domingo, 23 de julho de 2017

O Brasil precisa, sim, de reformas

O Brasil precisa, sim, de reformas. Para fazer que pobres paguem menos impostos que os ricos, por exemplo - Viomundo - O que você não vê na mídia



O Brasil precisa, sim, de reformas. Para fazer que pobres paguem menos impostos que os ricos, por exemplo

23 de julho de 2017 às 09h55









O BRASIL PRECISA DE REFORMAS 


por Aldemario Araujo Castro*



29.04.2017


“O Brasil precisa de reformas”. A frase foi proferida pelo senhor
Michel Temer, triste ocupante do Palácio do Planalto. “Reformas [no
Brasil] são claramente necessárias”. Essa frase foi proferida pela
senhora Christine Lagarde, diretora-gerente do FMI – Fundo Monetário
Internacional. O homem das mesóclises sofríveis e a mulher das certezas
incertas estão com a razão?


Os contínuos escândalos de corrupção criam a falsa impressão de que a honestidade (ela, e só ela) daria “jeito” neste país.


Felizmente, ou infelizmente, nossas profundas mazelas, notadamente a
construção e manutenção de uma das sociedades mais desiguais,
discriminatórias e violentas do planeta, resultam da existência de
instrumentos ou mecanismos socioeconômicos que precisam de profundas
transformações.


Essas transformações, se adotada a denominação de “reformas” neste momento histórico, devem seguir em qual rumo ou sentido?


O caminho apontado pelo governo Temer-Meireles-Padilha, mergulhado em
corrupção e fisiologismo, é aquele a ser trilhado e apoiado pela
maioria da população brasileira?


A resposta pode ser encontrada, entre outros, na Constituição de
1988. Esse documento, fundador do atual Estado Democrático de Direito,
fixa os seguintes objetivos fundamentais para a República Federativa do
Brasil:


a) construir uma sociedade livre, justa e solidária;


b) garantir o desenvolvimento nacional;


c)  erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais


e d) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.


Para que os fins destacados sejam alcançados, o constituinte definiu
os traços mais relevantes dos instrumentos fundamentais a serem
utilizados.


Assim, conformou o modelo de Estado e sociedade a serem desenvolvidos no Brasil. Entre outros pontos relevantes:


a) indicou a educação e a saúde como direitos de todos e deveres do Estado;


b) desenhou um avançado sistema de seguridade social, incluídas as proteções previdenciárias e assistenciais


e c) cuidou de estabelecer importantes mecanismos de financiamento das políticas públicas nessas e outras áreas.


A ambiciosa rede de proteção social concebida e organizada pelo
constituinte, baseada na solidariedade social e visando o bem-estar de
todos, está centrada na titularidade e efetiva fruição de uma série de
direitos sociais, qualificados constitucionalmente como fundamentais.


Exatamente no dispositivo que enuncia os direitos fundamentais dos
trabalhadores, a Constituição afirma categoricamente que outros
direitos, além dos listados, deverão ser adotados para “a melhoria de
sua condição social” (artigo sétimo).


Resta, portanto, fora de dúvida que vivemos numa sociedade (e Estado)
onde os direitos, notadamente sociais fundamentais, devem ser
assegurados e ampliados. A Constituição não tolera o retrocesso social. O
constituinte não admitiu a degradação da condição social dos
trabalhadores com limitações e restrições de seus direitos.


O governo Temer-Meireles-Padilha, como claro instrumento dos
interesses mais mesquinhos do empresariado do agronegócio, da indústria,
do comércio e da área financeira, adota rumo diametralmente oposto ao
indicado pelo constituinte de 1988.


A busca frenética pela eliminação e restrição de direitos sociais está presente:


a) na proposta (aprovada) de fixação de um teto draconiano de gastos
primários (e ausência de limites para as despesas financeiras);


b) na nova legislação sobre terceirização (e precarização) da força de trabalho;


c) na reforma trabalhista (parcialmente aprovada) que, entre outras
maldades, determina a prevalência do negociado sobre o legislado (“para
pior”)


e d) na reforma previdenciária, que contempla um festival de redução de direitos.


As verdadeiras reformas, aquelas de caráter democrático e popular,
devem buscar, como dito, a manutenção e ampliação de direitos, em
especial os sociais fundamentais.


Para tanto, as seguintes e perversas (em função das consequências sociais produzidas) realidades nacionais reclamam “reformas”:


a) a sonegação tributária, estimada em R$ 500 bilhões anuais, precisa de atenção e ataque planejado e organizado;


b) a Dívida Ativa da União e de suas autarquias, mediante uma
recuperação progressiva decorrente do adequado aparelhamento dos órgãos
públicos envolvidos, notadamente a Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional e a Procuradoria-Geral Federal. O estoque
dessa dívida ultrapassa a cifra de R$ 1,5 trilhão;


c) os benefícios (ou exonerações) tributárias. Segundo levantamento
especializado, “as desonerações de tributos concedida pelo governo da
presidente Dilma desde 2011 somarão cerca de R$ 458 bilhões em 2018”;


