A imprensa como partido político - Observatório da Imprensa - Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito
Por Washington Araujo em 20/04/2010 na edição 586
Esperei baixar a poeira. Em vão, porque a poeira existiu apenas na internet. E tudo porque me causou estranheza ler no diário carioca O Globo (18/3/2010) a seguinte declaração de Maria Judith Brito, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e executiva do grupo Folha de S.Paulo:
‘A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação e, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo.’
E como a poeira não baixou resolvi colocar no papel as questões que foram se multiplicando, igual praga de gafanhotos, plantação de cogumelos, irrupção de brotoejas. Ei-las:
1. É função da Associação Nacional de Jornais, além de representar legalmente os jornais, fazer o papel de oposição política no Brasil?
2. É de sua expertise mensurar o grau de força ou de fraqueza dos partidos de oposição ao governo?
3. Expirou aquela visão antiquada que tínhamos do jornalismo como sendo o de buscar a verdade, a informação legítima, para depois reportar com a maior fidelidade possível todos os assuntos que interessam à sociedade?
4. Como conciliar aquela função antiquada, própria dos que desejam fazer o bom jornalismo no Brasil, como tentei descrever na questão anterior, com a atuação político-partidária, servindo como porta-voz dos partidos de oposição?
5. Sendo o Datafolha propriedade de um dos grandes jornais do Brasil e este um dos afiliados da ANJ, como deveríamos fazer a leitura correta das pesquisas de opinião por ele trabalhadas? O Datafolha estaria também a serviço de uma oposição ‘que no Brasil se encontra fragilizada’?
6. Na condição de presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ) será que Maria Judith Brito não se excedeu para muito além de suas responsabilidades institucionais?
7. Ou será próprio de quem brande o estatuto da liberdade de imprensa que entidade de classe de veículos de comunicação assuma o papel de oposição política no saudável debate entre governo e oposição?
8. Historicamente, sempre que um dirigente ou líder de partido político de oposição desanca o governo, seja justa ou injustamente, é natural que o governo responda à altura e na mesma intensidade com que o ataque foi desferido. Mas, no caso atual, em que a ANJ toma si para a missão de atuar como partido político de oposição, não seria de todo natural esperar que o governo reaja à altura do ataque recebido?
9. E, neste caso, como deveria ser encarada a reação do governo? Seria vista como ataque à liberdade de expressão? Ou seria considerado como legítima defesa de da liberdade de expressão ou de ideologia?
Claro e transparente
10. Durante o período de 1989 a 2002, em que a oposição política no Brasil esteve realmente fragilizada, e ao extremo, não teria sido o caso de a ANJ ter tomado para si as dores daquela oposição, muitas vezes, capenga?
11. E, no caso acima, como a ANJ acha que teriam reagido os governos Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso?
12. Com o histórico de nossos veículos de comunicação, muitos deles escorados em sua antiguidade, como aferir se há pureza de intenções por parte da ANJ em sua decisão de tomar para si responsabilidade que só lhe poderia ser concedida pelo voto dos brasileiros depositados nas urnas periodicamente? Não seria uma usurpação de responsabilidade?
13. Afinal, não é através de eleições democráticas e por sufrágio universal e secreto que a população demonstra sua aprovação ou desaprovação a partidos políticos?
14. Será legítimo que, assinantes de jornais e revistas representados pela associação presidida por Maria Judith Brito passem, doravante, a esmiuçar a cobertura política desses veículos, tentando descobrir qual a motivação dessa ou daquela reportagem, dessa ou daquela nota, dessa ou daquela capa?
15. E quanto ao direito dos eleitores de serem livremente informados… que garantias estes terão de que serão informados, de forma justa e o mais imparcial possível, das ações e idéias do governo a que declaradamente se opõe a ANJ?
16. Para aqueles autoproclamados guardiães da liberdade de expressão e do Estado democrático de direito: será papel dos meios de comunicação substituir a ação dos partidos políticos no Brasil, seja de situação ou de oposição?
17. Em isso acontecendo… não estaremos às voltas com clássica usurpação de função típica de partido político? E não seria esta uma gigantesca deformação do rito democrático?
18. Repudiam-se as relações deterioradas entre governo e mídia na Venezuela, mas ao que tudo indica nada se faz para impedir sua ocorrência no Brasil. Ironicamente, os maiores veículos de comunicação do país demonizam o país de Hugo Chávez. A origem do conflito político na Venezuela não está umbilicalmente ligado ao fato que na Venezuela os meios de comunicação funcionam como partido político de oposição, abrindo mão da atividade jornalística?
19. Esta declaração da presidente da ANJ, publicada no insuspeito O Globo, traduz fielmente o objetivo de a ANJ estabelecer a ruptura com o governo, afetar a credibilidade da imprensa e trazer insegurança a todos os governantes, uma vez que serve também aos governos estaduais e dos municípios onde a oposição estiver fragilizada?
20. Considerando esta declaração um divisor de águas quanto ao sempre intuído partidarismo e protagonismo político dos grandes veículos de comunicação do país, será que não seria mais que oportuno e inadiável a ANJ vir a público esclarecer tão formidável mudança de atitude e de missão institucional? Por que não abordar o assunto de forma clara e transparente nas páginas amarelas da revista Veja? Por que não convidar a Maria Judith Brito para ser entrevistada no programa Roda Vida da TV Cultura? Por que não convidá-la para o Programa do Jô? E para ser entrevistada pelo Heródoto Barbeiro na rádio CBN? Por que não solicitar a leitura de ‘Nota da ANJ’sobre o assunto no Jornal Nacional? Por que não submeter texto para publicação na seção ‘Tendências/Debates’ do jornal Folha de S.Paulo, onde a presidente trabalha? De tão interessante não seria o momento de a revista Época traçar o perfil de Maria Judith Brito? E que tal ser sabatinada pela bancada do Canal Livre, da Band?
Prudente e sábio
Já que comecei falando de estranheza, estranhamento etc., achei esquisito a não-repercussão ostensiva da fala da presidente da ANJ junto aos veículos de seus principais afiliados. Estratégia política? Opção editorial? Ou as duas coisas?
Finalmente, resta uma questão de foro íntimo: que critério deverei usar, doravante, para separar o que é análise crítica própria de um partido político, para consumo interno de seus filiados, daquilo que é matéria propriamente jornalística, de interesse da sociedade como um todo?
Todos nós, certamente, já ouvimos centenas de vezes o ditado ‘cada macaco no seu galho’. E todos nós o utilizamos nas mais diversas situações. O ditado é um dos mais festejados da sabedoria popular, é expressão de conhecimento, nascido da observação de fatos; um aprendizado empírico. Vem de longa data e se estabelece porque pode ser comprovado através da vivência e mais recentemente foi citado por Michel Foucault e Jurgen Habermas. No caso aqui abordado, o ditado popular cai como luva assim como as palavras de Judith Brito ficarão por muito tempo gravadas no bronze incorruptível da nossa memória.
Mesmo assim sinto ser oportuno aclarar que entendo como papel da mídia atividades como registrar, noticiar os fatos, documentar, fiscalizar os poderes, denunciar abusos e permitir à população uma compreensão mais ampla da realidade que nos abarca. Neste rol de funções não contemplo o de ser porta-voz de partido político, seja este qual for. Ora, o governo tem limites de ação: operacionais, constitucionais, políticos. A mídia, quando não investida de poderes supraconstitucionais, também tem seus limites que não são tão flexíveis a ponto de atender as conveniências dos seus proprietários ou concessionários. É prudente e sábio reconhecer que em uma sociedade democrática todos os setores precisam de regulação – e a mídia não é diferente. E é bom que não seja. Afinal, a lei é soberana e a ela todos devem se submeter, já escrevia o pensador Shoghi Effendi (1897-1957) na segunda metade de 1950. Nada mais atual que isto.
******
Mestre em Comunicação pela UnB e escritor; criou o blog Cidadão do Mundo; seu twitter
sábado, 31 de dezembro de 2016
Como tornar desejada a dominação
Como tornar desejada a dominação. Por Sylvia Moretzsohn - TIJOLAÇO | .”
Por Sylvia Moretzsohn
No clássico A psicologia de massas do fascismo, escrito em 1933 – portanto, no processo de ascensão do nazismo na Alemanha –, Wilhelm Reich perguntava-se por que, até então, não se haviam estudado as razões pelas quais, há milênios, as pessoas aceitam a exploração, a humilhação, a escravidão. Não se trata, naturalmente, de indagar por que se submetem contra a vontade a uma força mais poderosa, mas de saber por que aceitam a dominação, a ponto de naturalizá-la. Mais ainda: por que participam ativamente do processo que resultará na própria submissão.
É uma questão que não pode ser respondida apenas com a abordagem tradicional sobre o poder da ideologia. Ou melhor: é uma questão que exige articular essa abordagem a algo mais profundo, que são as estruturas psicológicas das pessoas numa determinada época. Ao estudar o fenômeno do fascismo, Reich observou que ele só poderia prosperar num ambiente social e psicológico receptivo àquele tipo de propaganda, e que expressava a mentalidade do “Zé Ninguém”, um ser subjugado, sedento de autoridade e, ao mesmo tempo, revoltado. Assinalou a habilidade de Hitler em manejar as emoções desse público, através da tática – expressa no Mein Kampf – de evitar ao máximo uma argumentação objetiva: o fundamental era explorar frustrações e ressentimentos e martelar o grande objetivo final como recompensa. Precisamente, aliás, o que fez Donald Trump quase um século depois, ao prometer “make America great again”, e ganhar a Casa Branca.
(…) Perguntar por que acreditamos no que acreditamos, perceber a força do auto-engano é o ponto de partida para tentarmos entender e buscar superar a nossa tendência a viver num mundo feito de sombras. Dependendo da qualidade da nossa formação e da informação que recebemos, estaremos mais ou menos habilitados para o exercício dessa crítica. Pois, como Laerte sintetizou numa de suas notáveis charges, “em terra de cego ninguém se importa se o rei está nu”. A quem interessa produzir essa cegueira?
O Brasil é um país em que a maioria da população tem baixa escolaridade e se informa basicamente pela TV, pelo rádio e pela internet, esse ambiente que não apenas radicaliza a mistura de entretenimento e informação mas promove a circulação ininterrupta de informações falsas e verdadeiras, que chegam a confundir mesmo quem tem formação adequada para distingui-las. As redes sociais poderiam ser um espaço de debate e esclarecimento, mas tendem a reproduzir guetos de autoconvencimento, num contexto social de rejeição ao diálogo. Sobretudo quando são operadas por certos movimentos organizados, interessados em instrumentalizá-las para atingir seus objetivos.
(…) Desde que estourou o caso do Mensalão, em 2005, esta mídia veio identificando a corrupção ao PT, como se “nunca antes na história deste país” tivéssemos vivido situação semelhante. (…) O vínculo “corrupção = PT”, que ganhou força adicional por atingir um partido que surgiu e cresceu com a promessa de inaugurar “outra história” na política brasileira, foi trabalhado ao longo de uma década e produziu o antipetismo cego, componente essencial do discurso de ódio que se espalhou nas manifestações pelo impeachment. (…)
Despolitizar a questão da corrupção, transformá-la numa cruzada moral, instilar o medo e excitar o ódio sempre formaram o roteiro para desestabilizar governos minimamente comprometidos com as causas sociais. O processo que resultou no golpe atual envolve dois elementos novos: o primeiro é o próprio mal-estar causado pela ascensão de um ex-retirante nordestino ao cargo mais alto da República, algo que a elite jamais engoliu. O outro são a ampliação e a melhoria das condições econômicas da “classe C” durante os tempos de prosperidade dos governos petistas: a exploração da frustração da classe média diante da perda de certas distinções – ter de compartilhar espaços antes exclusivos em aeroportos e universidades, por exemplo – fez brotar aquilo que o famoso deputado detonador do Mensalão chamou de “instintos mais primitivos”, extravasados nas maciças manifestações de rua, nas varandas gourmet e nas redes sociais.
(…) Perceber como a mídia, sobretudo os meios eletrônicos, manipula as emoções do público é fundamental para entender o ponto a que chegamos. Mas, se, como afirmava Espinosa, uma paixão – no caso, o ódio – só pode ser vencida por outra paixão mais forte, é preciso trabalhar sobre elas e quebrar resistências para tentar reverter esse quadro.
Como sabemos, os princípios clássicos do jornalismo derivam do ideal iluminista de esclarecimento. Oferecer informações verdadeiras, contextualizá-las, abrir espaço ao confronto de ideias é fundamental para a formação da opinião. Mas essa aposta na razão sempre se frustra se não há a disposição de ouvir.
Professora de Jornalismo da Universidade Federal Fluminense. Artigo publicado originalmente no Suplemento Pernambuco, condensado pela autora para o Tijolaço.
Por Sylvia Moretzsohn
No clássico A psicologia de massas do fascismo, escrito em 1933 – portanto, no processo de ascensão do nazismo na Alemanha –, Wilhelm Reich perguntava-se por que, até então, não se haviam estudado as razões pelas quais, há milênios, as pessoas aceitam a exploração, a humilhação, a escravidão. Não se trata, naturalmente, de indagar por que se submetem contra a vontade a uma força mais poderosa, mas de saber por que aceitam a dominação, a ponto de naturalizá-la. Mais ainda: por que participam ativamente do processo que resultará na própria submissão.
É uma questão que não pode ser respondida apenas com a abordagem tradicional sobre o poder da ideologia. Ou melhor: é uma questão que exige articular essa abordagem a algo mais profundo, que são as estruturas psicológicas das pessoas numa determinada época. Ao estudar o fenômeno do fascismo, Reich observou que ele só poderia prosperar num ambiente social e psicológico receptivo àquele tipo de propaganda, e que expressava a mentalidade do “Zé Ninguém”, um ser subjugado, sedento de autoridade e, ao mesmo tempo, revoltado. Assinalou a habilidade de Hitler em manejar as emoções desse público, através da tática – expressa no Mein Kampf – de evitar ao máximo uma argumentação objetiva: o fundamental era explorar frustrações e ressentimentos e martelar o grande objetivo final como recompensa. Precisamente, aliás, o que fez Donald Trump quase um século depois, ao prometer “make America great again”, e ganhar a Casa Branca.
(…) Perguntar por que acreditamos no que acreditamos, perceber a força do auto-engano é o ponto de partida para tentarmos entender e buscar superar a nossa tendência a viver num mundo feito de sombras. Dependendo da qualidade da nossa formação e da informação que recebemos, estaremos mais ou menos habilitados para o exercício dessa crítica. Pois, como Laerte sintetizou numa de suas notáveis charges, “em terra de cego ninguém se importa se o rei está nu”. A quem interessa produzir essa cegueira?
O Brasil é um país em que a maioria da população tem baixa escolaridade e se informa basicamente pela TV, pelo rádio e pela internet, esse ambiente que não apenas radicaliza a mistura de entretenimento e informação mas promove a circulação ininterrupta de informações falsas e verdadeiras, que chegam a confundir mesmo quem tem formação adequada para distingui-las. As redes sociais poderiam ser um espaço de debate e esclarecimento, mas tendem a reproduzir guetos de autoconvencimento, num contexto social de rejeição ao diálogo. Sobretudo quando são operadas por certos movimentos organizados, interessados em instrumentalizá-las para atingir seus objetivos.
(…) Desde que estourou o caso do Mensalão, em 2005, esta mídia veio identificando a corrupção ao PT, como se “nunca antes na história deste país” tivéssemos vivido situação semelhante. (…) O vínculo “corrupção = PT”, que ganhou força adicional por atingir um partido que surgiu e cresceu com a promessa de inaugurar “outra história” na política brasileira, foi trabalhado ao longo de uma década e produziu o antipetismo cego, componente essencial do discurso de ódio que se espalhou nas manifestações pelo impeachment. (…)
Despolitizar a questão da corrupção, transformá-la numa cruzada moral, instilar o medo e excitar o ódio sempre formaram o roteiro para desestabilizar governos minimamente comprometidos com as causas sociais. O processo que resultou no golpe atual envolve dois elementos novos: o primeiro é o próprio mal-estar causado pela ascensão de um ex-retirante nordestino ao cargo mais alto da República, algo que a elite jamais engoliu. O outro são a ampliação e a melhoria das condições econômicas da “classe C” durante os tempos de prosperidade dos governos petistas: a exploração da frustração da classe média diante da perda de certas distinções – ter de compartilhar espaços antes exclusivos em aeroportos e universidades, por exemplo – fez brotar aquilo que o famoso deputado detonador do Mensalão chamou de “instintos mais primitivos”, extravasados nas maciças manifestações de rua, nas varandas gourmet e nas redes sociais.
(…) Perceber como a mídia, sobretudo os meios eletrônicos, manipula as emoções do público é fundamental para entender o ponto a que chegamos. Mas, se, como afirmava Espinosa, uma paixão – no caso, o ódio – só pode ser vencida por outra paixão mais forte, é preciso trabalhar sobre elas e quebrar resistências para tentar reverter esse quadro.
Como sabemos, os princípios clássicos do jornalismo derivam do ideal iluminista de esclarecimento. Oferecer informações verdadeiras, contextualizá-las, abrir espaço ao confronto de ideias é fundamental para a formação da opinião. Mas essa aposta na razão sempre se frustra se não há a disposição de ouvir.
Professora de Jornalismo da Universidade Federal Fluminense. Artigo publicado originalmente no Suplemento Pernambuco, condensado pela autora para o Tijolaço.
A Saúde Pública, os médicos e os super-ricos, por Ion de Andrade
A Saúde Pública, os médicos e os super-ricos, por Ion de Andrade
A Saúde Pública, os médicos e os super-ricos, por Ion de Andrade
por Ion de Andrade
O governo Temer vem desferindo continuamente alguns duríssimos golpes contra a saúde pública e contra os médicos sob silêncio geral de entidades que deveriam, por dever de ofício, exprimir-se contrariamente com veemência. Duas exceções ao silêncio: a redução pelo Ministério da Saúde do número de profissionais médicos nas UPAs (de quatro para dois no mínimo) e o glorioso projeto dos planos de saúde para pobre, visando aliviar a Atenção Básica, receberam notas negativas por parte de algumas entidades.
Mas a representação política de uma categoria tem a obrigação de antever no cenário político e econômico o que pode efetivamente ameaçar os interesses estratégicos para o exercício profissional, devendo ir para o enfrentamento tanto na macropolítica quanto na micro.
Lamentavelmente isso não ocorreu no tocante às seguintes condições claramente danosas ao exercício da medicina:
1. A redução do número de bolsas para a ampliação dos programas de Residência Médica;
2. A PEC 55, cuja força destruidora (agora inarredável) golpeará de forma talvez irreversível tudo o que interessa à vida profissional dos médicos,
3. O Projeto de Reforma da Previdência que prejudica enormemente os trabalhadores como um todo, com ênfase para os universitários, que iniciam a sua contribuição mais tardiamente que os que ingressam no mercado de trabalho mais cedo. A formação médica, com seus seis anos de duração, seguida de uma Residência Médica cuja duração acrescenta cerca de três a cinco anos a mais ao itinerário formativo é a mais longa, sendo por isso, matematicamente, a mais prejudicada no que toca aos macabros 49 anos de contribuição.
Não pretendo aqui analisar os condicionantes deste silêncio, que exprimem uma posição de apoio e adesão ao em nada elogiável governo Temer. Entretanto, em nenhuma circunstância, o alinhamento político poderia justifica o “lavar as mãos” para a catástrofe de proporções bíblicas que se abaterá sobre o exercício profissional médico (e sobre os seus pacientes SUS) nos anos vindouros. Não é preciso ser vidente para enxergar que medidas como a da redução do número de médicos nas UPAs são coerentes com a PEC 55. Ou para entender que elas se tornarão a regra num volume que será impossível de ser detido com “notas de viva oposição” focais.
A redução dos efetivos profissionais na porta das UPAs será seguida pelo recálculo per capita a maior para a autorização de todos e de cada componente da rede SUS. Antevejo, por exemplo, que se hoje uma UPA deva cobrir 200.000 pessoas para ser autorizada, num futuro próximo deverá cobrir 400.000. Complexo demais para quem não enxergou o mal maior da PEC ou da Reforma da Previdência tal miserando cálculo, coisa de sanitaristas, pode parecer de interesse menor e secundário para os médicos, mas não é. Reduzir o número de unidades ou o de efetivos profissionais equivale ao mesmo, pois impacta a qualidade do trabalho profissional, a sobrecarga, a empregabilidade e a renda. Mas qual será o apetite político das nossas entidades profissionais em se contrapor a uma tal mudança no cálculo de disponibilidade de unidades de saúde para o SUS? Ou que percepção os médicos terão de que isso toca ao seu interesse vital?
A minha geração conheceu o momento em que o que os políticos diziam dos médicos era que eram como farinha: “branco, barato e fácil de encontrar”. No caso das UPAs os dois médicos descartados viram farinha. E vão estar não somente desempregados, como aptos a baratear o custo da mão de obra médica, pois serão “exército de reserva”.
Tarde demais. O Navio do Estado Social vai a pique. Ele levará aos abismos a segunda e terceira classes formadas pelos pacientes do SUS, mas também uma iludida primeira classe.
Quem pensava que os salários médicos seriam melhorados em governo conservador se enganou, quem esperava boa recuperação do valor dos procedimentos SUS se enganou, quem esperava melhores contratos para os seus hospitais privados se enganou, o convés se inclina e logo estará na vertical.
Tudo isso para poupar os super ricos de mais impostos. Eles são 1% da população, detém 50% do PIB, recebem 50% do orçamento público federal via serviços do endividamento público e pagam em média 6% de impostos, contra os 27,5% que onera a classe média. E não são médicos, são empresários. É em nome deles que o governo foi derrubado e é em nome deles que o cenário de implosão se constrói.
Ainda há tempo para algo? Não. Vamos a pique.
Como diria Dante: “Deixai toda esperança, ó vós que entrais!”
A Saúde Pública, os médicos e os super-ricos, por Ion de Andrade
por Ion de Andrade
O governo Temer vem desferindo continuamente alguns duríssimos golpes contra a saúde pública e contra os médicos sob silêncio geral de entidades que deveriam, por dever de ofício, exprimir-se contrariamente com veemência. Duas exceções ao silêncio: a redução pelo Ministério da Saúde do número de profissionais médicos nas UPAs (de quatro para dois no mínimo) e o glorioso projeto dos planos de saúde para pobre, visando aliviar a Atenção Básica, receberam notas negativas por parte de algumas entidades.
Mas a representação política de uma categoria tem a obrigação de antever no cenário político e econômico o que pode efetivamente ameaçar os interesses estratégicos para o exercício profissional, devendo ir para o enfrentamento tanto na macropolítica quanto na micro.
Lamentavelmente isso não ocorreu no tocante às seguintes condições claramente danosas ao exercício da medicina:
1. A redução do número de bolsas para a ampliação dos programas de Residência Médica;
2. A PEC 55, cuja força destruidora (agora inarredável) golpeará de forma talvez irreversível tudo o que interessa à vida profissional dos médicos,
3. O Projeto de Reforma da Previdência que prejudica enormemente os trabalhadores como um todo, com ênfase para os universitários, que iniciam a sua contribuição mais tardiamente que os que ingressam no mercado de trabalho mais cedo. A formação médica, com seus seis anos de duração, seguida de uma Residência Médica cuja duração acrescenta cerca de três a cinco anos a mais ao itinerário formativo é a mais longa, sendo por isso, matematicamente, a mais prejudicada no que toca aos macabros 49 anos de contribuição.
