terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Manual do perfeito midiota: O governo Temer não tem onde ir - Brasileiros

Manual do perfeito midiota: O governo Temer não tem onde ir - Brasileiros



Manual do perfeito midiota: 

O governo Temer não tem onde ir



Os integrantes e associados do governo enterino já receberam cópias do conteúdo das delações da Odebrecht


Os integrantes e associados do governo enterino do sr. Michel Temer já receberam cópias do conteúdo das delações da Odebrecht.


A conclusão é dos advogados que editam o site e boletim Migalhas, especializado em questões jurídicas.
Para quem estranhava a súbita renúncia do ex-ministro das Relações Exteriores José Serra, eis aí uma boa pista.
Sob o título “Ai que dó”, a
nota observa que o advogado José Yunes acaba fazendo a revelação ao se
complicar nas explicações sobre como recebeu um pacote de dinheiro do
doleiro Lúcio Funaro: ele confessou ter atuado como “mula” do agora
ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil.
Deve o autor, evidentemente, se desculpar publicamente com a nobre estirpe dos muares.
“Ai que dó” é como o Migalhas se refere à alegação de Yunes, de que não sabia que o pacote entregue por Funaro continha dólares.
“A informação de Yunes revela
que ‘eles’ já tiveram acesso à delação da Odebrecht. E estão, todos,
montando suas versões”, diz o boletim.
O fato é muito grave e coloca
uma pá de cal sobre a credibilidade da força-tarefa que conduz a
operação Lava-Jato: o conteúdo da delação de Claudio Mello Filho, da
Odebrecht, nunca foi revelado, o que significa que a equipe liderada
pelo juiz Sergio Moro vazou para os acusados o teor das acusações, para
que eles possam planejar suas defesas.
O presidente-tampax vê se
desmoralizar ainda mais seu gabinete quando o ministro Serra deixa
abruptamente o cargo e alega um problema de coluna, ou, como se apressou
a divulgar a mensageira Eliane Cantanhede (Grupo Globo e Estado de S. Paulo), Serra estava “tristinho” no cargo de ministro das Relações Exteriores.
Serra saiu para tentar se desviar da enxurrada de esterco que a Lava-Jato procura esconder.
Esse é o episódio que irá
marcar definitivamente as biografias dos integrantes do Supremo Tribunal
Federal e do Conselho Nacional de Justiça.
A evidência de favorecimento,
por parte dos personagens que são tidos pelos midiotas como heróis da
moralidade pública, a integrantes da quadrilha abrigados no poder
federal, não admite omissão: cumpre ao CNJ agir, cumpre ao STF dar aos
brasileiros um sinal de que nem tudo é esculhambação.
Nem se deve, a esta altura,
cobrar alguma responsabilidade da imprensa hegemônica, porque de onde
nada se espera é que nada sai, mesmo.
Mas pode-se apostar que pelo menos a Folha de S. Paulo,
o jornal que atua como uma espécie de agência privada do ex-ministro
Serra, venha a trazer alguma informação nova enquanto repinicam os
tamborins.
Os midiotas, atordoados pela comprovação de que o impeachment
de Dilma Rousseff instalou as raposas no galinheiro, não têm mais como
ficar repetindo que o mandato do sr. Temer é transitório, porque a
transição significa que se sai de um lugar para outro, e ele demonstra
não saber onde está.
Faltava ao inquilino do
Planalto legitimidade. Depois se constatou que faltava estofo e carisma
para conduzir o que, segundo seus acólitos, seria a transição para fora
da crise econômica; agora não há como esconder que falta honestidade,
falta estratégia, falta respaldo popular, falta competência.
O governo enterino não tem para onde ir.
Aliás, alguns de seus integrantes e ex-integrantes têm, sim: o presídio da Papuda.

Enredo macabro

Enredo macabro da Escola de Samba Unidos do Serra-Obama, por Armando Coelho Neto | GGN



Enredo macabro 




por Armando Rodrigues Coelho Neto


O  ódio a Lula e ao Partido dos Trabalhadores tinha como
característica principal ser inconfessável. Padecia da falta de uma
explicação sensata e ou politicamente correta, se é que o ódio comporta
esse tipo de explicação. Desse modo, a corrupção institucionalizada, que
sempre foi privilégio das classes dominantes, passou a servir de
fundamento para que aquilo que não tinha explicação começasse a ter.
Aquele sentimento invisível, tão irracional quanto o pretenso asco do
Pastor Feliciano contra relação aos homossexuais, encontrou razão de
ser.


Os donos do Brasil S/A sempre conviveram de forma cínica com a
corrupção, repetindo a bocas miúdas que o país é assim mesmo, que vinha
desde os tempos de Pedro Álvares Cabral. Houve até quem tentasse
explicar com os relatos sobre a trupe do bispo Pero Vaz Sardinha. Dados
históricos dão conta de que escandalizado com a corrupção então vigente,
aquele religioso reuniu homens de bem para pedir providências ao rei de
Portugal. Quando navegava pelas costas do estado das Alagoas, ocorreu
um naufrágio. Os honestos que não morreram afogados teriam sido
devorados por índios antropófagos que viviam naquela região.