d) a Seguridade Social, por intermédio de uma ampla e democrática
auditoria que aponte as reais necessidades de modificações (envolvendo o
financiamento segundo os parâmetros constitucionais, as desonerações
tributárias, a sonegação, a inadimplência em razão da crise econômica,
as fraudes, os privilégios, a pertinência de alterações nas idades
mínimas e outros aspectos relevantes);


e) a dívida pública, via auditoria conforme exige o art. 26 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e implementação de
uma administração transparente e com controle social, inclusive com a
supressão de mecanismos indevidos que viabilizam o seu contínuo
crescimento (como a atualização monetária do montante e o seu
financiamento por intermédio do lançamento de novos títulos em flagrante
violação à “regra de ouro” inscrita no art. 167, inciso III, da
Constituição). Observe-se que a evolução da dívida pública mobiliária
federal interna não encontra nenhuma explicação nas diferenças positivas
e negativas do resultado primário (desconsiderada a parte financeira)
nos últimos vinte anos. O patamar desse endividamento saiu de R$ 61,7
bilhões em 1994 para R$ 2.753,4 bilhões em março de 2016. O problema
da dívida pública monumental e crescente não tem fundamento na vertente
fiscal da economia brasileira, como pretende o discurso oficial e da
grande imprensa;


f) a política monetária. Compreendendo uma regulamentação ampla e
social: f.1) da fixação da taxa de juros SELIC; f.2) do nível e
administração das reservas monetárias internacionais (admitindo a venda
do excesso, inclusive); f.3) do tamanho da base monetária e f.4) das
operações compromissadas e todas as formas de “ajuste de liquidez”.
Segundo dados do Banco Central do Brasil, as operações compromissadas
representavam R$ 528,7 bilhões da dívida pública em dezembro de 2013, R$
809,06 bilhões em dezembro de 2014, R$ 913,28 bilhões em dezembro de
2015 e R$ 1.113,97 bilhões em agosto de 2016;


g) a política cambial. Envolvendo uma regulamentação ampla e social:
g.1) do câmbio; g.2) do fluxo de capitais e g.3) das operações de swap
cambial;


h) o sistema tributário, mediante a drástica redução da tributação
sobre o consumo e aumento das tributações sobre a propriedade, capital e
aplicações financeiras, inclusive com a eliminação de privilégios
fiscais;


i) a concentração de mídia, por intermédio de uma profunda
democratização econômica (sem interferência na “redação” ou linha
editorial) da propriedade das empresas de comunicação;


j) a estrutura fundiária, na linha de sua radical desconcentração;


k) a reorganização administrativa do Estado que viabilize: k.1) a
profissionalização do serviço público; k.2) a quase extinção de cargos
comissionados; k.3) o atingimento de níveis satisfatórios de qualidade
na prestação dos serviços públicos; k.4) o controle social sobre o
funcionamento e os resultados da atuação administrativa; k.5) a fixação
de padrões remuneratórios compatíveis com a realidade socioeconômica;
k.6) o combate as diversas formas de privilégios espúrios e k.7) a
construção e fortalecimento de mecanismos efetivos e preventivos de
combate à corrupção;


l) a organização político-eleitoral em novas bases, contemplando:
l.1) a manutenção da impossibilidade de financiamento de campanhas e
partidos por empresas; l.2) a adoção do financiamento público de
campanhas em patamares espartanos, incluídas nessas restrições o fundo
partidário; l.3) a definição clara, sem anistias, da criminalização do
caixa 2 em campanhas eleitorais; l.4) a eliminação das coligações nas
eleições proporcionais, inclusive mediante formas disfarçadas (como na
federação de partidos e assemelhados); l.5) a adoção de fórmulas de
revogação de mandatos por parte dos eleitores; l.6) a democratização do
cálculo do coeficiente eleitoral e a distribuição dos restos nas
eleições proporcionais; l.7) a adoção do procedimento de voto
proporcional primeiro no partido e, depois, num dos candidatos do
partido e l.8) a democratização da distribuição de tempo na propaganda
eleitoral e a participação em debates.


Observe-se que quase todas as questões destacadas não são veiculadas
pela grande mídia. Todos os problemas nacionais parecem concentrados e
limitados aos aspectos estritamente fiscais dos gastos com a previdência
social e remunerações de servidores públicos e aos escândalos de
corrupção.


Opera-se, notadamente nas telas dos televisores, uma engenhosa
redução do mundo percebido pela quase totalidade da população. Afinal,
se quase todos sequer tomam conhecimento das questões antes levantadas,
as mazelas e suas soluções devem ser buscadas no universo parcial,
cuidadosamente recortado e apresentado pelos grandes meios de
comunicação.


O único caminho factível, mesmo lento e trabalhoso, reside na
intervenção popular (não confundir com a tresloucada intervenção
militar). Somente a  mobilização e conscientização populares, em torno 
de medidas efetivamente transformadoras, mudará o Brasil. Trata-se de
atuação que não pode, nem deve, ser terceirizada (para representantes de
qualquer tipo, líderes “esclarecidos” ou “salvadores da Pátria’).


A força motriz das mudanças de fundo, sem prejuízo de combativos e
comprometidos representantes e lideranças políticas como seus
instrumentos, deve estar centrada na cidadania ativa, no protagonismo da
atuação de cada cidadão nos mais variados espaços sociais.

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