Não pretendo aqui analisar os condicionantes deste silêncio, que exprimem uma posição de apoio e adesão ao em nada elogiável governo Temer. Entretanto, em nenhuma circunstância, o alinhamento político poderia justifica o “lavar as mãos” para a catástrofe de proporções bíblicas que se abaterá sobre o exercício profissional médico (e sobre os seus pacientes SUS) nos anos vindouros. Não é preciso ser vidente para enxergar que medidas como a da redução do número de médicos nas UPAs são coerentes com a PEC 55. Ou para entender que elas se tornarão a regra num volume que será impossível de ser detido com “notas de viva oposição” focais.
A redução dos efetivos profissionais na porta das UPAs será seguida pelo recálculo per capita a maior para a autorização de todos e de cada componente da rede SUS. Antevejo, por exemplo, que se hoje uma UPA deva cobrir 200.000 pessoas para ser autorizada, num futuro próximo deverá cobrir 400.000. Complexo demais para quem não enxergou o mal maior da PEC ou da Reforma da Previdência tal miserando cálculo, coisa de sanitaristas, pode parecer de interesse menor e secundário para os médicos, mas não é. Reduzir o número de unidades ou o de efetivos profissionais equivale ao mesmo, pois impacta a qualidade do trabalho profissional, a sobrecarga, a empregabilidade e a renda. Mas qual será o apetite político das nossas entidades profissionais em se contrapor a uma tal mudança no cálculo de disponibilidade de unidades de saúde para o SUS? Ou que percepção os médicos terão de que isso toca ao seu interesse vital?
A minha geração conheceu o momento em que o que os políticos diziam dos médicos era que eram como farinha: “branco, barato e fácil de encontrar”. No caso das UPAs os dois médicos descartados viram farinha. E vão estar não somente desempregados, como aptos a baratear o custo da mão de obra médica, pois serão “exército de reserva”.
Tarde demais. O Navio do Estado Social vai a pique. Ele levará aos abismos a segunda e terceira classes formadas pelos pacientes do SUS, mas também uma iludida primeira classe.
Quem pensava que os salários médicos seriam melhorados em governo conservador se enganou, quem esperava boa recuperação do valor dos procedimentos SUS se enganou, quem esperava melhores contratos para os seus hospitais privados se enganou, o convés se inclina e logo estará na vertical.
Tudo isso para poupar os super ricos de mais impostos. Eles são 1% da população, detém 50% do PIB, recebem 50% do orçamento público federal via serviços do endividamento público e pagam em média 6% de impostos, contra os 27,5% que onera a classe média. E não são médicos, são empresários. É em nome deles que o governo foi derrubado e é em nome deles que o cenário de implosão se constrói.
Ainda há tempo para algo? Não. Vamos a pique.
Como diria Dante: “Deixai toda esperança, ó vós que entrais!”
Temer e o Brasil sabujo e imbecil de seu comercial de TV
Temer e o Brasil sabujo e imbecil de seu comercial de TV - TIJOLAÇO | ”
Temer e o Brasil sabujo e imbecil de seu comercial de TV
Por Fernando Brito · 31/12/2016
Assisti, finalmente, o comercial de Michel Temer – não, não é um comercial do governo brasileiro – na televisão.
É uma peça de estupidez.
Além das mentiras que ontem se apontou aqui, com o trecho do texto antecipado pela Folha, o fecho do anúncio é de uma atroz prostituição ao capital estrangeiro.
“O mundo já reconhece que investir no Brasil voltou a ser um bom negócio”
Claro, onde é, no mundo, que se vai encontrar um governo que entregue jazidas imensas de petróleo praticamente de graça?
Onde é que se vai encontrar um país em que se possa colocar uns dólares e sair com eles generosamente multiplicados à custa de cortes na saúde, na educação e na assistência social de seu povo.
Onde é que vão encontrar um governante ilegítimo – afinal, as ditaduras escasseiam no mundo – que faça qualquer coisa para que um chefe de Estado ou um dirigente de multinacional venha posar para uma foto de cumprimentos, quando o planeta inteiro o olha de esguelha.
Somos, mais do que sempre fomos, um campo de caça do capital internacional. Somos um país de uma elite imbecil, que considera que só de fora há gente capaz de (nos) explorar as riquezas, e que algumas migalhas são o máximo que merecem por abrir a porteira, escancaradamente.
O Brasil “voltou a ser um bom negócio” porque o país está controlado por barraqueiros de feira na hora da xepa, vergado, destruído, arruinado, pedinte.
Regido – porque se comportam mesmo como rei pela usurpação – por um bando, como dizia o velho Brizola, de vendilhões da pátria.
Repito o que já disse: a propaganda do Temer é a cara do Temer.
Um evidente mau negócio para o Brasil.
Temer e o Brasil sabujo e imbecil de seu comercial de TV
Por Fernando Brito · 31/12/2016
Assisti, finalmente, o comercial de Michel Temer – não, não é um comercial do governo brasileiro – na televisão.
É uma peça de estupidez.
Além das mentiras que ontem se apontou aqui, com o trecho do texto antecipado pela Folha, o fecho do anúncio é de uma atroz prostituição ao capital estrangeiro.
“O mundo já reconhece que investir no Brasil voltou a ser um bom negócio”
Claro, onde é, no mundo, que se vai encontrar um governo que entregue jazidas imensas de petróleo praticamente de graça?
Onde é que se vai encontrar um país em que se possa colocar uns dólares e sair com eles generosamente multiplicados à custa de cortes na saúde, na educação e na assistência social de seu povo.
Onde é que vão encontrar um governante ilegítimo – afinal, as ditaduras escasseiam no mundo – que faça qualquer coisa para que um chefe de Estado ou um dirigente de multinacional venha posar para uma foto de cumprimentos, quando o planeta inteiro o olha de esguelha.
Somos, mais do que sempre fomos, um campo de caça do capital internacional. Somos um país de uma elite imbecil, que considera que só de fora há gente capaz de (nos) explorar as riquezas, e que algumas migalhas são o máximo que merecem por abrir a porteira, escancaradamente.
O Brasil “voltou a ser um bom negócio” porque o país está controlado por barraqueiros de feira na hora da xepa, vergado, destruído, arruinado, pedinte.
Regido – porque se comportam mesmo como rei pela usurpação – por um bando, como dizia o velho Brizola, de vendilhões da pátria.
Repito o que já disse: a propaganda do Temer é a cara do Temer.
Um evidente mau negócio para o Brasil.
quinta-feira, 29 de dezembro de 2016
Agora fica mais nítida a participação dos Estados Unidos nos contornos da Lava Jato – O Cafezinho
Agora fica mais nítida a participação dos Estados Unidos nos contornos da Lava Jato – O Cafezinho
Por Rafael Castilho, publicado em rede social
A bola da vez a ser encaçapada em definitivo é a Odebrecht.
Depois de colocarem o presidente da empresa na masmorra e o coagido a realizar a delação premiada (tortura por outros meios), o momento é de rapinar e delapidar o patrimônio da Odebrecht por meio de multas e confiscos.
O inexistente Estado da Suíça cumpre o seu papel e aproveita da situação para meter a mão no dinheiro investido naquele país, supostamente um lugar seguro. Bem feito, nesse sentido.
O fato é que como a sociedade ficou envolvida no cotidiano do Fora Dilma e do Fora Temer, pouquíssimas pessoas se deram conta dos interesses estadunidenses no desenrolar da Lava Jato, para além das disputas partidárias locais.
Não é teoria de conspiração. Os fatos recentes demonstram o apetite dos ianques. No mais, um país com o histórico de apoio a golpes, guerras e suporte a levantes no mundo todo, sempre em defesa da “paz, liberdade e democracia”, deixa a todos bem escolados de como funciona seu modo de operação.
Quem assistiu a série do Pablo Escobar vai se dar conta de alguns detalhes. Escobar era um traficante internacional de cocaína que se tornou bilionário vendendo para o mercado americano. O negócio continua a existir, porém não mais nas mãos de Escobar. Era um negócio muito grande para ele. Vinte anos depois da morte de Escobar, os EUA continuam a ser o maior consumidor de cocaína do mundo. Metade da droga do mundo é consumida pelo mercado americano.
Pois bem, para destruir Escobar, os EUA montaram uma operação diplomática e uma rede de colaboração que envolvia as polícias, a justiça e a mídia.
A Suíça recentemente também colaborou para o desmonte da diretoria da FIFA. A justiça e a polícia fizeram o serviço. Prendeu mais de uma dezena de dirigentes e alguns foram extraditados para os Estados Unidos, como o brasileiro José Maria Marin. Sim, o futebol e as copas se tornaram um negócio grande demais também.
Na última Copa no Brasil, as construtoras nacionais não deram nenhum espaço para as estrangeiras. Ficaram com tudo. Essa foi uma decisão do governo brasileiro que trabalhou de mãos dadas com as grandes construtoras no Brasil e no exterior, transformando-as nas famosas “campeãs mundiais”.
Sim, havia uma estratégia do Governo Lula em fomentar certa parcela produtiva da burguesia nacional e construir uma aliança estratégica para o desenvolvimento do Brasil. Se deu certo durante um tempo ou se deu errado para sempre, é outra história. Dessa política nasceram as lendas como aquela que dizia “o Lula é dono da Friboi”, entre outras.
Essas empresas “campeãs”, “amigas do governo”, se consagraram definitivamente como grandes multinacionais brasileiras. Andaram de mãos dadas na política externa e tornaram-se também grandes operadoras e financiadoras do sistema político.
Muitos episódios de corrupção efetivamente ocorreram.
O fato é que está tudo dentro da “normalidade” do que ocorre nas democracias burguesas. Essa “democracia” exportada a base de golpes e bombas, é a condição necessária justamente para que os mercados privados controlem os Estados, por meio de doações de campanha e financiamento do sistema político.
A questão passa a ser a seguinte, para quem o Estado está trabalhando?
A doação das grandes instituições financeiras havia diminuído sua importância relativa, em comparação com as grandes construtoras. O funcionamento do Estado brasileiro estava mais inclinado para a realização das grandes obras. Essas empresas ficam ainda mais fortes e influenciando o funcionamento do Estado. Ainda que a corrupção como prática naturalizada na política brasileira seja algo detestável e a ser combatido, o “jogo grande”, jogado pelos grandes players do capitalismo global não envolve esse tipo de pudor.
A realização de grandes obras e o aumento de investimento em infraestrutura, subverte a ordem econômica global do neoliberalismo. Para o estrangulamento dos Estados e a quebra de direitos dos trabalhadores com consequente aumento do poder de compra e diminuição do mercado interno, se deu um nome bonito de “controle orçamentário das contas públicas”. É dinheiro e poder nas mãos dos banqueiros e especuladores.
Ninguém aqui está dizendo que as empreiteiras brasileiras são vítimas ou boazinhas. O fato é que não existem empresas boazinhas. Isso seria um conflito justamente com a natureza do capitalismo, onde a competição pelo mercado e a maximização dos lucros e dos interesses estratégicos são a regra.
Mas a Odebrecht, como outras empresas brasileiras a serem esquartejadas num futuro próximo, eram sim importantes para estratégia de desenvolvimento do Brasil. Possuem ainda um acúmulo gigantesco de conhecimento, geram empregos e são responsáveis por grande parte das exportações nacionais e também de nossa estratégia para a política externa.
Conforme já foi dito, cresceram demais a partir do Governo Lula. Já eram grandes, mas ficaram mais fortes e, não por acaso, os contratos investigados dessas empresas foi justamente no setor de petróleo, o tesouro a ser verdadeiramente roubado pelos piratas internacionais.
Acreditem, não há um só segundo em que os grandes agentes envolvidos nesse processo estiveram verdadeiramente comovidos e preocupados com a corrupção. O que ocorre nada mais é do que um pano de fundo para, aí sim, o maior roubo da história do planeta que está por ocorrer. Vão engolir um gigante chamado Brasil.
A Odebrecht, concorria globalmente em vantagem competitiva com empresas americanas. Está ainda presente na África, no Oriente Médio, na Ásia, no Caribe e na América Latina.
Aquele porto de Mariel que escandalizou os coxinhas, era justamente uma porta de entrada da produção brasileira e cubana para o mercado dos Estados Unidos.
Odebrecht e outras grandes construtoras interditadas na Lava Jato, também passaram a influenciar os processos decisórios nos países da América Latina, tornando-se importantes doadoras para as campanhas eleitorais no continente. Entraram na rota de colisão com os norte americanos. Tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista político.
Por fim, a Lava Jato também cumpriu o papel de interditar o Brasil.
Só existe um país em condições de concorrer com os EUA como hegemonia local. Esse país é o Brasil. Não que o Brasil fosse alcançar o desenvolvimento dos Estados Unidos em vinte anos, mas eles trabalham para que não sejamos uma alternativa nem em cem, duzentos ou quinhentos anos.
E para destruir o Brasil não é preciso explodir uma bomba sequer. Bombas talvez vivessem a possibilitar que se identifique o inimigo. No Brasil, mais eficiente que mil bombas é a tolice de parte do nosso povo.
Que a camada da sociedade que está indesculpavelmente alijada da política não consiga nesse momento enxergar o que está ocorrendo é possível compreender, entender, dialogar, etc. Mas que a burguesia nacional, tendo, parte dela, seu dinheiro pilhado pelos chacais gringos e seus negócios prestes a serem tomados por piratas não consigam reagir, isso é de doer.
A burguesia nacional brasileira deixa demonstrações inequívocas de sua incompetência e sua incapacidade em liderar o Brasil.
A burguesia odeia o Estado e odeia a classe política, mas o fato é que o capitalismo brasileiro foi construído de cima pra baixo e se houver alguma reação possível, esta ainda virá justamente da classe política (que hoje está vulgarizada e de joelhos) e do povo brasileiro organizado.
Digo organizado para defender o Brasil, que está em processo de desaparecimento. Se for pra cada um ficar defendendo seu protagonismo político de varejo, vai ser até bonitinho, mas essa será a alegria final dos imperialistas.
- See more at: http://www.ocafezinho.com/2016/12/29/agora-fica-mais-nitida-participacao-dos-estados-unidos-nos-contornos-da-lava-jato/#sthash.ukJGoYrC.dpuf
Por Rafael Castilho, publicado em rede social
A bola da vez a ser encaçapada em definitivo é a Odebrecht.
Depois de colocarem o presidente da empresa na masmorra e o coagido a realizar a delação premiada (tortura por outros meios), o momento é de rapinar e delapidar o patrimônio da Odebrecht por meio de multas e confiscos.
O inexistente Estado da Suíça cumpre o seu papel e aproveita da situação para meter a mão no dinheiro investido naquele país, supostamente um lugar seguro. Bem feito, nesse sentido.
O fato é que como a sociedade ficou envolvida no cotidiano do Fora Dilma e do Fora Temer, pouquíssimas pessoas se deram conta dos interesses estadunidenses no desenrolar da Lava Jato, para além das disputas partidárias locais.
Não é teoria de conspiração. Os fatos recentes demonstram o apetite dos ianques. No mais, um país com o histórico de apoio a golpes, guerras e suporte a levantes no mundo todo, sempre em defesa da “paz, liberdade e democracia”, deixa a todos bem escolados de como funciona seu modo de operação.
Quem assistiu a série do Pablo Escobar vai se dar conta de alguns detalhes. Escobar era um traficante internacional de cocaína que se tornou bilionário vendendo para o mercado americano. O negócio continua a existir, porém não mais nas mãos de Escobar. Era um negócio muito grande para ele. Vinte anos depois da morte de Escobar, os EUA continuam a ser o maior consumidor de cocaína do mundo. Metade da droga do mundo é consumida pelo mercado americano.
Pois bem, para destruir Escobar, os EUA montaram uma operação diplomática e uma rede de colaboração que envolvia as polícias, a justiça e a mídia.
A Suíça recentemente também colaborou para o desmonte da diretoria da FIFA. A justiça e a polícia fizeram o serviço. Prendeu mais de uma dezena de dirigentes e alguns foram extraditados para os Estados Unidos, como o brasileiro José Maria Marin. Sim, o futebol e as copas se tornaram um negócio grande demais também.
Na última Copa no Brasil, as construtoras nacionais não deram nenhum espaço para as estrangeiras. Ficaram com tudo. Essa foi uma decisão do governo brasileiro que trabalhou de mãos dadas com as grandes construtoras no Brasil e no exterior, transformando-as nas famosas “campeãs mundiais”.
Sim, havia uma estratégia do Governo Lula em fomentar certa parcela produtiva da burguesia nacional e construir uma aliança estratégica para o desenvolvimento do Brasil. Se deu certo durante um tempo ou se deu errado para sempre, é outra história. Dessa política nasceram as lendas como aquela que dizia “o Lula é dono da Friboi”, entre outras.
Essas empresas “campeãs”, “amigas do governo”, se consagraram definitivamente como grandes multinacionais brasileiras. Andaram de mãos dadas na política externa e tornaram-se também grandes operadoras e financiadoras do sistema político.
Muitos episódios de corrupção efetivamente ocorreram.
O fato é que está tudo dentro da “normalidade” do que ocorre nas democracias burguesas. Essa “democracia” exportada a base de golpes e bombas, é a condição necessária justamente para que os mercados privados controlem os Estados, por meio de doações de campanha e financiamento do sistema político.
A questão passa a ser a seguinte, para quem o Estado está trabalhando?
A doação das grandes instituições financeiras havia diminuído sua importância relativa, em comparação com as grandes construtoras. O funcionamento do Estado brasileiro estava mais inclinado para a realização das grandes obras. Essas empresas ficam ainda mais fortes e influenciando o funcionamento do Estado. Ainda que a corrupção como prática naturalizada na política brasileira seja algo detestável e a ser combatido, o “jogo grande”, jogado pelos grandes players do capitalismo global não envolve esse tipo de pudor.
A realização de grandes obras e o aumento de investimento em infraestrutura, subverte a ordem econômica global do neoliberalismo. Para o estrangulamento dos Estados e a quebra de direitos dos trabalhadores com consequente aumento do poder de compra e diminuição do mercado interno, se deu um nome bonito de “controle orçamentário das contas públicas”. É dinheiro e poder nas mãos dos banqueiros e especuladores.
Ninguém aqui está dizendo que as empreiteiras brasileiras são vítimas ou boazinhas. O fato é que não existem empresas boazinhas. Isso seria um conflito justamente com a natureza do capitalismo, onde a competição pelo mercado e a maximização dos lucros e dos interesses estratégicos são a regra.
Mas a Odebrecht, como outras empresas brasileiras a serem esquartejadas num futuro próximo, eram sim importantes para estratégia de desenvolvimento do Brasil. Possuem ainda um acúmulo gigantesco de conhecimento, geram empregos e são responsáveis por grande parte das exportações nacionais e também de nossa estratégia para a política externa.
Conforme já foi dito, cresceram demais a partir do Governo Lula. Já eram grandes, mas ficaram mais fortes e, não por acaso, os contratos investigados dessas empresas foi justamente no setor de petróleo, o tesouro a ser verdadeiramente roubado pelos piratas internacionais.
Acreditem, não há um só segundo em que os grandes agentes envolvidos nesse processo estiveram verdadeiramente comovidos e preocupados com a corrupção. O que ocorre nada mais é do que um pano de fundo para, aí sim, o maior roubo da história do planeta que está por ocorrer. Vão engolir um gigante chamado Brasil.
A Odebrecht, concorria globalmente em vantagem competitiva com empresas americanas. Está ainda presente na África, no Oriente Médio, na Ásia, no Caribe e na América Latina.
Aquele porto de Mariel que escandalizou os coxinhas, era justamente uma porta de entrada da produção brasileira e cubana para o mercado dos Estados Unidos.
Odebrecht e outras grandes construtoras interditadas na Lava Jato, também passaram a influenciar os processos decisórios nos países da América Latina, tornando-se importantes doadoras para as campanhas eleitorais no continente. Entraram na rota de colisão com os norte americanos. Tanto do ponto de vista econômico, quanto do ponto de vista político.
Por fim, a Lava Jato também cumpriu o papel de interditar o Brasil.
Só existe um país em condições de concorrer com os EUA como hegemonia local. Esse país é o Brasil. Não que o Brasil fosse alcançar o desenvolvimento dos Estados Unidos em vinte anos, mas eles trabalham para que não sejamos uma alternativa nem em cem, duzentos ou quinhentos anos.
E para destruir o Brasil não é preciso explodir uma bomba sequer. Bombas talvez vivessem a possibilitar que se identifique o inimigo. No Brasil, mais eficiente que mil bombas é a tolice de parte do nosso povo.
Que a camada da sociedade que está indesculpavelmente alijada da política não consiga nesse momento enxergar o que está ocorrendo é possível compreender, entender, dialogar, etc. Mas que a burguesia nacional, tendo, parte dela, seu dinheiro pilhado pelos chacais gringos e seus negócios prestes a serem tomados por piratas não consigam reagir, isso é de doer.
A burguesia nacional brasileira deixa demonstrações inequívocas de sua incompetência e sua incapacidade em liderar o Brasil.
A burguesia odeia o Estado e odeia a classe política, mas o fato é que o capitalismo brasileiro foi construído de cima pra baixo e se houver alguma reação possível, esta ainda virá justamente da classe política (que hoje está vulgarizada e de joelhos) e do povo brasileiro organizado.
Digo organizado para defender o Brasil, que está em processo de desaparecimento. Se for pra cada um ficar defendendo seu protagonismo político de varejo, vai ser até bonitinho, mas essa será a alegria final dos imperialistas.
- See more at: http://www.ocafezinho.com/2016/12/29/agora-fica-mais-nitida-participacao-dos-estados-unidos-nos-contornos-da-lava-jato/#sthash.ukJGoYrC.dpuf
Retrospectiva 2016: 12 momentos inesquecíveis em que a mídia garantiu que o impeachment salvaria o Brasil
Retrospectiva 2016: 12 momentos inesquecíveis em que a mídia garantiu que o impeachment salvaria o Brasil
Retrospectiva 2016: 12 momentos inesquecíveis em que a mídia garantiu que o impeachment salvaria o Brasil
por : Pedro Zambarda de Araujo
O ano de 2016 se aproxima do fim e é importante lembrar do papel da imprensa no golpe e na subsequente draga econômica e institucional em que nos metemos.
Cheios de amor e de esperança, querendo agradar seus patrões a todo custo, jornalistas fizeram previsões furadas e propaganda, baseados no mais puro wishful thinking e, eventualmente, canalhice.
A ideia era vender a ideia de o golpe não era golpe e que a destituição de Dilma “ia tirar o Brasil do buraco”, tese consagrada por Eliane Cantanhêde, uma espécie de porta voz terceirizada de Temer.
Em abril, numa entrevista a uma rádio, ela disse seguinte: “Conversei com o Michel Temer nessa semana. Ele está muito seguro e muito sereno. Fala que está pronto para assumir a responsabilidade, que é tirar o país do buraco. O Michel Temer, por ter mais gás, parece ter chances de conseguir”.
