segunda-feira, 30 de março de 2015

Podemos tirar se achar melhor

Podemos tirar se achar melhor Juremir Machado da Silva - Correio do Povo | O portal de notícias dos gaúchos



Podemos tirar se achar melhor

Postado por Juremir em 28 de março de 2015 - Uncategorized
Nada como uma frase infeliz para fazer a
felicidade dos que esperam um pouquinho de verdade. Um lapso também
ajuda. As melhores frases dos últimos tempos foram do deputado gaúcho
Jorge Pozzobom (PSDB) e de um editor da agência de notícias Reuters.
Numa matéria sobre a corrupção no Brasil, baseada em entrevista com o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o jornalista referiu-se à
declaração do delator Pedro Barusco de que a roubalheira na Petrobras
começou na época do governo de FHC. O editor anotou, ao pé da frase,
para ser submetida ao entrevistado: “Podemos tirar se achar melhor”. Por
esquecimento, a zelosa observação foi publicada. A Reuters pagou mico.
Revelou o jornalismo sabujo que blinda alguns e detona outros. Quando se
trata de tucanos, esbravejam os petistas, predomina o “podemos tirar se
achar melhor”. Nada como ser rei ou amigo dele.


O sempre intenso deputado Jorge Pozzobom envolveu-se num bate-boca,
pelo twitter, com petistas. Lá pelas tentas, disse esperar que “alguém
que não seja ameaçado de morte ou morto como o Celso Daniel possa trazer
por delação a mega lista do PT”. Tomou uma dura. Respondeu assim ao
ex-secretário do governo Tarso Genro, Vinicius Wu: “Me processa. Eu
entro no Poder judiciário e por não ser petista não corro o risco de ser
preso”. Faz sentido. Muito sentido. O mensalão mineiro não foi julgado
até hoje. Manchete da Folha de S. Paulo diz: “Mensalão tucano está
parada em MG há um ano”. Falta juiz. A titular se aposentou. Fala sério,
Judiciário. A primeira denúncia contra o cartel do metrô de São Paulo,
envolvendo governos tucanos, foi recusada. Só a segunda foi aceita. Na
internet, circula um vídeo com um dos delatores citando Aécio Neves como
beneficiário de esquema irregular de financiamento de campanha. O
assunto não parece comover a justiça nem a mídia. Será uma invenção? Um
fake? Quem sabe! As frases da Reuters e do Pozzobom são legítimas. As
intenções, claro, são sempre outras.


A primeira impressão, porém, é que fica valendo.


Fico imaginando que Pozzobom poderia, depois de sua afirmação
controvertida, ter dito no twitter: “Falei a verdade, mas podemos tirar
se achar melhor”. Virou bordão. Serve para tudo, do noivo arrependido –
“colocamos as alianças, mas podemos tirar se achar melhor” – ao
treinador que escalou mal um jogador. Serve principalmente para os que
querem derrubar a presidente da República com um golpe nos moldes do que
foi executado em 1964: “O povo colocou Dilma lá no Planalto pelo voto,
mas podemos tirar se achar melhor”. A montagem do golpe é a mesma de
1964: toma a parte, que se manifesta, pelo todo, usa-se a mídia como
alavanca, pega-se a corrupção por pretexto e, como meio século atrás,
enfrenta-se a ameaça comunista.


Até a teoria do contragolpe voltou. As viúvas da ditadura dizem que
não houve golpe em 1964, mas um contragolpe. Essa aberração está sendo
disseminada agora. O golpe já teria acontecido, dado pelo PT. A
derrubada da presidente seria um contragolpe redentor. Uma moça me
explicou: “Dilma é muito ruim, mas podemos tirar se achar melhor”.


Disse que sou contra golpes. Ela me tirou da sua agenda golpista.


Curiosamente essas frases não chamaram a atenção da mídia que não tinha passar qualquer deslize dos agentes públicos.


Por que será?


TUDO EM CIMA

TUDO EM CIMA



 

Para advogado, ‘todos já estão condenados na Lava Jato’

Para advogado, ‘todos já estão condenados na Lava Jato’



ESTADÃO: O direito de defesa está sendo respeitado na Lava Jato?


OLIVEIRA LIMA: Não tenho a menor dúvida que no
momento oportuno será reconhecido pelos tribunais o cercamento da
defesa. Sempre digo que alguns juízes, promotores e jornalistas deveriam
figurar como réus em processos para entender a importância do direito
de defesa. O respeito sagrado a esse direito é fundamental para o Estado
Democrático de Direito.

'Quando dinheiro vem da corrupção, não há limites' - Política - Estadão

'Quando dinheiro vem da corrupção, não há limites' - Política - Estadão





http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,quando-dinheiro-vem-da-corrupcao-nao-ha-limites-imp-,1660402

domingo, 29 de março de 2015

A bizarra situação do ministro Levy na Operação Zelotes

A bizarra situação do ministro Levy na Operação Zelotes



A bizarra situação do ministro Levy na Operação Zelotes


Por que os bancos ganham tanto dinheiro?


Dias atrás, este foi um título de uma reportagem da BBC Brasil.
Tinham acabado de sair balanços bilionários de bancos brasileiros
relativos a uma temporada particularmente dura na economia nacional,
2015.


Bem, como deixa claro a Operação Zelotes, um dos motivos – aliás não citado pela BBC – é que os bancos sonegam muito.


Todo mundo sempre soube disso – exceto, aparentemente, a Receita Federal.


Algum tempo atrás, perguntei a um amigo meu que pertencia ao comitê
executivo da Abril por que a empresa contratara Fabio Barbosa, egresso
do setor financeiro.


“Para fazer planejamento fiscal”, ele imediatamente me respondeu.


Quer dizer: para sonegar. Planejamento fiscal é a versão empolada para o velho ato de sonegar.


A OZ é um embaraço geral. Mas particularmente, e ninguém parece ter
notado, é um enorme constrangimento para o ministro Joaquim Levy e o
governo Dilma.


Levy era diretor do Bradesco, pesadamente implicado no escândalo.


Bala perdida, você poderia alegar. Mas não. Pouco antes da OZ, o
Bradesco apareceu numa história milionária de evasão de impostos por
meio de um paraíso fiscal.


Isso não foi suficiente para evitar o convite nem a ele e nem, antes dele, a seu chefe, Trabuco, presidente do Bradesco.


Sabido que não há país que floresça com uma cultura de sonegação, o gesto de Dilma foi uma aberração.


Em todo o mundo, os governos estão publicamente agindo – e falando –
contra a sonegação das grandes companhias. Obama, Merkel, Cameron,
Hollande – todos eles se manifestaram.


Ninguém ouviu, até aqui, uma palavra de Dilma a esse respeito. É uma
pequena tragédia, sobretudo quando o governo tem a obrigação moral de
provar que o ajuste não vai ser feito apenas nas costas dos 99%.


E Levy, o que ele tem a dizer?


Quem conhece o universo corporativo sabe que decisões na área fiscal
que mexem com milhões ou bilhões de reais são tomadas na mais alta
esfera.


Como ministro, Levy tem que combater energicamente o que a companhia
da qual era um dos principais dirigentes fazia – ou faz – intensamente.


Terá Dilma conversado com ele sobre o assunto? Terá ela consciência
da ameaça à economia nacional representada pela cultura da sonegação que
vigora nas grandes empresas?


A OZ projeta luzes, também, sobre o pífio papel de fiscalização da Receita Federal.


Nos últimos tempos, me incomodava sempre o silêncio indefensável da Receita a respeito da sonegação da Globo.


Ninguém tem nada a dizer?


Agora, compreendo o mutismo. Altos funcionários da Receita estão
também sendo investigados pela OZ. Entre eles está o antigo secretário
geral – principal chefe – Otacílio Cartaxo.


A Receita precisa de um choque de tudo – a começar por transparência e eficácia.


Num país como o Brasil, o cargo de chefe da Receita pode ser mais importante do que o de ministro da Economia.


Esta é uma das lições da OZ.

A política e a perda do discurso ético - Brasileiros

A política e a perda do discurso ético - Brasileiros











A política e a perda do discurso ético

O filósofo Renato Janine Ribeiro mostra
como os avanços sociais do governo federal se deram apenas pelo
consumo, critica a falta de diálogo da presidenta Dilma Rousseff, o
projeto policialesco da oposição, a onipresença do Judiciário e muito
mais




















DILEMA – Para o filósofo, o eleitor de Dilma Rousseff está meio estupefato,
“sem saber se a medicina neoliberal vai funcionar ou não”




Renato Janine Ribeiro é um filósofo em
sintonia com o seu tempo. Professor titular de Ética e Filosofia
Política da Universidade de São Paulo, ele começou a carreira em meados
dos anos 1970, estudando o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679).
Não demorou a voltar-se para a reflexão e o debate sobre temas da
sociedade atual, o que agora faz em diferentes cenários – da academia às
redes sociais. Sem negar os avanços sociais registrados nos últimos 12
anos no Brasil, o filósofo lamenta que eles tenham se dado pela via do
consumo: “O grande flagelo ético do Brasil é a miséria. Se o PT batesse
nessa tecla o tempo todo e dissesse que está combatendo o problema,
teria uma imagem ética que poderia sobrepor à discussão de corrupção”.


Em um momento conturbado da política nacional, Janine Ribeiro critica
o isolamento da presidenta Dilma Rousseff, o excesso de protagonismo do
Judiciário e a postura da oposição: “Há toda uma crônica policial que
favorece o PSDB, assim como uma mídia que é simpática aos tucanos e
detesta o PT. Isso leva o PSDB a ter um projeto mais policial do que
político”. Para o filósofo, a proposta de impeachment
interessa à oposição “e, talvez, a uma parte da mídia”. Seja como for,
na sua opinião, o melhor seria Dilma Rousseff terminar o mandato em
condições razoáveis: “Qualquer outra coisa, seria dramático”.


Brasileiros – Como o senhor está vendo o momento político?


