domingo, 10 de maio de 2015

Os super-ricos e o resto — CartaCapital

Os super-ricos e o resto — CartaCapital



Os super-ricos e o resto


por Thomaz Wood Jr.



publicado
10/05/2015 10h19,


última modificação
10/05/2015 10h41

A estrutura social está cada vez mais parecida com a hierarquia corporativa


Brazil

A sociedade retratada no filme Brazil, 1958, Terry
Gilliam, é desigual e consumista, com tecnologia onipresente e governo
totalitário


Brazil é uma distopia satírica dirigida por Terry Gilliam, em 1985. O personagem central é Sam Lowry,
interpretado por Jonathan Pryce. A sociedade retratada no filme é
desigual e consumista, a tecnologia é onipresente, o governo é
totalitário, as corporações são poderosas e impessoais, a mãe do
protagonista é obcecada por cirurgia plástica e o seu trabalho não tem
sentido. As semelhanças com as empresas e a sociedade contemporânea são
notáveis.
A vida imita a arte. Em um texto sobre os
movimentos populares na sociedade do século XXI, Noam Chomsky traça a
origem dos termos Plutonomia e Precariado. O primeiro surgiu de um
estudo realizado há dez anos por analistas do Citigroup, segundo o qual o
mundo está dividido em dois blocos, a Plutonomia, formada pelos
super-ricos, e o resto. O objetivo dos autores era orientar os
investidores a selecionar as melhores ações, aquelas de empresas que
produzem para os abastados. 
 
A Plutonomia surgiu
das condições do capitalismo moderno: governos simpáticos às grandes
corporações, estado de direito que garante a liberdade econômica, espaço
para “inovações” financeiras, proteção de patentes e mão de obra
qualificada e dócil. Os super-ricos concentraram a riqueza dos países
desenvolvidos anglo-saxões, Estados Unidos, Inglaterra e Austrália.
Entretanto, os criadores do termo acreditavam que formações similares
surgiriam em economias emergentes, como Brasil, Rússia, Índia e China.
A contrapartida da Plutonomia é o Precariado, formado por
um contingente que vive em condições de insegurança e incerteza, tende a
crescer e tornar-se um componente relevante da estrutura social. O
economista Guy Standing é autor do mais conhecido livro sobre o tema, The Precariat: The new dangerous class, publicado em 2011. Standing advoga que a transformação global da economia está gerando uma nova estrutura de classes, substituta da anterior, cuja espinha dorsal era formada pela burguesia e pelo proletariado.
A nova estrutura, segundo o autor, é
composta de vários grupos. No topo encontra-se uma plutocracia
internacional, a usar seu poder econômico para influenciar e moldar o
poder político. Abaixo dela vicejam elites nacionais e compõe com a
primeira uma classe hegemônica. Logo abaixo, vem o grupo assalariado,
com rendimentos elevados e segurança no emprego. Seus membros ocupam o
topo da pirâmide das grandes empresas e nichos privilegiados da máquina
do Estado. É uma confraria pressionada, perde integrantes para os grupos
logo abaixo, frequentemente por causa de processos de terceirização.
Parte desse contingente é constituída por consultores e pequenos
empresários, que sonham em pertencer à elite. Abaixo desses situa-se o
velho proletariado, mais um grupo em processo de redução, com poucas
chances de sucesso na luta pela manutenção de conquistas passadas. O
precariado está abaixo do proletariado e constitui, segundo Standing,
uma “classe em construção”. Seu trabalho é caracterizado pela
flexibilidade e incerteza.
 
Standing observa que
o precariado é constituído por três subgrupos. O primeiro é formado
pelos desterrados do proletariado, com baixo nível de instrução,
frustrados e propensos a serem seduzidos pelo populismo de
extrema-direita. O segundo é composto de imigrantes e minorias,
frequentemente nostálgicos e politicamente passivos. O terceiro é
constituído por profissionais qualificados, inseguros sobre seu status
na sociedade e sujeitos a trabalho eventual. O autor identifica ainda um
lúmpen precariado, formado por miseráveis que vivem nas ruas, à margem
da sociedade.
A tipologia de Standing pode ser vista
como um modelo em construção. Entretanto, seus componentes podem ser
facilmente observados nas pirâmides empresariais. No topo, os
controladores e suas famílias, servidos por grupos seletos e bem
remunerados de executivos. Nos escalões médios, gestores e profissionais
especializados, aspirantes naturais à vida nos andares superiores.
Abaixo deles, um exército de analistas e operários, lutando para
preservar salários, empregos e benefícios. Ao redor, contingentes cada
vez maiores de prestadores de serviços, dos mais qualificados assessores
aos menos instruídos provedores de serviços básicos. A uni-los a
sujeição às intempéries econômicas e aos humores dos contratantes. A
sociedade parece imitar as corporações.

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