Confira uma seleção de 12 promessas que a mídia fez e os midiotas acreditaram.
1. O pior que não ficou no retrovisor
Míriam Leitão publicou em 16 de julho a coluna “O pior pelo retrovisor”, no Globo. Num tom otimista, traçava um panorama da economia brasileira baseado apenas na valorização dos papéis da Petrobras e na alta das bolsas de valores.
E acrescentava: “O resultado reflete a percepção de algumas melhoras, inclusive regulatórias, na economia e a avaliação de que a recessão está perdendo força, apesar de estar claro que não haverá a volta rápida do crescimento”.
As contas do governo Temer tiveram um déficit de R$ 38,4 bilhões em novembro, o pior resultado para o mês desde 1997. No mesmo mês do ano passado, com o governo sob Dilma, o saldo negativo foi de R$ 21,2 bilhões. Parece que o pior da economia está longe de sair do retrovisor, seja dos investidores ou dos cidadãos comuns.
2.“Pior que tá, não fica”
Em maio de 2016, quando o impeachment caminhava para minar o poder de Dilma Rousseff, Eliane Cantanhêde publicou várias colunas no Estadão dizendo que é “pior sem ele”.
No mês de dezembro, o Datafolha divulgou que 58% das pessoas consideram Michel Temer pior do que Dilma. Parece que ficou pior do que estava.
3. Previsão de crescimento de 1% que sumiu
Uma reportagem do site da Exame de setembro apontou que a economia sob Michel Temer poderia crescer 1% em 2016. A previsão foi traçada pela consultoria em negócios internacionais e políticas públicas Prospectiva, levando em conta até mesmo a Lava Jato.
O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel, afirmou em dezembro deste ano que a previsão para 2016 é de recessão de 3%, com queda na oferta de crédito bancário. Parece que as consultorias de estimação estão perdendo crédito em suas análises em menos de seis meses.
4. “Golpe contra o impeachment”
Antes de ficar famoso nacionalmente por perguntar a Temer como ele conheceu a mulher numa farsa no “Roda Viva”, Noblat escreveu um artigo bonito acusando um “golpe contra o impeachment”.
O texto faz denúncias de uma compra de votos contra o afastamento de Dilma Rousseff — para variar, sem apresentar provas. Teriam ocorridos pixulecos de R$ 1 milhão por voto “não” e R$ 400 mil pelas ausências.
Parece que o golpe contra o golpe não se concretizou. Noblat nunca explicou como é que essa operação milionária fracassou.
5. “Interrupções presidenciais têm impacto positivo”
Merval Pereira falou no dia 17 de janeiro de um estudo de um economista chamado Reinaldo Gonçalves, da UFRJ. O especialista tentava provar que o impeachment de Dilma poderia ser positivo.
Segundo o texto reforçado por Merval, o impedimento reverteria a recessão em 2017 e impulsionaria a economia em 2018.
Nenhum dos sinais dessas medidas com “impactos positivos” foram vistos com Michel no poder. Merval Pereira aproveitou a coluna para alfinetar advogados que criticaram a Operação Lava Jato. Nunca mais citou o tal Reinaldo.
6. Cunha “não tem nada a ver com o impeachment”
Merval também dá suas cacetadas no Jornal das 10 da GloboNews. No dia 13 de dezembro de 2015, ele soltou no programa que o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, não tinha relação com o golpe. Um santo.
“Eduardo Cunha não tem nada a ver com o impeachment. O Eduardo Cunha foi o presidente da Câmara que aceitou, viu que tecnicamente havia condições de aceitar aquele processo, aquele pedido. Então ele não tem nada a ver com isso, quem vai decidir mesmo é o plenário da Câmara”.
Merval jogou a responsabilidade num Congresso que tem maioria com pendências na Justiça só para tentar livrar a cara de um processo conduzido por um notório corrupto. Em 2016, consumado o golpe, Cunha foi preso. Merval Pereira nunca mais tocou no assunto.
7. “Impeachment ou caos”
O economista Rodrigo Constantino, o amigo do Pateta que foi demitido da Veja e do Globo e hoje tem coluna na Istoé, publicou um artigo em abril com o título: “impeachment ou caos!”.
Era baseado em teses esplêndidas como a de que o presidente Temer faria um “governo suprapartidário” caso o golpe prosperasse, usando aspas do professor de filosofia Denis Rosenfield.
Para Constantino, o governo Temer seria um sucesso porque não teria vermelho em sua bandeira. O único golpe possível era o que o PT estava fazendo, seja lá o que isso signifique.
8. Golpe “cristalizado”
Quando o impeachment foi consumado, em setembro, Eliane Cantanhêde afirmou em texto que o governo Michel Temer sofre com protestos mas “termina em pé”. Comparou-o a Itamar Franco.
“A palavrinha mágica ‘golpe’ ajudou a cristalizar, talvez em milhões de pessoas, a percepção de que o impeachment de Dilma foi ilegal e ilegítimo, a ‘jornada de 12 horas’ ajuda a oposição a ratificar que Temer vai retroceder nos direitos e abandonar os pobres à própria sorte. Em vez de falar esse absurdo, o governo bem que poderia ter usado e abusado, a seu favor e a favor da verdade, dos resultados do Ideb, que configuram o fracasso da ‘pátria educadora’ de Dilma”, diz Eliane no jornal.
9. A “revolta armada” do PT que não existiu
O ex-presidente Lula publicou uma cartilha criticando os procedimentos da Operação Lava Jato. Na cabeça do colunista Reinaldo Azevedo, a carta afirmava que o PT ia optar por uma “revolta armada”, segundo sua coluna na Folha de S.Paulo em agosto.
Dilma, segundo Reinaldo, era a “Afastada”. “Que bom que a ópera petista chega ao último ato, com o próprio partido chamando os inimigos por seus respectivos nomes. É o PT quem me dá razão, não os que concordavam comigo”, diz ele, sem explicar como se daria a revolução do partido de Lula em curso.
10. O editorial que mais curtiu o impeachment
“Impeachment é o melhor caminho” é o editorial de apoio ao golpe mais explícito publicado na imprensa. Feito pelo mesmo time do Estado de S.Paulo que chamou o jornalista Glenn Greenwald de “ativista petista” e pediu sua expulsão do Brasil, o texto é rico em previsões furadas sobre o governo Temer já em abril de 2016.
As propostas de novas eleições “são fórmulas engenhosas para resolver um problema complicado. Pena que sejam todas, pelas mais variadas razões, impraticáveis”.
Hoje, a notícia é de que a maioria da população apoia eleições diretas segundo absolutamente todos os institutos de pesquisa.
11. “A saída da crise”, segundo Paulo Skaf
Nenhuma lista dessa natureza ficaria completa sem as revistas da Editora Três, aquela que concedeu a Temer o título de Brasileiro do Ano.
Em março, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, estava na capa da IstoÉ Dinheiro com a chamada “A reação dos empresários”.
“O impeachment de Dilma é a saída mais rápida da crise”, falou. A reportagem destacava a atuação dele para conseguir a adesão “de boa parte da classe empresarial, da indústria ao varejo”.
De acordo com Skaf, a “economia está indo mal por causa da crise política. Há confiança no Brasil, mas não há confiança no governo”.
Ah, sim: o industrial sem indústria é um dos citados na delação da Odebrecht.
12. As instituições funcionam
O Globo, que defendeu o golpe militar de 64 e só se desculpou 50 anos depois, defendeu o impeachment com unhas e dentes em vários editoriais.
Num deles em especial, de 30 de março, a família Marinho mandou ver: “Na estratégia de defesa e nas ações de agitação e propaganda de um PT e de uma presidente acuada no Planalto, a palavra ‘golpe’ ganha grande relevância”.
O impeachment de Dilma, fomos informados, “transita pelas instituições sem atropelos. Em 64 seria diferente”.
E finalizava: “Aceite quem quiser que políticas de supostos benefícios aos pobres podem justificar a roubalheira. Não num país com instituições republicanas sólidas”.
Pois é.
Retrospectiva 2016: 12 momentos inesquecíveis em que a mídia garantiu que o impeachment salvaria o Brasil
por : Pedro Zambarda de Araujo
O ano de 2016 se aproxima do fim e é importante lembrar do papel da imprensa no golpe e na subsequente draga econômica e institucional em que nos metemos.
Cheios de amor e de esperança, querendo agradar seus patrões a todo custo, jornalistas fizeram previsões furadas e propaganda, baseados no mais puro wishful thinking e, eventualmente, canalhice.
A ideia era vender a ideia de o golpe não era golpe e que a destituição de Dilma “ia tirar o Brasil do buraco”, tese consagrada por Eliane Cantanhêde, uma espécie de porta voz terceirizada de Temer.
Em abril, numa entrevista a uma rádio, ela disse seguinte: “Conversei com o Michel Temer nessa semana. Ele está muito seguro e muito sereno. Fala que está pronto para assumir a responsabilidade, que é tirar o país do buraco. O Michel Temer, por ter mais gás, parece ter chances de conseguir”.
Confira uma seleção de 12 promessas que a mídia fez e os midiotas acreditaram.
1. O pior que não ficou no retrovisor
Míriam Leitão publicou em 16 de julho a coluna “O pior pelo retrovisor”, no Globo. Num tom otimista, traçava um panorama da economia brasileira baseado apenas na valorização dos papéis da Petrobras e na alta das bolsas de valores.
E acrescentava: “O resultado reflete a percepção de algumas melhoras, inclusive regulatórias, na economia e a avaliação de que a recessão está perdendo força, apesar de estar claro que não haverá a volta rápida do crescimento”.
As contas do governo Temer tiveram um déficit de R$ 38,4 bilhões em novembro, o pior resultado para o mês desde 1997. No mesmo mês do ano passado, com o governo sob Dilma, o saldo negativo foi de R$ 21,2 bilhões. Parece que o pior da economia está longe de sair do retrovisor, seja dos investidores ou dos cidadãos comuns.
2.“Pior que tá, não fica”
Em maio de 2016, quando o impeachment caminhava para minar o poder de Dilma Rousseff, Eliane Cantanhêde publicou várias colunas no Estadão dizendo que é “pior sem ele”.
No mês de dezembro, o Datafolha divulgou que 58% das pessoas consideram Michel Temer pior do que Dilma. Parece que ficou pior do que estava.
3. Previsão de crescimento de 1% que sumiu
Uma reportagem do site da Exame de setembro apontou que a economia sob Michel Temer poderia crescer 1% em 2016. A previsão foi traçada pela consultoria em negócios internacionais e políticas públicas Prospectiva, levando em conta até mesmo a Lava Jato.
O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Tulio Maciel, afirmou em dezembro deste ano que a previsão para 2016 é de recessão de 3%, com queda na oferta de crédito bancário. Parece que as consultorias de estimação estão perdendo crédito em suas análises em menos de seis meses.
4. “Golpe contra o impeachment”
Antes de ficar famoso nacionalmente por perguntar a Temer como ele conheceu a mulher numa farsa no “Roda Viva”, Noblat escreveu um artigo bonito acusando um “golpe contra o impeachment”.
O texto faz denúncias de uma compra de votos contra o afastamento de Dilma Rousseff — para variar, sem apresentar provas. Teriam ocorridos pixulecos de R$ 1 milhão por voto “não” e R$ 400 mil pelas ausências.
Parece que o golpe contra o golpe não se concretizou. Noblat nunca explicou como é que essa operação milionária fracassou.
5. “Interrupções presidenciais têm impacto positivo”
Merval Pereira falou no dia 17 de janeiro de um estudo de um economista chamado Reinaldo Gonçalves, da UFRJ. O especialista tentava provar que o impeachment de Dilma poderia ser positivo.
Segundo o texto reforçado por Merval, o impedimento reverteria a recessão em 2017 e impulsionaria a economia em 2018.
Nenhum dos sinais dessas medidas com “impactos positivos” foram vistos com Michel no poder. Merval Pereira aproveitou a coluna para alfinetar advogados que criticaram a Operação Lava Jato. Nunca mais citou o tal Reinaldo.
6. Cunha “não tem nada a ver com o impeachment”
Merval também dá suas cacetadas no Jornal das 10 da GloboNews. No dia 13 de dezembro de 2015, ele soltou no programa que o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, não tinha relação com o golpe. Um santo.
“Eduardo Cunha não tem nada a ver com o impeachment. O Eduardo Cunha foi o presidente da Câmara que aceitou, viu que tecnicamente havia condições de aceitar aquele processo, aquele pedido. Então ele não tem nada a ver com isso, quem vai decidir mesmo é o plenário da Câmara”.
Merval jogou a responsabilidade num Congresso que tem maioria com pendências na Justiça só para tentar livrar a cara de um processo conduzido por um notório corrupto. Em 2016, consumado o golpe, Cunha foi preso. Merval Pereira nunca mais tocou no assunto.
7. “Impeachment ou caos”
O economista Rodrigo Constantino, o amigo do Pateta que foi demitido da Veja e do Globo e hoje tem coluna na Istoé, publicou um artigo em abril com o título: “impeachment ou caos!”.
Era baseado em teses esplêndidas como a de que o presidente Temer faria um “governo suprapartidário” caso o golpe prosperasse, usando aspas do professor de filosofia Denis Rosenfield.
Para Constantino, o governo Temer seria um sucesso porque não teria vermelho em sua bandeira. O único golpe possível era o que o PT estava fazendo, seja lá o que isso signifique.
8. Golpe “cristalizado”
Quando o impeachment foi consumado, em setembro, Eliane Cantanhêde afirmou em texto que o governo Michel Temer sofre com protestos mas “termina em pé”. Comparou-o a Itamar Franco.
“A palavrinha mágica ‘golpe’ ajudou a cristalizar, talvez em milhões de pessoas, a percepção de que o impeachment de Dilma foi ilegal e ilegítimo, a ‘jornada de 12 horas’ ajuda a oposição a ratificar que Temer vai retroceder nos direitos e abandonar os pobres à própria sorte. Em vez de falar esse absurdo, o governo bem que poderia ter usado e abusado, a seu favor e a favor da verdade, dos resultados do Ideb, que configuram o fracasso da ‘pátria educadora’ de Dilma”, diz Eliane no jornal.
9. A “revolta armada” do PT que não existiu
O ex-presidente Lula publicou uma cartilha criticando os procedimentos da Operação Lava Jato. Na cabeça do colunista Reinaldo Azevedo, a carta afirmava que o PT ia optar por uma “revolta armada”, segundo sua coluna na Folha de S.Paulo em agosto.
Dilma, segundo Reinaldo, era a “Afastada”. “Que bom que a ópera petista chega ao último ato, com o próprio partido chamando os inimigos por seus respectivos nomes. É o PT quem me dá razão, não os que concordavam comigo”, diz ele, sem explicar como se daria a revolução do partido de Lula em curso.
10. O editorial que mais curtiu o impeachment
“Impeachment é o melhor caminho” é o editorial de apoio ao golpe mais explícito publicado na imprensa. Feito pelo mesmo time do Estado de S.Paulo que chamou o jornalista Glenn Greenwald de “ativista petista” e pediu sua expulsão do Brasil, o texto é rico em previsões furadas sobre o governo Temer já em abril de 2016.
As propostas de novas eleições “são fórmulas engenhosas para resolver um problema complicado. Pena que sejam todas, pelas mais variadas razões, impraticáveis”.
Hoje, a notícia é de que a maioria da população apoia eleições diretas segundo absolutamente todos os institutos de pesquisa.
11. “A saída da crise”, segundo Paulo Skaf
Nenhuma lista dessa natureza ficaria completa sem as revistas da Editora Três, aquela que concedeu a Temer o título de Brasileiro do Ano.
Em março, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, estava na capa da IstoÉ Dinheiro com a chamada “A reação dos empresários”.
“O impeachment de Dilma é a saída mais rápida da crise”, falou. A reportagem destacava a atuação dele para conseguir a adesão “de boa parte da classe empresarial, da indústria ao varejo”.
De acordo com Skaf, a “economia está indo mal por causa da crise política. Há confiança no Brasil, mas não há confiança no governo”.
Ah, sim: o industrial sem indústria é um dos citados na delação da Odebrecht.
12. As instituições funcionam
O Globo, que defendeu o golpe militar de 64 e só se desculpou 50 anos depois, defendeu o impeachment com unhas e dentes em vários editoriais.
Num deles em especial, de 30 de março, a família Marinho mandou ver: “Na estratégia de defesa e nas ações de agitação e propaganda de um PT e de uma presidente acuada no Planalto, a palavra ‘golpe’ ganha grande relevância”.
O impeachment de Dilma, fomos informados, “transita pelas instituições sem atropelos. Em 64 seria diferente”.
E finalizava: “Aceite quem quiser que políticas de supostos benefícios aos pobres podem justificar a roubalheira. Não num país com instituições republicanas sólidas”.
Pois é.
CLUBE DE ENGENHARIA
CLUBE DE ENGENHARIA
Nota de falecimento: a engenharia brasileira está morta
Voltar
A estratégia geopolítica de nações poderosas que querem nos enterrar não se resume a fortalecer sua própria engenharia e suas maiores empresas. Inclui sabotar as empresas e a engenharia de outros países
* Por Mauro Santayana, no Portal Rede Brasil Atual
Cortes em programa de submarinos, desenvolvido pela Odebrecht para a Marinha causam atrasos, desemprego e prejuízo
Cortes em programa de submarinos, desenvolvido pela Odebrecht para a Marinha causam atrasos, desemprego e prejuízo
A Engenharia Brasileira está morta. Será cremada no altar da Jurisprudência da Destruição, do entreguismo e da ortodoxia econômica. Suas cinzas serão sepultadas em hora e local a serem anunciados no decorrer deste ano de 2017.
Em qualquer país minimamente avançado, a engenharia é protegida e reverenciada como o outro nome do poder, da prosperidade e do desenvolvimento. Não há países que tenham chegado a algum lugar sem apoiar soberana e decisivamente sua engenharia.
Assim como não existem nações que tenham crescido econômica e geopoliticamente sabotando, inviabilizando, destruindo, execrando, ensinando seu povo a desprezar, odiar e demonizar essa área, seus técnicos, trabalhadores, suas empresas, projetos, líderes e empresários, como o Brasil está fazendo agora.
Sem engenharia, os soviéticos não teriam derrotado a Alemanha nazista, com suas armadilhas para Panzers e seus portentosos tanques T-34. Nem enviado o primeiro satélite artificial, o Sputnik, para a órbita terrestre, nem feito de Yuri Gagarin o primeiro homem a viajar pelo espaço.
Sem engenharia, os Estados Unidos não teriam construído suas pontes e arranha-céus, monumentos inseparáveis da mística do american way of life no século 20. Nem produzido a primeira bomba atômica, ou chegado à lua em menos de 10 anos, a partir do desafio estabelecido pelo presidente John Kennedy em 1961.
Desde a consolidação do Império Britânico, ela mesma filha direta, dileta, da Revolução Industrial inglesa; desde a substituição de importações pelos Estados Unidos após a independência, e pela URSS, depois da Revolução de Outubro de 1917, o mundo sabe: não existem nações dignas desse nome que consigam responder a questões como para onde avançar, como avançar, quando avançar, sem a ajuda da engenharia.
Como fez Juscelino Kubitschek, por exemplo, com o binômio “Energia e Transporte” e seus “50 anos em 5”, e os governos militares que – embora o tivessem combatido e perseguido em várias ocasiões – o seguiram na adoção do planejamento como instrumento de administração pública e no apoio a grandes empresas brasileiras para a implementação de grandes projetos nacionais.
Empresas e grupos que estão sendo destruídos, agora, pelo ódio, a pressão e a calúnia, como se tivessem sido atingidos por uma devastadora bomba de nêutrons.
Com a maior parte de seus executivos presos em algum momento, as maiores empreiteiras do país foram levadas a avalizar a transformação de doações legais de campanha e de caixa dois em propina – retroativamente, nos últimos três anos.
A aceitar, na ausência de provas cabais de pagamentos de corrupção na escala bilionária apresentada pela imprensa e aventada pelo Ministério Público a todo momento, a imposição de multas punitivas “civis” a título de nebulosas “indenizações por danos morais coletivos” da ordem estratosférica de bilhões de dólares.
A render-se a discutíveis acordos de delação premiada impostos por uma operação que já acarretou para o país – com a desculpa do combate à corrupção – R$ 140 bilhões em prejuízo, a demissão milhares de trabalhadores, a interrupção de dezenas de projetos na área de energia, indústria naval, infraestrutura e defesa, a quebra de milhares de acionistas, investidores e fornecedores.
Diante de tudo isso, não podemos fazer mais do que comunicar o falecimento da engenharia brasileira, famosa por ter erguido obras pelo mundo inteiro, de rodovias no deserto mauritaniano a ferrovias e sistemas de irrigação no Iraque; passando pela perfuração de galerias e túneis sob as montanhas dos Andes; pelo desenvolvimento de sistemas de resfriamento contínuo de concreto para a construção de Itaipu; ou pela edificação de enormes hidrelétricas na África Subsaariana.
A engenharia nacional está perecendo. Foi ferida de morte por um sistema judiciário que pretende condenar, a priori, qualquer contato entre empresas privadas e o setor público, e desenvolveu uma Jurisprudência da Destruição de caráter descaradamente político, que não concebe punir corruptos sem destruir grandes empresas, desempregar milhares de pais de família, interromper e destroçar dezenas de projetos estratégicos.
Um sistema judiciário que acredita que deve punir, implacável e estupidamente, não apenas as pessoas físicas, mas também as jurídicas, não interessando se esses grupos possuem tecnologia e conhecimento estratégicos, desenvolvidos ao longo de anos de experiência e aprendizado, se estão envolvidos em projetos vitais para o desenvolvimento e a segurança nacional, se deles dependem, para sobreviver, milhões de brasileiros.
A engenharia brasileira faleceu, com seus escritórios de detalhamento de projetos, suas fábricas de bens de capital, seus estaleiros de montagem de navios e plataformas de petróleo fechados, suas linhas de crédito encarecidas ou cortadas, seus ativos vendidos na bacia das almas e seus canteiros de obras abandonados.
E o seu sepultamento está marcado para algum momento de 2017.
Será sacrificada no altar da estúpida manipulação midiática de factoides econômicos, com atitudes desastrosas como a antecipação suicida pelo BNDES – em plena recessão – do pagamento de R$ 100 bilhões ao Tesouro. Um dinheiro que poderia ser imediatamente aplicado em infraestrutura, vai em troca de uma insignificante, irrelevante, pouco mais que simbólica redução de 1% na dívida pública, quando, sem fazer alarde, os dois últimos governos reduziram a Dívida Nacional Bruta de 80% em 2002 para 67% em 2015, e a Dívida Líquida de 60% para 35% no mesmo período, pagando US$ 40 bilhões devidos ao FMI, e economizando mais de US$ 370 bilhões em reservas internacionais nos anos seguintes.
A engenharia brasileira será sepultada, ou cremada, porque não pode mais sobreviver, a longo prazo, em um país que aceitou aumentar os gastos públicos apenas pelo índice de inflação do ano anterior, durante os próximos 20 anos, engessando estrategicamente o seu desenvolvimento, com uma imbecil e limitante camisa de força, enquanto outros países e regiões, como os Estados Unidos e a Europa, muito mais endividados – e desenvolvidos – do que nós, continuarão a se endividar, a se desenvolver e a se armar cada vez mais, já que seu discurso neoliberal e ortodoxo só serve para enganar e controlar trouxas de terceira categoria como os nossos, e quase nunca é aplicado no caso deles mesmos.
