esta perspectiva não é mais crível. É preciso então imaginar à democracia fundamentos anti ou supra-utilitaristas, i.e., que dão toda sua carga e todo seu valor às motivações intrínsecas da ação. É nesse sentido que nós advogamos, Marc Humbert, Serge Latouche, Patrick Viveret e eu, pelo futuro de um convivialismo, de uma arte de viver juntos, “se afrontando sem se massacrar”, como dizia Mauss, que se apresentaria como o digno sucessor do liberalismo, do comunismo e do socialismo (e do anarquismo).



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CAILLÉ, Alain. 10 questões para Alain Caillé : entrevista concedida à Valéry Rasplus. Tradução de Maíra Albuquerque. Nouvel Obs Blogs. Publicada em 01 de março de 2011. Disponível em : .





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* Tradução de Maíra Albuquerque



[1] NT: No original, Les Trente Glorieuses. Termo cunhado por Jean Fourastié para designar o período que sucedeu a Segunda Guerra Mundial, entre 1945 e 1975, na França. Este período foi marcado por um crescimento rápido da população combinado com prosperidade econômica, alta produtividade, alto consumo e pela criação de um sistema de benefícios sociais altamente desenvolvido.



[2] Sobre o eixo da liberdade, nós buscamos, acredito, o bom equilíbrio entre liberdade individual e liberdade coletiva. Sobre o da solidariedade, o com equilíbrio entre a solidariedade entre os vivos, os mortos e as gerações futuras, assim como com a natureza e as culturas, compreendidas em sua diversidade.

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Conjur - Na ausência de sucumbencial, honorário contratual deve ser acrescido

Conjur - Na ausência de sucumbencial, honorário contratual deve ser acrescido: "Artigos
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Perdas e danos
Sem sucumbência, honário contratual deve ser acrescido
Por Tiago Augusto de Macedo Binati

Nunca nos pareceu razoável que aquele que se viu obrigado a socorrer-se do Poder Judiciário e teve parte de seu patrimônio destinado ao pagamento de honorários devidos ao advogado, obtendo sucesso na demanda, ou seja, reconhecido seu direito, seja restituído apenas parcialmente, pois do montante total que obteve, teve que destacar parte para pagar os honorários contratuais de seu advogado.

Tal pretensão era frequentemente negada e vista com maus olhos por parcela considerável dos magistrados, por entenderem que abririam brechas para oportunistas, que se utilizariam de tal expediente de forma ardilosa, obtendo o enriquecimento sem causa.

Contudo, ao que parece, tal posicionamento tende a mudar motivado por entendimento que já vem se sedimentando no Superior Tribunal de Justiça.

Recentemente, ao julgar recurso interposto por uma seguradora (REsp 1.134.725-MG), não pela primeira vez, o Superior Tribunal de Justiça confirmou a responsabilidade daquele que deu causa à propositura da ação em arcar integralmente com os honorários contratuais do advogado da parte contrária, que se sagrou vencedora na ação.

A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, destacou a previsão legal no sentido de que os honorários advocatícios integram os valores relativos à reparação por perdas e danos, e que os honorários sucumbenciais, por constituírem crédito autônomo do advogado, não importam em decréscimo patrimonial do vencedor da demanda. Assim, como os honorários convencionais são retirados do patrimônio da parte lesada, para que haja reparação integral do dano sofrido, aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos com os honorários contratuais.

E justamente para evitar o que temiam os mais tradicionalistas, acrescentou a Ministra que, embora os honorários convencionais componham os valores devidos pelas perdas e danos, o valor cobrado pela atuação do advogado não pode ser abusivo. Sendo exorbitante o valor dos honorários contratuais, ponderou a Ministra, o juiz poderá, analisando as peculiaridades do caso, arbitrar outro valor, tendo como parâmetro, inclusive, a tabela de honorários da Ordem dos Advogados do Brasil, que permite a cobrança de honorários entre 20 e 30% do êxito obtido.

No caso em específico do citado julgado (REsp 1.134.725-MG), o juiz singular negou a pretensão de ressarcimento dos honorários contratuais, o que foi reformado pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais e cuja decisão foi, por fim, confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça. O Tribunal de Justiça, ao analisar o caso, ponderou que “tocando à seguradora a causa motivadora de cobrança judicial, porquanto inerte no pagamento de indenização contratualmente prevista, impõe-lhe ressarcir honorários advocatícios para este fim contratados pelo segurado”. Percebe-se, assim, a aplicação do Princípio da Causalidade, através do qual aquele que deu causa a ação responde integralmente pelas despesas dela decorrentes, inclusive honorários contratuais do advogado, indispensável à administração da justiça.

E o mesmo entendimento foi adotado pela eminente Ministra Nancy Andrighi, que assim expôs em sua fundamentação:

“O Código Civil de 2002 – nos termos dos arts. 389, 395 e 404 – determina, de forma expressa, que os honorários advocatícios integram os valores devidos a título de reparação por perdas e danos.

Os honorários mencionados pelos referidos artigos são os honorários contratuais, pois os sucumbenciais, por constituírem crédito autônomo do advogado, não importam em decréscimo patrimonial do vencedor da demanda.