A corrupção no Brasil tem dimensões escabrosas, caráter cínico, viés
fulanizado e partidarizado. Mas é fenômeno mundial e está entre as
preocupações da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE). De há muito, a entidade vem condenando o nefasto entendimento de
que a corrupção lubrifica economias. Este GGN veiculou, sob o título
“Pra não dizer que não falei do Moro”, texto de nossa autoria, no qual,
em passant, lembramos as queixas da OCDE no sentido de que até 1998,
apenas 14 países entre seus associados negavam a possibilidade que a
propina paga em diversos países fosse deduzida do imposto de renda.
Aliás, a Alemanha só em 1999 encerrou essa prática em relação ao Brasil.


A propósito, bom lembrar que não obstante a sua posição no ranking
mundial da corrupção, o Brasil, mesmo sem fazer parte oficialmente da
OCDE, ganhou o status informal de membro pleno, devido ao esforço
interno na implantação de leis contra a corrupção, durante os governos
Lula/Dilma. Aliás, em 2007, o Brasil chegou a ser convidado, mas
continua fora, entre outras razões, por haver perdoado dívidas de países
miseráveis como Haiti, Zâmbia, Congo e Tanzânia, fato proibido pela
OCDE. O perdão brasileiro decorre de seu engajamento no Clube de Paris,
cujo fundamento é ajudar nações em penúria econômica.


O concreto é que no Brasil, a corrupção vem sendo imposta pelo
coronelismo eletrônico como fato novo e fora dos limites. O limite
aceito, ao que tudo indica,  seria o dos casos não investigados e ou
arquivados. Leia-se, a elite brasileira aceita a corrupção “com
limites”. Desse modo, até o suposto combate à corrupção virou fraude no
Brasil e a operação Farsa Jato é um emblemático exemplo. Sua principal
estrela é um encantador de idiotas, que escancaradamente apelou aos
quatros cantos pelo clamor da imprensa. A ela, a estrela, não se pode
atribuir que pessoalmente tenha incorrido em crime, propiciando
vazamentos seletivos, criando clima de comoção de forma que o leigo em
direito aceitasse qualquer ilegalidade. E a omissão e conivência quanto a
isso?


A Farsa Jato segue na ilegalidade, na base do prende para investigar.
Recentemente, a revista eletrônica Conjur noticiou que o empresário
Apolo Santana Vieira seria preso preventivamente, por ordem do juiz
Sérgio Moro, que já tinha até expedido o respectivo mandado. Entretanto,
seis dias depois, ao saber que o alvo estaria negociando delação
premiada, Moro teria reconsiderado seu ato. Ora, a prisão preventiva
pressupõe requisitos legais que, uma vez presentes sobrevivem por si.
Não se extinguem de uma hora para outra por simples reavaliação de atos.
Há sem dúvida algo errado ou suspeito nisso. É como se a simples
intenção de delatar extinguisse os pressupostos legais então existentes.


Seria o caso Vieira mais uma prisão necessária? O que se constata é
que até mesmo uma repercussão negativa é capaz de exterminar os
requisitos de uma prisão temporária ou preventiva. Aconteceu com Guido
Mantega, cuja mulher encontrava-se internada para um tratamento de
câncer. Instaurada a comoção social diante da sádica prisão, esta foi
imediatamente revogada. Ora, a prisão era ou não era necessária? Desse
modo, os casos Vieira e Mantega vêm a se somar à tentativa de prisão
ilegal de ex-presidente Lula e as sentenças relâmpagos proferidas em
menos de três minutos de que se tem notícia.


Os casos como tais conhecidos autorizam a concluir que o prende pra
investigar e ou confessar, para espetacularizar ou politizar não é uma
crítica gratuita dos advogados de defesa que vêm oficiando no caso.


E pra não dizer que não falei do Rei Momo, estamos num Carnaval de
cinzas antecipadas. A Escola de Samba Unidos de Serra-Obama desfila para
um júri comprado e viciado; com financiamento obscuro e enredo
dissimulado; bateria desafinada e sem harmonia. Sob o canto de um samba
atravessado, é visível o desencontro dentre mestre-sala e
porta-bandeira, enquanto o presidente da escola é vaiado, e os coitados
formigões de pés descalços empurram o carro do abre-alas!


Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista e advogado,
delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em
São Paulo

Gen. Villas Boas: O país não está à deriva, afundou!, por Armando Coelho Neto | GGN

Gen. Villas Boas: O país não está à deriva, afundou!, por Armando Coelho Neto | GGN



Gen. Villas Boas: O pais não está à deriva, afundou!


por Armando Rodrigues Coelho Neto


Técnica e legalmente, a concessão para a exploração TV é de 15 anos
(rádios dez) renováveis por igual prazo, desde que cumpram exigências.
Entre elas privilegiar educação, cultura nacional e regional, não formar
monopólio ou oligopólio de propriedade, contemplando ainda aspectos de
cunho moral, financeiro e fiscal. Não há notícias da observância desses
critérios. Renovações de outorgas de concessões de TV e rádios continuam
um mistério. Prevalecem interesses políticos, econômicos, religiosos
e...!!!


Com ares de cercadinho ou máfia, o pensamento único da sociedade
brasileira parece imposto de forma coronelesca pelas famílias Abravanel
(SBT), Barbalho (RBA), Dallevo e Carvalho (Rede TV), Civita (Abril),
Frias (Folha), Levy (Gazeta), Macedo (Record), Marinho (Globo), Mesquita
(O Estado de S.Paulo), Queiroz (SVM), Saad (Band), Sarney (TV Mirante?)
e Sirotsky (RBS).