Renato Janine Ribeiro – Com muita preocupação. As eleições são
recentes e pelo menos quatro chefes do poder Executivo estão com
problemas sérios. A presidente da República e os governadores de São
Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul têm problema parecido, o descompasso
entre o que prometeram e o que estão fazendo. Em São Paulo, a questão é a
falta d’água. Alckmin alegou que não faltaria. No Paraná, o caso é mais
acentuado, porque o governador realmente entrou em choque com os
professores. Organizei inclusive um abaixo-assinado em apoio às
universidades estaduais.


Que mudanças o governador Beto Richa está fazendo?


Ele simplesmente cortou o dinheiro. Cortou a transferência de verbas
de custeio para algumas das principais universidades do Estado, como a
de Londrina. No geral, foram várias medidas. O fato é que, no Paraná, o
orçamento não está fechando. De alguma forma, em algum lugar, vai ter de
cortar.


E ele acaba de ser reeleito.


Assim como Dilma e Alckmin. São três casos de governantes reeleitos
que faltaram com o que prometeram. No Rio Grande do Sul é um pouco
diferente, porque o governador José Ivo Sartori é mais um personagem
folclórico, que se elegeu em um vazio político. A promessa implícita era
de honestidade, mas ele está demonstrando falta de cuidado no gasto
público. Um exemplo foi o uso de helicóptero para fazer um passeio.
Enfim, são quatro lugares com problema. E o problema se torna candente
no Paraná e na esfera federal.


Em São Paulo, a impressão que se tem é que nada pega em
Alckmin, como se a crise hídrica fosse descolada da figura do
governador.



Isso e os maus indicadores na Educação, na Saúde, em tudo mais. Nada
basta para que os paulistas enjoem de um partido que não cumpriu o que
prometeu. O PSDB sempre prometeu competência, qualidade de gestão. E
depois de 20 anos seguidos de gestão em São Paulo deu esse problema.


Tem uma explicação para isso?


É difícil estabelecer, fora o fato de o Estado de São Paulo ter se
tornado muito fortemente antipetista. Nesse sentido, qualquer crítica
que tiver cheiro de esquerda é desqualificada. Não pega por uma questão
ideológica, contrária ao PT. Qualquer sugestão na direção do PT não é
sequer escutada por uma boa parte da população.


Esse fenômeno não ocorre em todo o Brasil? Não há um fortalecimento da direita?


Há o fortalecimento da direita, mas não é igual. No Nordeste, a
partir da Bahia, não é assim. No próprio Estado de Minas, que elegeu um
governador do PT, não é assim. Esse fenômeno está concentrado sobretudo
em São Paulo, no Paraná, em alguns Estados que deram vitória muito clara
a Aécio Neves. Não é um fenômeno nacional, embora seja verdade que,
mesmo nos Estados em que o PT teve maior votação, uma parte
significativa do empresariado é contra o PT.


Como é esse avanço?


A direita tem avançado em boa parte por causa da pouca disposição da
esquerda em fazer o enfrentamento de ideias. E isso não se faz postando
no Facebook fotos de Hugo Chávez de manhã à noite. A pessoa tem de
conquistar quem discorda dela ou está indeciso. Não tem de ficar
reforçando a própria turma. Hoje, na política brasileira, tucano fala
para tucano, petista fala para petista. Ninguém convence ninguém. Com
isso, se destrói um dos elementos básicos da política, que é a
persuasão.


O movimento a favor de um impeachment está crescendo de forma perigosa?


O único lugar que as pessoas saíram à rua, em massa, protestando,
pressionando, foi o Paraná, contra o governador. Lá, um Estado muito
conservador, os professores tiveram, inclusive, a iniciativa de irem à
casa dos deputados que eles elegeram e que apoiam Richa para cobrar
deles uma posição. O caso federal é bem diferente, porque não tem uma
mobilização nas ruas comparada à do Paraná. Pelo menos, não por
enquanto. E o segundo ponto é que, a presidenta ou presidente, como
quiser, Dilma não deu satisfação a ninguém.


Esse é um problema.


Esse é o grande problema. Porque Richa e os seus, de alguma forma,
estão falando. Não convencem, mas estão falando. Agora, no plano
federal, o PT não está dando nenhuma satisfação.


É um problema de comunicação ou é deliberado?


Deliberado não é, mas não é apenas uma questão técnica. Assessor ruim
eles têm. Isso é óbvio. Só um maluco cumprimentaria a Beija-Flor no
perfil oficial da Dilma, como foi feito. Falasse sobre o Carnaval da
Bahia, falasse de Norte a Sul. É muito simples. Bastava ter alguma
inteligência.


A escola com patrocínio da ditadura de Guiné Equatorial.


Na verdade, é uma concepção de governo que não precisa prestar contas
à sociedade. É isso que a Dilma está mostrando. Uma concepção de
governo muito inquietante, porque é, no limite, autoritária. Adota as
medidas que precisam ser adotadas, mas não explica. E não explica por
que prometeu fazer uma coisa e está fazendo o contrário.


É o que aconteceu na reorientação da política econômica?


Isso. Os cortes nos programas sociais também poderiam ter sido
explicados. A questão do defeso, da compensação para o pescador no
período em que ele não pode trabalhar. Poderia ter explicado que o
defeso é alvo de muita fraude. Poderia ter colocado isso mais a público.
Não colocou. Não há nenhuma satisfação sendo dada. E os ministros
continuam tendo as orelhas puxadas cada vez que falam uma coisa de que
ela não gosta. Não há autonomia dos ministros.


De nenhum deles?


Os ministros com mais autonomia são o Joaquim Levy e o Juca Ferreira.
O primeiro justamente por ser quase uma intervenção tucana na economia,
um símbolo do descumprimento da promessa de campanha. O segundo está em
uma pasta para mim fundamental, mas não para o governo, que é o
Ministério da Cultura. Mas Juca Ferreira tem força no meio cultural que
dá a ele grande autonomia. Como ele maneja um orçamento pequeno,
comparado com o resto, provavelmente não vai levar puxão de orelha. Os
outros ministros correm o risco de terem a orelha puxada o tempo todo. O
que torna difícil para eles irem a público. Vão defender o quê? De
repente, muda tudo. Defendem o governo e recebem uma correção de cima.


Ao mesmo tempo, o PMDB parece estar cada vez mais forte,
independente, até mesmo chantageando. O vice-presidente Michel Temer já
avisou que não tem controle sobre o partido.



São várias coisas. Se Dilma conversasse com Temer e Lula, ela
certamente teria mais apoio. A sensação é que a presidente se isolou
muito, que ela não conversa com gente de peso. Temer tem peso
institucional. O ex-presidente Lula tem a força carismática, a
popularidade, inclusive no meio empresarial. Por outro lado, o PMDB
conta hoje com os três sucessores constitucionais à Presidência da
República: o vice-presidente, o presidente da Câmara dos Deputados e o
presidente do Senado Federal. Não se esperava isso. Então, o PMDB está
adquirindo força só pelo vazio que o PT está deixando na política. O PT
desocupou o espaço que tinha. Não desocupou com Dilma porque ela não
gosta de política. O PT começou a esvaziar com Lula.


Quando?


No começo de 2003. Uma das primeiras medidas que Lula fez votar foi a
Reforma da Previdência, que nunca foi do programa do PT. Isso levou à
saída dos que depois formaram o PSOL. Começou um processo em que o PT
parou de ter um discurso, em que o presidente do PT é uma pessoa que
fica em segundo, terceiro plano. É mais importante ser ministro de uma
pasta secundária do que presidir o PT, ou ser líder do governo no Senado
ou na Câmara. Quer dizer, os cargos essencialmente políticos foram
sendo esvaziados em favor do ministério.


O que o partido defendia não era compatível com o que é possível fazer no Executivo?


Esse é um dos lados da questão. Mas poderia, ainda assim, explicar o
processo, dizendo, por exemplo, que elegeu menos de 20% da Câmara e não
pode governar sozinho. Há um discurso óbvio: o governo Lula foi
fantástico do ponto de vista da inclusão social. Isso não teria sido
possível em uma política de enfrentamento. Se os meus amigos
intelectuais tivessem conseguido botar para fora o Henrique Meireles (presidente do Banco Central),
Lula não teria durado. O governo dele teria sido uma calamidade. Tudo o
que PT fez no governo foi porque Lula amarrou os acordos. Minha questão
é que não houve um trabalho político em cima desses acordos. E o ponto
político essencial, na verdade, é ético. O PT era o grande partido ético
brasileiro. Hoje, o PT conseguiu a fama de ser um partido antiético.


Na verdade, a fama é de ser um partido corrupto.


O PT teria de perceber que toda a inclusão social foi transformada em
um grande projeto de consumo. Não se tornou um projeto ético. No século
19, o grande flagelo ético do Brasil era a escravatura. Hoje, o grande
flagelo ético é a miséria. Não estou falando nem da pobreza. Um país com
milhões de miseráveis é uma droga. Se o PT batesse nessa tecla o tempo
todo e dissesse que está combatendo o problema, ele teria uma imagem
ética que poderia sobrepor à discussão de corrupção.


O PT bate nessa tecla.


Não do ponto de vista ético. Ele bate nessa tecla do ponto de vista
do consumo. Diz que melhorou o consumo das pessoas. A oposição, no
discurso dela contra a corrupção, jamais levanta a questão da miséria.
Não estou dizendo que a oposição quer a miséria. Mas em nenhum discurso
dos líderes da oposição se vê a miséria como uma chaga ética. Para eles,
a chaga ética é o desvio de dinheiro. Não parecem estar se ofendendo
com a miséria. Esse era um ponto em que o PT poderia bater, mas não faz
isso. Ele deixou todo o campo da discussão ética em mãos da oposição.


O PT não perdeu o discurso da ética depois de 2005, do Mensalão? O senhor fala em 2003.


Talvez você tenha razão. Falo em 2003 porque, em primeiro lugar, o PT
não deu satisfação nenhuma da mudança de programa, da priorização da
Reforma da Previdência. Segundo, o partido tornou-se figurante no
projeto lulista. Em 2003, Lula está tomando assento, não dá tempo de
fazer uma grande discussão popular. Em 2004 e 2005, tem o Mensalão e ele
reage aumentando os programas sociais. Em seguida, vem a cornucópia de
votos, o segundo mandato e toda a popularidade que Lula granjeou com os
programas sociais. Deste ponto de vista, há uma época áurea, não só para
o PT, mas para o Brasil.