Assim, como os honorários convencionais são retirados do patrimônio da parte lesada – para que haja reparação integral do dano sofrido – aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos com os honorários contratuais”.

Tão aplaudível decisão, expõe a necessidade de se prestigiar os princípios da restituição integral, da equidade e da justiça, atribuindo àquele que deu causa ao processo, o dever de arcar com os honorários do advogado contratado pela parte contrária, não permitindo, desta forma, que a parte que tem razão, sofra prejuízo por se ver obrigada a custear uma demanda que teve origem na inadimplência ou no cometimento de um ato ilícito.

Vejamos a ementa conferida ao julgado em comento:

101000134597 - CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - VALORES DESPENDIDOS A TÍTULO DE HONORÁRIOSADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS - PERDAS E DANOS - PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL - 1- Aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra parte com os honorários contratuais, que integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389 , 395 e 404 do CC/02 . 2- Recurso especial a que se nega provimento. (STJ - REsp 1.134.725 - (2009/0067148-0) - 3ª T. - Relª Minª Nancy Andrighi - DJe 24.06.2011 - p. 1904)

O mesmo entendimento já tinha sido aplicado em outros julgados proferidos no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, v.g., no REsp 1.027.797/MG, cujo julgado restou assim ementado:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO E SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. VIOLAÇÃO DA COISA JULGADA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. HONORÁRIOS CONVENCIONAIS. PERDAS E DANOS. PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO CIVIL.

1. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. 2. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico entre acórdãos que versem sobre situações fáticas idênticas. 3. A quitação em instrumentos de transação tem de ser interpretada restritivamente. 4. Os honorários convencionais integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos artigos 389, 395 e 404 do CC/02. 5. O pagamento dos honorários extrajudiciais como parcela integrante das perdas e danos também é devido pelo inadimplemento de obrigações trabalhistas, diante da incidência dos princípios do acesso à justiça e da restituição integral dos danos e dos artigos 389, 395 e 404 do CC/02, que podem ser aplicados subsidiariamente no âmbito dos contratos trabalhistas, nos termos do artigo 8º, parágrafo único, da CLT. 6. Recurso especial ao qual se nega provido. (STJ – Resp 1.027.797 – Relª Minª Nancy Andrighi - DJ 23/02/2011)

Contudo, mesmo ante o entendimento hodiernamente adotado pelo STJ quanto a matéria, ainda se percebe, ao menos por enquanto, a relutância dos magistrados singulares em aplicarem o entendimento aqui exposado.

E o assunto ora tratado toma contornos ainda mais relevantes quando a demanda em questão é proposta perante a Justiça do Trabalho ou no Juizado Especial, onde inexiste condenação nos chamados honorários sucumbenciais, que são aqueles comumente fixados na justiça cível em que o juiz, mediante sua exclusiva valoração, atribui um valor ao trabalho desenvolvido pelo advogado e que deve ser suportado pela parte sucumbente, ou seja, àquela que teve seu pedido julgado improcedente.

Percebe-se, pois, que os honorários advocatícios provenientes da sucumbência não se confundem com os honorários contratuais, esse último, uma das formas de ressarcimento por perdas e danos oriundas do inadimplemento de uma obrigação, ou seja, os honorários contratuais objetivam recompor os prejuízos amargados pelo lesado em razão da contratação de advogado para patrocinar a sua demanda em busca do cumprimento forçado da obrigação não satisfeita tempestivamente ou a contento. Da mesma forma deverá ser ressarcido aquele que foi demandado em juízo e, para tanto, teve que contratar advogado para contrapor pedidos que não se fizeram devidos.

Ora, aquele que injustificadamente move a máquina judiciária e não obtém êxito em seu desiderato, deve sim arcar com todas as despesas que deu causa, e isso está expresso no Código Civil de 2002, tal como se observa com a redação outorgada aos artigos 389, 395 e 404 do novel diploma legal, os quais pedimos vênia para colacioná-los. Vejamos:

Artigo 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Artigo 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.

Artigo 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Vale analisarmos citados dispositivos legais.

O artigo 389, de clareza ímpar, deixa evidente que aquele que deu causa a propositura da ação (inadimplemento da obrigação), responde por perdas e danos mais juros, multa e honorários de advogado. E ao comentar o artigo em testilha, assim expõe o aplaudível doutrinador Nelson Nery Júnior, cujo escólio pedimos vênia para colacionar e facilitar a compreensão da controvérsia. Nesse sentido:

“2. Inadimplemento da obrigação. É o não cumprimento dos deveres obrigacionais por aquele que tinha o dever de fazê-lo. [...] A conseqüência teoricamente normal para o inadimplemento é responder o inadimplente por perdas e danos.”

Já para Judith Martins-Costa,

“o termo “inadimplemento” não indica o não-cumprimento, (a) pelo devedor, das normas que impõem o dever de prestar ao credor, no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer”.

E prossegue afirmando:

“Em sentido amplo se pode dizer que o inadimplemento é a situação objetiva de não-realização da prestação devida e de insatisfação do interesse do credor, independentemente da causa da qual a falta procede.”

