sexta-feira, 24 de julho de 2015

Prof. Gaspari dá uma aula de manipulação!

Prof. Gaspari dá uma aula de manipulação! | Conversa Afiada



Prof. Gaspari dá
uma aula de manipulação!

Quando não interessa, não vem ao caso !











O Conversa Afiada reproduz aqui afiado artigo de
Sergio Saraiva, extraído do Nassif, sobre aquele que, aqui, é conhecido
como notável historialista (ver no ABC do CAf) dos chapéus (também no ABC):



Aprendendo com os mestres: uma aula de jornalismo, por Sérgio Saraiva


Imperdível, para quem se interessa por jornalismo, o
artigo do professor Elio Gaspari – “A cabeça dos oligarcas”, na Folha de
São Paulo de 22jul2015. O professor Gaspari é o criador do “jornalismo
mediúnico” e, no texto citado, nos dá uma aula sobre um tema
extremamente atual no jornalismo brasileiro: a manipulação da
informação.

por Sergio Saraiva

O
professor inicia apresentando-nos a Operação Lava Jato como uma luta do
bem contra o mal. Ambos, bem e mal, como valores absolutos.


“De
um lado [da Lava Jato], estão servidores a respeito dos quais não há um
fiapo de restrição moral ou mesmo política. São os magistrados e os
procuradores. Do outro lado está o outro lado, para dizer pouco”.

Do
lado do bem, os magistrados e procuradores. O lado do mal, o “outro
lado”, tanto podem estar os réus da Lava Jato como os que criticam seus
excessos, Gaspari não os discrimina. Assim como não apresenta o porquê
de representarem o mal. Deixa para que cada leitor imagine, por sua
conta, algo hediondo de que acusa-los.

Louvores devidos à maestria do mestre.

Gaspari
não coloca entre os “fiapos da restrição moral ou política” que se
poderia fazer aos procuradores e magistrados, o fato de as acusações a
Aécio Neves, ainda que detalhadas e coerentes com outros casos onde o
senador é envolvido, terem sido descartadas, ao mesmo tempo em que o
tesoureiro do PT, João Vaccari, está preso com base na criativa tese de
que as doações legais ao PT eram ilegais. Para não citar o “descuido” na
análise das informações que levaram sua cunhada à prisão por ser
parecida fisionomicamente com a irmã – a esposa de Vaccari.

Não
lhe parece condenável que suspeitas infundadas em relação à, então,
candidata Dilma Rousseff fossem vazadas às vésperas das eleições e
acabassem por ser utilizadas para beneficiar seu adversário, a quem
esses mesmos procuradores teciam elogios nas redes sociais.

Aqui,
Gaspari, parece apoiar-se, nas lições do professor Paulo Henrique
Amorim que nos ensina que, para a manipulação da informação
jornalística, alguns fatos, mesmo que relacionados ao assunto tratado,
“não vêm ao caso”.

Em outro sentido, Gaspari demonstra como dois
opostos podem ser apresentados como estando do mesmo lado. Tal se dá
quando ambos os lados podem ser apresentados como o que se costuma
chamar de “farinhas do mesmo saco”. E habilmente associa o termo “briga
de quadrilhas” ao governo Dilma.


“Há uma
armadilha nessa afirmação [de que Eduardo Cunha esteja constrangendo o
governo federal]. Ela pressupõe uma briga de quadrilhas, com Cunha de um
lado e o Planalto do outro”.


Gaspari sabe, até
porque Cunha não esconde, que a CPI do BNDES é uma retaliação, pouco
importando a que resultado chegue. Mas o professor mostra que é possível
apresentar se uma chantagem como um fato positivo.

“Ou
há esqueletos no BNDES ou não os há. Se os há, a CPI, bem-vinda, já
deveria ter sido criada há muito tempo. Se não os há, nada haverá”.

Seria
absurdo usar o mesmo argumento para justificar uma CPI que investigasse
se Gaspari, que é filho único, na juventude, estuprou sua irmã. Mas
isso não vem ao caso.

Prosseguindo, o professor Gaspari mostra
porque é cultuado como um dos grandes jornalistas da atualidade. Em um
único parágrafo, demonstra porque o PT deve ser condenado a pagar as
penas devidas pelos seus adversários.

Para tanto, compara o tratamento distinto dado pela Justiça aos casos da Lava Jato e da Castelo de Areia.

A
Castelo de Areia foi uma operação da Polícia Federal que apanhou
maganos, para usar um termo caro ao professor Gaspari, do DEM, José
Roberto Arruda e um secretário do governo Kassab, aliados de José Serra,
recebendo propina da empreiteira Camargo Correia. A Castelo de Areia
também envolvia o senador Agripino Maia e Paulo Skaf, além de um filho
de Ministro do TCU – Tribunal de Contas da União.

Pois bem, apesar da fartura de provas, a Castelo de Areia foi anulada nos tribunais superiores devido a filigranas jurídicas.

Como o professor Gaspari se posiciona, então?


“A
verdadeira crise institucional está nas pressões que vêm sendo feitas
sobre o Judiciário. Cada movimento que emissários do governo [Dilma]
fazem para azeitar habeas corpus de empresários encarcerados [em prisão
preventiva na Lava Jato] fortalece a ideia de que há um conluio entre
suspeitos presos e autoridades soltas. Ele já prevaleceu, quando
triturou-se a Operação Castelo de Areia”.