Até no protagonismo internacional.


Tudo. Faltou estruturar isso em uma sustentação popular que fosse
além do bolso. Acabou ficando muito o bolso. Até porque não dá para
cobrar de um partido o que ele não poderia fazer. Fazer o enfrentamento
do capital teria sido muito difícil. Agora, o que não deixa de ser meio
triste é que houve 12 anos de governo do PT, sem enfrentar jamais o
capital.


Sem ao menos negociar.


Negociar, negociou. Nunca houve um enfrentamento de choque. No
entanto, esse setor empresarial está muito descontente. Pelo que ouvi
dos empresários, o descontentamento inicialmente não era com o PT. Era
com Dilma. Tanto que um ano atrás, os empresários poderosos queriam
Lula. Não queriam outro. Em 2010, eles queriam Lula. Não sendo Lula,
eles preferiam Serra a Dilma porque conheciam Serra. No ano passado,
eles preferiam Lula a Dilma. E preferiam Lula a Aécio. Quando Lula não
entrou na campanha, eles foram para o outro lado. E Dilma conseguiu, não
sei de que maneira, torrar o patrimônio que ela amealhou no segundo
turno.


Com um Executivo ausente e um Legislativo que só defende causa própria, o Judiciário está ocupando um espaço desproporcional?


Sim. O Judiciário, as profissões correlatas, a Procuradoria Geral da
República, tudo. Há um processo pelo qual muito está sendo decidido por
eles. É preocupante porque, em um Estado Democrático, eles devem ter um
papel subsidiário. Não essencial. Um exemplo: a Constituição de 1988 é
programática. Se um governo decidisse não promover o aumento real do
salário mínimo todo ano, poderia ser questionado. É um aspecto que a
Constituição propicia. Agora, o Judiciário está indo para questões muito
específicas. Ele se beneficia do fato de ser atualmente o poder em
última instância. É o que declara tudo.


Até permitiu que um juiz saísse com o Porsche de um réu.


Isso já é uma deformação grande. Há juízes que estão barbarizando. Um
prendeu os funcionários da companhia aérea em Imperatriz quando estava
atrasado para o embarque, o outro tripudiou a agente de trânsito no Rio
de Janeiro. Ele teve o endosso do Tribunal de Justiça do Rio, o que é
muito grave. Para a opinião pública, o Tribunal de Justiça proclamou que
os juízes são deuses. Há duas profissões com péssima mídia. Juízes e
médicos. São as duas profissões que estão com imagem junto à sociedade
de gananciosas, de interesseiras, de egoístas, de pouca preocupação com o
bem comum. Claro que a maior parte não é assim.


Por que os médicos? Por causa da reação de parte deles quanto ao programa Mais Médicos?


Coincide, mas a questão mesmo são os casos de abuso. Um relato
recente foi o de Néli Pereira, jornalista da BandNews FM, que foi a um
médico de convênio, em um bom hospital de São Paulo. O médico disse que
não iria atendê-la, que não dava para fazer uma consulta boa pelo
convênio, que pagava a ele R$ 40 reais. Falou para ela ir no amigo dele,
que cobra R$ 700. E aproveitou para pedir para participar do programa
dela. Um absurdo. Como um médico dá um malho de 700 paus e ainda acha
que a pessoa vai promovê-lo no programa dela? É ser muito sem noção.
Esse é um aspecto que está batendo na sociedade brasileira. Há pessoas
que não se dão conta do que fazem. Acham normal agir de uma forma
antissocial.


Às vezes, soltam a porta em cima da pessoa que está passando. Falta um comportamento ético?


É ético, mas se pode dizer que está faltando o mínimo de boas
maneiras, de educação, de percepção do outro. A capacidade de se colocar
no lugar do outro sumiu. Esse é um traço que está acontecendo. Quando
se tem uma sociedade que só se orienta em direção ao consumo, é difícil
estabelecer outra coisa. E acho que o mérito e o fracasso da inclusão
social do governo Lula é ter sido basicamente pelo consumo. Por que é um
mérito, uma vantagem? Porque pelo consumo se deu bem com o
empresariado, com a produção. Quando se inclui pelo consumo, as pessoas
compram mais geladeira, mais carne, mais ovo…


E também ficam mais felizes. Em um primeiro momento, elas não tinham geladeira e queriam ter. Faltou um segundo momento?


Acho que deveria ter sido simultâneo. Deveria ter insistido o tempo
todo no tema que Dilma adotou – País rico é país sem pobreza. Se fosse
usado pra valer, desde o começo do governo Lula, esse tema é um projeto
de País. Não é um projeto de bolso. E você teria resultados. Um problema
que os tucanos apontam muito, com razão, é o despreparo da mão de obra.
Os programas sociais são bons, mas muitas pessoas entraram em uma zona
de conforto, em vez de se prepararem para serem melhores trabalhadores.


Qual a saída?


Associar os programas sociais fortemente com educação, com
treinamento da mão de obra. Claro que tem o Pronatec, tem programas
bons, mas é preciso expandi-los.


O PSDB falou na campanha. Qual teria de ser o papel da oposição hoje?


O PSDB tem um espaço para abraçar a agenda do empreendedorismo. O
PSDB está mais para ser um partido do grande capital do que do
empreendedor. Não é social-democrata, mas tem um foco mais liberal. O
grande espaço deles seria: “Vamos ser liberais”. O ideal seria uma meta
do tipo ter dez milhões de empreendedores em quatro anos. O avanço para a
economia seria significativo e o partido conseguiria uma base
extremamente forte.


Mas como o PSDB está agindo hoje?


Sabe o caminho das rosas e o caminho dos espinhos? O PSDB está
procurando o caminho das rosas, que é o mais fácil. E o caminho mais
fácil é o quê? Há toda uma crônica policial que os favorece, assim como
uma mídia que é simpática a eles e detesta o PT. Isso leva o PSDB a ter
um projeto mais policial do que político. Eles estão vendendo para si
próprios a ideia de que quase venceram a eleição. E isso os está cegando
e os tornando incapazes de fazer uma crítica do que poderiam ter feito e
de como atuar hoje. Hoje, está claro o seguinte: como o governo da
Dilma foi uma decepção do ponto de vista econômico, então, a política
que ela está adotando agora é tucana. Com ressalvas, mas é parecida com a
dos tucanos.


Como Lula no primeiro mandato?


Com a diferença de que Lula recebeu uma herança difícil e Dilma pega
sua própria herança. Como o Richa. O PSDB poderia ter muitas propostas,
ser mais transparente. Um problema sério das campanhas foi o ocultamento
de dados fundamentais. No fim das contas, o PSDB concordou com o Bolsa
Família. Mas esse programa não é o grande motor das mudanças sociais. O
grande motor é o aumento real do salário mínimo. E isso o PSDB iria
reduzir, com o argumento bom de que a economia brasileira não comporta
elevar o mínimo em termos reais. O PSDB poderia ter entrado nessa
discussão depois das eleições.


O PSDB está muito raivoso.


Sim. Porque acha que, se sacudir um pouco a árvore, tudo cai no colo dele.


Há alguma semelhança entre o atual momento e a República do Galeão?


Não chega a ter. O projeto golpista contra o getulismo contou como
atores principais a UDN, o empresariado urbano e rural, o governo dos
Estados Unidos e os militares. Hoje, os militares não querem o poder. E
os setores de direita querem muito pouca interferência estatal. E chamar
os militares para não fazer nenhum tipo de intervenção estatal me
parece contraditório. Então, os militares estão fora. O governo dos
Estados Unidos talvez veja com simpatia a queda de Maduro (Nicolás Maduro, da Venezuela) ou uma derrota do grupo de Cristina (Cristina Kirchner, da Argentina)
nas eleições. O Brasil é muito grande para o governo americano se meter
em uma aventura. E nem representa nenhuma ameaça a eles. O máximo que
aconteceu foi que, em um episódio, a Dilma fechou a cara para eles.


E o empresariado?


Eu me pergunto qual seria a lógica de trocar Joaquim Levy por uma
convulsão social. Ele já responde a uma parte substancial das demandas
do mercado. Ele talvez seja o único ministro indemissível desse governo.
Não apenas porque ele é forte. Se ele se demitir, todos saberão que
Dilma não apoiou seu projeto de recomposição da economia. Se eu sou
empresário, eu prefiro o Levy a Armínio Fraga, se o preço de o Armínio
entrar for um processo complicado de impeachment, com
manifestações na rua, com contramanifestações, greves. Se o governo for
mais à direita pelo fruto de um processo não democrático, como aconteceu
no Paraguai e em Honduras, haverá fortes riscos de a sociedade entrar
em uma crise séria. Isso não é bom para os empresários.


Quem quer o impeachment?


Não vejo vontade de tirar a Dilma do governo, a não ser do próprio
PSDB e talvez de setores da mídia. A carta-testamento de Getúlio tem uma
parte muito triste afirmando que o povo nunca mais será escravo. Foi.
Houve mais 20 anos de ditadura. Hoje, temos uma classe dos mais pobres
com muito mais autonomia. O pobre de algumas décadas atrás era mais
humilde. Hoje, é muito mais afirmativo.


Qual é sua posição em relação à regulação da mídia?


O que a esquerda tinha de fazer é constituir órgãos de mídia. Nestes
12 anos de governo do PT, não fomos além de uma proliferação de blogs,
que alguns chamam de sujos. Alguns são bons; outros são péssimos. Mesmo
os melhores não cobrem o que o jornal cobre.


O que a presidenta Dilma pode fazer para afastar a ideia de impeachment?


Dilma deveria fazer política, no sentido de reconquistar o
eleitorado. Enquanto a oposição faz coisa de polícia, e não de política,
o governo não está fazendo nenhuma das duas coisas. Por que Dilma foi
escolhida? Eu sempre tive a convicção de que Patrus Ananias teria muito
mais o perfil (para a Presidência), por ser alguém que teve
sucesso nas políticas sociais, que já tinha exercido cargos de chefia,
ter uma origem no PT mais antiga e circular bem politicamente.
Provavelmente, Lula a escolheu porque achou que dos nomes possíveis do
PT era a mais próxima do empresariado. Eu pensava que ela iria fazer uma
política mais de direita, mais próxima dos empresários.