Vale trazermos a análise, em contrapartida, a definição de obrigação segundo Clóvis Bevilaqua, para qual

“é a relação transitória de direito, que nos constrange a dar, fazer ou não fazer alguma coisa economicamente apreciável, em proveito de alguém, que, por ato nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado, ou em virtude de lei, adquiriu o direito de exigir de nós essa ação ou omissão”.

E a ideia de cumprimento da obrigação está intimamente ligada à boa-fé, eis que a inadimplência voluntária de uma obrigação gera, por óbvio, prejuízos a terceiros, notadamente ao credor da obrigação, sendo que se a inadimplência desta enseja a necessidade da parte lesada em socorrer-se do Poder Judiciário, tendo, para tanto, que contratar advogado para esse desiderato, evidente que cabe ao inadimplente da obrigação o ônus de arcar com os honorários do causídico, justamente por ter dado causa a propositura da ação, evitando, desta forma, o prejuízo imotivado da parte prejudicada pelo não cumprimento pontual da obrigação assumida.

Esse descumprimento da obrigação assumida enseja, como já dito, prejuízo ao credor da obrigação, o que se evidencia como dano, eis que, para ver seu direito amplamente tutelado, a parte teve diminuição em seu patrimônio, pois teve que contratar advogado. E mais uma vez pedimos vênia para citar a eminente doutora em Direito, Judith Martins-Costa, que com maestria assim expõe:

“Tradicionalmente, a noção de dano estava limitada à ideia de diminuição do patrimônio delineando, assim, uma noção meramente naturalista. Nos meados do séc. XX, Polacco, citado por Agostinho Alvim, assim o definia: “Dano é a efetiva diminuição do patrimônio e consiste na diferença entre o valor atual do patrimônio do credor e aquele que teria se a obrigação fora exatamente cumprida””.

Ora, se o dano é a efetiva diminuição do patrimônio, por óbvio, aquele que se vê obrigado a contratar advogado para buscar o adimplemento forçado da obrigação não cumprida tempestivamente ou a contento, sofre dano em seu patrimônio, visto que mesmo sagrando-se vencedor na demanda, seu patrimônio não será totalmente recomposto, pois uma parcela foi destinada ao pagamento dos honorários contratuais ajustados com seu advogado.

Assim, aquele que teve seu veículo atingido por terceiros, por exemplo, e teve negado pedido extra-judicial de ressarcimento, tendo que ingressar com ação para reaver o valor despendido e optando pelo Juizado Especial Cível, onde inexiste condenação em honorários sucumbenciais em primeiro grau, deverá incluir em seu pedido, além do valor passível de restituição pelos danos causados ao veículo, também o valor gasto com honorários de advogado, permitindo, desta forma, a reparabilidade integral do dano.

É o que se depreende, também, da mais tradicional doutrina, conforme escólio da já citada Judith Martins-Costa:

“É efeito do inadimplemento imputável o dever de reparar o prejuízo causado. É também efeito do inadimplemento imputável, quando definitivo, possibilitar o exercício do direito formativo extintivo de resolução, matéria tratada no artigo 475 ou, quando for o caso, dar ensejo à execução coativa, também acompanhada por perdas e danos”.

O artigo 395, por sua vez, deixa claro que o devedor responde pelos prejuízos que der causa, inclusive honorários do advogado.

Aquilatando a questão, temos ainda a redação outorgada ao Artigo 402, onde resta cristalino que as perdas e danos abrangem, além do que a parte deixou de lucrar, aquilo que ela efetivamente perdeu (danos emergentes), como o pagamento pelos honorários contratuais do advogado.

Ora, a finalidade precípua do instituto das perdas e danos, que surge com o inadimplemento da obrigação, é, segundo fórmula clássica, “recolocar a vítima na situação em que ela se encontraria se o prejuízo não tivesse sido produzido”.

Assim, no caso daquele que busca a Justiça do Trabalho, em especial, se as verbas que lhe eram devidas fossem pagas por seu empregador como manda a lei, a movimentação da Justiça seria desnecessária, assim como seria desnecessária a contratação de advogado. Portanto, quem deu causa a ação, no caso, o empregador, deve ser responsabilizado pelo pagamento integral dos honorários convencionados entre o trabalhador, que se viu obrigado a buscar a intervenção judiciária, e seu advogado, mesmo sem que seja obrigatório o acompanhamento por advogado.

E isso, pois nem mesmo a regra inserta no artigo 791 da Consolidação das Leis do Trabalho, a qual autoriza os empregados e empregadores a “reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho e acompanhar as suas reclamações até o final” afasta a procedência de tal pretensão, eis que a norma invocada outorga uma opção à parte que busca a Justiça Laboral, e não uma obrigação.

Até porque, face a complexidade do exercício da advocacia, notadamente na Justiça do Trabalho, onde há um extenso arcabouço jurídico que regula a matéria e que se estende a entendimentos jurisprudenciais, súmulas, enunciados, etc., exigir que o leigo e injustiçado busque tutelar seus direitos sem o patrocínio de um advogado, é o mesmo que não lhe dar condições técnicas de ver a justiça feita, ou ainda, admitir que litigue em absoluta disparidade de armas.