O pensamento único é um câncer a espalhar metástases em redes e
sub-redes impressas, televisivas, radiofônicas e internet. Presumir que
não possam se reunir num mesmo auditório com empresários nacionais e
estrangeiros é ilusão. Pensar que não o fariam, como já fizeram, pra
dizer quem pode ou vai ser presidente da República é ilusão. Isso não é
teoria da conspiração.


Tenho problemas com os patos amarelos por isso, e resolvi traçar
linhas sobre o vergonhoso papel do jornalismo que lhes inspiram. Serve
de exemplo uma tal de Istoé desta semana, com capa e conteúdo
esquizofrênico. Idem Veja, quando apelou para o subjetivismo em vésperas
de eleições com o “Ele sabia”, baseada em disse-me-disse. Não importa
se louco ou bandido, se mediante paga ou tortura. Se alguém delata
alguém é verdade. Em clima de troco ou retorsão, ditos esquerdistas
incorrem no mesmo erro. Desse modo, delação ganha status de sentença,
seja Cunha, Delcídio ou Maníaco do Parque, caso a versão lhes convenha.


Verdades e pós-verdades consagradas, o fato é que o engajamento
político da suposta grande mídia é tão rasteiro quanto uma briga de
jornalecos em currais eleitorais. No passado, a TV Bandeirantes
(campanha presidencial/1989) teve a pachorra de, nos intervalos de um
debate eleitoral, veicular um comercial do cosmético Biocolor. A
propaganda de tintura de cabelo encerrava com a seguinte frase: “Não
importa a cor de seu cabelo, “é Biocolor na cabeça”. O cinismo tirou de
cena os demais candidatos, entre eles Lula.


Com igual vileza, a empresa dos Frias desenterrou um comercial antigo
do jornal Folha de S. Paulo para atacar Lula, então líder nas
pesquisas. Diante da impossibilidade de negar os avanços sociais e
econômicos do País e a magnitude dos feitos de Lula, reexibiu o velho
comercial. A peça publicitária tinha formato de retículas, e uma voz em
off destacava virtudes de um grande político: “este homem criou milhares
de empregos, acabou com a inflação...” Aos poucos, as retículas iam se
aglutinando até formarem o rosto de Adolf Hitler. No final do anúncio
vinha a frase: existe muitas forma de se dizer mentiras e uma delas é
falando só verdades.


Tratam-se de lances mesquinhos que alguns tentam explicar como
conveniência de mercado, coincidência ou teoria da conspiração. Mas
outros não tanto - como a descarada produção de Collor pelos próprios
produtores da TV Globo. Usaram truques de figurino (gravata torta),
maquiagem, suores artificiais para conferir ar cansado. A Globo foi além
e editou o debate em seu noticiário para causar no espectador a
sensação de vitória do seu candidato. Uma edição classificada mais tarde
por Alberico Souza Cruz como comprometedora e burra, pois “Collor
ganharia de qualquer jeito”.


O jornal O Estado de São Paulo assumiu em editorial ter e defender
candidato. A imoralidade eleitoral (ignorada pelos tribunais) quebrou a
paridade de armas entre os concorrentes. As mentirosas capas de Istoé e
Veja com ataques a Lula e Dilma também tentaram influenciar no resultado
de eleições. Numa delas, O PT teve um inócuo e extemporâneo direito de
resposta. Quanto à Veja, no fluxo do pré-golpe, contou com o beneplácito
da justiça eleitoral (minúsculas de protesto). Um engajamento tão
flagrante, de forma a dar suporte factual até para o discutível número
45 (Aécio) inserido na abertura da novela Geração Brasil (Globo).


A dita grande mídia brasileira não faz questão de tentar fingir o
mito da imparcialidade. Exerce com destreza o que a pesquisadora
Cremilda Medina chamou de “Notícia um produto a venda como outro
qualquer”. Sem sorrelfa, cultuam o coronelismo eletrônico e seu caráter
venal. Aquilo que Barbalhos e Sarney promovem em seus redutos, é
protagonizado em escala nacional nas eleições presidenciais. No golpe
(2016) não foi diferente, com a cumplicidade da Operação Farsa Jato, do
ex-stf (minúsculas propositais) e de significativo contingente
parlamentar.


Enquanto a mídia maquia o golpe, não custa lembrar que o doleiro, o
juiz e a mídia do Caso Banestado eram os mesmos da Farsa Jato. A
camarilha golpista desmoralizou-se a si mesma. Junto com ela, a imprensa
e instituições como PF, STF, MPF e, segundo gravações divulgadas, com
“monitoramento” do Exército Brasileiro. Portanto, general Villas Bôas,
com uma mídia dessas, corrija sua frase no jornal Valor Econômico. O
país não está à deriva. Afundou num mar de lama.

E se o erro, a fabulação, o engano revelarem-se tão essenciais quanto a verdade?


E se o erro, a fabulação, o engano revelarem-se tão essenciais quanto a verdade? - 19/02/2017 - Ilustríssima - Folha de S.Paulo





E se o erro, a fabulação, o engano revelarem-se tão essenciais quanto a verdade?
