Por quê?


Dilma não parece ter muita simpatia por um elenco de temas de
esquerda. Ela nem tem familiaridade com os termos. Tempos atrás, ela
falou sobre opção sexual e não orientação sexual. Um presidente da
República que vai falar tem de ser brifado. Nenhum presidente ou chefe
tem de saber tudo. Ele tem de saber menos do que cada um de seus
ministros. Mas ele tem de fazer política.


Para isso, ele tem de ouvir.


Dizem que ela intervém demais nos ministérios, que não tem muita confiança (nos ministros).
Tivemos uma eleição mais alicerçada nos defeitos de um candidato do que
nas qualidades do outro. Não foi uma eleição em busca do melhor. E
estamos com um problema grande hoje porque não vemos uma saída. Não vejo
um horizonte de melhora na disputa política. Mas vamos pensar no que é
melhor para o Brasil e não para o PT.


O que é melhor?


Que Dilma termine o mandato em condições razoáveis. Qualquer outra
coisa seria dramático. Se Dilma acabar renunciando, ou pior ainda, se
sofrer um impeachment, este País vai ficar em um conflito muito
grande. Não adianta Temer fazer um governo melhor, porque a temperatura
estará aquecida. Mas vamos pensar em 2018. O PT pensa no Lula e o PSDB,
pelo visto, vai de Aécio, Serra ou Alckmin. Do quarteto que toma
decisões, o único que não deve concorrer é o Fernando Henrique. Beto
Richa, que poderia entrar no clube depois de o PSDB ter perdido em
Minas, está sob um tiroteio muito forte.


Há risco real de impeachment?


Não temos prévias disso. A única prévia é o governo Collor. Ele foi
eleito, assumiu o cargo legitimamente, e acabou ejetado por uma agenda
policial. Mas Collor não tinha nenhum apoio de partido ou movimentos e
fracassou redondamente. Hoje, há a busca de um pretexto para tirar a
Dilma. E ninguém tem argumento policial forte. Estão procurando.


E se encontrarem?


Se encontrarem algum sinal de que ela tampou a corrupção na
Petrobras, vai ser feio, muito feio. Mesmo que ela tenha feito isso a
contragosto. Mas o problema não é esse. O problema é o descontentamento
de uma parte da sociedade. Quem votou nela está meio estupefato, pelo
caminho que Dilma tomou e não se sabe se esta medicina mais neoliberal
vai funcionar ou não. Outro ponto importante é que parte do PT tem
posições conservadoras. Em junho de 2013, o partido condenou os
protestos. Em outras condições, o PT nadaria de braçada. É a ideia de
Sartre: há sempre razões para se revoltar. A revolta é legítima. Outra
coisa: o PT virou o partido que diz em público compreender a corrupção.
Isso é muito ruim. Os protestos contra as condições de encarceramento
dos empresários saíram mais de pessoas ligadas ao PT do que de partidos
de direita.


Tem chance de uma força política nova emergir no Brasil, como ocorreu na Grécia, com o Syriza?


Seria bom demais, mas acho muito difícil. É difícil porque o que se
colocou à esquerda do PT, o PSOL, tem falhas sérias de projeto, de
programa. Tirando Jean Wyllys e outros poucos, o pessoal não tem faróis
muito altos. O nosso sistema tem uma coisa muito boa: o período de
campanha eleitoral, sobretudo para presidente, ele destroça quem não tem
consistência. Dilma levou três anos de cacete. Aécio levou um ano de
porrada. Marina não aguentou dois meses. O fato de se ter um projeto
mais ou menos consistente conta. Hoje, não visualizo isso em ninguém. O
PT e o PSDB são fracos nesse ponto. Apesar de todas as críticas ao PT,
acho o PSDB pior do que o PT, mas eu não gostaria de continuar votando
no mal menor. I


quinta-feira, 26 de março de 2015

Crise de confusão, por Janio de Freitas

Crise de confusão, por Janio de Freitas







Mais do que nunca, o PMDB são vários --e esse é um dado básico
para perceber-se alguma coisa da situação




As últimas 30 ou 40 horas proporcionaram o necessário e atrasado exemplo de
quanto a situação é muito, muito mais confusa do que os jornalistas temos
transparecido. Falha devida, em parte, a que a própria situação está feita de
inconstâncias, disputas silenciosas, desorientações, e tudo o mais que caiba
para perturbar a nitidez interna e a percepção externa. E, de outra parte, por
força das características da imprensa brasileira atual.



Assim, por exemplo, desde que Renan Calheiros devolveu à Presidência uma
medida provisória e não foi à conversa de "entendimento" de Dilma com
o PMDB, o presidente do Senado é visto como convertido coadjuvante de Eduardo
Cunha nas insídias contra a presidente. Daí que, na manhã de ontem, os jornais
mais atualizados noticiavam mais uma derrota de Dilma, havida na Câmara, e o
complemento a ocorrer à tarde no Senado de Calheiros, com a confirmação do
projeto criado e feito aprovar por Eduardo Cunha.



A manhã apenas terminara quando no Senado se encerrou uma reunião conduzida
por Calheiros, com o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos, Delcídio
Amaral, e outros senadores. Era esperado que combinassem a aprovação dos 30
dias de prazo dados pela Câmara, na noite de anteontem, para que Dilma
regulamente a lei de redução das condições escorchantes cobradas aos Estados e
prefeituras devedores da União.



Resultado da reunião: derrota do "novo parceiro" Eduardo Cunha,
ficando suspensa "sine die" a votação no Senado do tal prazo, e
espera de nova posição do governo, que Delcídio Amaral foi logo negociar com o
dono do dinheiro público, Joaquim Levy.



O que houve de subjacente a determinar esse episódio?



O sentido de desaforo dado lá atrás à devolução de uma medida provisória,
por Calheiros, ignorou que era mesmo o caso de devolvê-la, porque tratava de
assuntos que exigem projeto de lei. A irritação de Renan com Dilma foi,
sobretudo, em razão do pretendido "entendimento" dela com Eduardo
Cunha, em desconsideração ao apoio que o presidente do Senado lhe dera até
então. Renan Calheiros não é tolo para supor, como tão noticiado, que se
irritara convicto de que o governo induzira o procurador-geral da República a
investigá-lo na Lava Jato (explicação que, ainda por cima, incluiu
injustificável insulto a Rodrigo Janot).



Mais do que nunca, o PMDB são vários --e esse é um dado básico para
perceber-se alguma coisa da situação. O PMDB de Calheiros não é o de Eduardo
Cunha, nem com ele quer se confundir jamais. Outro é o PMDB de Michel Temer,
que pode estar com o de Calheiros, mas com Eduardo Cunha faz no máximo
encenação de tolerância, à espera não sabe de quê. E José Sarney não perdeu o
seu PMDB ao deixar o Senado, sendo ainda a chamada "voz da
experiência" mais ouvida no partido.



O jogo desses PMDBs é duro. E, mesmo quando o joguem em relação ao governo,
no fundo a determinante essencial é o jogo entre eles: cada grupo sabe que nem
todos poderão sobreviver às condições que se armaram no partido. Distinguir uma
coisa e outra nesse duplo campo de ação é decisivo para chegar a alguma
compreensão, mas não tem acontecido. Muito ao contrário. E nisso o PMDB é só um
exemplo.



Ainda que ligeira, uma observação talvez útil: o prazo proposto por Eduardo
Cunha e fixado pela Câmara tem toda a razão de ser. A Dilma que se submete a
Joaquim Levy para burlar a lei de correção financeira e moral, em pequena parte
das relações do governo federal com Estados e municípios, é a mesma presidente
da República que, vangloriando-se do feito de justiça, sancionou tal lei
aprovada pelo Congresso. Ao que parece, não bastou aquele "esqueçam o
escrevi". Surgirá o "esqueçam o que assinei"?



Além disso, o beneficiário da correção justa não será Fernando Haddad, nem
Eduardo Paes, nem Geraldo Alckmin, ou qualquer outro governante. Serão os 12
milhões de habitantes da capital São Paulo, e a população do Rio como a do
Estado de São Paulo e outros municípios e Estados. Se Joaquim Levy "não
sabe de onde tirar os R$ 3 bilhões" que o governo federal deixará de
receber, se encerrada a agiotagem oficial, basta-lhe dar uma olhada no imposto
cobrado à especulação financeira, às remessas de lucros --aliás, não precisa
olhar, porque sabe muito bem e dá a sua proteção.



domingo, 22 de março de 2015

ConJur - Lenio Streck: O que fazer quando o MP quer violar a Constituição?

ConJur - Lenio Streck: O que fazer quando o MP quer violar a Constituição?





Regras mutantes

O que fazer quando o Ministério Público quer violar a Constituição?

Quando
eu era pequeno, tinha um menino que não jogava muito bem, mas era o
dono da bola. Quando não conseguia ganhar, pegava a bola e ia embora.
Pois o Ministério Público — instituição à qual pertenci, com muita
honra, durante 28 anos, sempre acreditando em seu papel de guardião o
Estado Democrático — agora quer pegar a bola ou mudar as regras. Parece
que não está gostando “do jogo”. Penso que isso é muito feio, para usar
as palavras que usávamos para criticar o menino-dono-da-bola.

Com
efeito, leio que o Ministério Público, na linha do Poder Executivo, acha
que o problema do combate à corrupção é a deficiência das leis. Simples
assim. Não acredita na Constituição. Nem o Poder Executivo e nem o MP
parecem acreditar nas regras do jogo. Como parecem estar perdendo a luta
contra o crime — isso está implícito nos discursos — propõem mudar as
regras (clique aqui para ler). Querem regras mais fáceis... para o MP. E para a Polícia. Pouco importa o que diz a Constituição.


alguns anos, estávamos Jacinto Coutinho, Fernando Faccury Scaff, Luís
Alberto David de Araújo, Antonio Avelãs Nunes, Gabriel Ciríaco e eu em
um Congresso em Maceió. Ouvimos uma promotora de Justiça defender
exatamente o que defendeu agora o procurador Nicolao Dino Neto: a
relativização da prova ilícita. Dizia ela: "onde já se viu absolver
alguém que se sabe que cometeu o crime só porque a prova foi ilícita?"
Todos caímos de pau no discurso da promotora. Pois passados tantos anos,
o assunto volta à baila.

