Os guardiões da inflação
Como o mercado financeiro está percebendo que o BC vai continuar reduzindo a Selic, está fazendo um verdadeiro terrorismo inflacionário para manter a Selic elevada. Não vai adiantar. O governo vai reduzir a Selic. Com isso sobrarão recursos para ampliar as ações de governo em áreas como educação, saúde e infraestrutura. O governo tem outra preocupação, que é o impacto da crise afetando a atividade econômica. O artigo é de Amir Khair.
Amir Khair
Enquanto os Estados Unidos e a Europa se debatem para tentar escapar da estagnação, aqui a discussão sobre a economia põe de um lado os guardiões da inflação e de outro os desenvolvimentistas.
São duas posições em debate. A dos guardiões da inflação, liderada pelo mercado financeiro, vê inflação crescente devido ao excesso da demanda em relação à oferta. Para combater a inflação advogam a redução do consumo via elevação da Selic. Se o Banco Central (BC) não manter a Selic em nível elevado, perde a credibilidade e não ancora as expectativas dos formadores de preços, etc.
Para essa corrente o país não pode crescer acima de 3,5%, pois fatalmente seria rompido o teto da meta de inflação de 6,5%, gerando o descontrole dos preços.
Os guardiões da inflação fazem uma verdadeira chantagem inflacionária, para pressionar o BC a manter a Selic elevada. É o seu lucro em jogo e desfilam argumentos para mostrar que há ameaça de inflação no horizonte, pois: a) os preços dos serviços caminham para crescer 8% a 9% neste ano; b) o reajuste salarial de algumas categorias de trabalhadores está sendo feito acima da inflação passada; c) o novo salário mínimo vai aumentar o consumo e; d) os preços das commodities não vão cair, pois a China continuará a ter crescimento forte, demandando produtos.
A outra posição defendida pelo governo é de que não há ameaça de inflação, pois a crise está derrubando os preços internacionais, o que acaba por manter os preços internos sob controle. Nessa situação, a Selic pode cair para um nível inferior ao atual, sem maiores problemas para a inflação. Essa corrente defende que é possível manter a inflação dentro do limite da meta, com um crescimento ao nível de 4,5% a 5,0% e defende estímulos à economia.
A razão parece estar com o governo quanto às perspectivas de inflação.
Em setembro as cotações das commodities tiveram o pior desempenho desde outubro de 2008, ápice da crise financeira com a quebra do Lehman Brothers. A crise na zona do euro pode se transformar em nova crise bancária e a ameaça de recessão na Europa e EUA pode pôr fim a um ciclo exuberante de demanda aquecida e preços estratosféricos. Tudo dependerá em grande parte da China, a grande consumidora, e uma ampla pesquisa feita entre investidores pela Bloomberg apontou que a economia chinesa vai desacelerar nos próximos anos e avançar a um ritmo de 5%.
De modo geral, os produtos agrícolas foram mais castigados que a média das commodities. Em setembro, o índice CRB, que acompanha também matérias-primas metálicas e energéticas, caiu 10,69%, o maior tombo desde outubro de 2008. Isso é importante, especialmente para os países emergentes onde o custo da alimentação prepondera no orçamento doméstico e a inflação depende mais da evolução dos preços dos alimentos. No Brasil alimentos e bebidas respondem por 23,4% do IPCA.
Apesar desta tendência declinante de preços, fato é que prever inflação está sujeito a erro que é tanto maior quanto maior o período que se quer prever. Tanto o mercado financeiro quanto o BC prevêem inflação acima da meta de 4,5% neste e no próximo ano. É puro chute. Essas previsões falham mesmo para um mês à frente, como ocorreu no terceiro trimestre de 2010, quando o mercado financeiro previu inflação de 0,4% em cada mês e ela foi zero. Fato é que se a crise for da intensidade que está se manifestando, pode ocorrer até deflação surpreendendo os guardiões da inflação.
