domingo, 3 de janeiro de 2016

Paulo Pimenta desmascara o Globo

Paulo Pimenta desmascara o Globo — Conversa Afiada



Jornal blinda e "brinda" seus anunciantes de cerveja





















(Imagem: de Renato Bloisi)


O C Af reproduz artigo de Paulo Pimenta:


O Globo blinda e "brinda" seus anunciantes de cerveja em matéria que
não "vê" relação entre consumo de álcool e mortes no trânsito

Paulo Pimenta (*)

A proximidade com o
carnaval e a dependência econômica que a mídia tem da publicidade de
cerveja levaram o jornal O Globo a isentar, desde agora, a combinação
bebida e direção como uma das causas da violência no trânsito.
Em
matéria deste domingo (3), o jornal "analisa" a ocorrência dos acidentes
em rodovias federais e aponta suas causas. O Globo "não viu", em nenhum
momento, o consumo de bebidas alcoólicas com um fator preponderante
para as vítimas das estradas.

Para dar suposta credibilidade
àquilo que O Globo quer esconder, ou não pode dizer  - a relação entre
álcool e acidentes com veículos - um especialista em segurança de
trânsito surge no texto para sentenciar que o "despreparo dos
motoristas", a "falta de manutenção dos veículos" e a "péssima qualidade
das vias" é que são os responsáveis pelas colisões nas estradas.
Nenhuma referência sobre álcool e direção, apesar de constar claramente
no site da Polícia Rodoviária Federal que, nas operações de fiscalização
de final de ano que terminam só depois do carnaval, a "embriaguez ao
volante" é uma das "principais atitudes dos condutores que acarretam
acidentes graves".

No ano passado, a Revista Época, do grupo
Globo,  revelou que a Ambev ocupava o sexto lugar entre as dez empresas
que mais investiram em publicidade no primeiro semestre de 2015 no país.

Não
fosse pelas razões óbvias e conhecidas, seria de se estranhar o fato de
uma matéria que dedicou uma página inteira sobre acidentes em rodovias
não ter ouvido nenhum especialista na área da saúde, por exemplo.

Até
porque, se ouvisse, saberia que a Organização Mundial da Saúde aprovou,
em texto assinado por 193 países no ano de 2010, a restrição da
publicidade de cerveja como uma solução estratégica à diminuição da
violência no trânsito. Dados da OMS afirmam que o álcool é o agente
causador de 4% das mortes do mundo, vitimando mais do que doenças como
AIDS e Tuberculose. O público jovem, especialmente do sexo masculino,
representa a maior parte das vítimas.

Em outro estudo, a OMS
verificou que países desenvolvidos que acabaram com a propaganda de
álcool reduziram o consumo em 16% e tiveram 23% menos mortes no trânsito
que os países onde não há restrições à propaganda, como o Brasil.

Aqui,
o Conar, espécie de autorregulação da propaganda, é conivente com os
recorrentes desrespeitos da publicidade de cerveja ao seu próprio
código. Para modificar essa situação, em 2011 apresentei projeto de lei
701/11 que estabelece restrições à publicidade de cerveja, como sugere a
OMS. Mas, o  Congresso Nacional não teve ainda a coragem necessária
para enfrentar o “lobby” dos três setores que impedem a aprovação de uma
legislação sobre esse tema no Brasil: a indústria de cerveja, as
agências de publicidade e a mídia.

Há alguns anos,  o professor
Braz de Lima, do Programa de Álcool e Drogas da UFRJ, estimou que o
álcool está presente em 75% dos acidentes de trânsito que ocorrem no
país.

Em 1996, o Congresso Nacional aprovou a restrição de
publicidades ao cigarro. Nesses 20 anos, o número de fumantes no Brasil,
que entre a década de 80 e 90 era de aproximadamente 30%, hoje
apresenta índice de 10,8%, segundo o Ministério da Saúde. Isso fez do
Brasil um dos países que mais reduziram o número de fumantes no mundo
nos últimos anos.

Como se sabe, o carnaval é o período em que os
segmentos de bebidas mais lucram, quando milhões e milhões de litros de
cerveja são consumidos, e que também muito investem em publicidade.

O
aumento do consumo de álcool nessa época faz com que esse seja o
período, apontado pela Polícia Rodoviária Federal, como o mais crítico
em termos de acidentes em rodovias federais.

Mas O Globo não
"descobriu" nada disso. Nem poderia, já que a matéria foi construída
para blindar - ou brindar ? - seu próprios anunciantes de qualquer
responsabilidade sobre os acidentes e mortes no trânsito que ocorrerão
durante o carnaval.


(*)Paulo Pimenta é jornalista e deputado federal ( PT-RS)

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