Consta no noticiário que o MPF quer
mudar o Código de Processo Penal para que até mesmo provas
ilícitas possam ser usadas nas ações penais, quando "os benefícios
decorrentes do aproveitamento forem maiores do que o potencial efeito
preventivo" (sic). A medida está em um pacote anticorrupção apresentado
pelo MPF nesta sexta-feira (20/2) e faz ressalvas, para casos de
tortura, ameaça e interceptações sem ordem judicial, por exemplo. Ufa.
Ainda bem que essas ressalvas foram feitas. Caso contrário, seria a
institucionalização de uma jihad!

O discurso é velho.
Serôdio. Na ditadura não se fazia pior. E nem melhor. Quando não se
consegue pelas vias normais — institucionalizadas pela democracia (sim, a
democracia, cara pálida, essa que conquistamos) — tenta-se pela via do
Estado de Exceção. O governo faz a mesma coisa. Em vez de lutar — não só
agora, mas há muito — pelo combate à impunidade, quer surfar na onda.
Bonito isso.... Não conheço ninguém — a não ser corruptos,
proxenetas etc — que sejam contra o combate à impunidade. Até as pedras
querem isso, o combate à impunidade. E jornalistas e jornaleiros também.
Então é fácil vir com discurso tipo “tem recursos demais”, “a
prescrição é muito curta”, “as penas tem de ser hediondas”, “a proibição
de prova ilícita atrapalha o combate ao crime” e assim por diante.
Assim, fica fácil propor que se violem cláusulas pétreas, como a
presunção da inocência e a vedação de provas ilícitas.

Diz o Procurador Nicolau Dino Neto: “É preciso fazer uma ponderação de interesses
e verificar em que medida a eventual irregularidade na produção da
prova pode indicar prejuízo à parte. Se não houver algo que evidencie
prejuízo à defesa, nada justifica a exclusão dessa prova”.

Não faltava mais nada. Tinha que aparecer a tal da “ponderação”, a famosa katchanga real (ver aqui).
O que é a ponderação de interesses? Interesses de quem? Estamos
tratando de direitos ou de interesses? Voltamos ao inicio do século XX?
Estão lendo os livros errados lá no MPF? Ninguém estuda nesse país? Por
que o MP manda seus agentes estudarem no exterior? Para “descobrirem”
que prova ilícita pode ser relativizada em nome do interesse público? Se
for isso, temos de pedir o dinheiro de volta!

E o que é "eventual irregularidade"?
Quem diz o que é e o que não é irregularidade? O MP? O juiz, com sua
consciência? Ah, bom. Vamos depender das boas consciências de juízes e
promotores. A história nos demonstra bem isso. Em pleno século XXI,
todos os 27 tribunais da Federação invertem o ônus da prova em Direito
Penal em casos de furto, estelionato e trafico de entorpecentes... Vou
demonstrar isso em uma coluna específica. Os dados eu já tenho. É uma
boa amostra de como isso vai anda em Pindorama...

O exemplo sobre a
prova (i)lícita que o procurador Dino dá é inadequado e infeliz. Quer
dizer que a interceptação telefônica pode ser feita
inconstitucionalmente? Quer dizer que os fins justificam os meios? E os
efeitos colaterais? E o precedente que isso gera, procurador? Ah, mas
era uma carga de cocaína. Ótimo. E quem diz que o juiz ou o promotor ou o
policial não vão usar isso em outras ocasiões? Abrir a porteira do
ilícito cometido pelo Estado é cair na barbárie. Isso mesmo.

A
propósito: quem deve defender a Constituição não pode aprovar uma
violação. Penso que até deveria ser analisada no plano disciplinar a
declaração do Procurador, quando aprova o uso de prova ilícita. Explico:
se o uso de prova ilícita é crime (Lei 9.296/96), quem aprova o seu uso
incentiva o crime. Ou o incita. Estou sendo duro, mas, por vezes, as
coisas devem ser ditas nas palavras exatas. Há muita demagogia nessa
coisa de combate ao crime em Pindorama.

Outra coisa: que história é
essa de justificar o uso de prova ilícita a partir da garantia da
subjetividade do juiz, que tem discricionariedade? Ops. Todos lutamos
contra isso. Parece que, na contramão do novo Código de Processo Civil, o
MPF apoia o livre convencimento. E a livre apreciação da prova. Claro.
Porque, agora, interessa. É uma coisa “boa ad-hoc”. Um voluntarismo ad hoc.
E um utilitarismo pós-moderno. O que diz a Constituição? Não importa. O
que importa é o resultado. Sim: uma política publica de combate à
criminalidade de resultados.

E que “coisa” é essa de “os ajustes
no CPP também preverem que o juiz só anule atos se fundamentar
claramente a decisão. Se isso acontecer, o juiz deverá ordenar as
providências necessárias a fim de que sejam repetidos ou retificados’”.

Como
assim, Excelência? Quer dizer que, se existir uma prova ilícita, o juiz
pode mandar consertá-la? Vou estocar comida. Passaram dos limites.

Outra das medidas é acabar com alguns recursos. Isso. Quem sabe o MPF sugere num artigo novo no CPP dizendo:

"Art. X: O acusado é culpado até provar a sua inocência."

E um parágrafo único:

"Se
o agente for encontrado na posse do objeto do crime e não conseguir
explicar, desde logo estará condenado, dispensando-se a formação do
processo."


Bingo. Genial também é a ideia de transformar a
corrupção de altos valores em crime hediondo. Pronto. Essa é uma solução
supimpa. Na Inglaterra do século XVIII transformaram o ato de bater
carteiras em pena de morte por enforcamento. No dia dos primeiros
enforcamentos — em praça pública — foi o dia em que mais carteiras
furtaram. O exemplo fala por si. Lembro quando transformaram o crime de
adulteração de remédios em hediondo. Maravilha. Os resultados estão aí.
Todos conhecemos.

Numa palavra final.

Despiciendo
dizer que estamos todos de saco cheio da corrupção, do proxenetismo com
o dinheiro público etc. Não conheço jurista que não queira uma
sociedade melhor. Mas, por favor, para isso não precisamos romper com o
pacto constituinte. Se um deputado apresentasse esse pacote, diríamos
que “esse edil não conhece a Constituição”. Mas o Ministério Público
apresentar um projeto em que se relativiza provas obtidas por meio
ilícito e outros quetais? Não pega bem.

Aliás, se o parlamento
aprovasse um projeto nos moldes desse apresentado pelo MPF, a primeira
coisa que eu esperaria é: o Procurador-Geral da República ingressará com
Açãoo Direta de Inconstitucionalidade. Só que, neste caso, ele é quem
propôs a inconstitucionalidade. Ups.

Compreendem o que quero dizer?

And I rest my case.
Tinha de dizer e escrever isso. Depois de vinte e oito anos de
Ministério Público, em que, diuturnamente, procurei zelar pela
Constituição. Já no primeiro dia depois de sua entrada em vigor, fiz a
primeira filtragem hermenêutico-constitucional. Lá na Comarca de
Panambi, que, por coincidência, chegou a se chamar Pindorama! E
continuei fazendo controle difuso anos e anos a fio. Preocupa-me que,
passados tantos anos, que a própria Instituição venha a propor coisas
como a relativização da prova obtida por meios ilegais. Afora outras
anomalias. Pode até haver coisas interessantes no pacote. Mas o saldo
não me parece bom, pela simples questão que vem contaminado pela
“questão da relativização da prova ilícita”.

Post scriptum:
E não venham dizer, depois, que “não era bem isso que o MPF queria
dizer”. OK. Mas, então, por que propuseram alterações para “alterar o
regime da prova ilícita”? Hein?

Vale tudo? - prova ilícita e combate à corrupção | Amálgama

Vale tudo? - prova ilícita e combate à corrupção | Amálgama

 




Vale tudo? – prova ilícita e combate à corrupção

Se o interesse público autoriza o Estado e seus agentes a descumprirem a lei, soçobrou o Estado Democrático de Direito.




É incrível como em certas épocas, nas quais a população demonstra
indignação e intolerância com certos comportamentos ou situações, indo
às ruas protestar contra práticas que considera abjetas, sempre aparecem
espertinhos (“malandro demais”, na expressão de Bezerra da Silva)
querendo se aproveitar das manifestações de modo a passar suas pautas. A
principal característica dessas pautas é que, se adotadas, levariam a
um caminho inverso ao pedido pelas manifestações principais. São, assim,
“pautas parasitárias” da reivindicação principal.


Um exemplo típico, que pode ser retirado das manifestações contrárias
à corrupção que estão ocorrendo no Brasil, é o caso dos pedidos de
intervenção militar. Se houvesse golpe, teríamos menos transparência e
menos democracia. Logo, menos controle popular sobre o governo. O que
levaria a mais corrupção.


É exatamente este, também, o caso de uma das medidas propostas pelo Ministério Público Federal em seu “pacote anticorrupção”.
O MPF quer que mesmo provas ilícitas possam ser usadas nos processos,
quando “os benefícios decorrentes do aproveitamento forem maiores do que
o potencial efeito preventivo” (sic). Seja lá o que o MPF queira dizer
com tal disparate, fica patente a violação ao art. 5º, LVI, da Constituição da República: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.


Entretanto, o subprocurador-geral da República, Nicolao Dino Neto,
alega que as provas ilícitas não podem, automaticamente, prejudicar todo
o processo, dizendo que “é preciso fazer uma ponderação de interesses e
verificar em que medida a eventual irregularidade na produção da prova
pode indicar prejuízo à parte. Se não houver algo que evidencie prejuízo
à defesa, nada justifica a exclusão dessa prova”.


Perguntamos: quais serão os “interesses” a serem “ponderados”? O
interesse no cumprimento da Constituição contra o interesse da punição
custe o que custar? Ou o interesse de ver uma condenação facilitada
contra o interesse de que se cumpram as regras do jogo? Porque se um dos
lados puder realizar ações que violam as regras, mas tais ações ainda
serão “ponderadas” pelo juiz para decidir se é o caso de anulá-las,
estamos feitos. Se o interesse público autoriza o Estado e seus agentes a
descumprirem a lei, soçobrou o Estado Democrático de Direito.