Pondo fim a qualquer discussão, insta frisar que a Constituição da República dispõe, em seu artigo 133, que o advogado é indispensável à administração da justiça, não estando, a Justiça do Trabalho, alheia a essa indispensabilidade. O mesmo se diga no âmbito dos Juizados Especiais.

Já quanto ao princípio da causalidade, motivador da pretensão reparatória aqui exposada, este dispõe que aquele que deu causa à propositura da ação deve responder pelas despesas daí decorrentes. Segundo escólio de Nelson Nery Júnior, isso se dá porque “às vezes, o princípio da sucumbência se mostra insatisfatório para a solução de algumas questões sobre responsabilidade pelas despesas do processo”. Ora, o processo não pode reverter em dano àquele que tem razão.

O próprio artigo 20 do Código de Processo Civil deixa clara a diferenciação entre os honorários sucumbenciais, arbitrados pelo juiz e por direito, devidos ao advogado, e as demais despesas processuais, entre elas, por óbvio, a contratação do advogado, por ser essa, sem dúvidas, uma despesa antecipada pela parte que necessitou mover a máquina judiciária.

Nelson Nery Júnior, ao esclarecer o que são despesas processuais, ensina que “são todos os gastos necessários despendidos para fazer com que o processo cumpra sua finalidade ontológica de pacificação social”. E como despesas processuais são todos os gastos tidos para se atingir o adimplemento de uma obrigação não cumprida a contento, os honorários contratuais não fogem de tal definição.

Portanto, com a devida vênia aos que pensam de forma diferente, defendemos que todo aquele que se viu obrigado a contratar um advogado para ingressar com uma ação ou para exercer seu direito de defesa, e se sagrou vencedor na ação, notadamente perante a Justiça do Trabalho ou o Juizado Especial, onde inexiste condenação em honorários sucumbenciais, tem o direito de acrescer à seu pedido as perdas e danos sofridas, estando, os honorários contratuais, perfeitamente enquadrados em tal hipótese, o que, conforme exposto, vem sendo – corretamente, é bom que diga -, acatado pelo Superior Tribunal de Justiça, guardião maior da legislação federal.

Bibliografia
Beviláqua, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil. 3ª ed., Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1930, Tomo IV, p.6.

Martins-Costa, Judith, 1952 – Comentários ao novo Código civil, volume V, tomo II, do inadimplemento das obrigações. / Judith Martins-Costa. – Rio de Janeiro: Forense, 2004.

MOLINA, André Araújo. Honorários advocatícios na Justiça do Trabalho: nova análise após a Emenda Constitucional nº 45/2004. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 740, 15 jul. 2005. Disponível em:. Acesso em: 6 jul. 2011.

Moraes, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional / Alexandre de Moraes. – 8. ed. atualizada atá a EC n° 67/10 – São Paulo: Atlas, 2011.

Nery Junior, Nelson. Código civil comentado / Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery. – 7. ed. rev., ampl. e atual. até 25.8.2009. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2009.

Nery Junior, Nelson. Responsabilidade civil, v. 1 – Teoria geral / Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery, organizadores. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2010.

Venosa, Sílvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos / Sílvio de Salvo Venosa. – 11. ed. – São Paulo : Atlas, 2011.

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terça-feira, 5 de julho de 2011

Blog de Ricardo Noblat: colunista do jornal O Globo com notícias sobre política direto de Brasília - Ricardo Noblat: O Globo

Blog de Ricardo Noblat: colunista do jornal O Globo com notícias sobre política direto de Brasília - Ricardo Noblat: O Globo: "Decálogo da Boa Ética

O governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, encomendou um código de conduta para ele respeitar nas suas relações com empresários e poderosos em geral. É com o único propósito de colaborar com Vossa Excelência que apresento as sugestões de um colaborador oculto deste blog:

I

O governante deve obrigar-se à leitura, durante ao menos uma hora por semana, de “Ética a Nicômacos” de Aristóteles, “A Moralidade da Liberdade” de Joseph Raz, “O Paradoxo da Moral” de Vladimir Jankélévitch ou “A Arte de Furtar”, de anônimo do século XVIII, e elaborar resumo semanal da matéria lida, que será incorporado ao acervo do Arquivo Público.

II

Caso o governante use a frase “eu não sabia”, quando da divulgação de escândalos no seu governo, deve submeter-se a um detector de mentiras, cujo resultado será levado a conhecimento público, sem prejuízo da obrigação de ler em voz alta, sem gaguejar, na sala de audiências públicas, ao menos uma poesia de “O Livro das Ignorãças” de Manoel de Barros.

III

O governante deve editar decreto obrigando a aposição, em todas as repartições públicas, de placa alusiva ao dever da moralidade dos agentes políticos e dos servidores, conforme estabelece o art. 37 da Constituição.

IV

O governante fica proibido de usar veículo terrestre, aéreo, marítimo, fluvial ou lacustre de propriedade de terceiros, ressalvadas as hipóteses de emergência médica ou carro fúnebre.

V

O governante que ocultar patrimônio ao fisco, à Justiça Eleitoral ou à Administração Pública, sujeitará o bem ocultado à expropriação judicial não onerosa, devendo o bem ser doado para fins de assentamento de pessoas sem-terra ou sem-teto, conforme tratar-se de, respectivamente, imóvel rural ou urbano.

