O Brasil, o golpe e o voo das baratas
Por Flávio Aguiar, na Rede Brasil Atual:
Explico. Eu dizia que nos golpes clássicos, a que nos acostumamos na América Latina, tínhamos um script definido. As ratazanas civis conspiravam, faziam os contatos "prima facie", isto é, a Embaixada dos Estados Unidos, e insuflavam o espírito gorila nos militares, até que estes – muitas vezes movidos por sentimentos corporativos e disciplinares – se decidissem. Eles punham então os tanques na rua, faziam o trabalho sujo e repressivo, derrubando o governo e instalando um novo.
Sem fazer apologia destes golpes, assinalei que tudo tinha uma "disciplina". Na frente iam os gorilas, nas bordas a chamada "tigrada", aplicando as prisões, torturas, assassinatos etc. Atrás, vinham os insetos civis, em ordem unida, marchando com suas teorias já então mercadológicas, tentando garfar os cargos possíveis. Pairando sobre tudo e todos, o Tio Sam abençoava o golpe. E enquadrava o país.
Houve exceções. Por exemplo, no último golpe argentino, quem foi na frente e nos lados não foram gorilas nem tigres: foram abutres, urubus, caçando carniça, para roubar os bens dos perseguidos e até suas crianças em alguns casos.
E houve problemas. Depois do episódio da Guerra das Malvinas, Tio Sam ficou cabreiro em relação a militares na América Latina.
Mas sempre há uma solução. Ela começou… na Flórida! E em Washington. Em 2000, foi uma votação apertada (5 x 4) na Suprema Corte dos Estados Unidos que garantiu a aceitação da fraude eleitoral naquele estado que deu a vitória a Bush Filho sobre Al Gore. O exemplo deu frutos. Nova decisão judicial, mais tarde, desta vez em Honduras, derrubou Manuel Zelaya e instalou um regime que, disfarçado de democracia, saqueia o país desde então. Na sequência, o Paraguai viveu um golpe parlamentar, derrubando, sem motivo, o presidente Fernando Lugo.
E aí veio a cereja do bolo, ou o bolo, num tamanho nunca visto: o Brasil. Reuniu-se tudo o que era disponível para dar o golpe: ações e programações de think tanks norte-americanos, apoio financeiro, bolsas de estudo, prebendas, sinecuras, figuras do Judiciário, da mídia, da Polícia Federal, do Parlamento, a vice-presidência da República, a classe média ressentida, as desculpas esfarrapadas de combate à corrupção. E deu-se o golpe.
Mas sem os militares. Não houve a ordem unida à frente. A tigrada teve de se contentar com espetáculos pirotécnicos, sem o segredo de antanho, fazendo "conduções coercitivas", agrilhoando prisioneiros com algemas e correntes como nos bons tempos na escravidão. E, junto, aconteceu o voo das baratas.
Não sei se a leitora ou o leitor já viu uma revoada de baratas, quando se depara com um ninho delas, abrindo à luz o local onde elas se escondem. É uma beleza! Sai aquele revoo, cada uma numa direção, num tropel alado e louco em busca de espaço. Foi o que aconteceu.
As esquerdas estão comprimidas, reprimidas, no sufoco, com seu (nosso) candidato principal na mira dos franco-atiradores do Judiciário, que são, nesta altura, o setor que tenta ser o mais organizado e engalfinhado do golpe. Também, pudera, se o golpe recuar (como recuará, nem que seja a médio prazo), serão os mais desmoralizados.
Mas as direitas estão voando a mil, feito baratas tontas, tentando definir quem será o próximo imperador da dinastia, o Temer II. Batem cabeças, umas com e contra as outras, em busca do melhor pedaço do butim.
Agora, por exemplo, houve uma revoada de baratas em direção a Davos, na Suíca, cada uma querendo se apresentar ao mundo das finanças internacionais, como a Dona Baratinha da canção, aquela que garantiria as moedinhas a Dom Ratão, se este não caísse na panela de feijão.
Na natureza, as baratas, embora despertem asco em muitos, não são perigosas. Não transmitem doenças, pelo menos em princípio. Mas no nosso mundo político, elas são os animais mais daninhos que existem. Até porque trazem junto as ratazanas, pulgas, mosquitos, bactérias, vírus que vão destruir nosso organismo social, se não forem contidos.
Antigamente, os golpes semeavam uma detestável ordem unida. Este, agora, semeia desde logo o caos. A abulia, a anonímia, a anomia, a apatia, a covardia, a sabujice, a pusilanimidade.
A ver o que os três réus – perante o tribunal da História – disfarçados histrionicamente de juízes, farão diante de e com tudo isto.
