O Brasil invisível à elite branca
O Brasil invisível à elite branca
Em uma viagem pelo interior mais pobrezinho do Nordeste, este jornalista
deu com uma cena que então parecia meio exótica. Crianças alimentadas,
numa barulheira alegre, lotavam um ônibus escolar amarelo como aqueles
de filme americano, mas estalando de novo.
De onde saíra aquilo? Na lataria, estava escrito: "Programa Caminho da
Escola - Governo Federal". O jornalista confessa com vergonha que até
este ano jamais ouvira falar do "Caminho da Escola". Além do mais, tende
a desconfiar de que alguns desses programas com nomes marqueteiros
sejam ficções, que existam apenas naquelas cerimônias cafonas de
anúncios oficiais.
O "Caminho da Escola", porém, financiou quase 26 mil ônibus desde 2009,
em mais de 4.700 cidades. Digamos que os ônibus carreguem 40 crianças
cada um (deve ser mais). Dá mais de 1 milhão de crianças. Conhecendo a
falta de dinheiro e as distâncias das escolas nos fundões do país, isso
faz uma diferença enorme.
Daqui do centro rico de São Paulo, o Brasil, esse país longínquo, e
muitas ações do governo parecem invisíveis. Quase ninguém "daqui" dá
muita bola para programas populares dos governos do PT até que o povo
miúdo apareça satisfeito em pesquisas eleitorais.
Juntos, tais programas afetam a vida de dezenas de milhões de pessoas,
tanto faz a qualidade dessas políticas, umas melhores, outras nem tanto,
embora nenhuma delas seja nem de longe tão ruim quanto a política
econômica.
Quem "daqui" conhece o Programa Crescer (Programa Nacional de
Microcrédito)? Existia desde 2005, foi reformado por Dilma Rousseff em
2011, quando passou a contar com crédito direcionado e juro baixo, ora
negativo (5%, abaixo da inflação).
O Crescer já financiou o negociozinho de 3,5 milhões de pessoas, um
terço delas recipientes de Bolsa Família. Tem uma versão rural, mais
antiga, mas vitaminada nos governos do PT, o Pronaf, que ofereceu
crédito a juro real ainda mais baixo a 2,2 milhões de agricultores
pequenos na safra 2012/13.
O Pronatec já é mais falado, mas pouco conhecido (até mesmo pelo
governo, que só agora começou a fazer uma avaliação de resultados).
Irmão mais novo e em geral grátis do universitário Prouni, trata-se de
um conjunto variadíssimo de ações que procura oferecer cursos
profissionalizantes e técnicos (ensino médio).
Desde sua criação, foram mais de 5 milhões de matrículas (há evidências
esparsas de grande evasão, de uns 20%, mas ainda falta estatística
séria). A maioria das vagas é reservada para os mais deserdados dos
brasileiros.
Reportagem desta Folha mostrou que os 13 mil médicos do Mais Médicos
devem estar ao alcance de cerca de 46 milhões de pessoas no ano que vem.
Não é uma política ampla de saúde, está claro. Mas, outra vez, vai
resolver muito problema de muita gente deserdada desta terra.
O Minha Casa, Minha Vida já entregou 1,32 milhão de casas; tem mais 1,6 milhão contratadas. Beneficia 4,6 milhões de pessoas.
Junte-se a isso tudo as já manjadas transferências sociais, em dinheiro,
crescentes em valor e cobertura. É muita gente "de lá" beneficiada.
Goste-se ou não do conjunto da obra, o efeito social e político é
enorme.
A gente "daqui" precisa visitar mais o Brasil.
Vinicius Torres Freire está na Folha desde 1991. Foi
secretário de Redação, editor de 'Dinheiro', 'Opinião', 'Ciência',
'Educação' e correspondente em Paris. Em sua coluna, aborda temas
políticos e econômicos. Escreve de terça a sexta e aos domingos
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