Esse hipócrita discurso para trouxas não é apenas econômico, mas também jurídico. E nesse caso, gera ganhos reais, que vão além da eliminação ou diminuição da concorrência de potenciais competidores em campos como o da engenharia.
Da estratégia geopolítica das nações mais poderosas do mundo, não faz parte apenas fortalecer permanentemente a sua própria engenharia e suas maiores empresas, mas, também, sabotar as empresas e a engenharia de outros países, usando desculpas de diferentes matizes, que são repetidas e multiplicadas pela mídia sabuja e babosa desses mesmos lugares.
Não é outra coisa o que os Estados Unidos fazem por meio de órgãos como o Departamento de Justiça e de iniciativas como o próprio Foreign Corrupt Practices Act, sob o manto do combate à corrupção e da proteção da concorrência. Leniente com suas próprias companhias, que não pagam mais do que algumas dezenas de milhões de dólares em multa, os Estados Unidos costumam ser muito mais duros com as empresas estrangeiras.
Tanto é que da lista de maiores punições de empresas pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos por corrupção em terceiros países – incluídos alguns como Rússia, que os Estados Unidos não querem que avancem com apoio de grupos europeus como a Siemens – não consta nenhuma grande empresa norte-americana de caráter estratégico.
A Lockheed Martin e a Halliburton, por exemplo, pagaram apenas uma fração do que está sendo imposto como punição, agora, à Odebrecht brasileira, responsável pela construção do nosso submarino atômico e do míssil ar-ar da Aeronáutica, entre outros projetos, que deverá desembolsar, junto com a sua subsidiária Braskem, uma multa de mais de R$ 7 bilhões, a mais alta já estabelecida pelo órgão regulador norte-americano contra uma empresa norte-americana ou estrangeira.
Nota de falecimento: a engenharia brasileira está morta
Voltar
A estratégia geopolítica de nações poderosas que querem nos enterrar não se resume a fortalecer sua própria engenharia e suas maiores empresas. Inclui sabotar as empresas e a engenharia de outros países
* Por Mauro Santayana, no Portal Rede Brasil Atual
Cortes em programa de submarinos, desenvolvido pela Odebrecht para a Marinha causam atrasos, desemprego e prejuízo
Cortes em programa de submarinos, desenvolvido pela Odebrecht para a Marinha causam atrasos, desemprego e prejuízo
A Engenharia Brasileira está morta. Será cremada no altar da Jurisprudência da Destruição, do entreguismo e da ortodoxia econômica. Suas cinzas serão sepultadas em hora e local a serem anunciados no decorrer deste ano de 2017.
Em qualquer país minimamente avançado, a engenharia é protegida e reverenciada como o outro nome do poder, da prosperidade e do desenvolvimento. Não há países que tenham chegado a algum lugar sem apoiar soberana e decisivamente sua engenharia.
Assim como não existem nações que tenham crescido econômica e geopoliticamente sabotando, inviabilizando, destruindo, execrando, ensinando seu povo a desprezar, odiar e demonizar essa área, seus técnicos, trabalhadores, suas empresas, projetos, líderes e empresários, como o Brasil está fazendo agora.
Sem engenharia, os soviéticos não teriam derrotado a Alemanha nazista, com suas armadilhas para Panzers e seus portentosos tanques T-34. Nem enviado o primeiro satélite artificial, o Sputnik, para a órbita terrestre, nem feito de Yuri Gagarin o primeiro homem a viajar pelo espaço.
Sem engenharia, os Estados Unidos não teriam construído suas pontes e arranha-céus, monumentos inseparáveis da mística do american way of life no século 20. Nem produzido a primeira bomba atômica, ou chegado à lua em menos de 10 anos, a partir do desafio estabelecido pelo presidente John Kennedy em 1961.
Desde a consolidação do Império Britânico, ela mesma filha direta, dileta, da Revolução Industrial inglesa; desde a substituição de importações pelos Estados Unidos após a independência, e pela URSS, depois da Revolução de Outubro de 1917, o mundo sabe: não existem nações dignas desse nome que consigam responder a questões como para onde avançar, como avançar, quando avançar, sem a ajuda da engenharia.
Como fez Juscelino Kubitschek, por exemplo, com o binômio “Energia e Transporte” e seus “50 anos em 5”, e os governos militares que – embora o tivessem combatido e perseguido em várias ocasiões – o seguiram na adoção do planejamento como instrumento de administração pública e no apoio a grandes empresas brasileiras para a implementação de grandes projetos nacionais.
Empresas e grupos que estão sendo destruídos, agora, pelo ódio, a pressão e a calúnia, como se tivessem sido atingidos por uma devastadora bomba de nêutrons.
Com a maior parte de seus executivos presos em algum momento, as maiores empreiteiras do país foram levadas a avalizar a transformação de doações legais de campanha e de caixa dois em propina – retroativamente, nos últimos três anos.
A aceitar, na ausência de provas cabais de pagamentos de corrupção na escala bilionária apresentada pela imprensa e aventada pelo Ministério Público a todo momento, a imposição de multas punitivas “civis” a título de nebulosas “indenizações por danos morais coletivos” da ordem estratosférica de bilhões de dólares.
A render-se a discutíveis acordos de delação premiada impostos por uma operação que já acarretou para o país – com a desculpa do combate à corrupção – R$ 140 bilhões em prejuízo, a demissão milhares de trabalhadores, a interrupção de dezenas de projetos na área de energia, indústria naval, infraestrutura e defesa, a quebra de milhares de acionistas, investidores e fornecedores.
Diante de tudo isso, não podemos fazer mais do que comunicar o falecimento da engenharia brasileira, famosa por ter erguido obras pelo mundo inteiro, de rodovias no deserto mauritaniano a ferrovias e sistemas de irrigação no Iraque; passando pela perfuração de galerias e túneis sob as montanhas dos Andes; pelo desenvolvimento de sistemas de resfriamento contínuo de concreto para a construção de Itaipu; ou pela edificação de enormes hidrelétricas na África Subsaariana.
A engenharia nacional está perecendo. Foi ferida de morte por um sistema judiciário que pretende condenar, a priori, qualquer contato entre empresas privadas e o setor público, e desenvolveu uma Jurisprudência da Destruição de caráter descaradamente político, que não concebe punir corruptos sem destruir grandes empresas, desempregar milhares de pais de família, interromper e destroçar dezenas de projetos estratégicos.
Um sistema judiciário que acredita que deve punir, implacável e estupidamente, não apenas as pessoas físicas, mas também as jurídicas, não interessando se esses grupos possuem tecnologia e conhecimento estratégicos, desenvolvidos ao longo de anos de experiência e aprendizado, se estão envolvidos em projetos vitais para o desenvolvimento e a segurança nacional, se deles dependem, para sobreviver, milhões de brasileiros.
A engenharia brasileira faleceu, com seus escritórios de detalhamento de projetos, suas fábricas de bens de capital, seus estaleiros de montagem de navios e plataformas de petróleo fechados, suas linhas de crédito encarecidas ou cortadas, seus ativos vendidos na bacia das almas e seus canteiros de obras abandonados.
E o seu sepultamento está marcado para algum momento de 2017.
Será sacrificada no altar da estúpida manipulação midiática de factoides econômicos, com atitudes desastrosas como a antecipação suicida pelo BNDES – em plena recessão – do pagamento de R$ 100 bilhões ao Tesouro. Um dinheiro que poderia ser imediatamente aplicado em infraestrutura, vai em troca de uma insignificante, irrelevante, pouco mais que simbólica redução de 1% na dívida pública, quando, sem fazer alarde, os dois últimos governos reduziram a Dívida Nacional Bruta de 80% em 2002 para 67% em 2015, e a Dívida Líquida de 60% para 35% no mesmo período, pagando US$ 40 bilhões devidos ao FMI, e economizando mais de US$ 370 bilhões em reservas internacionais nos anos seguintes.
A engenharia brasileira será sepultada, ou cremada, porque não pode mais sobreviver, a longo prazo, em um país que aceitou aumentar os gastos públicos apenas pelo índice de inflação do ano anterior, durante os próximos 20 anos, engessando estrategicamente o seu desenvolvimento, com uma imbecil e limitante camisa de força, enquanto outros países e regiões, como os Estados Unidos e a Europa, muito mais endividados – e desenvolvidos – do que nós, continuarão a se endividar, a se desenvolver e a se armar cada vez mais, já que seu discurso neoliberal e ortodoxo só serve para enganar e controlar trouxas de terceira categoria como os nossos, e quase nunca é aplicado no caso deles mesmos.
Esse hipócrita discurso para trouxas não é apenas econômico, mas também jurídico. E nesse caso, gera ganhos reais, que vão além da eliminação ou diminuição da concorrência de potenciais competidores em campos como o da engenharia.
Da estratégia geopolítica das nações mais poderosas do mundo, não faz parte apenas fortalecer permanentemente a sua própria engenharia e suas maiores empresas, mas, também, sabotar as empresas e a engenharia de outros países, usando desculpas de diferentes matizes, que são repetidas e multiplicadas pela mídia sabuja e babosa desses mesmos lugares.
Não é outra coisa o que os Estados Unidos fazem por meio de órgãos como o Departamento de Justiça e de iniciativas como o próprio Foreign Corrupt Practices Act, sob o manto do combate à corrupção e da proteção da concorrência. Leniente com suas próprias companhias, que não pagam mais do que algumas dezenas de milhões de dólares em multa, os Estados Unidos costumam ser muito mais duros com as empresas estrangeiras.
Tanto é que da lista de maiores punições de empresas pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos por corrupção em terceiros países – incluídos alguns como Rússia, que os Estados Unidos não querem que avancem com apoio de grupos europeus como a Siemens – não consta nenhuma grande empresa norte-americana de caráter estratégico.
A Lockheed Martin e a Halliburton, por exemplo, pagaram apenas uma fração do que está sendo imposto como punição, agora, à Odebrecht brasileira, responsável pela construção do nosso submarino atômico e do míssil ar-ar da Aeronáutica, entre outros projetos, que deverá desembolsar, junto com a sua subsidiária Braskem, uma multa de mais de R$ 7 bilhões, a mais alta já estabelecida pelo órgão regulador norte-americano contra uma empresa norte-americana ou estrangeira.
ConJur - Breve ranking de decisões que (mais) fragilizaram o Direito em 2016
ConJur - Breve ranking de decisões que (mais) fragilizaram o Direito em 2016
Senso Incomum
Breve ranking de decisões que (mais) fragilizaram o Direito em 2016
ImprimirEnviar223318
29 de dezembro de 2016, 8h00
Por Lenio Luiz Streck
Começo perguntando: O que é o Direito? E respondo: quando cada juiz decide que o Direito é do jeito que ele pensa que é, parece-me que um bom conceito de Direito é o de que, em uma democracia, o sistema democrático deve oferecer um critério acerca dos sentidos da lei que sejam publicamente acessíveis, para que, de posse deles, possamos cobrar padrões sociais que sejam vinculantes a todos, sem distinção de raça, cor, sexo, poder etc. Isto é: deve existir um padrão decisório. Isso se chama decisão por princípio. O que não deve existir é um decidir por decidir. Não posso correr sozinho e chegar em segundo lugar. O Judiciário deve ter um mínimo de racionalidade. Os sentidos da lei não são secretos.
Por isso, as decisões devem ser coerentes e íntegras (o que os tribunais fizeram com o artigo 926 do CPC?). Por exemplo: se o TRF-3 diz — corretamente — em uma decisão que clamor social não é motivo para prisão preventiva, tal decisão não pode ser ad hoc. Deve transcender. Outros juízes devem seguir esse padrão. Que, aliás, é o padrão constitucionalmente correto. De há muito o STF já disse que a violência do crime não prende por si, assim como clamor social não é motivo para prender. Mas essa interpretação que o TRF-3 deu ao caso do ex-secretário municipal de São Bernardo do Campo (SP) não pode ser uma loteria ou um achado. Tem de avisar aos demais juízes também, se me entendem o que quero comunicar. E os TRFs devem decidir por princípio. A integridade e coerência devem também ser horizontais. Afinal, há, hoje, dezenas ou centenas (ou milhares) de pessoas presas preventivamente pelo “fundamento” do clamor social. Compreendem o que quero dizer?
O inimigo da coerência e da integridade é o “decidir por argumentos morais” (e/ou outros argumentos de cunho subjetivo). Como já falei na coluna passada, 2016 foi o ano em que o Direito sucumbiu à moral. Parece que em definitivo. O que quero dizer com isso? Que estou pregando um Direito isento da moral? Óbvio que não. O que quero dizer é que o Direito é que deve filtrar a moral e a política... E não o contrário. Só isso. O que quero dizer é que não é a apreciação moral do juiz ou tribunal que deve corrigir ou torcer o conteúdo mínimo da lei. Há seis hipóteses pelas quais o Judiciário pode deixar de aplicar a lei. Fora disso, é sua obrigação aplicar. Se a lei não é “boa” — ou seja, se a lei não “bate” com o que o juiz pensa —, ele deve mudar de profissão. Ele não é o superego da sociedade nem corretor do parlamento. Nesta última coluna de 2016, trago uma citação da ex-juíza do Tribunal Constitucional alemão Ingeborg Maus:
"Quando a Justiça ascende ela própria à condição de mais alta instância moral da sociedade, passa a escapar de qualquer mecanismo de controle social — controle ao qual normalmente se deve subordinar toda instituição do Estado em uma forma de organização política democrática. No domínio de uma Justiça que contrapõe um Direito "superior", dotado de atributos morais, ao simples direito de outros Poderes do Estado e da sociedade, é notória a regressão a valores pré-democráticos de parâmetros de integração social".
Dá para entender ou vamos fazer uma letra de funk para ser mais palatável? Isso que disse a professora Maus bate com o que eu falei no início da coluna — o conceito de Direito.
Enquanto isso, apresento uma amostragem de decisões ativistas-behavioristas de 2016 que se enquadram na crítica acima:
as decisões judiciais que determinaram o bloqueio do WhatsApp;
decisão do juiz Sergio Moro, em 16 de março, de divulgar interceptação telefônica de conversa entre a então presidente da República e um ex-presidente; o STF excluiu tais provas, comprovando a tese da ilicitude;
o STF fragiliza a presunção da inocência contra expresso texto de lei e da Constituição (e metade da comunidade jurídica acha "bom");
"medida excepcional" da Justiça autoriza a polícia a fazer buscas e apreensões coletivas em favela no Rio de Janeiro contra expresso texto legal e constitucional;
mesmo após a vigência do novo CPC, o STJ — guardião da legalidade — continua entendendo que nada mudou acerca do dever de fundamentação, como se o artigo 489, parágrafo 1º, com todos seus incisos, fosse “letra morta”. Isso fica claro no trecho da fundamentação dos Embargos de Declaração no MS 21.315-DF, no qual consta que “o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”;
a decisão do STF na ADPF 347, assumindo a tese do Estado de Coisas Inconstitucional (ECI), que não serviu para nada; passado mais de ano, não colocaram um tijolo no sistema (essa decisão é de 2015, mas é como se fosse de 2016);
Tribunal de Justiça de São Paulo anulou o julgamento dos 73 policiais condenados pelo massacre do Carandiru. O voto do relator, desembargador Ivo Sartori, foi baseado exclusivamente na sua consciência;
a decisão do juiz Sergio Moro que autorizou a condução coercitiva do ex-presidente Lula. Com base nesse caso, a condução coercitiva tem sido autorizada de forma irregular pelo Judiciário. Judiciário legislando;
decisão do ministro Barroso em HC que afirmou — com base na ponderação alexiana — não ser crime a interrupção da gestação até o terceiro mês;
decisão do TRF-4 que afirmou que a operação "lava jato" não precisaria respeitar as regras de casos comuns por ser uma situação excepcional;
decisão liminar do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Mandado de Segurança 34.530, determinando "o retorno do Projeto de Lei da Câmara n. 80/2016, em tramitação no Senado Federal, à Casa de Origem", sob fundamentos que intervém perigosamente no processo legislativo;
decisão liminar do ministro Marco Aurélio que determinou o afastamento do senador Renan Calheiros da Presidência do Senado, descumprida pelo Senado até decisão do Plenário do STF, que voltou atrás para manter Renan na Presidência, mas fora da linha sucessória. Errada também a decisão que confirmou a liminar em parte.
Há tantas decisões que poderia fazer um Top 100. Por exemplo, a decisão do STJ sobre o pingente pendurado no pescoço, considerado como porte ilegal de munição e o perigo que isso representou para a paz social de Minas Gerais (o STF teve que conceder liminar em HC para terminar com a “bobagem” — sic); no Acre, ação penal fast food — no mesmo dia, houve denúncia, instrução, julgamento e sentença (leia aqui); o caso da indenização de R$ 7 na Bahia fundada no livre convencimento (leia aqui e aqui); o caso da fonte secreta para decretação de prisão no RN (leia aqui); o caso do dono de banca de jornal condenado a mais de sete anos de prisão por ter cometido crime contra a honra de um juiz; o caso do juiz da Infância e Juventude que mandou usar instrumentos de “persuasão” (meu eufemismo para tortura) contra adolescentes que são proibidos até pelo Senado dos EUA; o caso do uso do PowerPoint pelo MPF, que virou meme nas redes (aliás, PowerPoint é moda; os professores já não conseguem ministrar aulas sem “ele”). PowerPoint com efeito vinculante... E a caneta luminosa.
Numa palavra: 2016 foi um ano difícil para o Direito. Apanhou de todos os modos. Foi lanhado. No cotejo com a moral e a política, foi driblado inúmeras vezes. Também a economia tirou lascas do Direito, como nas decisões do STF sobre a tramitação da PEC 55/241. Na verdade, foram poucas as vezes em que o Direito filtrou a moral e a política. No mais das vezes, ocorreu o contrário. O Direito foi buscar lã e sempre voltou tosquiado, como se diz na minha terra.
Em 2016, foram 54 colunas e alguns artigos avulsos. Sempre na mesma trincheira. Buscando coerência e integridade para o Direito. Sei que não é fácil. Acostumamo-nos a ser torcedores. O juiz é bom quando é a nosso favor. Futebolizamos o Direito. Minha cruzada é: “Isto não deve ser assim”. Parafraseando o famoso bordão “Indignai-vos”, lançado pelo ex-combatente francês Stéphane Hessel, lanço o meu, explicitado na coluna da semana passada: “Envergonhai-vos”! Ou “Só a vergonha nos salvará!”.
Por isso, todas as semanas venho aqui para fincar mais uma bandeira, buscando ganhar nem que seja um milímetro do campo de batalha. Um feliz Ano-Novo para todos, inclusive para os que não gostam da coluna. Mas que, eu sei, esperam-na ansiosamente toda quinta-feira, às 8h da manhã.
Saludo!
Senso Incomum
Breve ranking de decisões que (mais) fragilizaram o Direito em 2016
ImprimirEnviar223318
29 de dezembro de 2016, 8h00
Por Lenio Luiz Streck
Começo perguntando: O que é o Direito? E respondo: quando cada juiz decide que o Direito é do jeito que ele pensa que é, parece-me que um bom conceito de Direito é o de que, em uma democracia, o sistema democrático deve oferecer um critério acerca dos sentidos da lei que sejam publicamente acessíveis, para que, de posse deles, possamos cobrar padrões sociais que sejam vinculantes a todos, sem distinção de raça, cor, sexo, poder etc. Isto é: deve existir um padrão decisório. Isso se chama decisão por princípio. O que não deve existir é um decidir por decidir. Não posso correr sozinho e chegar em segundo lugar. O Judiciário deve ter um mínimo de racionalidade. Os sentidos da lei não são secretos.
Por isso, as decisões devem ser coerentes e íntegras (o que os tribunais fizeram com o artigo 926 do CPC?). Por exemplo: se o TRF-3 diz — corretamente — em uma decisão que clamor social não é motivo para prisão preventiva, tal decisão não pode ser ad hoc. Deve transcender. Outros juízes devem seguir esse padrão. Que, aliás, é o padrão constitucionalmente correto. De há muito o STF já disse que a violência do crime não prende por si, assim como clamor social não é motivo para prender. Mas essa interpretação que o TRF-3 deu ao caso do ex-secretário municipal de São Bernardo do Campo (SP) não pode ser uma loteria ou um achado. Tem de avisar aos demais juízes também, se me entendem o que quero comunicar. E os TRFs devem decidir por princípio. A integridade e coerência devem também ser horizontais. Afinal, há, hoje, dezenas ou centenas (ou milhares) de pessoas presas preventivamente pelo “fundamento” do clamor social. Compreendem o que quero dizer?
O inimigo da coerência e da integridade é o “decidir por argumentos morais” (e/ou outros argumentos de cunho subjetivo). Como já falei na coluna passada, 2016 foi o ano em que o Direito sucumbiu à moral. Parece que em definitivo. O que quero dizer com isso? Que estou pregando um Direito isento da moral? Óbvio que não. O que quero dizer é que o Direito é que deve filtrar a moral e a política... E não o contrário. Só isso. O que quero dizer é que não é a apreciação moral do juiz ou tribunal que deve corrigir ou torcer o conteúdo mínimo da lei. Há seis hipóteses pelas quais o Judiciário pode deixar de aplicar a lei. Fora disso, é sua obrigação aplicar. Se a lei não é “boa” — ou seja, se a lei não “bate” com o que o juiz pensa —, ele deve mudar de profissão. Ele não é o superego da sociedade nem corretor do parlamento. Nesta última coluna de 2016, trago uma citação da ex-juíza do Tribunal Constitucional alemão Ingeborg Maus:
"Quando a Justiça ascende ela própria à condição de mais alta instância moral da sociedade, passa a escapar de qualquer mecanismo de controle social — controle ao qual normalmente se deve subordinar toda instituição do Estado em uma forma de organização política democrática. No domínio de uma Justiça que contrapõe um Direito "superior", dotado de atributos morais, ao simples direito de outros Poderes do Estado e da sociedade, é notória a regressão a valores pré-democráticos de parâmetros de integração social".
Dá para entender ou vamos fazer uma letra de funk para ser mais palatável? Isso que disse a professora Maus bate com o que eu falei no início da coluna — o conceito de Direito.
