Provas reais
por Janio de Freitas
*Publicado na Folha de S.Paulo
Em menos de um mês, Sergio Moro já recorre à terceira linha defensiva, na confrontação com as revelações do The Intercept Brasil por seu site e pela imprensa. A alegação de desimportância e normalidade das mensagens expostas mais confirmou sua conduta desregrada do que o defendeu.
Logo depois, “Não reconheço toda a autenticidade das frases” foi uma dubiedade necessária, mas invalidou a intenção de desacreditar as conversas. Agora, em audiência na Câmara, Sergio Moro apelou para a cansada evasão político-sentimental: é “vítima de revanchismo”. De quem?
Dos que difundem as mensagens, claro. Da Folha, do jornal O Globo e da TV Globo, do Estado de S. Paulo, da Veja, dos que por quase cinco anos o trataram como o herói perfeito, intocável e eleitoral?
Não há motivo para revanche nessa relação de gratidões mútuas, sem ressentimentos. A Lava Jato, seus métodos e suas consequências não seriam como foram, e são, sem as contribuições da imprensa e parte das TVs, em projeção e em tolerância.
Ainda agora, as revelações do Intercept Brasil associadas à imprensa são publicadas, na maioria das vezes, de maneira que nega revanchismo. É comum terem jeito de mera obrigação. O que, mesmo sem tal motivo, protege Moro das proporções de fato merecidas pelo escândalo de sua ação.
As conversas não surpreendem quem teve liberdade crítica na observação a Moro, aos procuradores e delegados da Lava Jato. Mas é espantoso, isso é, que Moro prossiga na transgressão às normas judiciais, a que dizia estar dedicado. Espantoso e provado.
Bolsonaro deu ordem a Moro de investigar todos os partidos. Os traços de Estado policial nessa ordem —percepção do repórter exemplar que é Rubens Valente, na Folha de 5/6— começam, porém, em outra irregularidade grave: a ordem de Bolsonaro seguiu-se ao recebimento de cópia, entregue por Moro, da investigação sobre os “laranjas” do PSL.
Moro transgrediu o segredo de Justiça aplicado ao inquérito. Com a mesma conduta de infidelidade judicial, o mesmo método de ação subterrânea, o mesmo ânimo transgressor que as mensagens comprovam.
Várias vezes indagado na Câmara a respeito de investigações contra o jornalista Glenn Greenwald, do Intercept Brasil, Moro teve duas reações: ou não respondeu, ou disse que sua relação com a Polícia Federal é apenas a de lhe proporcionar condições de trabalho. Não tinha a resposta, pois.
Não é verdade. Além do notório acompanhamento que faz da atividade da PF, o que Moro entregou a Bolsonaro foi um relato sigiloso de que tinha conhecimento, assim como das investigações da PF para a Justiça Eleitoral.
Sergio Moro pode seguir na escalada de escapismos. Mas não detêm impulsos transgressores nem restauram sua imagem fantasiosa. Resta-lhe satisfazer-se com os serviços que prestou e tentar, com eles, a retribuição de uma vaga no Supremo.
Logo depois, “Não reconheço toda a autenticidade das frases” foi uma dubiedade necessária, mas invalidou a intenção de desacreditar as conversas. Agora, em audiência na Câmara, Sergio Moro apelou para a cansada evasão político-sentimental: é “vítima de revanchismo”. De quem?
Dos que difundem as mensagens, claro. Da Folha, do jornal O Globo e da TV Globo, do Estado de S. Paulo, da Veja, dos que por quase cinco anos o trataram como o herói perfeito, intocável e eleitoral?
Não há motivo para revanche nessa relação de gratidões mútuas, sem ressentimentos. A Lava Jato, seus métodos e suas consequências não seriam como foram, e são, sem as contribuições da imprensa e parte das TVs, em projeção e em tolerância.
Ainda agora, as revelações do Intercept Brasil associadas à imprensa são publicadas, na maioria das vezes, de maneira que nega revanchismo. É comum terem jeito de mera obrigação. O que, mesmo sem tal motivo, protege Moro das proporções de fato merecidas pelo escândalo de sua ação.