E tudo feito tendo como pano de fundo dois fenômenos. De um lado, a
confiança na subjetividade do julgador (e não na integridade do sistema
jurídico) através da “ponderação”, da “livre apreciação das provas”, do
“livre convencimento”. Passamos a depender da bondade de juízes e
promotores (o “passamos” aqui é meramente retórico; essa gente faz isso
mesmo ao arrepio da Constituição e das leis). Do outro lado, a aposta no
inchaço do Direito Penal e no enfraquecimento do Direito Processual
Penal de matriz democrática. Penas maiores, inversão de ônus probatório,
relativização das nulidades etc.


Mas não precisamos nos preocupar, existem exceções! Estão ressalvados
os casos de tortura, ameaça e interceptações sem ordem judicial, por
exemplo. Estamos salvos! Afinal, essa prova ilícita não é prejudicial à
defesa. Mesmo o réu tendo sido condenado, porque existiam outras provas
(que só foram possíveis devido à prova ilícita)! Como diria Pangloss,
este é realmente o melhor dos mundos possíveis.


Isso sem contar o que se configura como a cereja do bolo: o
Ministério Público no Direito brasileiro tem entre as suas atribuições a
de ser o guardião da correta execução das leis – o fiscal da lei – e
deve, para cumprir essa função, arguir a inconstitucionalidade de leis
que violem a Constituição. Neste cenário, “Quis custodiet ipsos custodes
(quem fiscalizará os fiscalizadores)?”

quinta-feira, 19 de março de 2015

Nunca subestimem o ódio, o medo e a ignorância

TUDO EM CIMA



Nunca subestimem o ódio, o medo e a ignorância



Plínio Zúnica
denuncia o caráter fascista das manifestações de ontem, que reuniram
multidões no País e espalharam imagens constrangedoras, como os pedidos
de intervenção militar, o incêndio a uma sede do PT e as imagens de
Dilma e Lula enforcados


- Por Plínio Zúnica

Vocês que vestiram verde e amarelo ontem me envergonham.

Ontem,
amigos, conhecidos e parentes apoiaram a maior imbecilidade que eu já
vi. Não é questão de ser contra o governo, porque, francamente, existem
milhares de pontos a serem altamente criticados na Dilma sim. A questão é
que vocês não fazem a menor ideia do que estão criticando. Eu não apoio
o que tem sido o governo Dilma, mas sei escolher as minhas bandeiras e
com quem me misturo.

Eu tive dezenas de conversas com gente de
todo o tipo nos últimos meses, e o ponto em comum é que a maioria das
pessoas não faz ideia do que reclamar. Falam de uma corrupção que não
sabem o que é, não sabem diferenciar o que é uma presidenta da Republica
do que é uma rainha absolutista, não fazem ideia do que são as
atribuições de cada esfera do governo. 

Gente que não conhece
história, que não sabe o que foi o Collor,que não sabe o que foi a
ditadura, que não sabe o que foi a era FHC, que não entende os programas
mais simples e básicos do governo do PT. Gente botando a culpa até dos
serviços de telefone nas costas da Dilma.

Gente que se informa
por memes burros de Facebook, que acredita no Revoltados On Line, que
ouve o que dizem e dá poder para escrotos como o Lobão, Danilo Gentili,
Silas Malafaia, Jair Bolsonaro, Paulinho da Força. Gente que tem medo da
"Ameaça Comunista", que acha de verdade que o PT tá tentando
transformar o Brasil em Cuba. 

Gente que repete os
chavões burros de "bolsa esmola", "bolsa bandido". Que acha que a
corrupção do país vem toda do PT, e que não é capaz de fazer os
raciocínios mais basais sobre as porcarias que afirmar. gente que
protesta contra a corrupção usando uma camisa da CBF, cara!!! Cadê o
senso de ridículo de vocês???

Gente que é burra o suficiente
pra falar que o PT faz o Brasil passar fome. De todos os argumentos,
acho que esse é um dos mais imbecis. Pode-se criticar o PT por muita
coisa, mas falar sobre fome é de uma boçalidade impressionante.

Vocês,
meus amigos, conhecidos e parentes, podem ter a melhor das intenções,
mas estavam hoje marchando numa micareta com milhares de pessoas que
pediam claramente a volta da ditadura militar. Vocês fizeram coro com
gente carregando suásticas, enforcando bonecos da Dilma e do Lula,
carregando cartazes com dizeres de puro ódio e violência.

Vocês
marcharam ao lado de gente com um cartaz de "Femicídio sim!" (qualquer
pessoa que tenha visto essa foto e não tenha ficado enjoado é um
imbecil). Vocês juntaram sua voz com o que há de mais podre na
sociedade. Deram poder pra gente como os revoltados On Line, Lobão,
Danilo Gentili, Coronel Telhada, Jair Bolsonaro, Silas Malafaia, TV
Globo.

Vocês choraram pateticamente ao som do hino nacional, se
enrolaram em bandeira, caíram na ladainha nacionalista que é a base dos
fundamentalismos modernos, e fizeram isso ao lado de centenas de
cartazes pedindo pela intervenção militar.

Teve até um dos
grupos mais acéfalos e míopes da esquerda universitária lançando um
panfletinho safado pedindo que os grupos de esquerda se unissem ao coro
da demência. Gente que vive num mundinho de revolução vila-madalena e
tem uma capacidade de avaliação política pífia. Uma galera muito boa de
pintar kraft bonito e muito ruim de juntar 2+2.

Não interessa
qual foi a intenção de vocês. O que vocês fazem, com sua ignorância
política e histórica, é dar força para os fundamentalistas religiosos,
para os militares, para os assassinos da polícia, para grupos que pregam
a violência contra mulheres, que promovem a perseguição de gays,
lésbicas e transexuais, que alimentam o racismo, machismo, elitismo e
homofobia.

É um erro grande da Esquerda achar que esse é um
movimento feito só por grupos de elite. A ideologia é da elite, os
interesses são da elite, o dinheiro é da elite, os porta-vozes são da
pior das elites, mas essa ideologia é ardilosa o suficiente pra infectar
as mentes de todas as camadas sociais. 

É uma ideologia baseada
em medo, ódio e ignorância, e infelizmente esses elementos têm uma força
de mobilização muito poderosa, mais do que a razão e a solidariedade.
Não fosse assim, teria sido o movimento hippie a dominar o mundo, e não
ideologias fascistas, imperialistas, colonialistas, eugenistas e
elitistas. 

Não subestimem o poder
do ódio, do medo e da ignorância. Não faltam exemplos do estrago que
eles são capazes de fazer nas pessoas mais bem intencionadas.

Ontem foi um dia muito, muito triste.

Qual a diferença entre os 13% de aprovação de Dilma e os 13% de FHC?

Diário do Centro do Mundo » Qual a diferença entre os 13% de aprovação de Dilma e os 13% de FHC?



Qual a diferença entre os 13% de aprovação de Dilma e os 13% de FHC?




Postado em 18 mar 2015




E eis FHC palpitando sobre os 13% de aprovação de Dilma segundo o Datafolha.


Como tem acontecido sempre, FHC jogou mais sombras onde já as havia em quantidade copiosa.


Dilma estaria perdendo as condições de governar, afirmou, ao melhor
estilo de Carlos Lacerda, o Corvo. (Aliás, o C de Cardoso poderia, já
faz algum tempo, pelo C de Corvo.)


No caso em questão, FHC traria alguma luz ao debate se lembrasse que ele também passou exatamente pelos 13% de aprovação.


Foi em setembro de 1999, segundo o mesmo Datafolha. Para quem gosta
de comparações, foi uma queda de cerca de 70% em relação ao mesmo mês do
ano anterior.


Acabou o mundo? Acabou o governo FHC?


Não, tanto que, quinze anos depois, ei-lo pontificando.


Comparemos as circunstâncias. Dilma bate em 13% numa pesquisa
realizada logo depois de um protesto orquestrado descaradamente pela
Globo, e em meio a um noticiário manipulador que tenta associá-la ao
caso Petrobras e à palavra “corrupção”.


FHC chegou aos 13% com a blindagem monumental da mesma mídia que massacra agora Dilma.


FHC jamais foi cobrado, por exemplo, sobre a compra de votos, em 1997, para a emenda da reeleição.


Ao longo dos tempos, ele tem oscilado entre negar e distorcer a realidade.


Às vezes, FHC nega a compra. (Recentemente, o único repórter que
contou a história, Fernando Rodrigues, disse que colheu não evidências,
mas “provas cabais”.)


Outras, ele tergiversa. Em determinada ocasião, admitiu que
“provavelmente” votos foram comprados. Mas não pelo PSDB. Era coisa,
segundo ele, de governadores, também beneficiados com a emenda.


Invoco Wellington aqui. Quem acredita nisso acredita em tudo.


FHC também jamais foi apertado pelo nepotismo. Genro, filha, a lista de parentes empregados é longa.


Mas, claro, quando se trata de FHC, assim como acontece com Aécio, nomeações na família obedecem à mais estrita meritocracia.


Qual teria sido a aprovação de FHC se ele tivesse, diante de si, uma
mídia tão empenhada em jogar para baixo quanto a enfrentada por Dilma?


Melhor: qual seria o índice de popularidade dele se a imprensa fosse, simplesmente, honesta?


Tudo isso posto, qualquer presidente oscila nas avaliações. Em
momentos em que a economia cresce, o prestígio sobe. Em tempos de crise,
é o oposto.


O Brasil passa por uma crise, e então é natural que baixe a aprovação.


O ponto é que a queda, agora, é amplamente estimulada por uma mídia
que tenta enganar o público com a versão de que a crise é exclusividade
do Brasil.


Estamos diante de um abjeto estelionato editorial.


Até a BBC do Brasil mostrar a queda geral das moedas mundo afora
diante do dólar, nossos “especialistas” econômicos empurravam para as
pessoas a versão de que o problema acontecia no Brasil.


Acresce a tudo um fato que me intriga, e para o qual já chamei a
atenção. Também a esquerda parece intoxicada pelo catastrofismo maroto e
calculado dos conservadores.