RESUMO O autor analisa o atual fenômeno de relativização da
verdade à luz de conceitos como o perspectivismo nietzschiano. Ele
sustenta que, num cenário de produção e consumo ininterruptos de
informação, a ambiguidade do conteúdo difundido parece ser pré-requisito
para despertar o interesse do público e fidelizá-lo.




*
Integram o cortejo dos espectros que rondam Donald Trump, presidente dos
Estados Unidos, certas noções vagas como "pós-verdade" e "cultura
pós-factual", as quais, a despeito de sua fluidez, aparecem no debate
público como se fossem conceitos filosóficos.





Ambas designam a poluição da mídia por notícias falsas, ou "fake news",
e geram uma transformação nas relações entre verdade e mentira. Já não
se pergunta simplesmente se uma notícia é falsa ou verdadeira, mas em
que consiste a noção de verdade de uma informação. Ou seja, a própria
ideia de verdade surge como um problema.





Declarações ambíguas, enviesadas, enganosas ou derivadas de enganos são
na prática equiparadas a mentiras inventadas deliberadamente pelos mais
diversos motivos: ganhar dinheiro de anunciantes, alcançar resultados
eleitorais específicos, formar e influenciar correntes de opinião,
induzir metas de políticas públicas e reforçar vínculos de identificação
coletiva, formatando maneiras de pensar e sentir em determinados
segmentos sociais.





Avulta entre essas figuras a "disinformatzya": o objetivo aqui não é
defender uma bandeira particular ou atacar um adversário determinado,
mas causar desinformação. Inundam-se os suportes de difusão de mensagens
com afirmações falaciosas e distorções sensacionalistas no intuito de minar as bases de confiança tanto dos veículos tradicionais de comunicação quanto das diferentes redes informáticas que se aninham na internet.





Trata-se, portanto, de solapar o crédito de informações que se pretendem
objetivas, como se não houvesse um critério para diferenciar a notícia
falsa da verdadeira. O leitor, largado num meio sabidamente repleto de
mentiras, pode nivelar por baixo e duvidar de todos os conteúdos
publicados, ou pode agarrar-se àqueles que lhe pareçam mais apropriados.









Que importa se, objetivamente, era possível medir o tamanho do público
presente à cerimônia de posse de Trump? O governo americano sentiu-se à
vontade para mencionar um número maior, iniciativa que depois uma
assessora do presidente definiu como a apresentação de "fatos
alternativos".





Não existe nesse tipo de atitude nada que se confunda com a postura
filosófica do perspectivismo, segundo o qual o ponto de vista de cada um
interfere no modo de conhecer e apreender a verdade (que existe). Na
era da "pós-verdade", tudo se passa como se a verdade simplesmente não
existisse e todos os pontos de vista tivessem valor idêntico -como se a
suposta "verdade" divulgada pelo governo americano não fosse pior do que
a "verdade" factual apurada pelos jornais tradicionais.





Ora, se todas as "verdades" são igualmente válidas, se cada cidadão pode
escolher o ponto de vista de seu agrado, qual o sentido de um debate
público que busque o esclarecimento? Em outras palavras, está em jogo o
emprego sistemático de técnicas de propaganda para obliterar e
entorpecer a capacidade de pensar criticamente.





O filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), falsamente identificado como
precursor desse relativismo ambientado na penumbra em que todos os
gatos são pardos, foi, em vez disso, o pensador que antecipou um
conflito eventual que pode nos ajudar a compreender as agruras do
momento problemático que atravessamos.





É conhecida sua formulação: e se o erro, a falsidade, o engano
revelarem-se, tanto quanto a verdade, essenciais como meios úteis para a
conservação da vida? Essa pergunta incomoda o pensamento filosófico
desde que Nietzsche teve a ousadia de colocá-la em toda sua extensão e
profundidade.





Ora, os fenômenos que nos confrontam hoje podem ser interpretados na
chave hermenêutica que Nietzsche generosamente nos colocou nas mãos.
Vivenciamos um conflito entre verdade e condições de existência. De que
existência, porém, se trata aqui? Daquela que, como pensava Nietzsche,
sempre se produz em termos de relações de poder, de jogos de força em
que encontram apoio e expressão interesses vitais, desejos, temores,
expectativas de reconhecimento, aspirações de domínio e estratégias de
resistência.





Identifiquemos, então, algumas das variáveis no debate atual sobre a
definição e as consequências das "fake news" para os rumos da cultura e
da política nas democracias contemporâneas.





VERIFICAÇÃO





Com a explosão dos novos meios de comunicação no ambiente digital,
distribuídos pela malha includente da sociedade global em arranjos de
alta capilaridade (rizomáticos, a rigor) e se reproduzindo em milhares
de centros virtuais dificilmente localizáveis e responsabilizáveis (nos
sentidos ético e jurídico), torna-se instável a possibilidade de
verificação isenta de fatos, bem como muito mais dinâmica e inventiva a
produção e a circulação de mensagens, seja qual for o seu teor.





Em sociedades lastreadas na troca de informações e na comunicação
sustentada por tecnologias de ponta, que se autorreplicam e formatam
todos os setores da vida -economia, política, educação, cultura etc.-,
os interesses estratégicos e as condições de existência estão
estreitamente vinculados às possibilidades, tecnologicamente
facilitadas, de "tornar-comum" o conteúdo veiculado, ou seja, de
difundi-lo a um universo amplo de pessoas e de reduzi-lo a sua dimensão
mais simplória, num movimento que cria oportunidades para o vulgar e o
sensacionalista.