VI

O governante deve divulgar sua agenda de audiências, identificando, claramente, se o demandante da audiência foi doador da campanha eleitoral ou se é beneficiário de incentivo fiscal ou participante de algum procedimento licitatório, sob pena de ser obrigado a recitar, em praça pública, a letra de “Atire a Primeira Pedra”, de Mário Lago e Ataulfo Alves ou de “Um Otário pra Bancar”, da Gaiola das Popozudas, sem prejuízo de outras cominações civis e penais.

VII

O governante deve deserdar e repudiar publicamente filho ou filha que receber qualquer tipo de vantagem de concessionário de serviço público, beneficiário de incentivo fiscal ou vencedor contumaz de licitações.

VIII

O governante fica impedido de conceder benefício fiscal ou aprovar licitação de pessoa jurídica ou física que tenha contribuído para sua campanha eleitoral, sob pena de ressarcir o erário com o valor correspondente à doação eleitoral com aplicação de multa de 250%, sem prejuízo da obrigação de cantar, em rádio de grande audiência no horário comercial, a música “Errei Sim”, de Pixinguinha e João de Barro, imitando a voz de Dalva de Oliveira, ou, em caso de reincidência, “Errei Denovo” de Largados na Rua, com coro familiar.

IX

O governante, antes de nomear qualquer auxiliar direto, deve verificar suas atividades anteriores, nomeadamente a realização de consultorias ou prestação de serviços de qualquer natureza a quem tem interesse em decisões de governo, sob pena de cumplicidade.

X

O governante, no ato da posse, deve assinar documento público em que se compromete a não alegar falta de formação escolar ou educação doméstica, ou ainda demência para praticar atos em desacordo com a ética, bem como que consegue fazer a distinção, sem ajuda de terceiros, entre atos éticos e não éticos.

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Folha de S.Paulo - Maquiagem infla gastos com saúde em R$ 12 bilhões - 04/07/2011

Folha de S.Paulo - Maquiagem infla gastos com saúde em R$ 12 bilhões - 04/07/2011: "Maquiagem infla gastos com saúde em R$ 12 bilhões

Estados usam despesas de outras áreas para cumprir exigência constitucional

Prestações de contas entregues a ministério incluem investimentos em presídios, educação e até aposentadorias

DANIELA LIMA
MARIANA SCHREIBER
DE SÃO PAULO

Estados maquiaram seus investimentos em saúde pública nos últimos anos declarando quase R$ 12 bilhões gastos com reformas de presídios, aposentadorias de funcionários públicos e outras atividades como se tivessem sido aplicados no setor.
A emenda constitucional 29, aprovada pelo Congresso no ano 2000, determina que os Estados invistam no sistema público de saúde no mínimo 12% de suas receitas, mas a maioria não cumpre a legislação e tem inflado as prestações de contas entregues ao governo federal.
Despesas com ensino superior, obras de saneamento básico e financiamento habitacional também foram apresentadas como investimentos em saúde, de acordo com o Ministério da Saúde.
Os 27 Estados declararam gastos de R$ 115 bilhões com saúde de 2004 a 2008. Depois de examinar suas prestações de contas, o ministério concluiu que R$ 11,6 bilhões se referiam a despesas com outras áreas, que não poderiam ser usadas para cumprir a lei.
Esse dinheiro corresponde a 10% dos gastos informados pelos Estados nesses cinco anos e seria suficiente para manter por um ano 13 ambulâncias do SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) em cada um dos 5,5 mil municípios do país.

REGULAMENTAÇÃO
Como a emenda 29 não foi regulamentada até hoje pelo Congresso, não existe na legislação uma definição clara do tipo de ação governamental que pode ser classificada como ação de saúde. É por isso que os Estados encontram brechas para driblar o cumprimento da Constituição.
Deputados da base governista se mobilizaram nas últimas semanas para pôr em votação na Câmara um projeto de lei que trata do assunto, mas o governo é contra a iniciativa, porque ela poderá provocar um aumento nos repasses de verbas da União para Estados e municípios.
'Tem cidade em que até o asfalto na frente do hospital é computado como gasto em saúde', disse o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), presidente da Frente Parlamentar da Saúde, grupo de políticos ligados ao setor.
O Ministério da Saúde identificou problemas nas contas de todos os Estados em 2008. Treze conseguiram cumprir a emenda 29 mesmo após abater gastos com outras áreas. O governo ainda não analisou as prestações de contas de 2009 e 2010.
Em 2008, Minas Gerais computou como despesas de saúde o pagamento de aposentadorias e pensões de servidores e repasses para um fundo que financia casas para funcionários da Assembleia Legislativa do Estado.
Minas declarou ter gastado R$ 2,7 bilhões com saúde em 2008, o equivalente a 13% de suas receitas. O governo federal desconsiderou R$ 835 milhões, reduzindo as despesas do Estado com o setor para 8,6%. O governo mineiro informou que contabiliza suas despesas conforme critérios definidos pelo Tribunal de Contas do Estado.
Os gastos do Rio Grande do Sul com saúde em 2008 caíram de 12% para 4% da receita depois que a prestação de contas do Estado foi revista pelo Ministério da Saúde. Até despesas com um programa de prevenção da violência fora classificado pelo Estado como ação de saúde.
'Era feita uma maquiagem', disse o atual secretário estadual de Saúde, Ciro Simoni. 'Ano que vem não vai poder mais.' Ele promete cumprir a emenda 29 até 2014, mas para atingir a meta será preciso dobrar o orçamento de sua secretaria, que tem R$ 1,2 bilhão neste ano.

