quarta-feira, 2 de novembro de 2016

A vitória da Globo em Conquista — Conversa Afiada

A vitória da Globo em Conquista — Conversa Afiada



A vitória da Globo em Conquista

O grande erro foi não regular a mídia





















PHA:
Em Vitória da Conquista, na Bahia, Herzem Gusmão, do PMDB, ganhou a
eleição para Prefeito em segundo turno, com 58% dos votos, contra Zé
Raimundo, do PT. A cidade tem como Prefeito o médico Guilherme Menezes,
que foi Prefeito eleito em 1997, depois em 2000, depois em 2008, depois
em 2012... E, portanto, um homem de reputação indiscutível e prestígio
na cidade e na região. Eu converso com Guilherme Menezes e pergunto: por
que o PT perdeu em Vitória da Conquista?
Guilherme Menezes: Primeiro, da
minha parte, tenho uma profunda gratidão pelo povo de Vitória da
Conquista por esses cinco mandatos que conquistou o Partido dos
Trabalhadores aqui - e partidos aliados. É um município imenso e eu
gostaria de externar esta gratidão porque, além de quatro vezes
Prefeito, eu fui eleito Deputado Estadual e Deputado Federal, com a
votação majoritária de Vitória da Conquista. Acredito que a situação
nacional, esse verdadeiro massacre da grande mídia, tem ajudado muito. E
esse discurso do "tá na hora mudar, tá na hora de mudar"... Acredito
que isso tenha contribuído bastante para que nós não fôssemos para o
sexto mandato.  
PHA: O que foi esse massacre
divulgado através da grande mídia? O que é que foi discutido no plano
nacional e que pudesse ter tido um impacto tão agudo em Vitória da
Conquista?
GM: Eu reputo isso ao fascínio que
principalmente a televisão tem sobre as pessoas, principalmente aquelas
pessoas menos informadas politicamente, porque nós estamos aqui numa
cidade encravada no Polígono das Secas - portanto, numa cidade
tradicionalmente assolada pelas secas, e nós estamos no quinto ano de
seca sucessivo. Vale notar que a partir dos Governos Lula e Dilma, como
que, por milagre, desapareceram os retirantes nordestinos, flagelados da
fome e da seca... Houve um avanço muito grande nessas políticas com
Bolsa Família, benefício de prestação continuada, o Pronaf, que não
chegava aqui para esta região e começou a chegar para garantir a
safra... E, mesmo assim, grande parte da população entrou naquele
discurso do "é preciso mudar" e parece que deixou de olhar e ouvir.
Aquela coisa: "quem tem olhos para ver, que veja; quem tem ouvidos para
ouvir, que ouça". Parece que as pessoas deixaram de olhar e perceber o
que aconteceu nas suas vidas e no seu entorno e viraram muito mais para
esta campanha tão acirrada. Foi, como eu disse, um verdadeiro massacre
contra as políticas do Partido dos Trabalhadores e, principalmente,
contra as grandes lideranças e o grande líder, que é Lula.
PHA: Essa não terá sido uma
responsabilidade do próprio PT – não ter explicado que o Pronaf, o Bolsa
Família, o apoio à política de irrigação e a de minorar os efeitos da
seca... Não terá sido responsabilidade do próprio PT não ter conseguido
criar uma narrativa para explicar isso, como diz a professora Marilena
Chauí,
explicar que isso não estava pronto, não está na natureza, como uma cascata, mas teve que ser construído com esforço político?
GM: Eu creio que o PT tem a sua
parcela de culpa. Não vamos dizer que não houve, inclusive por conta das
próprias disputas internas. Como nosso município não tem água nem de
subsolo, nem de superfície (tanto que a água vem de um município
vizinho), e 63% é semiárido, então nós, durante esses quase 20 anos,
dotamos o município de cerca de 800 barragens.
Além disso, a partir do Governo
Lula, por parte da Defesa Civil, a houve a construção de cisternas de
placas - cada cisterna dessas tem a capacidade para 16 mil litros de
água, água da chuva, principalmente; as cisternas de produção para 52
ml... Só nosso município tem cerca de 4,2 mil dessas cisternas - nós que
temos uma área de 3743 km², com 304 povoados locais integrando 11
distritos federais. Então, é um município imenso. E as pessoas passaram a
usufruir desse conforto e nunca mais as populações rurais viram as suas
criações morrerem de sede.