Com isso, torna-se possível inserir nessas redes tudo o que for capaz de
abastecê-las com eficiência, passando, então, a fazer parte da
"nutrição cotidiana" de cada um. Não importa tanto se o conteúdo é
"verdadeiro"; importa acompanhar "como a coisa rola". A ambiguidade das
mensagens é condição necessária para manter acesa a avidez por
"novidades", a reiteração da expectativa curiosa em espiral infinita.





Informações transformaram-se em mercadorias intercambiáveis num arranjo
cujos agentes são reduzidos ao denominador comum de consumidores e cuja
lógica operante é a da produção e da circulação mercantil.





Razão pela qual importa menos a pretensão de validade do que a
expectativa de realização de desejo que a informação venha a satisfazer.
Por isso adquire plausibilidade o pseudoargumento: afinal, o que é a
verdade, já que temos bons motivos para descrer de toda verificação
factual?





A imputação de falsidade por parte de um opositor funciona como seu
contrário. Reforça convicções previamente firmadas, preconceitos
arraigados e impermeáveis a razões, mas dóceis às moções afetivas de
autoidentificação.





Daí por que notícias inventadas na esteira do sensacionalismo midiático
não são desqualificadas, mas, ao contrário, reafirmadas e até
estimuladas pelos melhores esforços para desmascará-las; pois o que
importa para os atores e as organizações sociais interessados na
proliferação desse tipo de comunicação é manter acesa a chama da
curiosidade que elas atiçam e alimentar o falatório até suas derradeiras
possibilidades de rendimento.





Uma explicação para isso encontra-se na lógica interna de tais
processos, infensos ao escrutínio crítico, já que o único critério que
conta são os acessos, ou indicadores quantitativos de consumo.
Desenvolve-se uma simbiose perfeita entre a comprovada demanda crescente
dos clientes e o rendimento auferido graças à divulgação de material
publicitário.





Dado que os indicadores de acesso substituem os antigos critérios de
verificação, embute-se o risco de esse novo parâmetro gerar um círculo
vicioso: a quantidade de acessos quase sempre está em relação com o
potencial de atração contido na distorção da mensagem. Isso significa
que o horizonte de avaliação é o do impacto causado.





Para manter vivo o interesse pela informação vale tudo, inclusive
induzir e filtrar seletivamente as escolhas preferenciais do leitor por
meio de algoritmos que "adivinham" sites mais consentâneos com suas
tendências. As possibilidades e limites da apropriação
político-ideológica dos conteúdos, bem como aquelas de seu controle
responsável, são virtualmente indetermináveis, e isso a despeito de
todas as catastróficas consequências que esse desregramento pode causar,
dentre as quais o estímulo ao cinismo irresponsável, o desfecho
eleitoral pernicioso e a destruição sistemática de reputações.





A capacidade de pensar por si e de assumir responsabilidades por
opiniões e ações passa pela antiga e saudável desconfiança e pelo
esforço de nos distanciarmos do que se nos pretende impingir como última
novidade, como sinal dos tempos da "pós-verdade".





É possível que se oculte aí apenas um velho fetiche, uma manobra
diversionista para desviar a atenção e dispensar da reflexão, reforçando
o isolamento narcísico que parece estar vinculado à inclusão aparente e
à conexão em redes de comunicação com alcance planetário.




OSWALDO GIACOIA JUNIOR, 62, é professor titular de história da filosofia contemporânea e ética na

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Darcy denuncia as negociatas da ditadura (e assombra a semelhança com a era Temer)




Darcy denuncia as negociatas da ditadura (e
assombra a semelhança com a era Temer)

darcymae
(Darcy se despede da mãe antes de partir para o exílio, em 1968. Foto: Fundação Darcy Ribeiro)
Foi na ditadura civil-militar, ao contrário do que defendem os
saudosistas que vão às ruas pedir por uma nova “intervenção” (sic) das
Forças Armadas, que a corrupção brasileira se profissionalizou.
Imaginem: uma época em que não se podia denunciar nada só podia ser uma
época de ouro para ladrões de dinheiro público. Segundo o historiador
Pedro Henrique Campos, autor do livro Estranhas Catedrais, o pagamento de propinas a empreiteiras, por exemplo, se consolidou durante o governo militar (leia mais nesta reportagem da BBC).


Um dos últimos membros do governo Jango a deixar o Palácio do
Planalto em 1964, o antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997) denunciou,
após a volta da democracia, as negociatas que se seguiram ao golpe. O
Brasil perdeu terras e empresas públicas, entregues a preço de banana
para os gringos, quando não de mão beijada, como parte do acordo para
derrubar Jango. Assombram a atualidade e a semelhança com o que está
acontecendo agora, com o novo golpe que arrancou Dilma Rousseff do
cargo, inclusive nas ameaças aos direitos dos trabalhadores. (Eu marquei
as semelhanças mais evidentes em negrito).