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Gerivaldo Neiva - Juiz de Direito

Gerivaldo Neiva - Juiz de Direito: "CNJ + PJe = $0,00 ≠ TJBa + SAJ = $39mi: Decifra-me ou devoro-te...
Édipo e a Esfinge - Augusto Dominique Ingres (1808), Paris.


Para entender o enigma acima, primeiro, leia isto:

O Tribunal de Justiça da Bahia apresentou aos juízes baianos, na última sexta-feira (10/06), o Sistema de Automação da Justiça (SAJ). Trata-se de um sistema desenvolvido pela empresa Softplan e adquirido pelo TJBa, com dispensa de licitação (Declaração de Inexigibilidade de Licitação nº. 18/11, publicada no Diário do Poder Judiciário de 18 de março de 2011), pelo “valor global estimado de R$ 39.082.000,00”, incluindo a implantação e suporte, conforme Instrumento de Contrato n° 17/11-S, publicado no Diário do Poder Judiciário de 06 de abril de 2011.
Segundo informações da Softplan, este sistema já está implantado em oito estados do país, representando mais de 60% dos processos que tramitam na justiça comum, em mais de 500 comarcas. Garante ainda a Softplan: 70% mais agilidade na tramitação de processos digitais em relação aos tradicionais, 90% de redução no tempo de atendimento a advogados e partes e 98% de redução no tempo de ajuizamento de processos de execução fiscal em meio eletrônico. Clique aqui para visitar o site da Softplan e conhecer mais sobre o SAJ. Leia mais...

Agora, leia isto:
Lançamento do Processo Judicial Eletrônico (PJe)
O Processo Judicial Eletrônico (PJe), sistema de informática desenvolvido pelo CNJ em parceria com os tribunais para a automação do Judiciário, foi lançado oficialmente em 21 de junho de 2011 pelo ministro Cezar Peluso, presidente do CNJ. No dia seguinte (22/06), presidentes de tribunais de todo o país participaram de uma apresentação detalhada do sistema e receberam um manual para auxiliar os técnicos na instalação dos software. O evento foi transmitido ao vivo pelo portal do CNJ e contou com 1.315 acessos, sendo 135 simultâneos. Além disso, 32 tribunais retransmitiram a apresentação via streaming aos seus servidores.
Entenda o PJe
O sistema Processo Judicial eletrônico (PJe) é um software elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a partir da experiência e com a colaboração de diversos tribunais brasileiros.
O objetivo principal do CNJ é manter um sistema de processo judicial eletrônico capaz de permitir a prática de atos processuais pelos magistrados, servidores e demais participantes da relação processual diretamente no sistema, assim como o acompanhamento desse processo judicial, independentemente de o processo tramitar na Justiça Federal, na Justiça dos Estados, na Justiça Militar dos Estados e na Justiça do Trabalho.
Além disso, o CNJ pretende convergir os esforços dos tribunais brasileiros para a adoção de uma solução única, gratuita para os próprios tribunais e atenta para requisitos importantes de segurança e de interoperabilidade, racionalizando gastos com elaboração e aquisição de softwares e permitindo o emprego desses valores financeiros e de pessoal em atividades mais dirigidas à finalidade do Judiciário: resolver os conflitos. Leia mais...
Acesse os arquivos do CD distribuído durante o evento.

Depois, leia isto:
(Ag. CNJ de Notícias, 22.06.2011) Os tribunais precisam elaborar seus planos para a implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJe), o sistema de automação do Poder Judiciário desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com os tribunais. O ideal é começar pelas capitais, que têm melhor infraestrutura, sugeriu, nesta quarta-feira (22/06), o conselheiro Walter Nunes da Silva Jr. na apresentação do sistema aos representantes dos tribunais.
O CNJ dará suporte técnico para a instalação do PJe, mas os tribunais também precisam ter suas próprias equipes técnicas para trabalhar na configuração e manutenção do sistema. Walter Nunes lembrou que o CNJ vem apoiando a modernização tecnológica dos tribunais, com a doação de equipamentos e capacitação de pessoal, de forma que todos tenham infraestrutura de tecnologia da informação para receber o PJe. O Conselho já investiu mais de R$ 180 milhões em equipamentos de informática que foram entregues aos tribunais. Leia mais..


Você entendeu alguma coisa?
Eu também não!
Mas que deve existir alguma explicação para este enigma, isto deve.

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Gerivaldo Neiva - Juiz de Direito

Gerivaldo Neiva - Juiz de Direito: "Isto é uma campanha educativa (“Crack, nem Pensar”) ou um filme de terror?