Ora, há uma crise global. Até a China reduziu pela metade a expectativa de crescimento.


Nenhuma grande economia do mundo – nenhuma – está imune à crise.


O governo está tentando enfrentar as dificuldades, concretamente.


Mas o maior obstáculo não é econômico, e sim mental. É
imperioso um choque positivo, algo que devolva a sanidade a pessoas – de
direita, centro e esquerda — que parecem prestes a cortar os pulsos.


O que está ocorrendo, hoje, é a síndrome do desastre anunciado.


Não ocorreu nada, mas de tanto falar em desastre vão se criando as condições para que ele se materialize.


Quanto a FHC, recomendo uma frase de Sêneca: “Quanto penso nas coisas que disse, sinto inveja dos mudos.”

quarta-feira, 18 de março de 2015

Pobre oposição! Sem lideranças, protesto contra a corrupção descamba para o ódio, o preconceito e a exaltação da Ditadura

Pobre oposição! Sem lideranças, protesto contra a corrupção descamba para o ódio, o preconceito e a exaltação da Ditadura | yahoo-news-br-laura-capriglione - Yahoo Notícias

 


Pobre oposição! Sem lideranças, protesto contra a corrupção descamba para o ódio, o preconceito e a exaltação da Ditadura






O que leva pessoas educadas, profissionalmente bem colocadas, gentis no trato pessoal, a comparecer a um ato público contra a corrupção, como o realizado no último dia 15 de março, na avenida Paulista, em São Paulo, e para lá levar cartazes, faixas e rimas podres com ofensas de cunho sexista e de ódio contra a presidente Dilma Rousseff –pelo fato de ela ser mulher?
“Quem se habilitaaaa… A comer a Dilma sem birita?”
“Dilma, arruma logo um namorado e para de foder o Brasil.”
“Dilma, pare de ferrar o Brasil e vai transar.”
“Dilma, biscate véia.”
“Dilma, mal comida.”
“Dilma, sapatão.”
“Dilma vaca.”
“Ei, Dilma!, vai tomar no cu!”


O que leva pessoas afáveis, amigas até, a jogar fora toda a sua convicção sobre a importância da solidariedade, da caridade, do amor e, de repente, vestir uma camiseta com a estampa de uma mão com quatro dedos sob o lema: “Basta!”

É a Lula que se refere, por razões óbvias, a tal estampa.

(Uma das pessoas que trajavam a indecorosa camiseta com a mão de quatro dedos era Ana Eliza Setubal, mulher de Paulo Setubal, da família que controla o banco Itaú)

Se
fossem — Lula ou Dilma— anões, negros, homossexuais, gagos, cegos,
surdos, obesos, sem-braços ou sem-pernas, como seriam as cruéis
estampas?

Deixo para os representantes de minorias ou dos
deficientes físicos, calejados resistentes da lida contra o preconceito,
a tarefa de imaginar o circo de horrores que seria retratado  —como se
toda a sua humanidade pudesse ser reduzida a um traço físico ou
psíquico.

Teve grosserias para todos os gostos e estômagos. O meu passou mal.

A
coisa podia ficar pior —e ficou. No carro de som que pedia a
“Intervenção Militar Já”, um notório torturador e assassino de
oposicionistas políticos da Ditadura, de nome Carlos Alberto Augusto,
conhecido pela alcunha de “Carlinhos Metralha”, era disputado como
celebridade para selfies.

“Metralha” vangloria-se de sua
participação no chamado “Massacre da Granja São Bento”, onde foram
assassinados vários militantes da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), em janeiro de 1973. Na ocasião, a jovem Soledad Barrett foi entregue, grávida, para ser executada por seu próprio marido, o traidor José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo.

No
final do “Dia contra a Corrupção”, o ex-policial festejava: “Posei hoje
para retratos com mais de 800 pessoas”. Parte importante de seu
discurso era o lamento por não ter conseguido metralhar mais gente em
sua carreira homicida. “Faria com o maior prazer”, disse.

Em
outros tempos, essa gente nem daria as caras, execrada que seria. Mas,
na manifestação de domingo, a massa vestida com a camisa do fracasso do 7
a 1, aplaudia, gritando: “A nossa bandeira jamais será vermelha”, seguido pelo indefectível “Ei, Dilma, vai tomar no cu!”

É claro que a Rede Globo,
fazendo tomadas aéreas, de helicóptero ou do alto dos prédios, não
mostrou nada disso. Os locutores da emissora preferiram enaltecer “o caráter pacífico do protesto”, “a grande manifestação em prol da democracia”.

A
verdade daquela violência simbólica toda, cantada em verso e prosa,
impressa em cartazes e camisetas, passou longe das câmeras da emissora
do Rio, que preferiu apresentar uma versão adocicada da barbárie, afim de não assustar os incautos.

Como chegamos a este ponto? Como é possível que o discurso do ódio se tenha entranhado a tal ponto em parcela da oposição?

Costuma-se comparar a atual campanha anti-Dilma àquela pelo impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992.

Mas elas têm o sinal trocado em quase tudo. Provavelmente, também no desenlace.

Como jornalista, tive a oportunidade de cobrir a campanha pelo impeachment de Collor.

À frente dela estiveram o maior símbolo do MDB que combateu a Ditadura, o deputado Ulysses Guimarães; o fundador do PSDB e depois governador de São Paulo, Mário Covas; o presidente  do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, os então presidentes da Associação Brasileira de Imprensa, Barbosa Lima Sobrinho, da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcello Lavenère, e da União Nacional dos Estudantes, Lindberg Farias, além de milhares de entidades e organizações da sociedade civil, artistas e intelectuais.

No ato do dia 15, as grandes figuras da oposição, os artistas, os intelectuais não deram as caras.

Até teve um Jair Bolsonaro (PP-RJ) aqui, um Andrea Matarazzo (PSDB-SP), e um Aloysio Nunes Ferreira (idem) acolá, além de sub-celebridades do segundo time do entretenimento, como Wanessa “Playback” Camargo, Danilo Gentili e  Juca Chaves.

Convenhamos, até na época do “Cansei” o camarote vip tinha mais atrações.

Onde estavam Fernando Henrique Cardoso, Aécio Neves, Geraldo Alckmin, a oposição no Congresso? Enfurnados em sua covardia, sabe-se lá onde.

Sem referências, sem lideranças, o jeito foi a galera fina, elegante e sincera, vestida com as camisetas oficiais da CBF, aquelas do 7 a 1 (R$ 149,90 na loja virtual Netshoes), chafurdar nos dicionários chulos de palavrões.

Na
ausência da dimensão pública representada pela grande política, sobrou
espaço para os extravazamentos dos ódios de bombados valentões,
cosplayers de Rambos,  em coturnos e trajes militares, pedindo a volta da Ditadura

Gol contra pior do que no 7 a 1.


“Eu não vim aqui pra isso. Eu sou contra os militares. Eu perdi amigos na Ditadura”, gritava Maria de Lourdes Di Paula, 57. Professora paulista,
Lourdes foi ao ato porque é “contra a corrupção”. Transtornada, ela
retirou-se do protesto com mais oito amigas. “A gente é pelo
aprimoramento da democracia, não pela destruição dela”, disse.

Por volta das 18h, esgotados manifestantes disputavam um lugarzinho no badalado restaurante Spot, na rua Ministro Rocha Azevedo, vizinho da avenida Paulista, onde uma saladinha da casa sai por R$ 52.

Na porta, duas senhoras perguntavam-se “e agora?”, ao que um fortão com camisa de camuflagem respondeu de bate pronto:

“Impeachment nem pensar porque senão vem o Temer e é pior. A única saída é a intervenção militar”.

Elas se assustaram —“Deus me livre de milicos!”— e fugiram para dentro. Foram em busca de um Prosecco para relaxar.

Acabou-se o protesto.
#jornalistaslivres




terça-feira, 17 de março de 2015

Eles não cabem em Miami, por Nílson Lage

Eles não cabem em Miami, por Nílson Lage | TIJOLAÇO | 

 









Eles não cabem em Miami, por Nílson Lage

16 de março de 2015 | 08:41 Autor: Fernando Brito
miamiburg


De Nílson Lage, no Facebook:


Certa vez ouvi de Leonel Brizola que a revolução cubana seria
impossível no Brasil. Argumentava que Fidel Castro pôde se livrar da
fração mais ativa da burguesia – algumas dezenas de milhares de pessoas
-, expulsando-a para Miami, e isso seria impossível aqui.
(Nota do Tijolaço: “não cabe”, explicava)


A burguesia de São Paulo – a de verdade e a pequena – é muito
maior do que a cubana e foi convencida por propaganda insistente de que
não tem saída senão a rua, no caso,a Avenida Paulista. Polarizada e
acuada, defende, como era de se esperar,
um programa protofascista, que inclui repressão e segregação da
população pobre e de tudo que a faz lembrar, inclusive o governo
trabalhista.



Descendentes da elite colonial do café ou oriundos de imigração
relativamente recente, os formadores de opinião de São Paulo Imaginam
uma vida confortável integrados na grande comunidade latino-americana
com capital cultural em Miami e financeira em paraísos fiscais. O
Brasil, para eles, é como uma espécie de clube social que os diferencia e
uma vaca com enorme teta em que mamam, jamais uma pátria independente.



O que mobiliza os medos e ódios da massa de gente que se reuniu
em São Paulo é um sistema de dominação montado ao longo de décadas em
que se esmagou a cultura popular e se impôs, para substituí-la, o
simulacro globalizante.



Os quadros jornalísticos foram filtrados, com a exclusão quase
total do pensamento inconveniente No entanto, os meios de comunicação – a
mídia globalizada – são parte da fragilização institucional do Brasil,
mas não a única. 



O trabalho da inteligência dos
Estados Unidos que coordena a agitação com objetivos econômicos e
políticos evidentes foi muito facilitado pela modernização deformante
das estruturas legais e das normas jurídicas, pela formação viciada nas
escolas militares e pela desorientação do ensino em todos os níveis.