Leiam algumas das falcatruas denunciadas por Darcy, em ordem
cronológica, no dia em que se completam 20 anos de sua morte. Que falta
ele faz ao país…


***


As negociatas da ditadura*

Por Darcy Ribeiro

1964


A empresa CONSULTEC, organizada por Roberto Campos, Mauro Thibau e
Garrido Torres Lucas Lopes como um grupo de assessoria e de pressão da Hanna Corporation,
que funcionou como principal agência de coordenação e financiamento das
atividades das multinacionais de apoio ao golpe de 1964, se converte
num bloco de poder depois do golpe. Assume, a seguir, o comando da
política econômica do governo militar juntamente com os velhos
testas-de-ferro das empresas estrangeiras. Em consequência, 15 dias
depois do golpe, o Congresso revoga a Lei de Remessa de Lucros. Revoga, a
seguir, a Lei de Estabilidade no Emprego, principal conquista dos
trabalhadores no período getulista.


Roberto Campos, ministro do Planejamento, e Otávio Gouveia de
Bulhões, ministro da Fazenda, negociam a dívida externa brasileira com o
FMI nos termos que os banqueiros ditam. O preço real foi a abertura de
toda a economia brasileira e de todos nossos recursos naturais às
empresas multinacionais e a aceitação das condições ditadas pela Hanna e
pela Amforp para a solução de seus litígios com o governo.


Os norte-americanos socorrem com urgência o governo que implantaram,
mandando entregar imediatamente a Castelo Branco, por conta da Aliança
para o Progresso, 4 milhões de dólares para despesas de algibeira e,
logo depois, mais 883 milhões como empréstimo. Mas começam também a
cobrar, fazendo o governo comprar por 105 milhões de dólares as empresas
que Brizola havia desapropriado por um dólar e que de Jango só
reclamavam 30 milhões.


Roberto Campos, Eugênio Gudin e Otávio Gouveia de Bulhões, montados no poderio da ditadura, dão um aumento de 100% aos militares
e, assim respaldados, ditam a política econômica antinacional e
socialmente irresponsável que jamais haviam podido executar. (…) Roberto
Campos entrega o BNDE a Garrido Torres, com o encargo de matá-lo; para
isto, tenta extinguir os fundos públicos com que operava. Queria
vingar-se dos técnicos que o haviam expulsado do banco como entreguista e
corrupto.


Três decretos marotos conseguem à Light tudo que ela pedia: elevação
de tarifas e sua correção automática, bem como a reavaliação dos seus
ativos convertidos, para nós, em astronômicos passivos.


O governo devolve as refinarias particulares encampadas por Jango.
Sabendo quanto elas pagariam de suborno para não serem encampadas, posso
avaliar o que terão pago para serem desencampadas.


A ditadura regulamenta o artigo da Constituição que garante direitos de greve,
para torná-la totalmente ilegal e punível. (…) O novo ministro do
Trabalho, Arnaldo Sussekind, intervém em cerca de mil sindicatos,
destitui as antigas diretorias legalmente empossadas e dissolve
entidades sindicais de grau superior.


Roberto Campos faz Castelo Branco decretar a anistia fiscal para os brasileiros que repatriassem depósitos clandestinos de dólares no exterior.


A Handson’s Letter de Wall Street chama os brasileiros de “palhaços
do mundo” pela compra da Amforp por 135 milhões de dólares. A compra
negociada por Roberto Campos previu o pagamento de 10 milhões de dólares
à vista, provavelmente o suborno; 24, 7 milhões em vinte anos, a juros
de 6%; e 100 milhões, no mesmo prazo, a juros de 6,5%. Dos 100% de ações
compradas, o Brasil só recebeu 75%; os outros 25% seriam as tais “ações
sem valor ao par”, dadas aqui aos figurões que a Amforp subornou ou aos
diretores cuja dedicação premiou. Assim terminaram as expropriações de
Brizola, as empresas gaúchas da ITT e da BBS.


1965


O Serviço Geológico dos Estados Unidos rouba e entrega à U.S.Steel os
levantamentos realizados por uma empresa brasileira para o governo,
graças aos quais se localizou na Serra dos Carajás uma grande jazida de
calcário e minério de ferro (18 bilhões de toneladas). A empresa
americana, para se apropriar das jazidas, arma uma falcatrua,
apresentando requerimentos de 167 funcionários no seu escritório de
Belém, que incluíam desde porteiro e secretária até o diretor,
requerendo alvarás de exploração de Carajás como uma montanha de
calcário. A maroteira era tão escandalosa que nem o governo ditatorial
pôde aprovar. Mas, ainda assim, concede à mesma United States Steel um
alvará de exploração do minério de ferro de Carajás para exportação, que
eles prometem iniciar imediatamente. Nunca iniciaram, porque o objetivo
era, como sempre, ficar sentada em cima das concessões de mineração que
obtinham. Mas venderam depois, ao próprio governo, esta licença
incumprida, por bom dinheiro.


Dado o desinteresse da Light em expandir e melhorar os seus serviços
de telefone, o governo decide nacionalizá-los. A empresa cede
gostosamente. Pagaram o dobro do que ela pediu originalmente, uma bolada
a pagar em 80 prestações trimestrais a juros de 6% –em dólares.


É promulgada e posta em execução a Lei 4.725, destinada a reduzir os
salários reais através dos critérios de fixação do salário mínimo e de
controle dos aumentos salariais. A nova lei, somada à repressão policial
e à intervenção nos sindicatos, submete o trabalho à servidão frente ao
capital.


