domingo, 31 de agosto de 2014

Um em dois - Janio de Freitas

BLOG DO SARAIVA



O tiro que, há 60 anos, Getúlio Vargas
deu no próprio coração para salvar as riquezas nacionais parece pronto a
ser disparado, agora contra elas.


Quis criar liberdade nacional na
potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa
esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma,
disse Vargas, ao explicar as razões de seu gesto.


O ódio à ideia de que o Brasil venha a
ser independente ressurge, agora que mal começa a jorrar o tesouro de
petróleo da camada do pré-sal.


Pelas mãos dos inimigos de sempre da
soberania e do progresso nacional mas, também, mal disfarçado numa  capa
primária de “ecologia” hipócrita, que encapuza os verdadeiros motivos:
hoje como sempre ter o apoio político de um sistema de comunicação
antinacional.


Janio de Freitas, em artigo primoroso na Folha de S. Paulo,
neste e em outros temas, expõe como são siamesas as de Aécio Neves as
propostas de Marina Silva no seu “programa de Governo” – neste momento
em revisão pelo senhor Silas Malafaia.




Um em dois

Janio de Freitas

O catatau dado como programa de
governo de Marina Silva e do PSB, mas que contraria tudo o que PSB
defendeu até hoje, leva a uma originalidade mais do que eleitoral: na
disputa pela Presidência, ou há duas Marinas Silvas ou há dois Aécios
Neves. As propostas definidoras dos respectivos governos não têm
diferença, dando aos dois uma só identidade. O que exigiu dos dois
candidatos iguais movimentos: contra as posições refletidas nas críticas
anteriores de Marina e contra a representação do avô Tancredo Neves
invocada por Aécio.


Ao justificar sua proposta para a
Petrobras, assunto da moda, diz Marina: “Temos que sair da Idade do
Petróleo. Não é por faltar petróleo, é porque já estamos encontrando
outras fontes de energia”. Por isso, o programa de Marina informa que,
se eleita, ela fará reduzir a exploração de petróleo do pré-sal.


Reduzir o pré-sal e atingir a
Petrobras no coração são a mesma coisa. Sustar o retorno do investimento
astronômico feito no pré-sal já seria destrutivo. Há mais, porém.
Concessões e contratos impedem a interferência na produção das empresas
estrangeiras no pré-sal. Logo, a tal redução recairia toda na Petrobras,
com efeito devastador sobre ela e em benefício para as estrangeiras.


Marina Silva demonstra ignorar o que é
a Idade do Petróleo, que lhe parece restringir-se à energia. Hoje o
petróleo está, e estará cada vez mais, por muito tempo, na liderança das
matérias-primas mais usadas no mundo. Os seus derivados estão na
indústria dos plásticos que nos inundam a vida, na produção química que
vai das tintas aos alimentos (pelos fertilizantes), na indústria
farmacêutica e na de cosméticos, na pavimentação, nos tecidos, enfim,
parte do homem atual é de petróleo. Apesar de Marina da Silva. Cuja
proposta para o petróleo significaria, em última instância, a carência e
importação do que o Brasil possui.


A Petrobras é o tema predileto de
Aécio Neves nos últimos meses. Não em ataque a possíveis atos e autores
de corrupção na empresa, mas à empresa, sem diferenciação. Que seja por
distraída simplificação, vá lá. Mas, além do que está implícito na
candidatura pelo PSDB, Aécio Neves tem como ideólogo, já anunciado para
principal figura do eventual ministerial, Armínio Fraga — consagrado
como especialista em aplicações financeiras, privatista absoluto e
presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique, ou seja,
quando da pretensão de privatizar a Petrobras.


A propósito, no debate pela TV
Bandeirantes, Dilma Rousseff citou a tentativa de mudança do nome
Petrobras para Petrobrax, no governo Fernando Henrique, e atribuiu-a à
conveniência de pronúncia no exterior. Assim foi, de fato, a ridícula
explicação dada por Philipe Reichstuhl, então presidente da empresa. Mas
quem pronuncia o S até no nome do país, com States, não teme o S de
Petrobras. A mudança era uma providência preparatória. Destinava-se a
retirar antes de tudo, por seu potencial gerador de reações à
desnacionalização, a carga sentimental ou cívica assinalada no sufixo
“bras”.


Ainda a propósito de Petrobras, e
oportuno também pelo agosto de Getúlio, no vol. “Agosto – 1954″ da
trilogia “A Era Vargas”, em edição agora enriquecida pelo jornalista
José Augusto Ribeiro, está um episódio tão singelo quanto sugestivo.
Incomodado com o uso feroz da TV Tupi por Carlos Lacerda, o general
Mozart Dornelles, da Casa Civil da Presidência, foi conversar a respeito
com Assis Chateaubriand, dono da emissora. Resposta ouvida pelo general
(pai do hoje senador e candidato a vice no Rio, Francisco Dornelles):
se Getúlio desistisse da Petrobras, em criação na época, o uso das tevês
passaria de Lacerda para quem o presidente indicasse. De lá para cá, os
diálogos em torno da Petrobras mudaram; sua finalidade, nem tanto.


De volta aos projetos de governo,
Marina e Aécio desejam uma posição brasileira que, por si só, expressa
toda uma política exterior. Pretendem o esvaziamento do empenho na
consolidação do Mercosul, passando à prática de acordos bilaterais. Como
os Estados Unidos há anos pressionam para que seja a política geral da
América do Sul e, em especial, a do Brasil.


Em política interna, tudo se define,
igualmente para ambos, em dois segmentos que condicionam toda a
administração federal e seus efeitos na sociedade. Um, é o Banco Central
dito independente; outro, é a prioridade absoluta à inflação mínima
(com essa intenção, mas sem o êxito desejado, Armínio Fraga chegou a
elevar os juros a 45% em 1999) e contenção de gastos para obter o
chamado superavit primário elevado. É prioridade já conhecida no Brasil.


Pelo visto, Marina e Aécio disputam para ver quem dos dois, se eleito, fará o que o derrotado deseja.

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