A combinação desses fatores, a
despolitização e a falta de informação sobre o mundo manifestam-se em
teses simplistas sobre a “culpa da Dilma”, a “corrupção” ( 61 anos
depois, o “mar de lama”), a ameaça comunista (a “conspiração
bolivariana”),a indolência (“vivem do bolsa família”), o ódio à
inteligência (“abaixo Paulo Freire”, “prisão para Karl Marx”) etc. .



É uma vitória que nenhuma
violência tenha ocorrido. Um milhão de pessoas- se foram tantas – é um
duzentos avos da população do Brasil, reunida em fração mínima de seu
território. Mas um fagulha pode, agora, causar explosão, como já tem
acontecido em outros lugares.



PS do Tijolaço. E a nossa pequeno-burguesia, aqui, com seus
“ideais maiâmicos”, com seu complexo de vira-latas, dá-lhes ouvidos e
faz-lhes modelo. Mesmo que seja para limpar a sujeira dos ricos de
verdade. Imagino o prazer da Veja ao tuitar a foto acima, ontem.

Diário do Centro do Mundo » Admita: você foi para a rua para odiar

Diário do Centro do Mundo » Admita: você foi para a rua para odiar

Admita: você foi para a rua para odiar

image


Primeiro, vamos combinar uma coisa: se você votou em Aécio Neves, nas eleições passadas, você não está preocupado com corrupção.


Você nem liga para isso, admita.


Aécio usou dinheiro público para construir um aeroporto nas terras da
família dele e deu a chave do lugar, um patrimônio estadual, para um
tio.


Aécio garantiu o repasse de dinheiro público do estado de Minas
Gerais, cerca de 1,2 milhão reais, a três rádios e um jornal ligados à
família dele.


Isso é corrupção.


Então, você que votou em Aécio, pare com essa hipocrisia de que foi às ruas se manifestar porque não aguenta mais corrupção.


É mentira.


Você foi à rua porque, derrotado nas eleições passadas, viu, outra
vez, naufragar o modelo de país que 12 anos de governos do PT viraram de
cabeça para baixo.


Você foi para a rua porque, classe média remediada, precisa absorver
com volúpia o discurso das classes dominantes e, assim, ser aceito por
elas.


Você foi para a rua porque você odeia cotas raciais, e não apenas
porque elas modificaram a estrutura de entrada no ensino superior ou no
serviço público.


Você odeia as cotas raciais porque elas expõem o seu racismo, esse
que você só esconde porque tem medo de ser execrado em público ou nas
redes sociais. Ou preso.


Você foi para a rua porque, apesar de viver e comer bem, é um
analfabeto político nutrido à base de uma ração de ódio, intolerância e
veneno editorial administrada por grupos de comunicação que contam com
você para se perpetuar como oligopólios.


Foram eles, esses meios de comunicação, emprenhados de dinheiro
público desde sempre, que encheram a sua alma de veneno, que tocaram
você como gado para a rua, com direito a banda de música e selfies com
atores e atrizes de corpo sarado e cabecinha miúda.


Não tem nada a ver com corrupção. Admita. Você nunca deu a mínima para corrupção.


Você votou em Fernando Collor, no PFL, no DEM, no PP, em Maluf, em
deputados fisiológicos, em senadores vis, em governadores idem.


Você votou no PSDB a vida toda, mesmo sabendo que Fernando Henrique
comprou a reeleição para, então, vender o patrimônio do país a preço de
banana.


Ainda assim, você foi para a rua bradar contra a corrupção.


E, para isso, você nem ligou de estar, ombro a ombro, com dementes
que defendem o golpe militar, a homofobia, o racismo, a violência contra
crianças e animais.


Você foi para a rua com fascistas, nazistas e sociopatas das mais diversas cepas.


Você se lambuzou com eles porque quis, porque não suporta mais as
cotas, as bolsas, a mistura social, os pobres nos aeroportos, os negros
nas faculdades, as mulheres de cabeça erguida, os gays como pais
naturais.


Você odeia esse mundo laico, plural, multigênero, democraticamente
caótico, onde a gente invisível passou a ser vista – e vista como gente.


Você foi não foi para a rua pedir nada.


Você só foi fingir que odeia a corrupção para esconder o óbvio.


De que você foi para a rua porque, no fundo, você só sabe odiar.

Eduardo Cunha, os deputados que “roubaram porque deixaram” e o diálogo de Cardozo

Eduardo Cunha, os deputados que “roubaram porque deixaram” e o diálogo de Cardozo | TIJOLAÇO

 









Eduardo Cunha, os deputados que “roubaram porque deixaram” e o diálogo de Cardozo

16 de março de 2015 | 16:53 Autor: Fernando Brito
dialogo


O Brasil virou o país da desfaçatez.


Duas semanas após a lista apresentada pelo Procurador Geral da
República ter gerado a abertura de investigação sobre dezenas de
políticos, entre eles o Presidente do Senado, Renan Calheiros, e o da
Câmara, Eduardo Cunha, este último diz a empresários paulistas – e
depois em entrevista para a grande mídia, que “a corrupção está no Executivo, não no Legislativo”.


“É bom deixar claro que a corrupção não está no Poder
Legislativo, a corrupção está no Executivo. Se eventualmente alguém no
Poder Legislativo se aproveitou da situação para dar suporte politico em
troca de benefícios indevidos é porque esses benefícios existiram pela
falta de governança do Poder Executivo”.



Então fica assim: “roubamos porque deixaram roubar”.


Pausa para rir do “se efetivamente alguém do Poder Legislativo se aproveitou”.


Enquanto Cunha, gravado na lista de Janot, bravateia a honestidade
dos políticos, o Governo, que não está na lista, gagueja que “vai lançar
um pacote anticorrupção” e diz que vai “dialogar”, pela boca do Ministro José Eduardo Cardozo.


Será, senhor Ministro, que alguém parecia ontem disposto a dialogar?


Isso não quer dizer que devam ser tratados abaixo de pau, é evidente,
embora se devesse agir, dentro da lei, contra quem prega golpes
militares e outras pérolas.


O governo tem é de agir, tanto na administração quanto na política,
revigorar sua base de apoio popular, mostrar à sociedade que é o que diz
ser e que este movimento é uma extensão espúria do processo eleitoral.


Não impor o ajuste necessário com medidas doces para os grandes
empresários – como foi o impacto de uma só vez, sem escalonamentos, das
tarifas de energia ou como é a elevação contínua dos juros – enquanto o
que é amargo para o povão nem sequer é pactuado.


Como é que as maiorias que elegeram este governo vão entender que é
preciso defendê-lo se ele não fala ou, quando fala, titubeia?


Sinceramente, não acredito que o governo, mesmo que o quisesse,
poderia a esta altura enfrentar a mídia, ao menos não decididamente,
depois de anos e anos de temor – e tremor, melhor dizendo – ante o
cogumelo que domina a informação neste país. E mesmo ao que nos resta de
mobilização, fazê-lo pouco será senão fornecer mais matéria-prima para a
ridícula e até cruel lenga-lenga sobre censura à imprensa,
bolivarianismo e outras baboseiras que se propagaram entre os
histéricos.


Porque, infelizmente, os controladores da comunicação, hoje, no
Brasil, se assemelham ao “protestante” da foto: berram como irracionais.


E tratam gente como Eduardo Cunha como respeitáveis senhores, ao qual
dão incontestados microfones para explicar quem rouba e como se rouba
no Brasil.


Quem sabe por reconhecer-lhe notório saber, como integrante da seleta e extensa lista do Dr. Janot.

O jornal de hoje embrulha o estômago do amanhã

O jornal de hoje embrulha o estômago do amanhã | TIJOLAÇO |

 









O jornal de hoje embrulha o estômago do amanhã

16 de março de 2015 | 22:53 Autor: Fernando Brito
19642015


Há, entre os jornalistas, um ditado para que aprendamos a perder a
vaidade de vermos nosso texto impresso, nosso nome publicado no papel:
“o jornal de hoje embrulha o peixe de amanhã”, coisa do tempo em que
haviam peixarias e as pobres corvinas, pescadas e anchovas eram envoltas
em discursos de políticos, crimes bárbaros ou partidas de futebol da
véspera.


Os fatos passam, as manchetes perdem o sentido, os personagens desbotam sua importância, como o tempo a tudo descolore.


Há, porém, uma exceção: a história.


Volta e meia ela se repete, disse há século e meio um barbudo alemão –
que alguns neuróticos acham ter renascido em Garanhuns  e querem pôr em
cana – que como farsa, depois de terem sido tragédias.


A imagem que posto, que o pessoal do Política no Face espalhou nas redes sociais com as capas, quase iguais, das edições de O Globo de hoje e de pouco antes do Golpe de 1964 é um destes casos.


Meio século depois, é inescondível o sentido desta semelhança.


Jango, como Dilma, tinha ainda o frescor da legitimidade eleitoral,
embora já se aproximando do último ano de seu mandato, porque havia
sido, um ano antes, restituído de seus poderes pelo plebiscito de
janeiro de 1963, que venceu com incríveis 82% dos votos.


Um ano depois, estava, pela imprensa dominante – jornais e rádios,
bem como pela nascente televisão – transformado em alguém frágil, que se
dedicava a um projeto de “república sindicalista”, uma versão
pré-história deste bolivarianismo que repetem, sem saber o que é, tanto
quando não sabiam  – e ninguém nunca soube – o que seria a tal república
dos sindicatos.


Soubemos bem, porém, o que veio depois que São Paulo pôs-se “de pé pela democracia”.


A ditadura. As cassações, as perseguições, as mortes, os livros queimados, as pessoas caladas.


Ruas desertas e o único humor que se fazia era o de não se achar
nada, pois dizia-se que “o último que achou, ainda não acharam”.


Os jornais de hoje, tomara, só embrulhem o peixe de amanhã.


Mas já embrulham o estômago de uma geração que cresceu sob a sombra,
sob o medo e que, de prêmio, só ganhou o direito de ser eternamente
prisioneira do sentimento de liberdade e de democracia.


A intervenção militar “provisória” durou de meus cinco anos até os
32, até que, num dia 1989, não pude votar para Presidente, porque dei
este maravilhoso direito a minha filha, uma menina de nove anos, para
que ela marcasse um xis na folha de papel.


As duas capas de O Globo são, espero eu, antes farsa que tragédia.