Enquanto isso, apresento uma amostragem de decisões ativistas-behavioristas de 2016 que se enquadram na crítica acima:
as decisões judiciais que determinaram o bloqueio do WhatsApp;
decisão do juiz Sergio Moro, em 16 de março, de divulgar interceptação telefônica de conversa entre a então presidente da República e um ex-presidente; o STF excluiu tais provas, comprovando a tese da ilicitude;
o STF fragiliza a presunção da inocência contra expresso texto de lei e da Constituição (e metade da comunidade jurídica acha "bom");
"medida excepcional" da Justiça autoriza a polícia a fazer buscas e apreensões coletivas em favela no Rio de Janeiro contra expresso texto legal e constitucional;
mesmo após a vigência do novo CPC, o STJ — guardião da legalidade — continua entendendo que nada mudou acerca do dever de fundamentação, como se o artigo 489, parágrafo 1º, com todos seus incisos, fosse “letra morta”. Isso fica claro no trecho da fundamentação dos Embargos de Declaração no MS 21.315-DF, no qual consta que “o julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”;
a decisão do STF na ADPF 347, assumindo a tese do Estado de Coisas Inconstitucional (ECI), que não serviu para nada; passado mais de ano, não colocaram um tijolo no sistema (essa decisão é de 2015, mas é como se fosse de 2016);
Tribunal de Justiça de São Paulo anulou o julgamento dos 73 policiais condenados pelo massacre do Carandiru. O voto do relator, desembargador Ivo Sartori, foi baseado exclusivamente na sua consciência;
a decisão do juiz Sergio Moro que autorizou a condução coercitiva do ex-presidente Lula. Com base nesse caso, a condução coercitiva tem sido autorizada de forma irregular pelo Judiciário. Judiciário legislando;
decisão do ministro Barroso em HC que afirmou — com base na ponderação alexiana — não ser crime a interrupção da gestação até o terceiro mês;
decisão do TRF-4 que afirmou que a operação "lava jato" não precisaria respeitar as regras de casos comuns por ser uma situação excepcional;
decisão liminar do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Mandado de Segurança 34.530, determinando "o retorno do Projeto de Lei da Câmara n. 80/2016, em tramitação no Senado Federal, à Casa de Origem", sob fundamentos que intervém perigosamente no processo legislativo;
decisão liminar do ministro Marco Aurélio que determinou o afastamento do senador Renan Calheiros da Presidência do Senado, descumprida pelo Senado até decisão do Plenário do STF, que voltou atrás para manter Renan na Presidência, mas fora da linha sucessória. Errada também a decisão que confirmou a liminar em parte.
Há tantas decisões que poderia fazer um Top 100. Por exemplo, a decisão do STJ sobre o pingente pendurado no pescoço, considerado como porte ilegal de munição e o perigo que isso representou para a paz social de Minas Gerais (o STF teve que conceder liminar em HC para terminar com a “bobagem” — sic); no Acre, ação penal fast food — no mesmo dia, houve denúncia, instrução, julgamento e sentença (leia aqui); o caso da indenização de R$ 7 na Bahia fundada no livre convencimento (leia aqui e aqui); o caso da fonte secreta para decretação de prisão no RN (leia aqui); o caso do dono de banca de jornal condenado a mais de sete anos de prisão por ter cometido crime contra a honra de um juiz; o caso do juiz da Infância e Juventude que mandou usar instrumentos de “persuasão” (meu eufemismo para tortura) contra adolescentes que são proibidos até pelo Senado dos EUA; o caso do uso do PowerPoint pelo MPF, que virou meme nas redes (aliás, PowerPoint é moda; os professores já não conseguem ministrar aulas sem “ele”). PowerPoint com efeito vinculante... E a caneta luminosa.
Numa palavra: 2016 foi um ano difícil para o Direito. Apanhou de todos os modos. Foi lanhado. No cotejo com a moral e a política, foi driblado inúmeras vezes. Também a economia tirou lascas do Direito, como nas decisões do STF sobre a tramitação da PEC 55/241. Na verdade, foram poucas as vezes em que o Direito filtrou a moral e a política. No mais das vezes, ocorreu o contrário. O Direito foi buscar lã e sempre voltou tosquiado, como se diz na minha terra.
Em 2016, foram 54 colunas e alguns artigos avulsos. Sempre na mesma trincheira. Buscando coerência e integridade para o Direito. Sei que não é fácil. Acostumamo-nos a ser torcedores. O juiz é bom quando é a nosso favor. Futebolizamos o Direito. Minha cruzada é: “Isto não deve ser assim”. Parafraseando o famoso bordão “Indignai-vos”, lançado pelo ex-combatente francês Stéphane Hessel, lanço o meu, explicitado na coluna da semana passada: “Envergonhai-vos”! Ou “Só a vergonha nos salvará!”.
Por isso, todas as semanas venho aqui para fincar mais uma bandeira, buscando ganhar nem que seja um milímetro do campo de batalha. Um feliz Ano-Novo para todos, inclusive para os que não gostam da coluna. Mas que, eu sei, esperam-na ansiosamente toda quinta-feira, às 8h da manhã.
Saludo!
Clube de Engenharia decreta a "morte da Engenharia Brasileira"
Clube de Engenharia decreta a "morte da Engenharia Brasileira" - TIJOLAÇO | ”
Clube de Engenharia decreta a “morte da Engenharia Brasileira”
Por Fernando Brito · 28/12/2016
prosub
“A Engenharia Brasileira está morta. Será cremada no altar da Jurisprudência da Destruição, do entreguismo e da ortodoxia econômica. Suas cinzas serão sepultadas em hora e local a serem anunciados no decorrer deste ano de 2017.”
A “nota fúnebre” foi publicada hoje pelo Clube de Engenharia, entidade que reúne os profissionais e o melhor do pensamento estratégico do setor há nada menos que 136 anos e é a mais antiga sociedade de engenheiros da América Latina.
Num extenso artigo, o Clube diz que “não existem nações que tenham crescido econômica e geopoliticamente sabotando, inviabilizando, destruindo, execrando, ensinando seu povo a desprezar, odiar e demonizar essa área, seus técnicos, trabalhadores, suas empresas, projetos, líderes e empresários, como o Brasil está fazendo agora”.
Empresas e grupos que estão sendo destruídos, agora, pelo ódio, a pressão e a calúnia, como se tivessem sido atingidos por uma devastadora bomba de nêutrons.
O artigo aponta como efeito da aventura judicial, que confunde empresas com pessoas fisicas, “R$ 140 bilhões em prejuízo (à economia) , a demissão de milhares de trabalhadores, a interrupção de dezenas de projetos na área de energia, indústria naval, infraestrutura e defesa, a quebra de milhares de acionistas, investidores e fornecedores”.
A engenharia nacional está perecendo. Foi ferida de morte por um sistema judiciário que pretende condenar, a priori, qualquer contato entre empresas privadas e o setor público, e desenvolveu uma Jurisprudência da Destruição de caráter descaradamente político, que não concebe punir corruptos sem destruir grandes empresas, desempregar milhares de pais de família, interromper e destroçar dezenas de projetos estratégicos.
Um sistema judiciário que acredita que deve punir, implacável e estupidamente, não apenas as pessoas físicas, mas também as jurídicas, não interessando se esses grupos possuem tecnologia e conhecimento estratégicos, desenvolvidos ao longo de anos de experiência e aprendizado, se estão envolvidos em projetos vitais para o desenvolvimento e a segurança nacional, se deles dependem, para sobreviver, milhões de brasileiros.
O artigo diz ainda que “as nações mais poderosas do mundo” não apenas fortalecem “sua própria engenharia e suas maiores empresas”, mas se dedicam, também a ” sabotar as empresas e a engenharia de outros países, usando desculpas de diferentes matizes, que são repetidas e multiplicadas pela mídia sabuja e babosa desses mesmos lugares”.
Não é outra coisa o que os Estados Unidos fazem por meio de órgãos como o Departamento de Justiça e de iniciativas como o próprio Foreign Corrupt Practices Act, sob o manto do combate à corrupção e da proteção da concorrência.
Como se diz no futebol, não tem mais time bobo. Ou tem, nestas bandas aqui.
O manifesto do Clube de Engenharia – que você pode ler aqui,
na íntegra – aponta como “desastrosa” a antecipação “suicida” pelo BNDES – em plena recessão – do pagamento de R$ 100 bilhões ao Tesouro: um dinheiro que poderia ser imediatamente aplicado em [obras de] infraestrutura, vai em troca de uma insignificante, irrelevante, pouco mais que simbólica redução de 1% na dívida pública.
E conclui, tristemente: “A engenharia brasileira faleceu, com seus escritórios de detalhamento de projetos, suas fábricas de bens de capital, seus estaleiros de montagem de navios e plataformas de petróleo fechados, suas linhas de crédito encarecidas ou cortadas, seus ativos vendidos na bacia das almas e seus canteiros de obras abandonados. E o seu sepultamento está marcado para algum momento de 2017.”
Clube de Engenharia decreta a “morte da Engenharia Brasileira”
Por Fernando Brito · 28/12/2016
prosub
“A Engenharia Brasileira está morta. Será cremada no altar da Jurisprudência da Destruição, do entreguismo e da ortodoxia econômica. Suas cinzas serão sepultadas em hora e local a serem anunciados no decorrer deste ano de 2017.”
A “nota fúnebre” foi publicada hoje pelo Clube de Engenharia, entidade que reúne os profissionais e o melhor do pensamento estratégico do setor há nada menos que 136 anos e é a mais antiga sociedade de engenheiros da América Latina.
Num extenso artigo, o Clube diz que “não existem nações que tenham crescido econômica e geopoliticamente sabotando, inviabilizando, destruindo, execrando, ensinando seu povo a desprezar, odiar e demonizar essa área, seus técnicos, trabalhadores, suas empresas, projetos, líderes e empresários, como o Brasil está fazendo agora”.
Empresas e grupos que estão sendo destruídos, agora, pelo ódio, a pressão e a calúnia, como se tivessem sido atingidos por uma devastadora bomba de nêutrons.
O artigo aponta como efeito da aventura judicial, que confunde empresas com pessoas fisicas, “R$ 140 bilhões em prejuízo (à economia) , a demissão de milhares de trabalhadores, a interrupção de dezenas de projetos na área de energia, indústria naval, infraestrutura e defesa, a quebra de milhares de acionistas, investidores e fornecedores”.
A engenharia nacional está perecendo. Foi ferida de morte por um sistema judiciário que pretende condenar, a priori, qualquer contato entre empresas privadas e o setor público, e desenvolveu uma Jurisprudência da Destruição de caráter descaradamente político, que não concebe punir corruptos sem destruir grandes empresas, desempregar milhares de pais de família, interromper e destroçar dezenas de projetos estratégicos.
Um sistema judiciário que acredita que deve punir, implacável e estupidamente, não apenas as pessoas físicas, mas também as jurídicas, não interessando se esses grupos possuem tecnologia e conhecimento estratégicos, desenvolvidos ao longo de anos de experiência e aprendizado, se estão envolvidos em projetos vitais para o desenvolvimento e a segurança nacional, se deles dependem, para sobreviver, milhões de brasileiros.
O artigo diz ainda que “as nações mais poderosas do mundo” não apenas fortalecem “sua própria engenharia e suas maiores empresas”, mas se dedicam, também a ” sabotar as empresas e a engenharia de outros países, usando desculpas de diferentes matizes, que são repetidas e multiplicadas pela mídia sabuja e babosa desses mesmos lugares”.
Não é outra coisa o que os Estados Unidos fazem por meio de órgãos como o Departamento de Justiça e de iniciativas como o próprio Foreign Corrupt Practices Act, sob o manto do combate à corrupção e da proteção da concorrência.
Como se diz no futebol, não tem mais time bobo. Ou tem, nestas bandas aqui.
O manifesto do Clube de Engenharia – que você pode ler aqui,
na íntegra – aponta como “desastrosa” a antecipação “suicida” pelo BNDES – em plena recessão – do pagamento de R$ 100 bilhões ao Tesouro: um dinheiro que poderia ser imediatamente aplicado em [obras de] infraestrutura, vai em troca de uma insignificante, irrelevante, pouco mais que simbólica redução de 1% na dívida pública.
E conclui, tristemente: “A engenharia brasileira faleceu, com seus escritórios de detalhamento de projetos, suas fábricas de bens de capital, seus estaleiros de montagem de navios e plataformas de petróleo fechados, suas linhas de crédito encarecidas ou cortadas, seus ativos vendidos na bacia das almas e seus canteiros de obras abandonados. E o seu sepultamento está marcado para algum momento de 2017.”
quarta-feira, 28 de dezembro de 2016
ConJur - Lenio Streck: O que o queijo tem a ver com o escândalo das Teles?
ConJur - Lenio Streck: O que o queijo tem a ver com o escândalo das Teles?
Por Lenio Luiz Streck
Começo com uma provocação: Em um país em que aquele que provoca tumulto em um posto de gasolina Petrobras situado em Agudo ou em Inhambu corre o risco de ser julgado em Curitiba face à competência infinita da operação "lava jato", eis, aqui, um prato cheio e uma grande oportunidade de os procuradores e o juiz estenderem seus tentáculos para um esquema de corrupção que pode ocasionar cinco vezes mais prejuízos do que o caso Petrobras.
Como a "lava jato" pode ser competente? Sei lá. Não faço a mínima ideia. Estou apenas metaforizando. Moro sempre dá um jeito de ver e encontrar uma conexão. Aqui, uma ideia: o escândalo de que falo é o da Lei Geral das Telecomunicações, que concede benefícios às teles no valor de R$ 100 bilhões. Tão escandaloso que a Ministra Cármen Lúcia concedeu liminar para trancar a tramitação relâmpago no Senado (para evitar, inclusive, de corrermos o risco de o Presidente Temer sancionar).
Qual é a tese da conexão, então? Simples: como se trata de um escândalo envolvendo telecomunicações e como todos os envolvidos possuem telefones celulares e alguns componentes dos aparelhos vem do petróleo, bingo. Eis a conexão para levar tudo para Curitiba. Tudo sempre está interligado, como na história do sujeito que dá uma bofetada no outro por tê-lo chamado, por dedução, de “corno”. Afinal, o desafeto ofereceu-lhe um pedaço de queijo. Que vem do leite. Que vem da vaca. Que tem chifres. Simples, pois.
É uma blague, mas estou provocando a seletividade reinante no combate à corrupção em Pindorama. O Procurador-Geral da República já deveria ter entrado em campo. Ele mesmo deveria ter entrado com a ação para evitar a criação desse monstrengo de mais de R$ 100 bilhões (isso é demonstrado por várias fontes: o próprio mandado de segurança, informações do Tribunal de Contas, O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a Associação Brasileira de Procons e outras 18 organizações civis assinaram uma nota de repúdio contra o ato da Mesa Diretora do Senado Federal que rejeitou recursos parlamentares que pediam a análise em plenário do projeto de lei; basta procurar no Google).
Até a revista Veja falou no assunto, mostrando de onde veio o “presente” para as Teles. Está lá, bem claro, como f(Oi), ao vivo, tim tim por tim tim. O que quero lembrar? Quero lembrar os gritos (histéricos) dos parlamentares na hora do afastamento da Presidente Dilma: “ - pelo Brasil, por meus filhos, por um país decente, pela Lava Jato, por meus cachorros, por minha namorada, por minha amante etc”. Como se começasse um Brasil do zero. Ora, ledo engano. Ilusão de quem acreditava nisso, hipocrisia de quem se aproveitou da situação. Basta ver o número de pessoas que estão listadas nas delações.
Portanto, um aviso aos moralistas de plantão: não existe uma sociedade sem vícios. Como já tantas vezes contei aqui, temos de reler, constantemente, a fábula das abelhas do barão de Mandeville: Vícios privados, benefícios públicos. As abelhas que tentaram zerar os vícios a qualquer custo – que eram as abelhas moralistas - , ajudaram a colocar a sociedade no caos, a ponto de pedirem para a rainha que restaurasse os vícios. Está lá na fábula. Leiam. Daí a máxima: vícios privados, benefícios públicos. Só que, em Pindorama, o lema é: vícios públicos, benefícios privados. Invertemos a fábula do Barão.
Tentando ser mais simples, o episódio do Telegate (ou os bilhões natalinos das teles) apenas mostra que, em uma democracia, temos de seguir as regras do jogo. Não se tem como obrigar a que as pessoas sejam virtuosas. De que adianta fragilizar direitos fundamentais? De que adianta violar garantias e querer legitimar provas ilícitas obtidas de “boa fé”? De um lado se faz isso... e de outro vem um escândalo cinco vezes maior. Isso apenas prova de que o patrimonialismo brasileiro tem raízes fortes. E que, no combate à corrupção, não existem bons e maus corruptos. Não dá para ser seletivo. Mas não dá, mesmo.
Que este escândalo das teles (o TeleGate) seja um exemplo de que não podemos escolher inimigos. Que devemos ser imparciais no combate à corrupção. E que há vários modos de fazer corrupção. Pode-se receber dinheiro de caixa dois, etc aos moldes Lava Jato; mas também é possível entregar mais de 100 bilhões para empresas – cujo dinheiro daria para tapar o dito déficit da Previdência. As abelhas entendem bem isso?
Sendo sarcástico mais uma vez: O que mais dói é ver que as multas que as Teles receberam durante esses anos foram apagadas no tal projeto. Tudo ao Vivo. Bem Claro. Com um Oi para a malta. Mas tudo Tim Tim por Tim Tim (desculpem-me o trocadilho). Todos meus telefonemas para o Procon, meus stresses com o 0800 foram em vão. Quero ver denúncias, agora, falando no clássico “lavagem de dinheiro e formação de quadrilha” ou coisas do gênero. Se o instituto da conexão “funcionar” – se me entendem a ironia – as celas de Curitiba deverão ser esvaziadas para novos hóspedes.
Ou não?
Por Lenio Luiz Streck
Começo com uma provocação: Em um país em que aquele que provoca tumulto em um posto de gasolina Petrobras situado em Agudo ou em Inhambu corre o risco de ser julgado em Curitiba face à competência infinita da operação "lava jato", eis, aqui, um prato cheio e uma grande oportunidade de os procuradores e o juiz estenderem seus tentáculos para um esquema de corrupção que pode ocasionar cinco vezes mais prejuízos do que o caso Petrobras.
Como a "lava jato" pode ser competente? Sei lá. Não faço a mínima ideia. Estou apenas metaforizando. Moro sempre dá um jeito de ver e encontrar uma conexão. Aqui, uma ideia: o escândalo de que falo é o da Lei Geral das Telecomunicações, que concede benefícios às teles no valor de R$ 100 bilhões. Tão escandaloso que a Ministra Cármen Lúcia concedeu liminar para trancar a tramitação relâmpago no Senado (para evitar, inclusive, de corrermos o risco de o Presidente Temer sancionar).
Qual é a tese da conexão, então? Simples: como se trata de um escândalo envolvendo telecomunicações e como todos os envolvidos possuem telefones celulares e alguns componentes dos aparelhos vem do petróleo, bingo. Eis a conexão para levar tudo para Curitiba. Tudo sempre está interligado, como na história do sujeito que dá uma bofetada no outro por tê-lo chamado, por dedução, de “corno”. Afinal, o desafeto ofereceu-lhe um pedaço de queijo. Que vem do leite. Que vem da vaca. Que tem chifres. Simples, pois.
É uma blague, mas estou provocando a seletividade reinante no combate à corrupção em Pindorama. O Procurador-Geral da República já deveria ter entrado em campo. Ele mesmo deveria ter entrado com a ação para evitar a criação desse monstrengo de mais de R$ 100 bilhões (isso é demonstrado por várias fontes: o próprio mandado de segurança, informações do Tribunal de Contas, O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a Associação Brasileira de Procons e outras 18 organizações civis assinaram uma nota de repúdio contra o ato da Mesa Diretora do Senado Federal que rejeitou recursos parlamentares que pediam a análise em plenário do projeto de lei; basta procurar no Google).
Até a revista Veja falou no assunto, mostrando de onde veio o “presente” para as Teles. Está lá, bem claro, como f(Oi), ao vivo, tim tim por tim tim. O que quero lembrar? Quero lembrar os gritos (histéricos) dos parlamentares na hora do afastamento da Presidente Dilma: “ - pelo Brasil, por meus filhos, por um país decente, pela Lava Jato, por meus cachorros, por minha namorada, por minha amante etc”. Como se começasse um Brasil do zero. Ora, ledo engano. Ilusão de quem acreditava nisso, hipocrisia de quem se aproveitou da situação. Basta ver o número de pessoas que estão listadas nas delações.
Portanto, um aviso aos moralistas de plantão: não existe uma sociedade sem vícios. Como já tantas vezes contei aqui, temos de reler, constantemente, a fábula das abelhas do barão de Mandeville: Vícios privados, benefícios públicos. As abelhas que tentaram zerar os vícios a qualquer custo – que eram as abelhas moralistas - , ajudaram a colocar a sociedade no caos, a ponto de pedirem para a rainha que restaurasse os vícios. Está lá na fábula. Leiam. Daí a máxima: vícios privados, benefícios públicos. Só que, em Pindorama, o lema é: vícios públicos, benefícios privados. Invertemos a fábula do Barão.
Tentando ser mais simples, o episódio do Telegate (ou os bilhões natalinos das teles) apenas mostra que, em uma democracia, temos de seguir as regras do jogo. Não se tem como obrigar a que as pessoas sejam virtuosas. De que adianta fragilizar direitos fundamentais? De que adianta violar garantias e querer legitimar provas ilícitas obtidas de “boa fé”? De um lado se faz isso... e de outro vem um escândalo cinco vezes maior. Isso apenas prova de que o patrimonialismo brasileiro tem raízes fortes. E que, no combate à corrupção, não existem bons e maus corruptos. Não dá para ser seletivo. Mas não dá, mesmo.
Que este escândalo das teles (o TeleGate) seja um exemplo de que não podemos escolher inimigos. Que devemos ser imparciais no combate à corrupção. E que há vários modos de fazer corrupção. Pode-se receber dinheiro de caixa dois, etc aos moldes Lava Jato; mas também é possível entregar mais de 100 bilhões para empresas – cujo dinheiro daria para tapar o dito déficit da Previdência. As abelhas entendem bem isso?
Sendo sarcástico mais uma vez: O que mais dói é ver que as multas que as Teles receberam durante esses anos foram apagadas no tal projeto. Tudo ao Vivo. Bem Claro. Com um Oi para a malta. Mas tudo Tim Tim por Tim Tim (desculpem-me o trocadilho). Todos meus telefonemas para o Procon, meus stresses com o 0800 foram em vão. Quero ver denúncias, agora, falando no clássico “lavagem de dinheiro e formação de quadrilha” ou coisas do gênero. Se o instituto da conexão “funcionar” – se me entendem a ironia – as celas de Curitiba deverão ser esvaziadas para novos hóspedes.
Ou não?
Um meio de ter proteção nuclear sem os custos de fazer a bomba, por J. Carlos de Assis | GGN
Um meio de ter proteção nuclear sem os custos de fazer a bomba, por J. Carlos de Assis | GGN
Um meio de ter proteção nuclear sem os custos de fazer a bomba
por J. Carlos de Assis
O Brasil se apresenta como uma nação pacífica, amiga dos EUA. Mas os EUA se comportam como se fossem inimigos do Brasil. Muitos especialistas em política internacional, como o infatigável Moniz Bandeira, tem apontado essa contradição, mas a realidade veio à tona quando se divulgou que a NSA, principal agência de espionagem norte-americana, espionou a Petrobrás e a Presidenta Dilma. A reação da Presidenta foi simbólica: adiou uma visita a Washington. Já a Petrobrás não teve espaço para reagir, pois os próprios EUA, como se sabe hoje, trataram de usar o juiz Sérgio Moro para divulgar os escândalos de seus diretores.