A USP e a UFRJ, bem como dezenas de vetustas instituições culturais, veem surgir de dentro delas, espumantes de ódio, intelectuais
repressores que aderem à ditadura e passam a apontar, de dedo duro, a
seus colegas mais competentes como subversivos
. O reitor da
USP, Gama e Silva, se credencia para ministro da Justiça nomeando uma
Comissão Dedo-Duro, que compões laboriosamente uma lista de 50
professores e estudantes dos mais brilhantes e remete aos órgãos de
segurança para serem punidos e demitidos.


Entra em ação o acordo MEC-USAID, ratificado secretamente em 1967
para implantar a reforma universitária, que corresponde ao espírito da
ditadura, privatizando as universidades públicas e
dissolvendo as organizações estudantis. Para isto, o general Meira Matos
junta milicos e deseducadores brasileiros com subintelectuais
norte-americanos contratados pelo mesmo órgão de Washington que
patrocinou o treinamento dos torturadores.


1966


Juracy Magalhães, embaixador do Brasil em Washington, convencido de
que é bom para o Brasil tudo que for lucrativo para os Estados Unidos,
assina um Pacto de Submissão Colonial. Por ele, se dá garantias formais
de que respeitaremos as leis norte-americanas que garantem os
investimentos de suas empresas no Brasil até 20 anos depois de qualquer
futura lei brasileira que venha a afetá-los.


A reforma tributária é posta em execução, impondo o
predomínio da União e reduzindo drasticamente as fontes de recurso dos
estados e dos municípios, que passam, assim, a depender inteiramente das
autoridades federais.


O bando entreguista instalado no poder entrega à Hanna Corporation
–empresa reconhecidamente não-idônea nos Estados Unidos – a Companhia
Vale do Paraopeba, detentora de imensas jazidas minerais– com a qual
João Goulart pensava fazer a independência do Brasil, vendendo minério
exclusivamente para construir siderúrgicas. A Hanna recebe, ainda, a
estrada de ferro que liga Minas ao Rio para exportação de ferro e
manganês, em competição com a Cia. Vale do Rio Doce. Desgastada no uso
mais intensivo para transferir as montanhas de Minas para os Estados
Unidos, a Rede Ferroviária custa ao governo brasileiro, em subsídios
anuais, muito mais do que tudo que a Hanna paga pelo minério. Pelo uso
daquela rede ferroviária de 633km de Belo Horizonte ao porto privado de
Sepetiba, a Hanna pagava uma tarifa de 125 cruzeiros por tonelada,
quando o preço de custo para o governo era de 160 mil cruzeiros. Em
consequência desta outorga, o governo inicia a construção de uma outra
estrada, por nossa conta, a Ferrovia do Aço, para levar o minério de
Minas a Volta Redonda. Nela, já se gastaram mais de 2 bilhões de
dólares, e falta outro tanto. Tamanha dação só se explica porque a Hanna
foi a principal financiadora do golpe de 1964.


1967


Castelo Branco paga a última prestação do preço do golpe de 1964: um
avião militar norte-americano desembarca em Brasília os diretores da
Hanna Corporation que vêm firmar com Azevedo Antunes a ata de fundação
da empresa nominalmente nacional, Minerações Brasileiras Reunidas, a fim
de legalizar a apropriação estrangeira de 720km² das terras de Minas
Gerais, onde se encontra uma das maiores reservas de minérios deste
mundo, que Jango havia recuperado para o Brasil e eles ganharam.


Escândalo nacional com as acusações a Roberto Campos de ter
participado da “vaquinha” que enriqueceu vários membros do governo com a
nova alta do dólar por ele decretada.


O milionário Daniel K. Ludwig –secretariado por Heitor Ferreira de
Aquino, que também foi secretário de Geisel e Figueiredo– compra, com a
ajuda zelosa do general Golbery, um país de 60 milkm², no Amapá e no
Pará, para montar ali um ambicioso projeto madeireiro, minerador e
agroindustrial. Acaba dando imenso prejuízo que, como sempre, o Banco do
Brasil assume e converte em mais uma negociata na forma de empréstimos
subsidiados a milionários nativos.


Eminentes educadoras paulistas como Maria José Werebe, Maria Nilde
Mascelani e Teresinha Framme, em São Paulo, Henriette Amado e diversas
outras no Rio são perseguidas e denunciadas escandalosamente por darem uma orientação esclarecida a seus alunos sobre a matéria sexual.


Um incêndio suspeito destrói os artigos com a documentação e os
registros de terras de índios e a filmoteca do velho SPI, então sob a
guarda da Funai em Brasília.


1969


A Phillips Petroleum consegue de Costa e Silva a construção de um
grande conjunto habitacional , bem em cima de uma jazida de fosforita,
em Olinda, para inviabilizar sua exploração, que era competitiva com a
deles.


1970


Avança o loteamento da Amazônia. Além dos 6 milhões de hectares de
Ludwig, são doados 668 mil à Suyá-Missu, 600 mil à Codeara, 500 mil à
Paragominas e outros tantos à Georgia Pacific, à Bruynzeel, à Volkswagen
e à Robin Mac. Também entram na negociata a Anderson Clayton, a
Swift-Armour, a Goodyear, a Nestlé, a Mitsubishi, a Bordon, a Mappin,
além dos nativos Camargo Corrêa, Bradesco et caterva.