Ou
seja, à leniência utilizada ao se julgar os delitos do DEM deve
corresponder, como compensação à sociedade, um rigor exemplar a ser
aplicado no julgamento de casos envolvendo o PT.

Gaspari não
advoga que a Castelo de Areia seja reaberta, à luz da Lava Jato, mas
inova magistralmente ao defender não apenas a inversão do ônus da prova
em relação ao PT, mas, além, a inversão do ônus da pena. Repare-se ainda
que, em nenhum momento do seu texto, Gaspari cita o DEM e sua aliança
com o PSDB.

Genialidade é pouco para qualificar esse parágrafo genial.

Assim
como genial é a forma como exalta indiretamente o Juiz Sergio Moro.
Utiliza-se de uma analogia carregada de audácia e risco.

“Quem
joga com as pretas tentando fechar o registro da Lava Jato sabe que a
Polícia Federal e o Ministério Público estão vários lances à frente das
pressões. Da mesma forma, quem se meteu nas petrorroubalheiras sabe que
suas pegadas deixaram rastro. Curitiba dribla como Neymar. Quando baixa
uma carta, já sabe o próximo passo”.

Os críticos
do juiz Moro encontram analogias entre suas longas prisões preventivas
para obter confissões e delações premiadas e as detenções efetuadas por
seu xará, Sergio Fleury, durante a ditadura de 64. Fleury, para
descobrir o paradeiro de algum adversário da ditadura, prendia seu
advogado. E para garantir que o procurado se entregaria sem resistência,
prendia a mãe do procurado. Nem de longe que Moro faça uso do
pau-de-arara.

Gaspari conhece o modus operandi de Fleury, dadas
as suas extensas pesquisas para a elaboração da sua magistral série de
livros sobre a ditadura. O professor Percival de Souza também o descreve
no seu livro “A autópsia do medo”.

Mas Gaspari opta pela
comparação de Moro a Neymar, o craque do Barcelona. Por certo, não o
capitão da seleção derrotada na Copa América.

Onde a audácia e o risco?

Neymar
é um craque, não há quem o negue. Usá-lo como analogia é um elogio,
desde que se esqueça de que o craque temperamental costuma ser expulso
de campo por agredir adversários e está envolvido até a alma em um caso
de sonegação de impostos.

Por fim, Gaspari esconjura a
possibilidade de absolvição futura dos réus devido à falhas processuais
na Lava Jato. E já os condena a 150 anos de prisão.

O professor
demonstra como argumentar convincentemente que os réus da Lava Jato não
podem ter direito à defesa. Já que tal defesa corresponderia a fomentar
uma crise institucional. Para tanto, faz uso de seu cosmopolitismo e vai
buscar uma analogia internacional. Compara a Lava Jato ao caso Maddoff e
ao atentado às torres gêmeas do World Trade Center.

Maddoff é um
picareta que aplicou o golpe da pirâmide em gananciosos milionários
americanos. Foi a julgamento, com direito à defesa, e está preso.

Vejamos a analogia feita pelo professor Gaspari:


“Afora
os amigos que fazem advocacia auricular junto a magistrados, resta a
ideia da fabricação da crise institucional. É velha e ruim. Veja-se, por
exemplo,… Bernard Maddoff: …ele sabia que seu esquema de investimentos
fraudulentos estava podre. Quando dois aviões explodiram nas torres
gêmeas de Nova York… ele pensou: “Ali poderia estar a saída”. Eu queria
que o mundo acabasse”.

Outro jornalista culpou Lula pela crise
grega e caiu no ridículo, mas, dado o brilhantismo da argumentação, esse
risco Gaspari não corre.

O uso do caso Maddoff relacionado ao 11
de Setembro, ainda que próximo à ficção ou à liberdade poética, é, no
entanto, um lance de mestre de Gaspari. Evita que seja levado a tratar
da “crise institucional” do “estado policial” do Ministro Gilmar Mendes
que facilitou que Daniel Dantas se safasse da Satiagraha.

Gaspari
argumenta que o diário de Marcelo Odebrecht é um risco institucional.
Inteligentemente, o professor reveste Odebrecht de um poder que, no
entanto, não serve sequer para garantir luz elétrica na sua cela, quanto
mais para abalar a República. Já Dantas mandou prender o delegado que o
investigou e levou a julgamento o juiz que o condenou. Isso do alto de
dois habeas corpus obtidos em menos de 24 horas diretamente do STF.

Mas o professor sabe: isso não vem ao caso.

Por
fim, em um dia de ressaca jornalística, após a cobertura da deblaquê de
Eduardo Cunha, resta-me agradecer ao professor Elio Gaspari pela aula
de jornalismo contida em seu pequeno texto, como pequeno são os frascos
que contém os grandes perfumes e os grandes venenos.


PS1:
por óbvio, não faço referência, neste post, ao professor Luis Nassif.
Não faltaria material sobre o assunto, na sua obra “O Caso Veja”. Porém,
citá-lo poderia parecer adulatório, evitei. Tampouco cito o mestre
Janio de Freitas, pelo simples fato de não ter encontrado em sua obra o
que pudesse ser associado à manipulação de informação.

PS2: para os que dispõem de alguns tostões para pagar a travessia pelo paywall da Folha, segue aqui o acesso ao texto do professor Gaspari.

PS3: para acesso a textos abandonados à caridade pública, visite a oficina de concertos gerais e poesia
.


Em tempo: esse Bessinha … - PHA​

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