Foi a partir dessa espionagem que se tornaram mais frequentes as viagens do juiz Sergio Moro para palestras e recepção de prêmios nos Estados Unidos. Hoje se sabe com bastante segurança que o juiz e os procuradores da Lava Jato não apenas receberam informações sobre a Petrobrás de autoridades americanas, oriundas da espionagem, como transmitiram ilegalmente a elas informações obtidas em delações premiadas não apenas sobre a Petrobrás mas também sobre a cadeia de empresas privadas em torno dela. Não sou jurista mas, no meu entender, acho que se trata de uma clara situação de crime de lesa-pátria.
O povo ainda não se deu conta de que a corrupção – inequívoca, é verdade – está sendo usada para mascarar a conquista da soberania brasileira pelo capital financeiro e pelas petrolíferas internacionais, com foco nos EUA. Isso já não se faz com canhoneiras, exceto se uma convulsão social instigada no Brasil pelos próprios americanos resultar numa guerra civil cuja parte contrária às posições deles ameaçar ganhar. Nesse caso entrarão para “defender” a democracia como fizeram no Iraque, na Líbia, no Egito, na Síria, através não só de marines mas principalmente das ONGs que se apresentam como defensoras dos direitos humanos e paladinos contra a corrupção.
Os Estados Unidos não nos dão sequer o status de inimigos. Isso é para a Rússia e a China, que são potências nucleares. Nós, cujo projeto atômico secreto do Exército foi liquidado pelo “democrata” Collor de Mello, merecemos a posição de subalternos. Por imposição deles, sem qualquer contrapartida, assinamos o Tratado de Não Proliferação Nuclear. Eles não se deram sequer ao trabalho de garantir a nós, e ao mundo, que jamais usarão bombas nucleares em primeiro lugar contra nós ou contra qualquer país. Ao contrário, se dão o direito de tomar a iniciativa de destruir o mundo com a estratégia de “guerra nuclear protegida” – a ideia de desfechar um primeiro ataque e proteger o próprio território tecnologicamente.
Propusemos aos Estados Unidos transformar o Atlântico Sul, nosso vizinho, numa zona não nuclearizada. Já que desistimos de fazer a bomba atômica que nos dessem ao menos o direito de não ter armas atômicas nas nossas costas. Riram de nós. Reativaram a IV Frota, com seu poderio nuclear, certamente com vistas à “proteção” do nosso pré-sal, descoberto por nós com tecnologia nossa, e agora visado por eles com sua ganância peculiar. Apenas num ponto ficaram assustados: quando nos aliamos à China, à Rússia e à Índia na criação dos BRICS. A partir daí passaram a nos sabotar, e o meio adotado foi, adivinhem, a corrupção da cúpula do poder no Brasil. A propósito, estudo do Bank of America Merryl Linch acaba de decretar abertamente que “é hora de dividir os BRiCS”, grupo que “nunca fez muito sentido”.
O movimento que demos na direção de uma relativa autonomia geopolítica e geoeconômica, contra a tendência asfixiante da globalização financeira, foi reforçado pela nossa conquista no desenvolvimento de centrífugas para enriquecimento de urânio até 20%, o que nos possibilitará ter combustível nosso para o submarino nuclear que estamos construindo com tecnologia transferida pelos franceses. Provavelmente por ordem dos Estados Unidos o esquema do juiz Moro mandou para a cadeia, com pena de 43 anos, o herói nacional Almirante Othon, do qual não conseguiram arrancar em delação premiada, justamente por ser um herói, a rota no mercado negro dos equipamentos usados para construir as centrífugas.
Espero que os militares leiam e reflitam sobre esse artigo. Se quisermos preservar nossa soberania temos que nos aliar a potências não subalternas aos Estados Unidos. O caminho é óbvio. Um tratado de proteção recíproca no âmbito dos BRICS pelo qual se ofereça à Rússia e à China, e preferivelmente às duas simultaneamente, uma base militar na costa brasileira em condições de defender o pré-sal e o Atlântico Sul. O presidente que se opuser a isso deve ser afastado por desídia em relação a interesses fundamentais do Brasil. Com esse tratado poderemos dormir em paz sem precisar de armas nucleares sob nosso controle, obedecendo ao que ordenou a Collor o governo norte-americano.
Um meio de ter proteção nuclear sem os custos de fazer a bomba
por J. Carlos de Assis
O Brasil se apresenta como uma nação pacífica, amiga dos EUA. Mas os EUA se comportam como se fossem inimigos do Brasil. Muitos especialistas em política internacional, como o infatigável Moniz Bandeira, tem apontado essa contradição, mas a realidade veio à tona quando se divulgou que a NSA, principal agência de espionagem norte-americana, espionou a Petrobrás e a Presidenta Dilma. A reação da Presidenta foi simbólica: adiou uma visita a Washington. Já a Petrobrás não teve espaço para reagir, pois os próprios EUA, como se sabe hoje, trataram de usar o juiz Sérgio Moro para divulgar os escândalos de seus diretores.
Foi a partir dessa espionagem que se tornaram mais frequentes as viagens do juiz Sergio Moro para palestras e recepção de prêmios nos Estados Unidos. Hoje se sabe com bastante segurança que o juiz e os procuradores da Lava Jato não apenas receberam informações sobre a Petrobrás de autoridades americanas, oriundas da espionagem, como transmitiram ilegalmente a elas informações obtidas em delações premiadas não apenas sobre a Petrobrás mas também sobre a cadeia de empresas privadas em torno dela. Não sou jurista mas, no meu entender, acho que se trata de uma clara situação de crime de lesa-pátria.
O povo ainda não se deu conta de que a corrupção – inequívoca, é verdade – está sendo usada para mascarar a conquista da soberania brasileira pelo capital financeiro e pelas petrolíferas internacionais, com foco nos EUA. Isso já não se faz com canhoneiras, exceto se uma convulsão social instigada no Brasil pelos próprios americanos resultar numa guerra civil cuja parte contrária às posições deles ameaçar ganhar. Nesse caso entrarão para “defender” a democracia como fizeram no Iraque, na Líbia, no Egito, na Síria, através não só de marines mas principalmente das ONGs que se apresentam como defensoras dos direitos humanos e paladinos contra a corrupção.
Os Estados Unidos não nos dão sequer o status de inimigos. Isso é para a Rússia e a China, que são potências nucleares. Nós, cujo projeto atômico secreto do Exército foi liquidado pelo “democrata” Collor de Mello, merecemos a posição de subalternos. Por imposição deles, sem qualquer contrapartida, assinamos o Tratado de Não Proliferação Nuclear. Eles não se deram sequer ao trabalho de garantir a nós, e ao mundo, que jamais usarão bombas nucleares em primeiro lugar contra nós ou contra qualquer país. Ao contrário, se dão o direito de tomar a iniciativa de destruir o mundo com a estratégia de “guerra nuclear protegida” – a ideia de desfechar um primeiro ataque e proteger o próprio território tecnologicamente.
Propusemos aos Estados Unidos transformar o Atlântico Sul, nosso vizinho, numa zona não nuclearizada. Já que desistimos de fazer a bomba atômica que nos dessem ao menos o direito de não ter armas atômicas nas nossas costas. Riram de nós. Reativaram a IV Frota, com seu poderio nuclear, certamente com vistas à “proteção” do nosso pré-sal, descoberto por nós com tecnologia nossa, e agora visado por eles com sua ganância peculiar. Apenas num ponto ficaram assustados: quando nos aliamos à China, à Rússia e à Índia na criação dos BRICS. A partir daí passaram a nos sabotar, e o meio adotado foi, adivinhem, a corrupção da cúpula do poder no Brasil. A propósito, estudo do Bank of America Merryl Linch acaba de decretar abertamente que “é hora de dividir os BRiCS”, grupo que “nunca fez muito sentido”.
O movimento que demos na direção de uma relativa autonomia geopolítica e geoeconômica, contra a tendência asfixiante da globalização financeira, foi reforçado pela nossa conquista no desenvolvimento de centrífugas para enriquecimento de urânio até 20%, o que nos possibilitará ter combustível nosso para o submarino nuclear que estamos construindo com tecnologia transferida pelos franceses. Provavelmente por ordem dos Estados Unidos o esquema do juiz Moro mandou para a cadeia, com pena de 43 anos, o herói nacional Almirante Othon, do qual não conseguiram arrancar em delação premiada, justamente por ser um herói, a rota no mercado negro dos equipamentos usados para construir as centrífugas.
Espero que os militares leiam e reflitam sobre esse artigo. Se quisermos preservar nossa soberania temos que nos aliar a potências não subalternas aos Estados Unidos. O caminho é óbvio. Um tratado de proteção recíproca no âmbito dos BRICS pelo qual se ofereça à Rússia e à China, e preferivelmente às duas simultaneamente, uma base militar na costa brasileira em condições de defender o pré-sal e o Atlântico Sul. O presidente que se opuser a isso deve ser afastado por desídia em relação a interesses fundamentais do Brasil. Com esse tratado poderemos dormir em paz sem precisar de armas nucleares sob nosso controle, obedecendo ao que ordenou a Collor o governo norte-americano.
Mineirinho da Odebrecht depõe na PF e a imprensa abafa, por Helena Sthephanowitz
Mineirinho da Odebrecht depõe na PF e a imprensa abafa, por Helena Sthephanowitz
Por Helena Sthephanowitz
Na RBA
A imprensa não estava na porta da Polícia Federal para transmitir ao vivo. Helicópteros não cobriram o trajeto do carro que levava o depoente. Não havia um batalhão de fotógrafos na entrada e na saída do suspeito. Não teve imagens do oficial de Justiça entregando a intimação e nem condução coercitiva com bonitão da PF escoltando.
No mais absoluto sigilo, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) compareceu à sede da Polícia Federal em Brasília na quinta-feira passada para prestar depoimento no inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), em que o tucano é acusado pelo ex-senador Delcídio do Amaral de atrasar o envio de dados do Banco Rural à CPI para poder “apagar dados bancários comprometedores” e evitar que a apuração sobre fraudes na instituição levasse a nomes de outros políticos do PSDB. O inquérito está nas mãos do ministro Gilmar Mendes no STF. O conteúdo do depoimento, contrariando o que passou a ser prática na nossa grande imprensa, também não vazou.
De acordo com o depoimento de Delcídio, durante as investigações feitas pela CPI dos Correios, o senador Aécio Neves, então governador de Minas Gerais, “enviou emissários” para barrar quebras de sigilo de pessoas e empresas investigadas, entre elas o Banco Rural. Delcídio do Amaral, que presidiu a Comissão Parlamentar de Inquérito dos Correios em 2005, disse também que foi descoberto maquiagens em “dados comprometedores” fornecidos pelo Banco Rural para esconder relação entre o Banco e mensalão Tucano. O mensalão tucano, foi revelado durante a CPI dos Correios, em 2005. À época, Eduardo Azeredo era presidente nacional do PSDB.
Eram dados que, segundo ele, prejudicariam o ex-governador Aécio Neves, o ex-vice-governador de Minas Gerais, Clésio Andrade (em 2002, foi sócio de Marcos Valério na SMP&B), além da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, do publicitário Marcus Valério, que utilizava suas empresas para lavagem de dinheiro em forma de publicidade para governos tucanos, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), que sabia que os dados estavam sendo maquiados e o prefeito do Rio, Eduardo Paes, que na época era deputado pelo PSDB). Delcídio também afirmou que em relação a Aécio, “sem dúvida” o presidente nacional do PSDB recebeu propina em um esquema de corrupção na estatal de energia Furnas que, era semelhante ao da Petrobrás, envolvendo inclusive as mesmas empreiteiras.
Dias depois da delação de Delcídio, o jornal O Globo divulgou que documentos da CPI haviam sido deslocados do arquivo do Senado para outro setor da Casa a pedido de Aécio. A pesquisa feita pelo senador Aécio resultou num relatório que foi divulgado pelo próprio senador para contestar as acusações do ex-senador Delcídio.
Daniel Dantas apareceu...
Se de um lado, a imprensa não teve curiosidade de saber o que disse o senador Aécio Neves em depoimento à Policia Federal, também ignorou o pedido do banqueiro Daniel Dantas, pivô de uma série de casos bastante suspeitos envolvendo figuras da classe política brasileira.
Sete anos depois de bater às portas do Supremo para deixar, por duas vezes, a prisão, o banqueiro Daniel Dantas recorreu mais uma vez ao STF. Agora, o dono do Grupo Opportunity quer acesso a todos os documentos da CPI dos Correios. O ministro Gilmar Mendes que já concedeu três habeas corpus a Dantas, deferiu o pedido, autorizando que o empresário tenha acesso a todos os autos da CPI ao Senado, local onde estão guardados
O pedido de Dantas deferido por Gilmar foi protocolado no inquérito que investiga a participação do senador Aécio Neves na maquiagem de dados que foram enviados à CPI dos Correios. O inquérito está no STF, e desde outubro para avaliar se denúncia ou não o senador Aécio.
Em 2005, o banqueiro foi convocado para explicar as operações da Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) com a Telecom Itália na tentativa de compra da Brasil Telecom, que mais tarde virou a Tim. A CPI dos Correios recomendou o indiciamento de Daniel Dantas por gerir de forma espúria, por meio de seu banco Opportunity, os fundos de pensão. O banqueiro só se tornou réu em 2009, na Operação Satiagraha, foi preso duas vezes, e nas duas vezes, o Gilmar Mendes que mandou soltar, agora seu acesso aos documentos da CPI
Para relembrar: governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), Dantas obteve apoio político do PSDB e do PFL (o atual DEM) para participar da privatização das teles. Há o episódio do jantar dele com FHC em junho de 2002. No dia seguinte, haveria troca do comando da Previ, como desejava o banqueiro.
Daniel Dantas estava desaparecido do noticiário até julho desse ano, quando a Justiça Federal em São Paulo liberou os R$ 4,5 bilhões do Opportunity.
O dinheiro estava bloqueado há sete anos para servir de garantia à operação, que investigou crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro. No entanto, todas as provas foram invalidadas e a operação acabou anulada pelo STF.
Agora é aguardar os próximos capítulos para saber o que pretende Daniel Dantas depois de ler toda papelada da CPI da qual ele participou.
Por Helena Sthephanowitz
Na RBA
A imprensa não estava na porta da Polícia Federal para transmitir ao vivo. Helicópteros não cobriram o trajeto do carro que levava o depoente. Não havia um batalhão de fotógrafos na entrada e na saída do suspeito. Não teve imagens do oficial de Justiça entregando a intimação e nem condução coercitiva com bonitão da PF escoltando.
No mais absoluto sigilo, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) compareceu à sede da Polícia Federal em Brasília na quinta-feira passada para prestar depoimento no inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), em que o tucano é acusado pelo ex-senador Delcídio do Amaral de atrasar o envio de dados do Banco Rural à CPI para poder “apagar dados bancários comprometedores” e evitar que a apuração sobre fraudes na instituição levasse a nomes de outros políticos do PSDB. O inquérito está nas mãos do ministro Gilmar Mendes no STF. O conteúdo do depoimento, contrariando o que passou a ser prática na nossa grande imprensa, também não vazou.
De acordo com o depoimento de Delcídio, durante as investigações feitas pela CPI dos Correios, o senador Aécio Neves, então governador de Minas Gerais, “enviou emissários” para barrar quebras de sigilo de pessoas e empresas investigadas, entre elas o Banco Rural. Delcídio do Amaral, que presidiu a Comissão Parlamentar de Inquérito dos Correios em 2005, disse também que foi descoberto maquiagens em “dados comprometedores” fornecidos pelo Banco Rural para esconder relação entre o Banco e mensalão Tucano. O mensalão tucano, foi revelado durante a CPI dos Correios, em 2005. À época, Eduardo Azeredo era presidente nacional do PSDB.
Eram dados que, segundo ele, prejudicariam o ex-governador Aécio Neves, o ex-vice-governador de Minas Gerais, Clésio Andrade (em 2002, foi sócio de Marcos Valério na SMP&B), além da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, do publicitário Marcus Valério, que utilizava suas empresas para lavagem de dinheiro em forma de publicidade para governos tucanos, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), que sabia que os dados estavam sendo maquiados e o prefeito do Rio, Eduardo Paes, que na época era deputado pelo PSDB). Delcídio também afirmou que em relação a Aécio, “sem dúvida” o presidente nacional do PSDB recebeu propina em um esquema de corrupção na estatal de energia Furnas que, era semelhante ao da Petrobrás, envolvendo inclusive as mesmas empreiteiras.
Dias depois da delação de Delcídio, o jornal O Globo divulgou que documentos da CPI haviam sido deslocados do arquivo do Senado para outro setor da Casa a pedido de Aécio. A pesquisa feita pelo senador Aécio resultou num relatório que foi divulgado pelo próprio senador para contestar as acusações do ex-senador Delcídio.
Daniel Dantas apareceu...
Se de um lado, a imprensa não teve curiosidade de saber o que disse o senador Aécio Neves em depoimento à Policia Federal, também ignorou o pedido do banqueiro Daniel Dantas, pivô de uma série de casos bastante suspeitos envolvendo figuras da classe política brasileira.
Sete anos depois de bater às portas do Supremo para deixar, por duas vezes, a prisão, o banqueiro Daniel Dantas recorreu mais uma vez ao STF. Agora, o dono do Grupo Opportunity quer acesso a todos os documentos da CPI dos Correios. O ministro Gilmar Mendes que já concedeu três habeas corpus a Dantas, deferiu o pedido, autorizando que o empresário tenha acesso a todos os autos da CPI ao Senado, local onde estão guardados
O pedido de Dantas deferido por Gilmar foi protocolado no inquérito que investiga a participação do senador Aécio Neves na maquiagem de dados que foram enviados à CPI dos Correios. O inquérito está no STF, e desde outubro para avaliar se denúncia ou não o senador Aécio.
Em 2005, o banqueiro foi convocado para explicar as operações da Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) com a Telecom Itália na tentativa de compra da Brasil Telecom, que mais tarde virou a Tim. A CPI dos Correios recomendou o indiciamento de Daniel Dantas por gerir de forma espúria, por meio de seu banco Opportunity, os fundos de pensão. O banqueiro só se tornou réu em 2009, na Operação Satiagraha, foi preso duas vezes, e nas duas vezes, o Gilmar Mendes que mandou soltar, agora seu acesso aos documentos da CPI
Para relembrar: governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), Dantas obteve apoio político do PSDB e do PFL (o atual DEM) para participar da privatização das teles. Há o episódio do jantar dele com FHC em junho de 2002. No dia seguinte, haveria troca do comando da Previ, como desejava o banqueiro.
Daniel Dantas estava desaparecido do noticiário até julho desse ano, quando a Justiça Federal em São Paulo liberou os R$ 4,5 bilhões do Opportunity.
O dinheiro estava bloqueado há sete anos para servir de garantia à operação, que investigou crimes contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro. No entanto, todas as provas foram invalidadas e a operação acabou anulada pelo STF.
Agora é aguardar os próximos capítulos para saber o que pretende Daniel Dantas depois de ler toda papelada da CPI da qual ele participou.
Xadrez de como o MPF tornou-se uma força antinacional
Xadrez de como o MPF tornou-se uma força antinacional
Xadrez de como o MPF tornou-se uma força antinacional
O Xadrez do Golpe
Luis Nassif
Peça 1 - o cenário pré-Lava Jato
A Lava Jato vai revelando dois aspectos do estágio de desenvolvimento brasileiro.
O primeiro, a corrupção endêmica e generalizada que foi apodrecendo o sistema político sem ser enfrentada por nenhum partido. Era o tema à vista de todos e há décadas percebido pela opinião pública, o único tema capaz de provocar a comoção geral.
O segundo, as indicações de que o país estava a caminho de se transformar em uma potência média, repetindo a trajetória de outras potências, inclusive no atropelo das boas normas.
Como potência média, ainda não havia desenvolvido internamente legislações e regulamentos que disciplinassem o financiamento político, que blindassem as empresas que representassem o interesse nacional, os procedimentos que impedissem que o combate à corrupção comprometesse setores da economia. Enfim, todo esse aparato jurídico-político com que as nações desenvolvidas desenvolvem e blindam suas empresas e até tratam com tolerância, criando uma zona de conforto para que possam pular os limites, nos casos de ampliação do chamado poder nacional.
O Brasil trilhava o caminho de potência média, mas sem essas salvaguardas e sem os cuidados necessários.
Os arquivos da Odebrecht revelam influência no México, Peru, Equador, Argentina, Colômbia, Guatemala, República Dominicana e Panamá, nas eleições de vários países da região, na esteira da ampliação da influência diplomática brasileira, além da notável expansão das empreiteiras na África e América Latina (https://goo.gl/oyxNpa).
Por outro lado, desenvolvia-se uma indústria de defesa autônoma, com absorção de tecnologias avançadas e inúmeras possibilidades abertas com a quase consolidação dos BRICS e das parcerias com a China e seus bancos de desenvolvimento. Avançava-se nos submarinos, nos satélites e na informática.
Com a descoberta do pré-sal, o país se projetava como um dos futuros grandes produtores de energia, desenvolvendo paralelamente uma indústria naval potente e uma grande cadeia de fornecedores para as mais diversas necessidades, de máquinas, equipamentos, caldeiraria a sistemas informatizados de ponta.
Nascia uma nova potência.
Mas havia uma pedra no meio do caminho: a falta de foco interno sobre o chamado interesse nacional e uma corrupção generalizada na política. Em cima dessa vulnerabilidade, desse calcanhar de Aquiles, o Reino foi buscar seus campeões, os candidatos a Paris, os jovens mancebos do Ministério Público Federal capazes de, a pretexto do combate à corrupção, liquidar com as pretensões nacionais.
É assim que se inicia nossa história. Antes de prosseguirmos, um pouco das disputas históricas entre potências estabelecidas e candidatas a potência.
Peça 2 – o complexo de vira-lata
Qualquer obra de história da economia identificará o desenvolvimento como um processo gradativo. A estratégia de cada país deve se dar de acordo com suas circunstâncias, com seu grau de desenvolvimento, com o nível de competitividade da sua economia.
Desde a primeira metade do século 19 consagrou-se o conceito do "chutando a própria escada" na economia política.
Coube ao economista alemão Friedrich List (1789-1846) decifrar o jogo das potências. Com um diagnóstico correto dos fatores de desenvolvimento, List ajudou a Alemanha a desenvolver o Sistema Nacional de Inovação e a consagrar o conceito da união nacional como fator essencial de consolidação econômica e política.
A nova ciência preconizava que da ambição de cada indivíduo se faria o progresso. List rebatia que nem toda iniciativa era virtuosa e caberia ao Estado definir um projeto de país no qual pudessem ser canalizadas as iniciativas de seus cidadãos.
Para se tornar a primeira superpotência da era industrial, a Inglaterra se valeu de todos os recursos que tinha à mão. Praticou pirataria, impôs acordos comerciais lesivos aos parceiros, protegeu seu mercado da invasão dos produtos têxteis indianos, criou reservas de mercado para sua armada, e demanda para seus estaleiros.
Montou um mercado global para seus produtos. Consolidado o mercado,cada fazendeiro que resolvesse mudar de ramo adquiria uma pequena máquina têxtil. O mercado era tão grandioso que em menos de um ano triplicava sua produção, principalmente porque o setor era protegido da invasão dos têxteis indianos, de muito melhor qualidade.