Podemos dizer que não tem hoje, em
nosso município, nenhuma criança, nenhum adolescente, nenhum adulto sem
escola.  Nós temos hoje 42 mil alunos e 53 mil vagas - porque projetamos
ter sempre mais vagas, que era um déficit imenso que vem da zona rural;
temos política de saúde, com 44 equipes de saúde que cobrem
principalmente toda a zona rural…
E, mesmo assim, houve uma política
muito acirrada, em cima inclusive desse "tá na hora de mudar", mesmo com
os nossos Governos tendo sido de mudanças.
PHA: Vamos tentar dar uma
dimensão nacional à situação de Vitória: quais os efeitos que esse
massacre em Vitória da Conquista podem vir a ter na eleição para 2018 ?
GM: Foi um verdadeiro desastre! O
partido vai ter que se recompor, infelizmente. E nós temos uma liderança
da dimensão de Lula, uma liderança nacional e internacional. Nós temos
muito o que discutir com a população: os muitos feitos; a retirada de
tantas pessoas da linha da miséria, da pobreza e da fome; aquele
conceito de que só se acaba com a fome extinguindo a pobreza extrema;
temos muitos argumentos, apesar desse massacre que aconteceu, criando no
senso comum a imagem do PT como se fosse o grande inimigo do País.
Nós temos muito trabalho. O PT deixou de dialogar como dialogava.
Quando eu fui eleito, por exemplo,
em 1996, antes de tomar posse eu já estava em Santos, vendo as políticas
desenvolvidas pelo Governo Telma de Souza e David Capistrano Filho -
que foi, inclusive, nosso assessor, no início.
Estive lá em Porto Alegre, vendo orçamento participativo…
Tudo isso deu certo em Vitória da Conquista.
Mas me parece que, de um momento
para outro, esse diálogo se reduziu bastante. Eu acho que o partido tem
que estar mais unido, dialogando, fazendo um levantamento de todas as
conquistas e, também, do que erramos nesse tempo, inclusive na falta de
uma regulação da mídia - acho que isso foi, em âmbito nacional, um dos
grandes erros…
Essas concessões passaram a
comandar, inclusive, a cabeça das pessoas e a ditar as preferências.
Agora, para nós daqui, foram 20 anos de muito sucesso para o Governo e
para a população. A mortalidade infantil era imensa; hoje, eu posso lhe
dizer que não morrem mais crianças à míngua neste município. Criamos
inclusive um Hospital Materno Infantil, com UTI neonatal, cirurgia
neonatal, banco de leite humano... Mesmo isso sendo caríssimo para um
município que arrecada tão pouco.
Mas temos, ainda, muito chão pela
frente, por tudo o que foi feito. Acho que a população brasileira vai
ter, no momento, principalmente nas regiões mais sofridas, de confrontar
o como era com o que está passando a ser com Governos concentradores de
riquezas, de oportunidades, de poder.
Como os antigos diziam: pão comido, pão esquecido.
Parece que só se sente a necessidade
quando se está com fome. Isso é tudo como direito; nada chegou como
moeda de troca. Inclusive um Governo que teve a coragem de começar toda
essa história com a palavra que todos os outros governantes não tinham
coragem de dizer: fome! No Brasil existia uma conspiração do silêncio
sobre a fome, como dizia Josué de Castro.
PHA: Tereza Campello acabou de dar uma entrevista à Carta Capital dizendo que o Brasil pode voltar ao Mapa da Fome.
GM: Isso é uma tristeza, uma
perspectiva que nos traz muita preocupação. Como Lula sempre disse,
pobre nunca foi problema, sempre foi solução! Põe dinheiro na mão do
pobre, que o dinheiro circula, gera dignidade, gera renda, gera riqueza,
gera emprego. Porque aumenta o consumo, o consumo aumenta a produção...
Tudo isso que ele ensinava da forma mais simples, bem diferente de
deixar o bolo crescer para dividir depois. Vamos dividir para crescer!
Mas, infelizmente, veio esse Golpe,
que contribuiu muito para essas derrotas. Mas nós estamos aqui firmes,
nesse momento de transição e desejando que a população de Vitória da
Conquista seja feliz no novo Governo.
Gostaria de ressaltar a imensa
gratidão que eu tenho por todos esses mandatos e essa confiança colocada
sobre nós. Espero que, em grande parte, tenhamos correspondido a essa
confiança.

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