Nessa discussão cada lado tem seus argumentos, mas o que chama a atenção é que ambos os lados usam a Selic para defender sua posição e ela não tem nada a ver com o problema, pois não altera o preço dos serviços, não altera a oferta de crédito, nem o valor das prestações, não influi sobre os preços internacionais e pior, desestimula a oferta ao inibir os investimentos das empresas, sendo esse importante fator de equilíbrio entre oferta e demanda. Em vez de atenuar a inflação a Selic a agrava.
Assim, tem-se uma falsa discussão. A inflação pode subir ou cair? Pode. A crise pode reduzir os preços internacionais? Pode. E a Selic, o que tem a ver com isso? Nada, absolutamente nada.
Se não tem a ver com isso, porque é a mais alta do mundo há tanto tempo? É porque predomina no País o rentismo, que é o ganho fácil, sem risco, em cima do governo federal, que paga os juros de quem aplica em, seus títulos, que têm taxas de juros balizadas pela Selic.
Quer dizer que a inflação segue seu caminho próprio, independente da Selic e ainda independente do nível de crescimento? Sim. O crescimento se dá pelo estímulo ao consumo e, também, pelo estímulo ao investimento para aumentar a oferta interna de produtos e serviços. É essa oferta que irá atender junto com a oferta internacional o mercado, suprindo suas necessidades. Se os preços internacionais estiverem em queda, a inflação estará em queda. Se, ao contrário, estiverem em ascensão, teremos pressão inflacionária. Mas a pressão inflacionária não se combate com a redução da atividade econômica, mas sim com, a elevação da oferta. É esse o caminho virtuoso do crescimento.
A realidade é que a inflação está há vários anos conduzida pelos preços internacionais. Seu efeito sobre os mercados internos é marcante para as economias abertas, como é o nosso caso. Estamos sob a égide da globalização. Cada empresa compete com empresas de vários países. Não são as empresas domésticas que definem os preços, mas o mercado externo. Se uma empresa tenta vender seu produto acima do preço da concorrência fatalmente irá sofrer a perda de posição no mercado, sendo forçada a praticar o preço que possa concorrer com os produtos similares ou substitutos.
Segundo o relatório de inflação do Banco Central de setembro é provável que a inflação fique dentro da meta neste ano, com o risco de 45% (?) de probabilidade que possa ultrapassá-lo, dependendo da magnitude da crise internacional.
Face à crise o BC reduziu a previsão de crescimento deste ano de 4,0% para 3,5%, nível abaixo da média do crescimento mundial prevista em 4,0% pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e bem abaixo do crescimento dos países emergentes de 6,4%.
O governo ainda objetiva alcançar o crescimento entre 4,0% e 4,5% e prevê crescer 5,0% em 2012. Para isso vai precisar ativar a economia, pois a crise já começou a afetar todos os países.
Mas, como o mercado financeiro está percebendo que o BC vai continuar reduzindo a Selic, está fazendo um verdadeiro terrorismo inflacionário para manter a Selic elevada. Não vai adiantar. O governo vai reduzir a Selic. Com isso vão sobrar recursos fiscais para ampliar as ações de governo em áreas chaves como educação, saúde e investimentos em infraestrutura.
O governo tem outra preocupação, que é o impacto da crise afetando o nível da atividade econômica. Os principais indicadores da atividade apontam para forte desativação da economia com ampliação do desemprego e tensão social decorrente. Tem-se a nona queda seguida do índice de confiança da indústria, atingindo o menor patamar desde agosto de 2009 e as perspectivas do setor seguem em tendência de piora.
Diante disso, o governo pretende estimular a economia e reduzir a Selic que está inibindo os investimentos das empresas e danificando o desempenho fiscal.
Creio que será possível ter uma inflação dentro da meta. Basta que a inflação média mensal no último quadrimestre fique em 0,49%. A possibilidade de isso ocorrer é grande. No segundo quadrimestre a inflação média mensal foi de 0,29%. Caso se mantenha nesse nível, a inflação neste ano poderá ficar em 5,6%. Caso vá para o nível ocorrido em agosto de 0,37%, a inflação atingiria 6,0%.