Chutando a própria escada
Depois de consolidado seu poder sobre o mercado global, a Inglaterra passou a defender o livre mercado, a abolição de práticas protecionistas, insurgiu-se contra o tráfico negreiro, não por razões humanitárias - que não cabiam em quem impôs à Índia um imperialismo sangrento -, mas puramente econômicas.
A maneira de chutar a própria escada foi com a cooptação de políticos e intelectuais de outros países. Através de cursos e visitas à Inglaterra voltavam deslumbrados com o avanço do país e passavam a vender a ideia que a modernidade consistia em emular o estilo que a Inglaterra adotara depois de ter se tornado potência.
Mais arguto observador do seu tempo, List teve papel relevante para convencer seus conterrâneos que o processo de desenvolvimento se dava em estágios. Daí, a impossibilidade de países pré-industriais emularem estratégias de países já plenamente industrializados, se desarmando de todos os instrumentos de defesa da produção e do mercado internos antes de atingirem o estágio dos países desenvolvidos.
Em 1792, o então secretário do Tesouro norte-americano, Alexander Hamilton, apresentou o "Report of Manufactures", o primeiro projeto de defesa das manufaturas norte-americanas, em reação ao protecionismo que havia na Europa. As tarifas iniciais foram insuficientes. Mas em 1808, com a guerra explodindo, o comércio com a Europa foi interrompido. Em um ano, o número de indústrias têxteis saltou de 8.000 para 31 mil. Quando o livre comércio foi retomado, veio de novo a crise.
Eram essas evidências que List ia buscar para desenvolver os princípios de sua economia política
List não conhecia o termo "vira lata" para descrever os internacionalistas deslumbrados de seu tempo. Mas descreveu de forma definitiva a maneira como as sub-elites intelectuais alemãs aderiram ao discurso inglês, por modismo, ignorância ou para poder ascender social ou profissionalmente junto aos setores ligados ao exterior. Em suma, o avesso do avesso desse rapaz deslumbrado, o Deltan Dallagnoll.
No entanto, foi através desse deslumbramento de procuradores, procurando emular os yuppies do mercado financeiro, que a geopolítica norte-americana conquistou seu mais notável feito: o da judicialização da política nos países democráticos, promovendo a maior quantidade de desestabilizações políticas da história, sem envolver um míssil sequer nos embates. E o instrumento utilizado foi o instituto da cooperação internacional contra a corrupção.
Afinal, ser contra o combate à corrupção, quem haveria de?
Peça 3 - a cooperação internacional contra a corrupção
Nas últimas décadas, Síria, Egito, Líbia e Iraque se constituíram na aliança mais expressiva contra o eixo Estados Unidos-Israel no Oriente Médio.
Contra a Líbia, se buscou o álibi da derrubada do ditador sanguinário; o mesmo na Síria e no Egito; no Iraque, o combate às armas químicas de alta letalidade, que jamais foram encontradas. Países inteiros foram destruídos e submetidos a sistemas muito mais cruéis.
Paralelamente, contra a Índia, a socialdemocracia portuguesa, espanhola, alemã e francesa, montaram-se campanhas com denúncias a granel, produzidas pela cooperação internacional.
Essa nova forma de atuação geopolítica surge no momento em redesenhava-se a geografia mundial.
Nos anos 80, a estratégia norte-americana de abrir mão de setores industriais permitiu a explosão de novos centros industriais pelo planeta. Criou-se um quadro acomodatício com os EUA criando empregos na China e na Ásia e os chineses financiando o consumo norte-americano.
O sonho acabou em 2008 e, ali, a China já se projetava como potência industrial tornando-se o chão de fábrica do mundo enquanto a Índia se convertia no chão de escritório, com seus serviços de informática. Os BRICS se projetam criando seu próprio banco de desenvolvimento e anunciando o lançamento próximo de sua própria moeda e o Brasil, além de potência agroexportadora, se projeta com suas siderúrgicas e empreiteiras ocupando espaços na América Latina e África.
Por outro lado, desde os anos 80 a liberalização financeira provocara a proliferação de paraísos fiscais, por onde circulavam recursos dos petrodólares, dos magnatas japoneses, dos narcotraficantes colombianos, dos plutocratas russos, dinheiro de corrupção política e pública. A maneira de enfrentar essas práticas foi através da globalização da repressão.
Dos anos 90 para cá foram construídas três grandes convenções internacionais contra a corrupção, que serviram de alavanca principal para o processo global de judicialização da política.
A. Convenção Interamericana contra a Corrupção, concluída em Caracas, Venezuela, em 29 de março de 1996, patrocinada pela Organização dos Estados Americanos (OEA).
B. Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, concluída em Paris, França, em 17 de dezembro de 1997, patrocinada pela OCDE.
C. Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003, assinada pelo Brasil em 9 de dezembro de 2003 e promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006. Também conhecida como UNCAC (United Nations Convention Against Corruption) ou ainda como Convenção de Mérida, cidade do México onde foi assinada.
Essas convenções passam a estimular a cooperação recíproca entre países, por meio de assistência técnica, treinamento, cooperação jurídica internacional, parcerias formais e trocas de informações por vias informais. E passaram a promover o envolvimento da sociedade civil, através das organizações não governamentais (ONGs).
Dois pontos saltaram à vista na consolidação dessas políticas.
1. Os interesses econômicos explícitos, na criação de regras internacionais para impedir que atos de corrupção pudessem atrapalhar a livre competição. A preocupação inicial era com a concorrência desleal no comércio exterior. Tanto que foi a partir de estudos da SEC (a CVM dos EUA) que surge a Convenção sobre Corrupção de Funcionários Públicos em Transações, bancada pela OCDE.
2. O conceito de soberania nacional como principal adversário da cooperação. Inicialmente, devido à dificuldade em extraditar criminosos, por conta de conceitos tortos de soberania.
Peça 4 - a demonização do conceito de Nação
Para a área de direitos humanos, o conceito de Nação sempre foi negativo. Era através dele que se criavam distinções entre cidadãos da terra e imigrantes, que se proibiam fluxos migratórios, que se impedia a extradição de criminosos comuns, de guerra ou aqueles que cometeram crimes contra a humanidade.
Nos anos 70, era comum o Brasil abrigar criminosos estrangeiros, protegidos pela não existência de tratados de extradição. Em 2003, o STF negou a quebra de sigilo bancário no país, dizendo que o pedido atentava contra a ordem pública brasileira. Este ano, mesmo, o Supremo impediu a deportação de um criminoso de guerra argentino.
Com o tempo, passou-se a demonizar o próprio conceito de interesse nacional.
Vários artigos sobre o tema foram publicados no caderno "Temas de Cooperação Internacional" da Unidade de Cooperação Internacional do MPF. Como mencionado em um dos textos: "A cooperação jurídica internacional constrói a ideia de um espaço comum de justiça, com reconhecimento mútuo de jurisdições. Embora não se exija para ela a harmonização de legislações, é evidente que a transformação do mundo em uma aldeia global termina por promover essa ideia, inegavelmente ligada à relativização do dogma da soberania".
Os setores do MPF ligados à cooperação internacional passaram a tratar de forma negativa todo conceito de soberania como se, em todas as circunstâncias, fosse um obstáculo à inevitabilidade da nova ordem global. Como se soberania significasse o atraso e globalização a civilização. E interesse nacional fosse apenas um álibi para atrapalhar o trabalho dos justiceiros globais.
De repente, procuradores caboclos e delegados tupiniquins esquecem as origens, e são alçados à condição de polícias do mundo, ombreando-se com colegas norte-americanos, suíços, ingleses. As novas tropas globais passam a ser enaltecidas em séries de TV e, pouco a pouco, vão criando uma superestrutura acima dos poderes nacionais, dando partida à judicialização da política em nível global.
A criação de uma ideologia internacionalista e antinacional no MPF foi um trabalho bem mais meticuloso, no qual as conferências tiveram papel central.
Peça 5 – os controles legais nacionais
No início da década de 2000, no Brasil, surgiram três órgãos voltados a certos aspectos de contenciosos internacionais: em 2003, o Departamento Internacional (DPI) da Advocacia-Geral da União; em 2004, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça; em 2005 a Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) do Ministério Público Federal. No MPF foram criadas unidades especializadas.
A autoridade central para a cooperação passou a ser o DRCI da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ), do Ministério da Justiça. Apenas abria-se exceção para o acordo do Brasil com Portugal e com o Canadá, casos em que a autoridade central é a Procuradoria Geral da República.
Era através do DRCI que o Ministro da Justiça poderia exercer o controle sobre os pedidos da cooperação. Caberia a ele o suporte e orientação e o ponto de contato entre as autoridades brasileiras e internacionais para inquéritos policiais e processos penais. Permitindo, também, o controle de todas as cooperações pelo Ministro da Justiça.
No governo Dilma Rousseff, o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo abriu mão completamente desse trabalho, por inércia acabou entregando o controle total da cooperação à Procuradoria Geral da República.
Para se preparar para a cooperação, o MPF havia criado o Centro de Cooperação Jurídica Internacional (CCJI), ainda na gestão de Cláudio Lemos Fonteles. Em dezembro de 2010, na gestão de Roberto Gurgel, foi substituído pela Assessoria de Cooperação Jurídica Internacional (ASCJI).
Em setembro de 2013, em um dos primeiros atos do novo PGR Rodrigo Janot, foi criada a Secretaria de Cooperação Jurídica Internacional (SCI), pela primeira vez sob o comando de um procurador em regime de dedicação plena, contando com grupos de apoio para cada área de atuação.
Havia uma razão de ordem prática e outra de ordem política para a criação desses grupos especializados.
Peça 6 – a criação da comunidade das polícias do mundo
As Conferências constatavam que a posição dos países poderia variar, de acordo com o presidente ou parlamentares eleitos, atrapalhando a continuidade dos trabalhos.
Juntavam procuradores, delegados, fiscais de todas as partes do mundo, tendo em comum a ameaça da subordinação ao poder do Executivo, a quem caberia sempre a última palavra sobre a cooperação. Bastaria entrar um presidente avesso à cooperação internacional, para a estrutura interna desmoronar.
Para se impor sobre a vontade do Executivo, decidiu-se recomendar a cada país a criação de estruturas permanentes, comunicando-se entre si e articulando os trabalhos de juízes, procuradores, fiscais e delegados de polícia, de maneira a dar um by pass nas limitações jurídicas e políticas convencionais, com suas estruturas burocráticas, processos lentos de decisão e interesses particulares ou nacionais.
A troca direta de informações deveria ser pontual. No Brasil, tornou-se uma constante, principalmente devido à anomia do Ministério da Justiça.
A cooperação passou a estimular cada vez mais as comunicações diretas entre seus membros. Cada vez mais foram assinados tratados (ou iniciativas baseadas na reciprocidade) prevendo a comunicação direta entre órgãos do Judiciário, com eliminação das autoridades diplomáticas.
O objetivo principal foi colocar os inquéritos fora do alcance das autoridades do Executivo. Como diz um dos artigos: "Com as comunicações diretas, evita-se ainda o inconveniente de fazer com que autoridades do Executivo assumam atividades sem conexão com suas tarefas principais, participando dos atos de cooperação de forma demasiadamente desinteressada, formal ou burocrática. "
Surge, então, uma organização supranacional, que gradativamente tenta-se colocar acima dos governos nacionais. Os encontros anuais, as redes de relacionamentos, os sistemas de premiação oficiais ou de blogs internacionais especializados, tornam-se a bússola desse novo poder. A Convenção de Palermo induz à formação de equipes conjuntas de cooperação, ampliam-se as formas de contato direta, através de videoconferências e da criação de redes, como a Rede Judicial Europeia e a Rede Ibero-americana de Cooperação Jurídica Internacional.
A accountability (prestação de contas) desses poderes envolvidos na luta contra a corrupção, passa a ser para os acordos de cooperação, não para os governos nacionais. Os vira-latas passam a disputar as premiações internacionais. E o tamanho do prêmio dependia dos recordes obtidos de prisões e de desmonte da economia dos seus países.
Em um quadro de ampla dissipação moral na política, bastava apenas apontar os adversários da globalização que o MPF se encarregava de decapitar, poupando e aliando-se aos aliados dos interesses centrais. É o que explica a ampla blindagem do PSDB.
Peça 7 – o conceito de Nação
Um presidencialismo de coalizão que se enlameou com a corrupção, um Legislativo totalmente comprometido, um Supremo medroso, uma imprensa venal, Forças Armadas burocratizadas, tudo isso convergiu para abrir um espaço sem precedentes para o desmonte do país.
É em cima desse vácuo que cresceu a Operação Lava Jato. Em vez de instrumento para o saneamento amplo da política brasileira, tornou-se a responsável pelo maior trabalho de destruição da história da economia brasileira.
Nunca o sentimento de lesa pátria foi tão explícito em um dos poderes da República, provavelmente nem no Banco Central, quando promoveu o maior crescimento da dívida pública da história.
Jovens procuradores deslumbrados, com complexo explícito de vira-lata, juízes provincianos, uma corporação cega, sem um pingo de inteligência corporativa, chefiada por um Procurador Geral medíocre, sem visão de país e dos jogos globais do poder, comandaram o primeiro tempo do jogo: o da destruição.
Haverá novos tempos. O poder político se reconstituirá, com partidos de extração política diversas.
Com um Congresso revigorado, ou um Executivo forte, haverá a prestação de contas. Não escaparão de uma CPI para analisar sua conduta antinacional. E essa conduta não está nos corruptos e corruptores que foram presos, nem mesmo nos abusos cometidos, na parcialidade flagrante das investigações. Mas em uma ação deliberadamente antinacional.
A CPI terá condições de analisar todos os acordos de cooperação, abrir as gavetas indevassáveis do Procurador Geral, levantar o que estava por trás dessa fúria antinacional, conferir o que ele foi fazer no Departamento de Justiça e em outros órgãos do governo dos EUA, levando informações contra a Petrobras e trazendo contra a Eletronuclear.
Mesmo antes disso, a imprudência com que o PGR atuou nesse período já está promovendo a volta do cipó de Aroeira: basta conferir a quantidade cada vez maior de reportagens tratando procuradores e juízes como marajás.
Antes da luta aberta, haverá o sufoco financeiro do MPF, prejudicando enormemente o trabalho sério e patriótico dos procuradores que continuaram acreditando no MPF como fator de defesa dos direitos dos vulneráveis e da modernização do Brasil.
Xadrez de como o MPF tornou-se uma força antinacional
O Xadrez do Golpe
Luis Nassif
Peça 1 - o cenário pré-Lava Jato
A Lava Jato vai revelando dois aspectos do estágio de desenvolvimento brasileiro.
O primeiro, a corrupção endêmica e generalizada que foi apodrecendo o sistema político sem ser enfrentada por nenhum partido. Era o tema à vista de todos e há décadas percebido pela opinião pública, o único tema capaz de provocar a comoção geral.
O segundo, as indicações de que o país estava a caminho de se transformar em uma potência média, repetindo a trajetória de outras potências, inclusive no atropelo das boas normas.
Como potência média, ainda não havia desenvolvido internamente legislações e regulamentos que disciplinassem o financiamento político, que blindassem as empresas que representassem o interesse nacional, os procedimentos que impedissem que o combate à corrupção comprometesse setores da economia. Enfim, todo esse aparato jurídico-político com que as nações desenvolvidas desenvolvem e blindam suas empresas e até tratam com tolerância, criando uma zona de conforto para que possam pular os limites, nos casos de ampliação do chamado poder nacional.
O Brasil trilhava o caminho de potência média, mas sem essas salvaguardas e sem os cuidados necessários.
Os arquivos da Odebrecht revelam influência no México, Peru, Equador, Argentina, Colômbia, Guatemala, República Dominicana e Panamá, nas eleições de vários países da região, na esteira da ampliação da influência diplomática brasileira, além da notável expansão das empreiteiras na África e América Latina (https://goo.gl/oyxNpa).
Por outro lado, desenvolvia-se uma indústria de defesa autônoma, com absorção de tecnologias avançadas e inúmeras possibilidades abertas com a quase consolidação dos BRICS e das parcerias com a China e seus bancos de desenvolvimento. Avançava-se nos submarinos, nos satélites e na informática.
Com a descoberta do pré-sal, o país se projetava como um dos futuros grandes produtores de energia, desenvolvendo paralelamente uma indústria naval potente e uma grande cadeia de fornecedores para as mais diversas necessidades, de máquinas, equipamentos, caldeiraria a sistemas informatizados de ponta.
Nascia uma nova potência.
Mas havia uma pedra no meio do caminho: a falta de foco interno sobre o chamado interesse nacional e uma corrupção generalizada na política. Em cima dessa vulnerabilidade, desse calcanhar de Aquiles, o Reino foi buscar seus campeões, os candidatos a Paris, os jovens mancebos do Ministério Público Federal capazes de, a pretexto do combate à corrupção, liquidar com as pretensões nacionais.
É assim que se inicia nossa história. Antes de prosseguirmos, um pouco das disputas históricas entre potências estabelecidas e candidatas a potência.
Peça 2 – o complexo de vira-lata
Qualquer obra de história da economia identificará o desenvolvimento como um processo gradativo. A estratégia de cada país deve se dar de acordo com suas circunstâncias, com seu grau de desenvolvimento, com o nível de competitividade da sua economia.
Desde a primeira metade do século 19 consagrou-se o conceito do "chutando a própria escada" na economia política.
Coube ao economista alemão Friedrich List (1789-1846) decifrar o jogo das potências. Com um diagnóstico correto dos fatores de desenvolvimento, List ajudou a Alemanha a desenvolver o Sistema Nacional de Inovação e a consagrar o conceito da união nacional como fator essencial de consolidação econômica e política.
A nova ciência preconizava que da ambição de cada indivíduo se faria o progresso. List rebatia que nem toda iniciativa era virtuosa e caberia ao Estado definir um projeto de país no qual pudessem ser canalizadas as iniciativas de seus cidadãos.
Para se tornar a primeira superpotência da era industrial, a Inglaterra se valeu de todos os recursos que tinha à mão. Praticou pirataria, impôs acordos comerciais lesivos aos parceiros, protegeu seu mercado da invasão dos produtos têxteis indianos, criou reservas de mercado para sua armada, e demanda para seus estaleiros.
Montou um mercado global para seus produtos. Consolidado o mercado,cada fazendeiro que resolvesse mudar de ramo adquiria uma pequena máquina têxtil. O mercado era tão grandioso que em menos de um ano triplicava sua produção, principalmente porque o setor era protegido da invasão dos têxteis indianos, de muito melhor qualidade.
Chutando a própria escada
Depois de consolidado seu poder sobre o mercado global, a Inglaterra passou a defender o livre mercado, a abolição de práticas protecionistas, insurgiu-se contra o tráfico negreiro, não por razões humanitárias - que não cabiam em quem impôs à Índia um imperialismo sangrento -, mas puramente econômicas.
A maneira de chutar a própria escada foi com a cooptação de políticos e intelectuais de outros países. Através de cursos e visitas à Inglaterra voltavam deslumbrados com o avanço do país e passavam a vender a ideia que a modernidade consistia em emular o estilo que a Inglaterra adotara depois de ter se tornado potência.
Mais arguto observador do seu tempo, List teve papel relevante para convencer seus conterrâneos que o processo de desenvolvimento se dava em estágios. Daí, a impossibilidade de países pré-industriais emularem estratégias de países já plenamente industrializados, se desarmando de todos os instrumentos de defesa da produção e do mercado internos antes de atingirem o estágio dos países desenvolvidos.
Em 1792, o então secretário do Tesouro norte-americano, Alexander Hamilton, apresentou o "Report of Manufactures", o primeiro projeto de defesa das manufaturas norte-americanas, em reação ao protecionismo que havia na Europa. As tarifas iniciais foram insuficientes. Mas em 1808, com a guerra explodindo, o comércio com a Europa foi interrompido. Em um ano, o número de indústrias têxteis saltou de 8.000 para 31 mil. Quando o livre comércio foi retomado, veio de novo a crise.
Eram essas evidências que List ia buscar para desenvolver os princípios de sua economia política
List não conhecia o termo "vira lata" para descrever os internacionalistas deslumbrados de seu tempo. Mas descreveu de forma definitiva a maneira como as sub-elites intelectuais alemãs aderiram ao discurso inglês, por modismo, ignorância ou para poder ascender social ou profissionalmente junto aos setores ligados ao exterior. Em suma, o avesso do avesso desse rapaz deslumbrado, o Deltan Dallagnoll.
No entanto, foi através desse deslumbramento de procuradores, procurando emular os yuppies do mercado financeiro, que a geopolítica norte-americana conquistou seu mais notável feito: o da judicialização da política nos países democráticos, promovendo a maior quantidade de desestabilizações políticas da história, sem envolver um míssil sequer nos embates. E o instrumento utilizado foi o instituto da cooperação internacional contra a corrupção.
Afinal, ser contra o combate à corrupção, quem haveria de?
Peça 3 - a cooperação internacional contra a corrupção
Nas últimas décadas, Síria, Egito, Líbia e Iraque se constituíram na aliança mais expressiva contra o eixo Estados Unidos-Israel no Oriente Médio.
Contra a Líbia, se buscou o álibi da derrubada do ditador sanguinário; o mesmo na Síria e no Egito; no Iraque, o combate às armas químicas de alta letalidade, que jamais foram encontradas. Países inteiros foram destruídos e submetidos a sistemas muito mais cruéis.
Paralelamente, contra a Índia, a socialdemocracia portuguesa, espanhola, alemã e francesa, montaram-se campanhas com denúncias a granel, produzidas pela cooperação internacional.
Essa nova forma de atuação geopolítica surge no momento em redesenhava-se a geografia mundial.
Nos anos 80, a estratégia norte-americana de abrir mão de setores industriais permitiu a explosão de novos centros industriais pelo planeta. Criou-se um quadro acomodatício com os EUA criando empregos na China e na Ásia e os chineses financiando o consumo norte-americano.
O sonho acabou em 2008 e, ali, a China já se projetava como potência industrial tornando-se o chão de fábrica do mundo enquanto a Índia se convertia no chão de escritório, com seus serviços de informática. Os BRICS se projetam criando seu próprio banco de desenvolvimento e anunciando o lançamento próximo de sua própria moeda e o Brasil, além de potência agroexportadora, se projeta com suas siderúrgicas e empreiteiras ocupando espaços na América Latina e África.
Por outro lado, desde os anos 80 a liberalização financeira provocara a proliferação de paraísos fiscais, por onde circulavam recursos dos petrodólares, dos magnatas japoneses, dos narcotraficantes colombianos, dos plutocratas russos, dinheiro de corrupção política e pública. A maneira de enfrentar essas práticas foi através da globalização da repressão.
Dos anos 90 para cá foram construídas três grandes convenções internacionais contra a corrupção, que serviram de alavanca principal para o processo global de judicialização da política.
A. Convenção Interamericana contra a Corrupção, concluída em Caracas, Venezuela, em 29 de março de 1996, patrocinada pela Organização dos Estados Americanos (OEA).
B. Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, concluída em Paris, França, em 17 de dezembro de 1997, patrocinada pela OCDE.
C. Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003, assinada pelo Brasil em 9 de dezembro de 2003 e promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006. Também conhecida como UNCAC (United Nations Convention Against Corruption) ou ainda como Convenção de Mérida, cidade do México onde foi assinada.