Diz em voz grave o locutor desse vídeo: “... O uso do crack pode provocar as piores consequências: dor, prostituição, roubo e assassinato são algumas delas...”
Este vídeo faz parte da campanha 'Crack, nem Pensar', promovida pelo CNJ, CNMP, TJs e Instituto Crack, nem Pensar
Na verdade, este tipo de campanha só serve para alimentar as agências de publicidade, inflar o ego dos governantes e iludir a opinião pública.
Ora, quem disse que o crack é a “causa” das “consequências” (dor, prostituição, roubo, assassinato...), não conhece nem um palmo da realidade das periferias das grandes cidades desse país.
Acordem! O uso do crack não é a causa do que a elite hipócrita desse país define como “violência urbana”, mas a consequência de séculos de miséria, pobreza e exclusão social. Por conta disso, não se combate as mazelas de um modelo social excludente e concentrador da riqueza com 'filmes de terror' sobre um drama social. Esta ideia é antiga, superada e comprovadamente inútil.
Ora, não seria melhor caminho estudar por que um jovem se torna dependente do crack, discutir soluções para essas causas e, sobretudo, impedir que novos jovens comecem a usar, do que culpá-los pelos males do mundo e ainda por cima produzir filmes de terror sobre este drama, usando personagens maquiados grosseiramente?
Campanhas assim são absolutamente inócuas e não servem para evitar que crianças e jovens sem sonhos, errantes no mundo, pobres e excluídos comecem a usar crack e, muito menos, vai recuperar os que já são dependentes.
Pior ainda: muda o foco do problema e transmite a falsa ideia de que roubos e assassinatos acontecem por causa dos dependentes do crack.
Como diz o Juiz Alexandre Morais da Rosa, quem livrará “da bondade dos bons” os adolescentes pobres e excluídos desse país, por séculos marginalizados, e agora dependentes do crack?


(veja outras fotografias, vídeos e cartilha no hotsite da campanha: http://www.cnj.jus.br/campanhas-page/14856-crack-nem-pensar

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Gerivaldo Neiva - Juiz de Direito

Gerivaldo Neiva - Juiz de Direito: "Isto é uma campanha educativa (“Crack, nem Pensar”) ou um filme de terror?

Diz em voz grave o locutor desse vídeo: “... O uso do crack pode provocar as piores consequências: dor, prostituição, roubo e assassinato são algumas delas...”
Este vídeo faz parte da campanha 'Crack, nem Pensar', promovida pelo CNJ, CNMP, TJs e Instituto Crack, nem Pensar
Na verdade, este tipo de campanha só serve para alimentar as agências de publicidade, inflar o ego dos governantes e iludir a opinião pública.
Ora, quem disse que o crack é a “causa” das “consequências” (dor, prostituição, roubo, assassinato...), não conhece nem um palmo da realidade das periferias das grandes cidades desse país.
Acordem! O uso do crack não é a causa do que a elite hipócrita desse país define como “violência urbana”, mas a consequência de séculos de miséria, pobreza e exclusão social. Por conta disso, não se combate as mazelas de um modelo social excludente e concentrador da riqueza com 'filmes de terror' sobre um drama social. Esta ideia é antiga, superada e comprovadamente inútil.
Ora, não seria melhor caminho estudar por que um jovem se torna dependente do crack, discutir soluções para essas causas e, sobretudo, impedir que novos jovens comecem a usar, do que culpá-los pelos males do mundo e ainda por cima produzir filmes de terror sobre este drama, usando personagens maquiados grosseiramente?
Campanhas assim são absolutamente inócuas e não servem para evitar que crianças e jovens sem sonhos, errantes no mundo, pobres e excluídos comecem a usar crack e, muito menos, vai recuperar os que já são dependentes.
Pior ainda: muda o foco do problema e transmite a falsa ideia de que roubos e assassinatos acontecem por causa dos dependentes do crack.
Como diz o Juiz Alexandre Morais da Rosa, quem livrará “da bondade dos bons” os adolescentes pobres e excluídos desse país, por séculos marginalizados, e agora dependentes do crack?


(veja outras fotografias, vídeos e cartilha no hotsite da campanha: http://www.cnj.jus.br/campanhas-page/14856-crack-nem-pensar

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sábado, 2 de julho de 2011

A pantomima do hacker de Brasilia | Brasilianas.Org

A pantomima do hacker de Brasilia | Brasilianas.Org: "A pantomima do hacker de Brasilia
Enviado por luisnassif, sab, 02/07/2011 - 09:14

Repito: esse hacker não é peça solta. A intenção de transformá-lo em um espião solitário é cômoda, mas esconde a super-estrutura que havia por trás das tentativas de roubo de emails. Assim como outros jornalistas, enviei um email para o endereço de Dilma Rousseff na UOL. Duas horas depois o Google acusou tentativa de invasão de minha caixa postal.

