Locaute não é greve, é golpe!
triste lembrança do Chile volta do passado. Na época, insuflados por uma
ação da Agência Norte-americana de Inteligência, a CIA, um grupo de
caminhoneiros realizou uma grande paralisação no país visando conferir
legitimidade ao golpe militar que culminou no assassinato do Presidente,
democraticamente eleito, Salvador Allende.
O resto da história já é do conhecimento de todos. O Chile viveu uma
ditadura cruel, das mais selvagens da história, que contou com requintes
de selvageria, como o massacre de milhares de oposicionistas do regime
num estádio de futebol.
Sendo assim, quando os caminhoneiros do Brasil realizam uma
paralisação em diversos estados é preciso separar o joio do trigo, a
necessidade do golpismo, a luta política democrática do mero golpismo.
Sem ingressar no mérito das reivindicações, é preciso destacar que a
maior parte das organizações de trabalhadores de transporte acolheu
plenamente a proposta do Governo Federal costurada pelo sempre eficiente
Ministro Miguel Rosseto. Daí fica a pergunta: se as entidades de classe
acolheram a proposta apresentada pelo Governo, porque algumas cidades
ainda sofrem com a paralisação e bloqueio de rodovias? Quem ganha com o
caos?
Com certeza, não são os caminhoneiros, que terão uma Lei que garante
uma série de direitos trabalhistas sancionada na íntegra pela Presidenta
da República, além da isenção do pedágio para caminhões vazios e o
congelamento do preço do diesel por um período mínimo de seis meses,
dentre outras vantagens.
A resposta está nas entrelinhas do movimento, nas suas contradições, e
na presença de atores estranhos e alheios ou contrários à pauta de
reivindicação dos trabalhadores. Sugiro olhar e fotografar a placa da
maior parte dos caminhões paralisados e, com certeza, teremos uma
surpresa ao ver que grande parte é de Santa Catarina ou do Paraná. Ou
seja, são caminhões das grandes empresas de transportes, que emplacam os
seus caminhões em estados que fazem populismo com o IPVA, e se utilizam
da desinformação imposta pela mídia da direita golpista, especialmente a
Rede Globo, a Folha e a Veja, para sustentar uma crise fabricada.
Há uma imensa contradição entre a Agenda dos trabalhadores
rodoviários, que hoje são submetidos a jornadas humilhantes, com
garantias mínimas, ou forçados a falsificar contratos de terceirização
dos serviços, e o das empresas de transporte, ou ainda do grande
agronegócio, que se aproveitam da fragilidade legal do trabalho da
categoria para impor um regime quase escravagista e baixos valores de
fretes.
Assim, muitos dos trabalhadores que hoje fazem figuração no movimento
paredista são vítimas da ação deliberada do grupo dominante, e sem a
menor compreensão do processo político e social defendem a agenda dos
seus maiores inimigos, que são os grandes empresários do agronegócio e
das grandes empresas de transporte.
Isso não greve, e sim Locaute, ou Lockout, para utilizar a expressão
britânica. Trata-se de uma prática proibida pela legislação brasileira,
exercitada pelos empregadores, que tem por objetivo frustrar ou
dificultar o atendimento de reivindicações dos empregados.
No Locaute impende-se o acesso dos trabalhadores aos meios de
trabalho, ou simplesmente é suspendido o direito ao trabalho através do
uso desproporcional da força econômica. O resultado buscado pelos
dirigentes dos Locautes é sempre o enfraquecimento da pauta da classe
trabalhadora organizada para impor um regime de interesse do capital.
Não é por acaso que figuras desconhecidas, surgem, do nada, como
líderes, normalmente “laranjas” muito bem pagos pelos interessados nos
resultados do movimento contra-reivindicatório.
Assim, você brasileiro que hoje sofre com a chantagem egocêntrica de
um grupo de caminhoneiros que violentamente bloqueiam a circulação de
caminhões, ou com a campanha de pânico imposta pela mídia golpista,
especialmente a Rede Globo, fiquem certos que não são os trabalhadores
que lideram o essa organização paredista, Mas aqueles que se usufruem da
exploração de milhares de trabalhadores que atuam no segmento do
transporte.
Não há uma greve legítima, esta terminou na quarta-feira, na reunião
entre o movimento dos caminhoneiros e o Ministro Miguel Rosseto. Temos,
isto sim, um Locaute, medida absolutamente ilegal.
Quais os motivos deste movimento, que curiosamente começou no Paraná,
Estado onde o Governador, vinculado ao PSDB, enfrenta protestos diários
pelas denúncias de corrupção e pelo corte dos direitos de servidores
públicos, e mostra alguma forma no Rio Grande do Sul, onde o Governador
Sartori promete atrasar o pagamento da folha salarial dos servidores.
Talvez a resposta sejam a tentativa de abafar as denúncias contra
Aécio Neves e FHC na operação Lava-jato, ou ainda o vergonhoso escândalo
do HSBC, esquecido pela mídia, e que representa o maior caso de
corrupção e de lavagem de dinheiro do Planeta, ou para dar gás à sede
golpista de um grupo de conservadores que não consegue aceitar a perda
das eleições de outubro, ou ainda, claramente, para atrasar a sanção da
Lei dos Caminhoneiros, o que traria uma imensa e justa vantagem para
esta importante categoria profissional.
Se estamos diante de um Locaute, e não de uma greve, não há mais
exercício da Democracia, mas sim um típico caso de polícia, e que assim
deve ser tratado pelo Ministério Público e pela Polícia Federal.
.oOo.
Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.
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