Vê-se que é possível ter uma inflação dentro do limite da meta e, mesmo que ultrapasse, está na hora de pisar no acelerador face aos impactos da crise que está crescendo e reduzir firmemente a Selic. Os guardiões da inflação que busquem novas fontes de lucro, pois a mamata da Selic vai acabar.
São duas posições em debate. A dos guardiões da inflação, liderada pelo mercado financeiro, vê inflação crescente devido ao excesso da demanda em relação à oferta. Para combater a inflação advogam a redução do consumo via elevação da Selic. Se o Banco Central (BC) não manter a Selic em nível elevado, perde a credibilidade e não ancora as expectativas dos formadores de preços, etc.
Para essa corrente o país não pode crescer acima de 3,5%, pois fatalmente seria rompido o teto da meta de inflação de 6,5%, gerando o descontrole dos preços.
Os guardiões da inflação fazem uma verdadeira chantagem inflacionária, para pressionar o BC a manter a Selic elevada. É o seu lucro em jogo e desfilam argumentos para mostrar que há ameaça de inflação no horizonte, pois: a) os preços dos serviços caminham para crescer 8% a 9% neste ano; b) o reajuste salarial de algumas categorias de trabalhadores está sendo feito acima da inflação passada; c) o novo salário mínimo vai aumentar o consumo e; d) os preços das commodities não vão cair, pois a China continuará a ter crescimento forte, demandando produtos.
A outra posição defendida pelo governo é de que não há ameaça de inflação, pois a crise está derrubando os preços internacionais, o que acaba por manter os preços internos sob controle. Nessa situação, a Selic pode cair para um nível inferior ao atual, sem maiores problemas para a inflação. Essa corrente defende que é possível manter a inflação dentro do limite da meta, com um crescimento ao nível de 4,5% a 5,0% e defende estímulos à economia.
A razão parece estar com o governo quanto às perspectivas de inflação.
Em setembro as cotações das commodities tiveram o pior desempenho desde outubro de 2008, ápice da crise financeira com a quebra do Lehman Brothers. A crise na zona do euro pode se transformar em nova crise bancária e a ameaça de recessão na Europa e EUA pode pôr fim a um ciclo exuberante de demanda aquecida e preços estratosféricos. Tudo dependerá em grande parte da China, a grande consumidora, e uma ampla pesquisa feita entre investidores pela Bloomberg apontou que a economia chinesa vai desacelerar nos próximos anos e avançar a um ritmo de 5%.
De modo geral, os produtos agrícolas foram mais castigados que a média das commodities. Em setembro, o índice CRB, que acompanha também matérias-primas metálicas e energéticas, caiu 10,69%, o maior tombo desde outubro de 2008. Isso é importante, especialmente para os países emergentes onde o custo da alimentação prepondera no orçamento doméstico e a inflação depende mais da evolução dos preços dos alimentos. No Brasil alimentos e bebidas respondem por 23,4% do IPCA.
Apesar desta tendência declinante de preços, fato é que prever inflação está sujeito a erro que é tanto maior quanto maior o período que se quer prever. Tanto o mercado financeiro quanto o BC prevêem inflação acima da meta de 4,5% neste e no próximo ano. É puro chute. Essas previsões falham mesmo para um mês à frente, como ocorreu no terceiro trimestre de 2010, quando o mercado financeiro previu inflação de 0,4% em cada mês e ela foi zero. Fato é que se a crise for da intensidade que está se manifestando, pode ocorrer até deflação surpreendendo os guardiões da inflação.
Nessa discussão cada lado tem seus argumentos, mas o que chama a atenção é que ambos os lados usam a Selic para defender sua posição e ela não tem nada a ver com o problema, pois não altera o preço dos serviços, não altera a oferta de crédito, nem o valor das prestações, não influi sobre os preços internacionais e pior, desestimula a oferta ao inibir os investimentos das empresas, sendo esse importante fator de equilíbrio entre oferta e demanda. Em vez de atenuar a inflação a Selic a agrava.
