Partido político, um negócio melhor que tráfico de drogas, por J. Carlos de Assis | GGN
Pastor Everaldo, aquele que se for eleito presidente vai vender a
Petrobrás para combater a corrupção, comprou no próprio nome o
PSC-Partido Social Cristão por R$ 20 milhões, a pedido e financiado pelo
então governador Garotinho, que queria ter uma legenda auxiliar na sua
candidatura à Presidência. Os dois brigaram algum tempo depois e o
pastor ficou com o partido apenas para si na condição formal de
vice-presidente. É negócio como poucos no Brasil. O investimento inicial
foi dinheiro desviado de obras públicas e, no caso do PSC, dá um
retorno só de Fundo Partidário a pequena fortuna de R$ 32 milhões
anuais.
De dois em dois anos, nos períodos de eleição, a fortuna partidária
cresce exponencialmente. Pastor Everaldo, como os donos de todos os
partidos que se coligam em eleições proporcionais ou majoritárias, vende
“seu” tempo de televisão para o líder da coligação. Às vezes a
negociação não se completa por causa da ganância. De fato, Pastor
Everaldo pediu ao PT R$ 20 milhões para se coligar com Dilma. A proposta
foi recusada porque pareceu um excesso. (Aliás, R$ 20 milhões foi o que
o PT na eleição de 2004 havia prometido a Roberto Jefferson, que disse
ter recebido apenas R$ 4 milhões. A cobrança da diferença gerou um
transtorno que veio a ser nacionalmente conhecido como mensalão!)
Indignado com a recusa do PT em comprar “seu” tempo na televisão para
a disputa majoritária, o bravo pastor decidiu ele mesmo, a despeito de
nunca ter tido cargo eletivo, lançar-se candidato nada menos do que à
Presidência da República. Isso não diminui em nada sua renda. É que ele
não tem só o Fundo Partidário e a venda de legenda para candidatura
majoritária como fonte de renda pessoal na qualidade de dono absoluto do
partido. O tempo de televisão é vendido também em todo o país para as
eleições majoritárias e proporcionais locais, e parte da receita,
milhões, vem para a presidência.
E não é só isso. O presidente do PSC em nível municipal contribui com
R$ 5 mil para o presidente da legenda no nível estadual. No Estado do
Rio, isso representa R$ 450 mil por mês. Desses, R$ 100 mil são
encaminhados religiosamente para o presidente nacional, a saber, para o
pastor Everaldo. E ainda não é só isso. Com o dinheiro do Fundo
Partidário e da venda da legenda para a propaganda eleitoral, o partido
nos últimos anos fez um considerável patrimônio imobiliário para suas
sedes e outros serviços. Tudo está em nome do presidente ou de laranjas.
O dinheiro reflui para o caminho certo, na forma de aluguéis, mês a
mês.
Alguém poderá perguntar: como um presidente de partido em nível
municipal consegue R$ 5 mil mensais para alimentar as caixas estadual e
nacional? Muito simples, ensina o pastor Everaldo: nas eleições, os
partidos “emitem” dinheiro, ou seja, bônus para contribuição por parte
de empresas e pessoas físicas os quais podem ser abatidos do imposto de
renda. Talvez você pergunte qual seria o interesse maior de uma empresa
ou de uma pessoa física em contribuir para um partido em época de
eleição, mesmo abatendo essa contribuição no imposto. Elementar, meu
caro Watson. Como o bônus é deduzido do imposto de renda, nada impede
que o “doador” compre 100 e o partido lhe devolva 50 na forma de dedução
do imposto de forma a que ele embolse pessoalmente os outros 50 sacado
diretamente do imposto pago ou a pagar.
O que estou contando é a história relativa a apenas um partido.
Foi-me relatada por quem a ouviu diretamente do pastor Everaldo. Não lhe
direi o nome, por enquanto, podendo revelá-lo em juízo na hipótese de o
pastor Everaldo me processar por difamação. Quanto aos demais partidos,
disse o que afirmou Marx em outro contexto: não investiguei os
detalhes, mas de te fabula narratur (a fábula trata também de
ti). Sim, porque todas as complexas negociações de alianças envolvendo
36 partidos políticos existentes no país, em época de eleição, é um
festival inacreditável de patifarias com privatização de dinheiro
público que acaba por financiar barbaridades inacreditáveis em tempo
pago pelo povo para se fazer, por exemplo, a “promessa” em tempo
nacional de televisão de vender a Petrobras.
Insista-se. O tempo de televisão que esses mercadores de legenda
vendem uns para os outros é bancado diretamente pelo povo, pois as
emissoras (e rádios) cobram as maiores tarifas pelo tempo de horário
nobre transcorrido na propaganda eleitoral e as rebatem diretamente do
imposto de renda. Aliás, é justamente porque isso se tornou uma fonte
fácil de negócios da mídia, em horário nobre apresentado como
“gratuito”, que praticamente não existe na imprensa crítica a esse
sistema absolutamente imoral. É esse sistema espúrio, não o voto
obrigatório, não a escolha entre parlamentarismo e presidencialismo que
deveria ser visado numa reforma partidário. A rigor, teria que ser
extinto, em nome da moralidade política brasileira. Do jeito que está é
uma indecência, um acinte ao povo, e um estupro contra a democracia
brasileira. Muitos se perguntam, ingenuamente, por que temos 36 partidos
políticos no Brasil. A resposta é simples: porque ter partido, quando
transformado em propriedade privada fora do controle de um diretório
autêntico, dá a seus donos mais dinheiro que tráfico de drogas, sem os
inconvenientes da ilegalidade.
J. Carlos de Assis - Economista, doutor em Engenharia de
Produção pela Coppe/UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB,
autor de mais de 20 livros sobre economia política brasileira.
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