As conversas não surpreendem quem teve liberdade crítica na observação a Moro, aos procuradores e delegados da Lava Jato. Mas é espantoso, isso é, que Moro prossiga na transgressão às normas judiciais, a que dizia estar dedicado. Espantoso e provado.
Bolsonaro deu ordem a Moro de investigar todos os partidos. Os traços de Estado policial nessa ordem —percepção do repórter exemplar que é Rubens Valente, na Folha de 5/6— começam, porém, em outra irregularidade grave: a ordem de Bolsonaro seguiu-se ao recebimento de cópia, entregue por Moro, da investigação sobre os “laranjas” do PSL.
Moro transgrediu o segredo de Justiça aplicado ao inquérito. Com a mesma conduta de infidelidade judicial, o mesmo método de ação subterrânea, o mesmo ânimo transgressor que as mensagens comprovam.
Várias vezes indagado na Câmara a respeito de investigações contra o jornalista Glenn Greenwald, do Intercept Brasil, Moro teve duas reações: ou não respondeu, ou disse que sua relação com a Polícia Federal é apenas a de lhe proporcionar condições de trabalho. Não tinha a resposta, pois.
Não é verdade. Além do notório acompanhamento que faz da atividade da PF, o que Moro entregou a Bolsonaro foi um relato sigiloso de que tinha conhecimento, assim como das investigações da PF para a Justiça Eleitoral.
Sergio Moro pode seguir na escalada de escapismos. Mas não detêm impulsos transgressores nem restauram sua imagem fantasiosa. Resta-lhe satisfazer-se com os serviços que prestou e tentar, com eles, a retribuição de uma vaga no Supremo.
O autor
Os 25 anos do Plano Real motivaram numerosas reportagens e considerações. Não faltaram autores para entrevistas e fotografias. Quem menos foi realçado —e mesmo citado— e não se ofereceu para colher gloríolas foi o autor verdadeiro do Plano Real. Uma praxe brasileira.
Itamar Franco demitiu três ministros da Fazenda que não conseguiram atender, no prazo desejado, à sua exigência obsessiva de um plano anti-inflação. Fernando Henrique assumiu levando o compromisso de André Lara Resende, um tanto a contragosto: entregaria um plano em dois meses e cairia fora.
Pérsio Arida, hoje direitista mal disfarçado, foi o principal coadjuvante de André, antes companheiros na idealização do Plano Cruzado no governo Sarney. As reuniões para o Real, na casa do professor Hélio Jaguaribe, então sogro de André, contaram com poucos mais, presenças irregulares para elaboração de dados setoriais e outros pormenores.
O Plano foi entregue no prazo. Fernando Henrique o reteve quatro meses, enganando Itamar Franco, com o pretexto de atraso, por conveniência de sua ansiada candidatura à Presidência. A criatividade e o talento amplo de André Lara Resende não poderiam estar dispensados neste país de tantos oportunistas e tão menos cabeças relevantemente originais.
Os 25 anos do Plano Real motivaram numerosas reportagens e considerações. Não faltaram autores para entrevistas e fotografias. Quem menos foi realçado —e mesmo citado— e não se ofereceu para colher gloríolas foi o autor verdadeiro do Plano Real. Uma praxe brasileira.
Itamar Franco demitiu três ministros da Fazenda que não conseguiram atender, no prazo desejado, à sua exigência obsessiva de um plano anti-inflação. Fernando Henrique assumiu levando o compromisso de André Lara Resende, um tanto a contragosto: entregaria um plano em dois meses e cairia fora.
Pérsio Arida, hoje direitista mal disfarçado, foi o principal coadjuvante de André, antes companheiros na idealização do Plano Cruzado no governo Sarney. As reuniões para o Real, na casa do professor Hélio Jaguaribe, então sogro de André, contaram com poucos mais, presenças irregulares para elaboração de dados setoriais e outros pormenores.
O Plano foi entregue no prazo. Fernando Henrique o reteve quatro meses, enganando Itamar Franco, com o pretexto de atraso, por conveniência de sua ansiada candidatura à Presidência. A criatividade e o talento amplo de André Lara Resende não poderiam estar dispensados neste país de tantos oportunistas e tão menos cabeças relevantemente originais.
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