Conversava eu com um amigo meu, carioca, com sua ironia da gema, sobre o estado atual do golpe em curso no Brasil, quando ele me surpreendeu com esta metáfora eloquente: "parece um voo de baratas".
Explico. Eu dizia que nos golpes clássicos, a que nos acostumamos na América Latina, tínhamos um script definido. As ratazanas civis conspiravam, faziam os contatos "prima facie", isto é, a Embaixada dos Estados Unidos, e insuflavam o espírito gorila nos militares, até que estes – muitas vezes movidos por sentimentos corporativos e disciplinares – se decidissem. Eles punham então os tanques na rua, faziam o trabalho sujo e repressivo, derrubando o governo e instalando um novo.
Sem fazer apologia destes golpes, assinalei que tudo tinha uma "disciplina". Na frente iam os gorilas, nas bordas a chamada "tigrada", aplicando as prisões, torturas, assassinatos etc. Atrás, vinham os insetos civis, em ordem unida, marchando com suas teorias já então mercadológicas, tentando garfar os cargos possíveis. Pairando sobre tudo e todos, o Tio Sam abençoava o golpe. E enquadrava o país.
Houve exceções. Por exemplo, no último golpe argentino, quem foi na frente e nos lados não foram gorilas nem tigres: foram abutres, urubus, caçando carniça, para roubar os bens dos perseguidos e até suas crianças em alguns casos.
E houve problemas. Depois do episódio da Guerra das Malvinas, Tio Sam ficou cabreiro em relação a militares na América Latina.
Mas sempre há uma solução. Ela começou… na Flórida! E em Washington. Em 2000, foi uma votação apertada (5 x 4) na Suprema Corte dos Estados Unidos que garantiu a aceitação da fraude eleitoral naquele estado que deu a vitória a Bush Filho sobre Al Gore. O exemplo deu frutos. Nova decisão judicial, mais tarde, desta vez em Honduras, derrubou Manuel Zelaya e instalou um regime que, disfarçado de democracia, saqueia o país desde então. Na sequência, o Paraguai viveu um golpe parlamentar, derrubando, sem motivo, o presidente Fernando Lugo.
E aí veio a cereja do bolo, ou o bolo, num tamanho nunca visto: o Brasil. Reuniu-se tudo o que era disponível para dar o golpe: ações e programações de think tanks norte-americanos, apoio financeiro, bolsas de estudo, prebendas, sinecuras, figuras do Judiciário, da mídia, da Polícia Federal, do Parlamento, a vice-presidência da República, a classe média ressentida, as desculpas esfarrapadas de combate à corrupção. E deu-se o golpe.
Mas sem os militares. Não houve a ordem unida à frente. A tigrada teve de se contentar com espetáculos pirotécnicos, sem o segredo de antanho, fazendo "conduções coercitivas", agrilhoando prisioneiros com algemas e correntes como nos bons tempos na escravidão. E, junto, aconteceu o voo das baratas.
Não sei se a leitora ou o leitor já viu uma revoada de baratas, quando se depara com um ninho delas, abrindo à luz o local onde elas se escondem. É uma beleza! Sai aquele revoo, cada uma numa direção, num tropel alado e louco em busca de espaço. Foi o que aconteceu.
As esquerdas estão comprimidas, reprimidas, no sufoco, com seu (nosso) candidato principal na mira dos franco-atiradores do Judiciário, que são, nesta altura, o setor que tenta ser o mais organizado e engalfinhado do golpe. Também, pudera, se o golpe recuar (como recuará, nem que seja a médio prazo), serão os mais desmoralizados.
Mas as direitas estão voando a mil, feito baratas tontas, tentando definir quem será o próximo imperador da dinastia, o Temer II. Batem cabeças, umas com e contra as outras, em busca do melhor pedaço do butim.
Agora, por exemplo, houve uma revoada de baratas em direção a Davos, na Suíca, cada uma querendo se apresentar ao mundo das finanças internacionais, como a Dona Baratinha da canção, aquela que garantiria as moedinhas a Dom Ratão, se este não caísse na panela de feijão.
Na natureza, as baratas, embora despertem asco em muitos, não são perigosas. Não transmitem doenças, pelo menos em princípio. Mas no nosso mundo político, elas são os animais mais daninhos que existem. Até porque trazem junto as ratazanas, pulgas, mosquitos, bactérias, vírus que vão destruir nosso organismo social, se não forem contidos.
Antigamente, os golpes semeavam uma detestável ordem unida. Este, agora, semeia desde logo o caos. A abulia, a anonímia, a anomia, a apatia, a covardia, a sabujice, a pusilanimidade.
A ver o que os três réus – perante o tribunal da História – disfarçados histrionicamente de juízes, farão diante de e com tudo isto.
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