sábado, 23 de agosto de 2014

O que está pior, a economia ou a mídia?

Assaz Atroz

O que está pior, a economia ou a mídia?





23/08/2014

Por Fábio Jammal Makhul, na Revista do Brasil

Não
é improvável um espectador do telejornal noturno ter o sono perturbado
com vozes soturnas de apresentadores e analistas. Pelo que se vê e se
ouve, não se sabe o que aquele apresentador sério quer dizer com "boa
noite". Afinal, a economia do Brasil pode estar à beira da bancarrota.
Tampouco se perdoa o "bom dia" do apresentador da manhã, pois os jornais
do dia também trarão o apocalipse. Não é para menos.A preocupação com a
economia move o dia a dia das pessoas, inclusive as que dormem mais
cedo que os jornais noturnos. Ninguém passa um único e escasso dia sem
fazer contas. Foi entendendo a importância dessa ciência, nem sempre
exata, que o estrategista James Carville, do Partido Democrata,
eternizou a frase "é a economia, estúpido!"
Era 1992, e com esse aprendizado Bill
Clinton superaria o favoritismo do republicano George Bush, o pai,
demonstrando sintonia com as angústias cotidianas dos norte-americanos
nesse quesito. Eis o segredo do homem que faria história no Salão Oval
da Casa Branca pelos próximos oito anos: saber o que, com quem e por que
estava falando.O noticiário econômico cumpre vários objetivos. Um
deles, saciar os humores do mercado financeiro, servir de ponte para
suscitar apostas nos cassinos da especulação, detectar (ou criar) o
clima do ambiente eleitoral, entre outros, inclusive informar de vez em
quando. Porém, pelo que algumas pesquisas têm demonstrado, a opinião
pública talvez não veja a economia do Brasil como a veem os
especialistas.
Pesquisas
do Datafolha apuram o índice de confiança do brasileiro em relação ao
país. Numa escala de 0 a 200, um levantamento feito no início de julho
revelou que a expectativa da situação econômica pessoal é de 160 pontos,
sendo um dos "aspectos para os quais os brasileiros demonstram um
sentimento positivo acima da média", no relato do instituto. Já a
expectativa da situação econômica do país¬ registrou 102 pontos em
julho, alta de 6 pontos na comparação com maio. Os eleitores brasileiros
também foram consultados sobre a situação econômica pessoal e 48%
esperam que ela vá melhorar nos próximos meses. Outros 38% acreditam que
ficará como está.
E
apenas 12%, que vai piorar. Pela pesquisa, pode-se constatar que há um
grande descompasso entre o sentimento positivo do brasileiro com relação
à economia e o cenário catastrófico divulgado pela mídia tradicional.
O
jornal ou o caixaO comerciante Mário Paixão da Silva, de 46 anos, tem
uma pequena loja de roupas no centro do Recife (PE) há mais de 20 anos. E
diz que basta conferir as vendas para saber se a economia está bem ou
não.
"Você
acha que vou acreditar no jornal ou no meu caixa?", brinca, ainda
comemorando as vendas que fez durante a Copa do Mundo. "A gente precisa
ser criativo e se reinventar a cada dia. Durante a Copa, por exemplo,
troquei as tradicionais roupas da vitrine por camisas da seleção ou por
peças que privilegiassem o verde e o amarelo. Vendi muito, não posso
reclamar. E, nos últimos meses, minhas vendas estão no mesmo patamar dos
anos anteriores", diz.Mesma opinião tem a auxiliar de serviços gerais
Vilma Silva de Lima, de 57 anos.
O
noticiário econômico não é algo que a perturbe, ou atraia. Moradora de
um bairro pobre de Camaragibe, região metropolitana do Recife, Vilma diz
que as principais preocupações são com a saúde pública e a segurança.
"Aliás, nas próximas eleições, vou prestar atenção no que os candidatos
vão dizer sobre esses problemas", afirma.Com a aproximação do pleito, a
mídia tradicional começa a definir candidatos que querem ajudar ou
atrapalhar.
E,
diferentemente de quase um quarto do eleitorado, parece não estar
indecisa, analisa o jornalista e sociólogo Venício Artur de Lima,
professor titular de Ciência Política e Comunicação da Universidade de
Brasília (UnB). Ele analisa o comportamento midiático em eleições há
três décadas e tem vários livros sobre o tema.Lima avalia que a profusão
de informações parciais para privilegiar uns e prejudicar outros dá o
tom. "Seguem a mesma conduta das eleições passadas, talvez de forma
