Sinal dos tempos: quase 1/5 dos seguidores de Sergio Moro no Twitter seriam robôs
Em uma semana em que a mídia dá mostras da vitalidade do jornalismo de dados e revela a queda dos homicídios dolosos, o crescimento das mortes decorrentes de intervenção policial, bem como a tragédia do nosso sistema prisional, o Brasil ficou, mais uma vez, tomado pela cortina de fumaça ideológica que o Governo de Jair Bolsonaro insiste em propagar.
São tantas as frentes de batalha que são abertas todas as semanas que os temas fundamentais de políticas públicas vão sendo esquecidos e ficam, em geral, em segundo plano, sobretudo nas redes sociais. Não discutimos como identificar boas práticas governamentais e promover avanços na melhoria da Segurança, da Saúde, da Educação, da geração de Emprego e Renda, da Economia, da Assistência Social, do Meio Ambiente, dos Direitos Humanos, entre outros temas.
Ficamos reféns da agenda bolsonarista que discute o bem contra o mal. Somos reféns da ideia equivocada de que tudo o que existe é ruim e que agora a administração Bolsonaro precisa “resgatar” o Brasil da “corrupção da esquerda” e da “depravação moral” em que fomos submersos. A gestão Bolsonaro está conseguindo avançar aceleradamente na desconstrução da institucionalidade das políticas públicas estabelecida pela Constituição de 1988, que se assenta no pressuposto de que devemos pensá-la a partir da ideia da universalidade de direitos e reconhecimento das identidades e diferenças.
Engana-se quem acha que os conflitos internos da coalizão que nos governa está impedindo – ou ao menos retardando – a reconfiguração política e institucional do Brasil.
Na ausência de uma ética pública baseada na não violência e na cidadania, tudo o que não é espelho é visto como imoral (aliás, ética é um campo da Filosofia e que agora também é combatido). Atualmente, ao que tudo indica, o governo Bolsonaro está conseguindo estabelecer, mesmo que no contraponto contínuo, o frame (as fronteiras) do debate público, em muito apoiado pelo pretenso papel democrático das redes sociais.
Diz a lenda que as redes sociais são territórios de democratização da informação, aparentemente sem donos e leis. Mas, de fato, elas são tomadas e manipuladas pelos senhores da guerra ideológica que comandam exércitos de robôs e buscam fortalecer posições, interesses econômicos e porta-vozes de seus projetos de Poder.
Análises conduzidas por João Akio, no Fórum Brasileiro de Segurança Pública, trazem dois exemplos que resumem o argumento aqui exposto. A primeira mostra que na semana da divulgação da prisão dos acusados de matar Marielle Franco, que foi alçada pela ultra direita a símbolo do que deve ser combatido em termos morais e políticos, houve um esforço de diminuir o impacto da notícia relacionando-a com questões sobre o atentando sofrido pelo Presidente Jair Bolsonaroe sobre o assassinato do ex-prefeito de Santo Andre, pelo PT, Celso Daniel.
Já a segunda análise, que teve o caráter exploratório e objetivou testar técnicas e algoritmos disponíveis para análise do comportamento das redes sociais (que não são isentos e estão sujeitos a distorções que exigem conhecimentos das Ciências Humanas, como Sociologia e Filosofia, para que não se tornem instrumentos totalitários), revelou como as autoridades públicas precisam ficar atentas.
Usando a aplicação disponível no site https://mikewk.shinyapps.io/botornot/, criada por Michael W. Kearney, professor da Escola de Jornalismo do Instituto de Informática da Universidade do Missouri, foi possível calcular a probabilidade de robôs serem seguidores do Ministro Sergio Moro. Com base nesta técnica, analisamos 583.171 seguidores do ministro em 09/04/2019 e, assumindo 75% de probabilidade de respostas positivas e refazendo a conta três vezes, com amostras diferentes, é possível dizer que ao menos 17,3% dos seguidores de Moro naquela data eram bots.
Ou seja, quase 1 em cada 5 seguidores do perfil do Ministro Sergio Moro naquela data tinham as características de perfis robotizados. Em geral, esse perfis são utilizados para combater ou ampliar determinadas causas ou propostas e, por isso, todas as cautelas são necessárias quando se discute “apoios” ou “tendências” medidos pelas redes sociais. Elas podem conter vieses difíceis de serem filtrados e ponderados.
O debate político não pode e não deve se resumir a uma guerra de hashtags ou likes; não podemos resumir a vida política do país aos ecos e repercussões oriundas da manipulação da guerra de narrativas.
Mais do que nunca, política pública deve ser baseada em evidências, estudos de impacto e monitoramento. O planejamento rigoroso e a observância de uma ética pública plural e democrática podem ser aliados poderosos contra as tentações autoritárias da nossa histórica cultura política violenta e pouco afeita ao contraditório. As vozes da diferença não podem ser caladas.
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