Por esquiber

acker que abala a repúblicaPolícia Federal tenta enquadrar jovem da periferia de Brasília que invadiu os computadores da presidente, copiou 25 mil e-mails do ex-ministro José Dirceu e tentou vender as informações sigilosas para a oposiçãoLúcio Vaz



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O HACKER E O POLÍTICO
Douglas (acima) teria mostrado emails de figurões da República para o
presidente do DEM do DF, Alberto Fraga (abaixo), que manteve o crime sob sigilo

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Na sexta-feira 1º, o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, determinou uma missão a ser cumprida rapidamente pela Polícia Federal: apurar detalhes de como agiu e enquadrar criminalmente um hacker que tem deixado figurões da República em estado de alerta e também punir seus eventuais cúmplices. A última vítima das bisbilhotices eletrônicas do rapaz que se identifica como Douglas, diz morar em Taguatinga – cidade satélite de Brasília –, e que nos últimos dias vinha se gabando por ter invadido o computador da presidente Dilma Rousseff durante a campanha eleitoral do ano passado, é o ex-ministro José Dirceu. Segundo o colunista Guilherme Barros, do portal IG, 25 mil e-mails de Dirceu foram acessados e copiados pelo hacker. O ex-ministro descobriu que fora alvo da invasão na segunda-feira 27. “Eram 9 horas quando liguei o computador e o acesso ao correio eletrônico estava bloqueado”, disse o ex-ministro. “Liguei para o UOL (provedor) e soube que alguém havia usado meu CPF, meu RG e meu endereço e com isso alterou a senha e passou a ter acesso a todas as minhas mensagens”. Segundo Dirceu, os técnicos do provedor lhe informaram que a invasão ocorreu às 2h09 da segunda-feira 27 e durou cerca de sete horas. “Quando solicitei o número do telefone e o IP do computador de quem invadiu o sistema, me disseram que essa informação só pode ser fornecida com autorização judicial”, reclama o ex-ministro, que já escalou um grupo de advogados para tratar do caso. Na sexta-feira 1º, a direção do UOL informou que está fazendo investigações internas e que não iria se manifestar. “Ainda bem que em meus e-mails não há nada que não possa ser público”, afirmou o ex-ministro, ainda sem saber que essa não fora a primeira invasão feita em seus computadores.

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VÍTIMAS
A presidente Dilma e o ex-ministro Dirceu:
computadores invadidos e correspondência violada

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Já se sabe que o hacker procurou o ex-deputado Alberto Fraga, presidente do DEM do Distrito Federal, para vender sua muamba por R$ 300 mil. Antes, ele teria procurado líderes do PSDB e oferecido o material por um valor superior. O relato que Fraga faz do episódio é uma verdadeira aula de como figuras públicas são capazes de acobertar crimes, quando acreditam que podem se beneficiar deles. Fraga admitiu a ISTOÉ que recebeu e gravou telefonema do hacker no dia 9 de junho. O rapaz dizia ter cópias de e-mails comprometedores de figuras públicas. Qual a reação do líder partidário? Ao contrário do que se poderia esperar de um cidadão de bem, Fraga admite que gostou da história. “Venha até aqui”, respondeu ao rapaz. De fato, no dia 13, se encontrou com o vigarista na sede do Democratas, no Setor Comercial Sul, de Brasília. “Tenho e-mail da presidente Dilma. São uns 600”, disse Douglas, conforme o relato de Fraga. Então, o ex-deputado se empertiga e relata a razão de ter recusado a muamba: faltava-lhe imunidade para o crime. “Se eu tivesse mandato, faria a República tremer”, gaba-se Fraga, que diz ter lido algumas cópias dos e-mails de Dilma. “Mas, sem mandato, não vou entrar nessa canoa”. Mesmo assim, sem proteção assegurada, Fraga torna-se parceiro do crime. Ele contou para ISTOÉ, sem pedir sigilo, que “o mais grave” material do botim do hacker era um email enviado por Dilma para o presidente de um banco privado, que estava prestes a divulgar o resultado de uma pesquisa de opinião às vésperas da eleição. A então candidata, segundo Fraga, teria “evidenciado” que seria interessante se ela aparecesse na frente das pesquisas. “Se isso viesse à tona na época das eleições, seria desastroso para eles”, suspira do líder do DEM.

Além das mensagens da presidente, Fraga admite ter lido 12 e-mails de um total de 2.986 copiados do correio eletrônico de José Dirceu até aquele dia. Hoje ele até se encoraja a dar vazão à chantagem, tornando-se, de certo modo, um cúmplice dela: “Alguns dos e-mails do Zé Dirceu eram dirigidos ao ex-ministro Antônio Palocci e tratavam sobre tráfico de influência, valor de ações da Telebrás e palestras”, diz ele. Depois, sem qualquer resquício de lógica, o ex-deputado procura se diferenciar: “Nós e o PSDB não aceitamos os e-mails porque não fazemos política como os aloprados”. Ao final, porém, Fraga admite que acabou incentivando o crime: “Perguntei se ele tinha documentos recentes e ele respondeu que, se eu quisesse, poderia entrar a qualquer momento no computador da presidente”. A resposta de Fraga ao hacker foi mais um exemplo acabado de dissimulação, segundo seu próprio relato: “No meu gabinete, não!”, exclamou.

A gravação em poder do presidente do DEM do DF é uma prova concreta para que a PF cumpra sua missão. “Va­mos abrir inquérito, requisitar essa gravação que já poderia ter sido entregue à PF e enquadrar criminalmente todos os envolvidos”, afirmou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, na sexta-feira 1º.

http://www.istoe.com.br/reportagens/144812_UM+HACKER+QUE+ABALA+A+REPUBLICA

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