ainda mais exacerbada."O pesquisador pondera, porém, que o Brasil mudou e
o eleitor está mais capacitado e dispõe de meios diversos de informação
para decidir o voto.
"Tenho
uma visão diferente da que tinha quando comecei a estudar eleições, nos
anos 80. As pessoas buscam muito mais informação fora do esquema da
grande mídia. É claro que a TV aberta continua sendo a principal fonte
de informação, mas as fontes alternativas têm peso muito grande desde
2006", avalia. Isso não significa, observa Lima, que a mídia
convencional não seja importante para influenciar comportamentos em
longo prazo.
"A
percepção das pessoas sobre corrupção e a estigmatização dos partidos
ainda é influenciada pela mídia, mas no comportamento eleitoral em si, o
peso do que é publicado nos principais jornais, na TV e no rádio
diminuiu, graças a meios que antes não existiam", comenta.Pessimismo
militanteUsar o jornalismo econômico para fazer política no Brasil é uma
estratégia que tem sido bastante criticada por Luis Nassif, jornalista
econômico com 45 anos de experiência e organizador do portal GGN.
Para
ele, há muitas críticas à condução da política econômica do governo
federal e vulnerabilidades que precisam ser enfrentadas - especialmente o
desequilíbrio nas contas externas do país. "Mas nada que, nem de longe,
se pareça com o quadro pintado nos grandes veículos. Aumentos de meio
ponto percentual ao ano nos índices inflacionários são tratados como
prenúncio de hiperinflação; acomodamento das vendas do varejo, em níveis
elevados, como prenúncio de recessão", comenta.
O
que ele chama de "pessimismo militante" compromete a crítica necessária
sobre os pontos efetivamente vulneráveis da política econômica e do
processo de desenvolvimento do Brasil. "Há uma guerra política
inaugurada em 2005, que sacrifica a notícia no altar das disputas
partidárias. É evidente que há muito a melhorar no ambiente e na
política econômica, mas quem está em crise exposta, hoje em dia, é certo
tipo de jornalismo que acabou subordinando os fatos a disputas
menores."
O
fotógrafo Alexandre Lombardi, de 38 anos, não gosta de generalizar uma
má conduta da mídia. Ele não duvida que todo veículo favoreça um lado e
prejudique outro. Lê os jornais tradicionais, procura na internet por
blogs, fóruns de discussão e mídias sociais com pensamentos diferentes,
mas desconfia à esquerda e à direita, e procura consistência:"Gosto da
pluralidade de pensamentos", conta Alexandre, que mora em Sorocaba,
interior paulista. "A internet deixou tudo muito fácil.
É
possível comparar versões. Analiso, converso com os amigos e formo a
minha própria opinião. Não tiro conclusões baseadas em uma única fonte",
explica. Ele ainda não definiu candidatos para a próxima eleição, mas
levará em conta as¬ propostas, inclusive para a economia.Transmitir
confiança, credibilidade e consistência, com propostas claras, será o
melhor meio de ganhar o voto do eleitor em outubro.
Quem
afirma é o publicitário Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto
Data Popular - empresa de pesquisa especializada no conhecimento das
classes C e D, onde se concentra a maioria dos brasileiros.
"O
que vai decidir o voto é a capacidade das candidaturas de entender os
problemas reais que o eleitor enfrenta e de oferecer perspectivas de
futuro", observa.Para Meirelles, será, antes de tudo, uma eleição sobre o
futuro e não de legado. "Os eleitores estão mais preocupados em saber o
que vai levar o Brasil adiante e não o que trouxe o país até aqui. Isso
-coloca a discussão em outro patamar. Os candidatos devem fazer uma
campanha muito mais propositiva em vez de ficar falando do passado",
explica.
A
queda na credibilidade da mídia, as novas tecnologias da informação e a
recente ascensão social no Brasil criaram um novo formador de opinião
que terá peso nestas eleições. Trata-se do jovem da classe C. "Esses
jovens estudaram mais que os pais, estão mais conectados, contribuem
mais com a renda familiar do que o jovem da elite. Ele é provedor de
conteúdo em casa e sua opinião vai ajudar a definir o voto da família",
afirma Meirelles.
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(Re)leia também...