Assim, tem-se uma falsa discussão. A inflação pode subir ou cair? Pode. A crise pode reduzir os preços internacionais? Pode. E a Selic, o que tem a ver com isso? Nada, absolutamente nada.
Se não tem a ver com isso, porque é a mais alta do mundo há tanto tempo? É porque predomina no País o rentismo, que é o ganho fácil, sem risco, em cima do governo federal, que paga os juros de quem aplica em, seus títulos, que têm taxas de juros balizadas pela Selic.
Quer dizer que a inflação segue seu caminho próprio, independente da Selic e ainda independente do nível de crescimento? Sim. O crescimento se dá pelo estímulo ao consumo e, também, pelo estímulo ao investimento para aumentar a oferta interna de produtos e serviços. É essa oferta que irá atender junto com a oferta internacional o mercado, suprindo suas necessidades. Se os preços internacionais estiverem em queda, a inflação estará em queda. Se, ao contrário, estiverem em ascensão, teremos pressão inflacionária. Mas a pressão inflacionária não se combate com a redução da atividade econômica, mas sim com, a elevação da oferta. É esse o caminho virtuoso do crescimento.
A realidade é que a inflação está há vários anos conduzida pelos preços internacionais. Seu efeito sobre os mercados internos é marcante para as economias abertas, como é o nosso caso. Estamos sob a égide da globalização. Cada empresa compete com empresas de vários países. Não são as empresas domésticas que definem os preços, mas o mercado externo. Se uma empresa tenta vender seu produto acima do preço da concorrência fatalmente irá sofrer a perda de posição no mercado, sendo forçada a praticar o preço que possa concorrer com os produtos similares ou substitutos.
Segundo o relatório de inflação do Banco Central de setembro é provável que a inflação fique dentro da meta neste ano, com o risco de 45% (?) de probabilidade que possa ultrapassá-lo, dependendo da magnitude da crise internacional.
Face à crise o BC reduziu a previsão de crescimento deste ano de 4,0% para 3,5%, nível abaixo da média do crescimento mundial prevista em 4,0% pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e bem abaixo do crescimento dos países emergentes de 6,4%.
O governo ainda objetiva alcançar o crescimento entre 4,0% e 4,5% e prevê crescer 5,0% em 2012. Para isso vai precisar ativar a economia, pois a crise já começou a afetar todos os países.
Mas, como o mercado financeiro está percebendo que o BC vai continuar reduzindo a Selic, está fazendo um verdadeiro terrorismo inflacionário para manter a Selic elevada. Não vai adiantar. O governo vai reduzir a Selic. Com isso vão sobrar recursos fiscais para ampliar as ações de governo em áreas chaves como educação, saúde e investimentos em infraestrutura.
O governo tem outra preocupação, que é o impacto da crise afetando o nível da atividade econômica. Os principais indicadores da atividade apontam para forte desativação da economia com ampliação do desemprego e tensão social decorrente. Tem-se a nona queda seguida do índice de confiança da indústria, atingindo o menor patamar desde agosto de 2009 e as perspectivas do setor seguem em tendência de piora.
Diante disso, o governo pretende estimular a economia e reduzir a Selic que está inibindo os investimentos das empresas e danificando o desempenho fiscal.
Creio que será possível ter uma inflação dentro da meta. Basta que a inflação média mensal no último quadrimestre fique em 0,49%. A possibilidade de isso ocorrer é grande. No segundo quadrimestre a inflação média mensal foi de 0,29%. Caso se mantenha nesse nível, a inflação neste ano poderá ficar em 5,6%. Caso vá para o nível ocorrido em agosto de 0,37%, a inflação atingiria 6,0%.
Vê-se que é possível ter uma inflação dentro do limite da meta e, mesmo que ultrapasse, está na hora de pisar no acelerador face aos impactos da crise que está crescendo e reduzir firmemente a Selic. Os guardiões da inflação que busquem novas fontes de lucro, pois a mamata da Selic vai acabar.
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