O Brasil precisa voltar a amar Chico Buarque
do El País
O Brasil precisa voltar a amar Chico Buarque
por Xico Sá
Chico Buarque ganha prêmio literário na França.
Mal o estagiário sobe o seu honesto e suado post no portal de notícias
e, em segundos, a caixa de comentários vira uma “caixa de ódio” - tal e
qual a letra do Lupicínio. A baba da raiva humana contamina na
velocidade da rede. Um vírus tropical sem vacina. Chico Buarque ganha importantíssimo prêmio literário na França, repito e retuito, parabenizo o artista genial pela glória estrangeira. A baba escorre por telas de computadores e smartphones.
Tudo bem que o xará não seja aquela unanimidade do tempo dos
festivais, a unanimidade nacional da frase sacana de Nelson Rodrigues,
mas, peraí, colega, esse ódio todo ao Chico é sintoma de que o país
perdeu de vez o rumo das ventas e a ideia de delicadeza. O Brasil
precisa voltar a amar Chico Buarque de Holanda. De todas as maneiras.
Com tesão e com afeto. Inclusive com o perdão por te trair, me perdoa,
desapontada leitora, mas tem que ser assim.
O Brasil carece voltar a amar o Chico ardentemente, não de forma
sadomasoquista, aos chutes e pontapés, como leio agora nos comentários
da página de cultura do “Estadão”, o primeiro a registrar o prêmio
francês ao moço lírico dos tristes trópicos. Amo tanto e de tanto amar,
acho que ele merece mais dengo, amo tanto e de tanto amar, acho que o
país precisa saber da importância de ser Francisco não apenas por
notícias frescas vindas de Paris ou do planeta... Todo aquele roteiro
“Bye bye Brasil” precisa voltar a gamar no Chico, noves fora odiozinhos
internéticos e passageiros.
No Tocantins, o chefe do Parintintins, quem curte rock vintage e
Bee Gees, o pessoal do Ceará que ama Cidadão Instigado, Patativa e
Godard... O país precisa viver a doce ilusão que Chico ainda representa a
unanimidade rodrigueana. Tudo isso significa recuperar a delicadeza
perdida, como no magistral documentário -para francês ver-, dirigido por
Walter Salles e Nelson Motta (1990).
Corta. Digo, eu mesmo corto o barato, ao lembrar que o xará descobriu
ele mesmo, em 2011, a “caixa de ódio” da internet. “Não sabia como era o
jogo, fiquei espantadíssimo”, disse o torcedor do Fluminense, às
gargalhadas. Chico descobrira os comentaristas de plantão que o chamavam
de velho bêbado, petista, vagabundo da lei Rouanet etc. Só rindo dessa
gente que não bate palmas e não pede bis para o conjunto da obra de
Francisco Buarque de Holanda. No disco, no teatro ou no livro.
Não que o xará caísse no conto da unanimidade pregada sacanamente
pelo Nelson Rodrigues..., mas, bicho, a rua ria bonito, a praia
espraiava vendo o Chico passar no seu cooper do Leblon ao
Arpoador... E até as herdeiras dos generais da Ditadura davam valor ao
homem revoltado e suas abençoadas redondilhas poéticas, sejam as menores
ou as maiores, redentora ou trágicas como Genis ou calabares. “Você não
gosta de mim, mas sua filha gosta (....)”.
Que Francisco volte a ser aos olhos de nós todos, mesmo nos tempos
pós-golpe parlamentar, o grande Chico. Pelo conjunto da obra, como o
sábio júri do prêmio francês. Que volte a ser, no que lembro da entrevista aqui no EL PAÍS BRASIL ao amigo Antonio Jiménez Barca,
o homem mais desejado. Recordo que o xará respondeu a pergunta da forma
mais tranquila: “Isso já faz muito tempo”. Vale a pena ler de novo esse
encontro.
O homem mais desejado. Imagina, desdenhou Francisco. Faz tempo uma
ova. Tudo é quase ontem, poeta, como a gente nem se lembra, como a
memória daquele estrangeiro do livro do Camus diante da provação de uma
morte materna. Parabéns pelo prêmio francês e por tudo que representas
para a humanidade - mesmo para os brasileiros do ódio e do contra.
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