Renda per capita de Absurdil



 

Fernando Soares Campos – Brasil, janeiro de 2005 

Absurdil
era uma republiqueta perdida entre o Atlântico e o Pacífico, lá todos
os cidadãos pagavam a mesma taxa de imposto, não importava se o sujeito
ganhava uma relíquia (RL$, a moeda corrente de Absurdil) ou mil
relíquias, a taxa de imposto era a mesma: 20%.


A
distribuição de renda em Absurdil somente podia ser comparada à de
certo país sul-americano, pois, dos seus 1010 habitantes, 1000 ganhavam
RL$10,00/ano, cada; enquanto os 10 privilegiados cidadãos faturavam
RL$10.000,00 anuais, cada. A renda bruta da população era, portanto,
RL$110.000,00 anuais. Em cima disso, os cofres públicos de Absurdil
arrecadavam RL$22.000,00 por ano, deixando para a população
RL$88.000,00. Assim, a renda per capita líquida dos absurdileiros era de
RL$87,12. Este era o quadro macroeconômico de Absurdil, e assim vivia
seu povo, numa tranqüila e eterna infelicidade.

Um
dia a população rebelou-se e colocou outro presidente no poder. Já nos
primeiros momentos, o novo mandatário e seu gabinete ministerial
trataram de acelerar o PIB que, há muitos anos, andava em baixa. O
presidente correu mundo para vender os produtos absurdileiros no
exterior. Conquistou mercados que nunca haviam sido bem explorados pelos
governos anteriores. Incentivou a qualificação da mão-de-obra local e
promoveu melhores condições de trabalho, além de apoiar o empresariado,
combatendo o contrabando, estimulando pesquisas científicas e melhorando
a qualidade dos seus produtos. Esses foram alguns dos fatores que
impulsionaram a economia de Absurdil. Foi tudo muito surpreendente, em
pouco tempo, o país apresentou resultados estatísticos que assombravam
os descontentes: superavit astronômico! Risco Absurdil despencando; era o
mundo passando a acreditar e respeitar aquela ex-republiqueta
casa-de-mãe-joana.

Chegada
a hora, o novo governo, que havia prometido mudanças na área econômica e
social do país, tomou as primeiras decisões: a partir daquele momento,
os absurdileiro mais pobres passaram a ganhar RL$11,00 por ano, e,
igualmente, foram aumentadas as rendas de cada um dos 10 privilegiados
para RL$11.000,00 anuais. No entanto, a taxa de IR de Absurdil foi
modificada: os menos favorecidos passariam a pagar 15% de IR e os
privilegiados 30%. No primeiro ano de governo, a renda bruta da
população bateu recorde:RL$121.000,00. Descontados RL$ 1.650,00 da renda
total de RL$11.000,00 da camada mais desgraçada, e RL$33.000,00 dos
privilegiados que ganhavam juntos RL$110.000,00 por ano, a população em
geral ficou com RL$86.350,00, o que representou uma renda per capita de
RL$85,49.

Entretanto
os miseráveis ficaram menos miseráveis, passando a receber RL$9,35
líquidos por ano, quando recebiam RL$8,00, e os privilegiados
continuaram com seus privilégios, só que um pouco menores, bobagem:
RL$7.700,00 líquidos anuais, cada, contra os RL$8.000,00 que ganhavam no
governo anterior. Mesmo começando a recuperar suas "perdas" com o
aumento da produção e das novas oportunidades, os privilegiados chiaram.
E chiaram muito!! Queriam o poder de volta. Precisavam convencer a
população de que aquilo tudo era ruim para ela. Foi aí que tiveram uma
brilhante idéia: pegaram as estatísticas do ano anterior e extraíram
aquele item que indicava "queda" na renda per capita, em relação àquele
período. Com esse suposto paradoxo econômico, os privilegiados gritaram
veementemente para os absurdileiros mais pobres:
- Vocês foram enganados!!! A renda per capita caiu de RL$87,13 para RL$85,49.

Moral da história recente de Absurdil: Os números não mentem; quem mente são os numerólogos quando mexem nos seus numerários.

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