Essas convenções passam a estimular a cooperação recíproca entre países, por meio de assistência técnica, treinamento, cooperação jurídica internacional, parcerias formais e trocas de informações por vias informais. E passaram a promover o envolvimento da sociedade civil, através das organizações não governamentais (ONGs).
Dois pontos saltaram à vista na consolidação dessas políticas.
1. Os interesses econômicos explícitos, na criação de regras internacionais para impedir que atos de corrupção pudessem atrapalhar a livre competição. A preocupação inicial era com a concorrência desleal no comércio exterior. Tanto que foi a partir de estudos da SEC (a CVM dos EUA) que surge a Convenção sobre Corrupção de Funcionários Públicos em Transações, bancada pela OCDE.
2. O conceito de soberania nacional como principal adversário da cooperação. Inicialmente, devido à dificuldade em extraditar criminosos, por conta de conceitos tortos de soberania.
Peça 4 - a demonização do conceito de Nação
Para a área de direitos humanos, o conceito de Nação sempre foi negativo. Era através dele que se criavam distinções entre cidadãos da terra e imigrantes, que se proibiam fluxos migratórios, que se impedia a extradição de criminosos comuns, de guerra ou aqueles que cometeram crimes contra a humanidade.
Nos anos 70, era comum o Brasil abrigar criminosos estrangeiros, protegidos pela não existência de tratados de extradição. Em 2003, o STF negou a quebra de sigilo bancário no país, dizendo que o pedido atentava contra a ordem pública brasileira. Este ano, mesmo, o Supremo impediu a deportação de um criminoso de guerra argentino.
Com o tempo, passou-se a demonizar o próprio conceito de interesse nacional.
Vários artigos sobre o tema foram publicados no caderno "Temas de Cooperação Internacional" da Unidade de Cooperação Internacional do MPF. Como mencionado em um dos textos: "A cooperação jurídica internacional constrói a ideia de um espaço comum de justiça, com reconhecimento mútuo de jurisdições. Embora não se exija para ela a harmonização de legislações, é evidente que a transformação do mundo em uma aldeia global termina por promover essa ideia, inegavelmente ligada à relativização do dogma da soberania".
Os setores do MPF ligados à cooperação internacional passaram a tratar de forma negativa todo conceito de soberania como se, em todas as circunstâncias, fosse um obstáculo à inevitabilidade da nova ordem global. Como se soberania significasse o atraso e globalização a civilização. E interesse nacional fosse apenas um álibi para atrapalhar o trabalho dos justiceiros globais.
De repente, procuradores caboclos e delegados tupiniquins esquecem as origens, e são alçados à condição de polícias do mundo, ombreando-se com colegas norte-americanos, suíços, ingleses. As novas tropas globais passam a ser enaltecidas em séries de TV e, pouco a pouco, vão criando uma superestrutura acima dos poderes nacionais, dando partida à judicialização da política em nível global.
A criação de uma ideologia internacionalista e antinacional no MPF foi um trabalho bem mais meticuloso, no qual as conferências tiveram papel central.
Peça 5 – os controles legais nacionais
No início da década de 2000, no Brasil, surgiram três órgãos voltados a certos aspectos de contenciosos internacionais: em 2003, o Departamento Internacional (DPI) da Advocacia-Geral da União; em 2004, o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça; em 2005 a Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) do Ministério Público Federal. No MPF foram criadas unidades especializadas.
A autoridade central para a cooperação passou a ser o DRCI da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ), do Ministério da Justiça. Apenas abria-se exceção para o acordo do Brasil com Portugal e com o Canadá, casos em que a autoridade central é a Procuradoria Geral da República.
Era através do DRCI que o Ministro da Justiça poderia exercer o controle sobre os pedidos da cooperação. Caberia a ele o suporte e orientação e o ponto de contato entre as autoridades brasileiras e internacionais para inquéritos policiais e processos penais. Permitindo, também, o controle de todas as cooperações pelo Ministro da Justiça.
No governo Dilma Rousseff, o Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo abriu mão completamente desse trabalho, por inércia acabou entregando o controle total da cooperação à Procuradoria Geral da República.
Para se preparar para a cooperação, o MPF havia criado o Centro de Cooperação Jurídica Internacional (CCJI), ainda na gestão de Cláudio Lemos Fonteles. Em dezembro de 2010, na gestão de Roberto Gurgel, foi substituído pela Assessoria de Cooperação Jurídica Internacional (ASCJI).
Em setembro de 2013, em um dos primeiros atos do novo PGR Rodrigo Janot, foi criada a Secretaria de Cooperação Jurídica Internacional (SCI), pela primeira vez sob o comando de um procurador em regime de dedicação plena, contando com grupos de apoio para cada área de atuação.
Havia uma razão de ordem prática e outra de ordem política para a criação desses grupos especializados.
Peça 6 – a criação da comunidade das polícias do mundo
As Conferências constatavam que a posição dos países poderia variar, de acordo com o presidente ou parlamentares eleitos, atrapalhando a continuidade dos trabalhos.
Juntavam procuradores, delegados, fiscais de todas as partes do mundo, tendo em comum a ameaça da subordinação ao poder do Executivo, a quem caberia sempre a última palavra sobre a cooperação. Bastaria entrar um presidente avesso à cooperação internacional, para a estrutura interna desmoronar.
Para se impor sobre a vontade do Executivo, decidiu-se recomendar a cada país a criação de estruturas permanentes, comunicando-se entre si e articulando os trabalhos de juízes, procuradores, fiscais e delegados de polícia, de maneira a dar um by pass nas limitações jurídicas e políticas convencionais, com suas estruturas burocráticas, processos lentos de decisão e interesses particulares ou nacionais.
A troca direta de informações deveria ser pontual. No Brasil, tornou-se uma constante, principalmente devido à anomia do Ministério da Justiça.
A cooperação passou a estimular cada vez mais as comunicações diretas entre seus membros. Cada vez mais foram assinados tratados (ou iniciativas baseadas na reciprocidade) prevendo a comunicação direta entre órgãos do Judiciário, com eliminação das autoridades diplomáticas.
O objetivo principal foi colocar os inquéritos fora do alcance das autoridades do Executivo. Como diz um dos artigos: "Com as comunicações diretas, evita-se ainda o inconveniente de fazer com que autoridades do Executivo assumam atividades sem conexão com suas tarefas principais, participando dos atos de cooperação de forma demasiadamente desinteressada, formal ou burocrática. "
Surge, então, uma organização supranacional, que gradativamente tenta-se colocar acima dos governos nacionais. Os encontros anuais, as redes de relacionamentos, os sistemas de premiação oficiais ou de blogs internacionais especializados, tornam-se a bússola desse novo poder. A Convenção de Palermo induz à formação de equipes conjuntas de cooperação, ampliam-se as formas de contato direta, através de videoconferências e da criação de redes, como a Rede Judicial Europeia e a Rede Ibero-americana de Cooperação Jurídica Internacional.
A accountability (prestação de contas) desses poderes envolvidos na luta contra a corrupção, passa a ser para os acordos de cooperação, não para os governos nacionais. Os vira-latas passam a disputar as premiações internacionais. E o tamanho do prêmio dependia dos recordes obtidos de prisões e de desmonte da economia dos seus países.
Em um quadro de ampla dissipação moral na política, bastava apenas apontar os adversários da globalização que o MPF se encarregava de decapitar, poupando e aliando-se aos aliados dos interesses centrais. É o que explica a ampla blindagem do PSDB.
Peça 7 – o conceito de Nação
Um presidencialismo de coalizão que se enlameou com a corrupção, um Legislativo totalmente comprometido, um Supremo medroso, uma imprensa venal, Forças Armadas burocratizadas, tudo isso convergiu para abrir um espaço sem precedentes para o desmonte do país.
É em cima desse vácuo que cresceu a Operação Lava Jato. Em vez de instrumento para o saneamento amplo da política brasileira, tornou-se a responsável pelo maior trabalho de destruição da história da economia brasileira.
Nunca o sentimento de lesa pátria foi tão explícito em um dos poderes da República, provavelmente nem no Banco Central, quando promoveu o maior crescimento da dívida pública da história.
Jovens procuradores deslumbrados, com complexo explícito de vira-lata, juízes provincianos, uma corporação cega, sem um pingo de inteligência corporativa, chefiada por um Procurador Geral medíocre, sem visão de país e dos jogos globais do poder, comandaram o primeiro tempo do jogo: o da destruição.
Haverá novos tempos. O poder político se reconstituirá, com partidos de extração política diversas.
Com um Congresso revigorado, ou um Executivo forte, haverá a prestação de contas. Não escaparão de uma CPI para analisar sua conduta antinacional. E essa conduta não está nos corruptos e corruptores que foram presos, nem mesmo nos abusos cometidos, na parcialidade flagrante das investigações. Mas em uma ação deliberadamente antinacional.
A CPI terá condições de analisar todos os acordos de cooperação, abrir as gavetas indevassáveis do Procurador Geral, levantar o que estava por trás dessa fúria antinacional, conferir o que ele foi fazer no Departamento de Justiça e em outros órgãos do governo dos EUA, levando informações contra a Petrobras e trazendo contra a Eletronuclear.
Mesmo antes disso, a imprudência com que o PGR atuou nesse período já está promovendo a volta do cipó de Aroeira: basta conferir a quantidade cada vez maior de reportagens tratando procuradores e juízes como marajás.
Antes da luta aberta, haverá o sufoco financeiro do MPF, prejudicando enormemente o trabalho sério e patriótico dos procuradores que continuaram acreditando no MPF como fator de defesa dos direitos dos vulneráveis e da modernização do Brasil.
O assassinato do ambulante Luiz no metrô: Um conto de Natal brasileiro -
O assassinato do ambulante Luiz no metrô: Um conto de Natal brasileiro - Cotidiano - Cotidiano
Leonardo Sakamoto
O vendedor ambulante Luiz Carlos Ruas foi espancado até a morte por dois homens após, segundo a polícia, tentar defender duas travestis em situação de rua que estavam apanhando deles no centro de São Paulo. Chegou a correr para a dentro da estação de metrô Pedro II, mas foi perseguido, derrubado e levou socos e pontapés por um minuto e meio.
Tudo nessa história converge para chocar: o espancamento de um homem de 54 anos por dois jovens de 26 e 21; a morte ter ocorrido dentro de uma estação de metrô; a falta de preocupação dos rapazes de fazerem isso em um local em que certamente seriam identificados; não ter aparecido nenhum segurança para impedir; câmeras terem gravado as imagens que, mostradas pela imprensa, viralizaram pela rede; uma pessoa já discriminada socialmente (um vendedor ambulante) ter morrido porque tentou defender outras pessoas que também são (travestis); ser noite de 25 de dezembro, Natal.
É a mistura da banalização da violência, da sensação de onipotência e de invencibilidade, do ódio profundo a algo.
A banalização da violência causada por uma sociedade que transforma a violência em produto e a vende diariamente, na forma de programas sensacionalistas na TV, de jogos para computador ou videogame. Uma sociedade incapaz de refletir sobre a importância do diálogo e não da força na resolução de conflitos.
Há quem se sinta onipotente por fazer parte de um grupo tido como hegemônico (homens, héteros…) Pensa que, com isso, os outros lhes devem algum tributo. O sentimento sempre esteve presente em nossa história e a violência e as mortes impunes decorrentes dele também. Mas acredito que essa sensação foi potencializada após certas visões ultraconservadoras terem saído do armário diante do contexto favorável nos últimos anos. Perdeu-se o pudor de não ter pudor.
Isso sem contar o ódio profundo. Prega-se em púlpitos, em plenários, na TV, em reuniões com amigos, que o mal precisa ser extirpado. Que há pessoas ou grupos que representam o mal e precisam ser eliminados. Quantas vezes não lemos nas redes sociais comentários como ''ele é um câncer que precisa ser extirpado'' ou ''tal pessoa merece a morte''? Na superfície dessa afirmação, há ódio. Mas se escavarmos um pouco, chegaremos ao medo do desconhecido e do diferente e, portanto, à ignorância sobre o outro.
Nesse ponto, vale ir mais a fundo.
Ao assistir às imagens chocantes do assassinato de Luiz, lembrei-me de um depoimento que me foi dado por Maria Aparecida Costa, que militou contra a última ditadura civil militar. Ela ficou presa por três anos e meio, dos quais dois meses sendo torturada no DOI-Codi, na rua Tutóia, em São Paulo, local onde hoje fica o 36o Distrito Policial. Paus-de-arara, eletrochoques, ''cadeiras do dragão'' e tantos outros métodos criativos aplicados na resistência por militares e policiais tinham lugar por lá.
''O ódio. Eu não consigo, até agora, entender de onde vinha tanto, tanto ódio.''
A dúvida de Maria Aparecida tem mais de 40 anos, mas bem caberia na polarização tacanha de hoje, em que muitos não reconhecem os outros como seus semelhantes simplesmente porque esses pensam diferentes ou são fisicamente diferentes. Enxergamos inimigos em cada esquina.
A tortura, naquela época, firmava-se como arma de uma disputa. Era necessário ''quebrar'' a pessoa, mentalmente e fisicamente, pelo que ela era, pelo que representava e pelo que defendia. Não era apenas um ser humano que morria a cada pancada. Era também uma visão de mundo, uma ideia.
Há um incômodo paralelo entre as mortes ocorridas no DOI-Codi e a morte de Luiz Carlos. O que Luiz sofreu antes de morrer foi uma sessão de tortura pelo que ele era, pelo que representava e pelo que defendeu.
É inominável a sensação de que isso não acontece apenas nos porões, nos becos, no escuro, mas na frente de câmeras de segurança e de centenas de pessoas. Esqueça a questão ética, que nem está presente. A morte foi praticamente uma encenação da estética da violência reprimida e que, agora no Brasil do caos, ganha a liberdade. E, portanto, uma declaração pública, inconsciente ou não.
Ainda hoje, Cida tenta entender o que ocorreu. ''Tinha mais alguma coisa. Claro que a justificativa era ideológica. Mas tinha mais alguma coisa. Porque eles sentiam prazer de verdade no que faziam. Prazer de verdade em torturar.'' Talvez o ódio surgia, como ela lembra, da sensação de poder. De fazer porque se pode fazer enquanto o outro nada pode.
Luiz não deveria ter dito ''Não faz isso com o rapaz'', quando eles agrediam uma das travestis. Mas agiu com justiça e disse e, ousando sair de sua invisibilidade e pagando um preço caro por isso.
Dizem que carrascos não podem pensar muito no que fazem sob o risco de enlouquecerem. Mas também dizem que os melhores carrascos são os psicopatas que gostam do que fazem. E se dedicam com afinco a descobrir novas formas de garantir o sofrimento humano.
A certeza do ''tudo pode'' provoca vítimas nas periferias das grandes cidades, entre a população LGBT ou em situação de rua, entre os jovens negros e pobres, grupos cuja vida, para nós, vale muito pouco. Eles sempre sofreram e morreram, mas sem que as imagens corressem pela internet.
O problema é que ódio não surge de geração espontânea. É cultivado.
Como já escrevi aqui, pastores e padres de certas igrejas inflamam seus fieis contra aquilo que consideram um desrespeito às leis de seu deus. Quando um grupo espanca um gay ou uma travesti, esses pastores e padres dizem que não têm nada a ver com isso.
Figuras públicas da TV inflamam a população contra a degradação da civilização e das famílias de bem. Quando um grupo resolve amarrar alguém em um poste e linchar até a morte, essas figuras públicas dizem que não têm nada a ver com isso.
Certas famílias inflamam seus filhos contra o público LGBT, contra jovens negros e pobres da periferia e contra pessoas em situação de rua, dizendo que são uma ameaça à vida nas grandes cidades e não valem nada. Quando um grupo resolve despejar preconceito ou dar pauladas e por fogo nessas pessoas, as famílias dizem que não têm nada a ver com isso.
Políticos, de governo e oposição, inflamam seus eleitores, desumanizando o adversário e transformando o jogo democrático em uma luta do bem contra o mal. Quando um grupo passa a agredir fisicamente o outro, os políticos dizem que não têm nada a ver com isso.
Hordas de guerrilheiros digitais sob perfis falsos inflamam seus leitores, repassando conteúdo violento e falso. Quando um grupo passa a assediar, de forma injusta, pessoas ou instituições com base nesse conteúdo, há quem diga que as pessoas por trás desses perfis e páginas nas redes sociais não têm nada a ver com isso.
Talvez, no fundo, todos estejam certos.
Culpado mesmo era o Luiz.
Leonardo Sakamoto
O vendedor ambulante Luiz Carlos Ruas foi espancado até a morte por dois homens após, segundo a polícia, tentar defender duas travestis em situação de rua que estavam apanhando deles no centro de São Paulo. Chegou a correr para a dentro da estação de metrô Pedro II, mas foi perseguido, derrubado e levou socos e pontapés por um minuto e meio.
Tudo nessa história converge para chocar: o espancamento de um homem de 54 anos por dois jovens de 26 e 21; a morte ter ocorrido dentro de uma estação de metrô; a falta de preocupação dos rapazes de fazerem isso em um local em que certamente seriam identificados; não ter aparecido nenhum segurança para impedir; câmeras terem gravado as imagens que, mostradas pela imprensa, viralizaram pela rede; uma pessoa já discriminada socialmente (um vendedor ambulante) ter morrido porque tentou defender outras pessoas que também são (travestis); ser noite de 25 de dezembro, Natal.
É a mistura da banalização da violência, da sensação de onipotência e de invencibilidade, do ódio profundo a algo.
A banalização da violência causada por uma sociedade que transforma a violência em produto e a vende diariamente, na forma de programas sensacionalistas na TV, de jogos para computador ou videogame. Uma sociedade incapaz de refletir sobre a importância do diálogo e não da força na resolução de conflitos.
Há quem se sinta onipotente por fazer parte de um grupo tido como hegemônico (homens, héteros…) Pensa que, com isso, os outros lhes devem algum tributo. O sentimento sempre esteve presente em nossa história e a violência e as mortes impunes decorrentes dele também. Mas acredito que essa sensação foi potencializada após certas visões ultraconservadoras terem saído do armário diante do contexto favorável nos últimos anos. Perdeu-se o pudor de não ter pudor.
Isso sem contar o ódio profundo. Prega-se em púlpitos, em plenários, na TV, em reuniões com amigos, que o mal precisa ser extirpado. Que há pessoas ou grupos que representam o mal e precisam ser eliminados. Quantas vezes não lemos nas redes sociais comentários como ''ele é um câncer que precisa ser extirpado'' ou ''tal pessoa merece a morte''? Na superfície dessa afirmação, há ódio. Mas se escavarmos um pouco, chegaremos ao medo do desconhecido e do diferente e, portanto, à ignorância sobre o outro.
Nesse ponto, vale ir mais a fundo.
Ao assistir às imagens chocantes do assassinato de Luiz, lembrei-me de um depoimento que me foi dado por Maria Aparecida Costa, que militou contra a última ditadura civil militar. Ela ficou presa por três anos e meio, dos quais dois meses sendo torturada no DOI-Codi, na rua Tutóia, em São Paulo, local onde hoje fica o 36o Distrito Policial. Paus-de-arara, eletrochoques, ''cadeiras do dragão'' e tantos outros métodos criativos aplicados na resistência por militares e policiais tinham lugar por lá.
''O ódio. Eu não consigo, até agora, entender de onde vinha tanto, tanto ódio.''
A dúvida de Maria Aparecida tem mais de 40 anos, mas bem caberia na polarização tacanha de hoje, em que muitos não reconhecem os outros como seus semelhantes simplesmente porque esses pensam diferentes ou são fisicamente diferentes. Enxergamos inimigos em cada esquina.
A tortura, naquela época, firmava-se como arma de uma disputa. Era necessário ''quebrar'' a pessoa, mentalmente e fisicamente, pelo que ela era, pelo que representava e pelo que defendia. Não era apenas um ser humano que morria a cada pancada. Era também uma visão de mundo, uma ideia.
Há um incômodo paralelo entre as mortes ocorridas no DOI-Codi e a morte de Luiz Carlos. O que Luiz sofreu antes de morrer foi uma sessão de tortura pelo que ele era, pelo que representava e pelo que defendeu.
É inominável a sensação de que isso não acontece apenas nos porões, nos becos, no escuro, mas na frente de câmeras de segurança e de centenas de pessoas. Esqueça a questão ética, que nem está presente. A morte foi praticamente uma encenação da estética da violência reprimida e que, agora no Brasil do caos, ganha a liberdade. E, portanto, uma declaração pública, inconsciente ou não.
Ainda hoje, Cida tenta entender o que ocorreu. ''Tinha mais alguma coisa. Claro que a justificativa era ideológica. Mas tinha mais alguma coisa. Porque eles sentiam prazer de verdade no que faziam. Prazer de verdade em torturar.'' Talvez o ódio surgia, como ela lembra, da sensação de poder. De fazer porque se pode fazer enquanto o outro nada pode.
Luiz não deveria ter dito ''Não faz isso com o rapaz'', quando eles agrediam uma das travestis. Mas agiu com justiça e disse e, ousando sair de sua invisibilidade e pagando um preço caro por isso.
Dizem que carrascos não podem pensar muito no que fazem sob o risco de enlouquecerem. Mas também dizem que os melhores carrascos são os psicopatas que gostam do que fazem. E se dedicam com afinco a descobrir novas formas de garantir o sofrimento humano.
A certeza do ''tudo pode'' provoca vítimas nas periferias das grandes cidades, entre a população LGBT ou em situação de rua, entre os jovens negros e pobres, grupos cuja vida, para nós, vale muito pouco. Eles sempre sofreram e morreram, mas sem que as imagens corressem pela internet.
O problema é que ódio não surge de geração espontânea. É cultivado.
Como já escrevi aqui, pastores e padres de certas igrejas inflamam seus fieis contra aquilo que consideram um desrespeito às leis de seu deus. Quando um grupo espanca um gay ou uma travesti, esses pastores e padres dizem que não têm nada a ver com isso.
Figuras públicas da TV inflamam a população contra a degradação da civilização e das famílias de bem. Quando um grupo resolve amarrar alguém em um poste e linchar até a morte, essas figuras públicas dizem que não têm nada a ver com isso.
Certas famílias inflamam seus filhos contra o público LGBT, contra jovens negros e pobres da periferia e contra pessoas em situação de rua, dizendo que são uma ameaça à vida nas grandes cidades e não valem nada. Quando um grupo resolve despejar preconceito ou dar pauladas e por fogo nessas pessoas, as famílias dizem que não têm nada a ver com isso.
Políticos, de governo e oposição, inflamam seus eleitores, desumanizando o adversário e transformando o jogo democrático em uma luta do bem contra o mal. Quando um grupo passa a agredir fisicamente o outro, os políticos dizem que não têm nada a ver com isso.
Hordas de guerrilheiros digitais sob perfis falsos inflamam seus leitores, repassando conteúdo violento e falso. Quando um grupo passa a assediar, de forma injusta, pessoas ou instituições com base nesse conteúdo, há quem diga que as pessoas por trás desses perfis e páginas nas redes sociais não têm nada a ver com isso.
Talvez, no fundo, todos estejam certos.
Culpado mesmo era o Luiz.
Assinar:
Postagens (Atom)