Laura Carvalho é professora do
Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for
Social Research (NYC). Escreve às quintas-feiras.
Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for
Social Research (NYC). Escreve às quintas-feiras.
Quem paga o pacto?
Romero Jucá do seu ministério, registrou "o trabalho competente e a
dedicação do ministro Jucá no correto diagnóstico de nossa crise
financeira e na excepcional formulação de medidas (...) para a correção
do deficit fiscal e da retomada do crescimento da economia".
O pacto confessado por Jucá na gravação de Sérgio Machado, cujo conteúdo
foi divulgado nesta Folha na segunda-feira (23), não deve conseguir nem
uma coisa nem outra. Em vez de técnicos notáveis, fica claro que quem
manda na economia do governo provisório são os políticos. E que
políticos! Temer esclarece, aliás, que Jucá continuará dando as cartas
desde o Senado.
A redução da meta fiscal para um deficit de R$ 170,5 bilhões em 2016
apresentada pelo ex-ministro interino –que teve muito mais tempo para
planejar o golpe do que o Orçamento deste ano– difere da proposta de R$
96,7 bilhões do ministro Nelson Barbosa ao prever menor
contingenciamento de despesas e nenhuma nova fonte de receita.
A política econômica começa, assim, a acertar as contas. No que poderia
ser classificado como mais um caso de keynesianismo fisiológico, o
aumento da previsão de deficit já aprovado no Congresso, em vez de abrir
mais espaço para os investimentos e a criação de empregos, garante
recursos para os sócios do golpe nos Poderes Executivo e Legislativo.
Já para os que conspiravam de fora da Esplanada, o governo sinaliza que
manterá o regime de tributação regressivo, as desonerações fiscais e os
fundos necessários para, por exemplo, o escandaloso reajuste do
Judiciário.
Seguiu-se na terça-feira (24) a apresentação de um conjunto de medidas
de médio prazo para a contenção de gastos. A antecipação de pagamento de
R$ 100 bilhões dos R$ 480 bilhões repassados do Tesouro ao BNDES, além
de possivelmente ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal, não tem efeito
imediato sobre a dívida líquida (que deduz o valor dos ativos do
governo).
A manobra, que poderia gerar uma economia de R$ 7 bilhões anuais em
subsídios, deve prejudicar o financiamento de longo prazo para
investimentos em infraestrutura em caso de retomada do crescimento.
Pouco importa. O BNDES sempre pode voltar ao papel de mero vendedor de
ativos públicos que tinha nos anos 1990.
O roteiro é velho conhecido. Identificada a crise, exige-se um ajuste
fiscal rápido e brusco pela via do corte de gastos e investimentos. Com a
crise agravada e os juros mais altos, a dívida pública continua a
aumentar. Pronto. A oportunidade está criada para promover as
privatizações e a redução estrutural do papel do Estado na economia.
Já as vítimas do golpe terão de sofrer, por exemplo, com o cancelamento
da terceira fase do Minha Casa, Minha Vida, a desvinculação do piso
previdenciário do salário mínimo e, por meio do artifício do
estabelecimento de um teto para o crescimento das despesas dado pela
inflação do ano anterior, com a desobrigação dos gastos constitucionais
com saúde e educação.
Os analistas agora saúdam o deficit maior como um exemplo de
transparência, responsabilidade e pragmatismo fiscal. Garantidos os
privilégios e a perpetuação da desigualdade na renda, sanar as contas
públicas deixa de ser uma palavra de ordem. Na Patópolis, a verdade é a
história da fraude.
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