Acelera-se, em consequência, a destruição da floresta amazônica com
drogas desfolhantes, napalm e correntes arrastadas por enormes tratores
de esteira. O programa é esteira. O programa é transformar a selva em pastagens.


É criado o INCRA –Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária–, mas o que se implanta é a anti-reforma pela entrega de glebas quilométricas a grandes empresas para serem afazendadas
à custa do povo. Isto porque as beneficiárias podem deduzir todos os
seus gastos até a metade do imposto de renda que deveriam pagar, mas
embolsam. Incrível, só neste Brasil da ladroagem.


Paulo Freire, exilado, publica nos Estados Unidos sua obra maior: Pedagogia do Oprimido,
uma apreciação crítica de suas práticas de pioneiro da educação de
adultos. Este livro é o texto educacional brasileiros mais traduzido e
que exerce maior influência no mundo. Curioso é que, tal como ocorreu
com Josué de Castro –outro intelectual nosso com grande êxito
internacional, detestado pela mediocridade nativa–, Paulo Freire provoca
a inveja mais odienta de toda a pedagogia fútil e vadia, que nada faz,
mas se engalana com plumas tiradas do nosso grande educador.


É criado o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), destinado a pôr em prática um imenso programa de alfabetização imbecilizadora,
aplicando ao contrário os métodos de Paulo Freire. Somado à repressão
nas universidades, e mantido o ensino fundamental nesta campanha de
alfabetização despolitizadora, a ditadura reduz drasticamente os gastos
com a educação, que de 11,2% di irçamento da União, em 1962, caem para
5,4%.


1971


A ditadura, simultaneamente à liquidação política do Congresso
nacional, o degrada com vergonhosas mordomias para legisladores que não
legislam; o clientelismo de legiões de assessores e serviçais bem pagos e
o faraonismo que converte a Câmara e o Senado –inúteis– nos maiores
edifícios públicos do mundo.


São Paulo, na primeira fase da industrialização pioneira, realizada
pelos Mattarazzo, gostava de se ver como a locomotiva que arrastava o
Brasil, como um comboio de vagões vazios. Com a industrialização
substitutiva, através da implantação de grandes fábricas das
multinacionais, muda de imagem. Começa a ser vista pelo país como a
grande bomba de sucção que nos sangra, para carrear lucros para o
estrangeiro. Com efeito, o intercâmbio entre São Paulo e o resto do
Brasil passa a ser tão desigual que alguns estados planejam criar
reservas de mercado para suas próprias indústrias,  fim de enfrentar o
colonialismo interno, praticado ferozmente pelos gerentes paulistas das
multinacionais.


A exploração dos doentes brasileiros pelas multinacionais, produtoras
de remédios, que controlam a produção e o mercado, chega a níveis tão
altos que provoca, mesmo na ditadura, a provação de um Plano Diretor de
Medicamentos destinado a pôr cobro no escândalo. Mas Wall Street
protesta e o Plano é anulado.


Graças ao cientista Albert Sabin, se verifica que o governo Médici,
além de falsificar os índices do custo de vida para comprimir salários e
de exagerar os progressos da alfabetização, mente também nas
informações relativas ás condições sanitárias da população, declarando
vacinações antipólio que não realizou, o que põe em risco a população
infantil.


1972


A Hanna e Antunes inauguram, na baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro,
um porto próprio, destinado a transportar para os Estados unidos as
montanhas de ferro de Minas Gerais, a fim de constituir, ali, uma
gigantesca reserva que garantirá tanto a prosperidade futura deles como a
nossa pobreza.


*Trechos do livro Aos Trancos e Barrancos – Como o Brasil Deu No Que
Deu, de Darcy Ribeiro, publicado em 1985 pela editora Guanabara

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Por que o governo Temer segue vivo após tantas denúncias? - Cotidiano - Cotidiano

Por que o governo Temer segue vivo após tantas denúncias? - Cotidiano - Cotidiano



Por que o governo Temer segue vivo após tantas denúncias?

Leonardo Sakamoto

Todos os presidentes após a redemocratização poderiam ter
sofrido impeachment. Haveria razões para tanto – ou elas nasceriam pelas
mãos da inventividade política. Isso não aconteceu porque contaram com
o apoio político do Congresso Nacional e o respeito do Supremo Tribunal
Federal.

Um impeachment de Temer é, ainda hoje, algo impensável.
Uma parte considerável dos deputados federais, senadores e da classe
política deposita nele a esperança de que poderá frear, de alguma forma,
a operação Lava Jato, impedindo-os de ir para o xilindró ou devolver
milhões roubados. Menos impensável, mas ainda assim remota, é a chance
de cassação da chapa Dilma-Temer durante a gestão Gilmar Mendes como
presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Até aí, nada de novo.

Mas
pouco se fala da segunda perna desse apoio, que vem de uma parte da
elite econômica. Empresários brasileiros e estrangeiros têm condicionado
seu apoio ao governo Michel Temer à aprovação de reformas que combatem a
crise econômica jogando a fatura no colo dos mais pobres ao mesmo tempo
que usam a própria crise como justificativa a fim de reduzir a parte do
Estado que atende às necessidades da xepa humilde, protegendo os mais
ricos via manutenção de altos subsídios e baixa carga tributária de sua
renda e seu patrimônio.

Esse grupo, na prática, mostra não se
incomodar tanto com a corrupção desde que a missão seja cumprida. Até
porque, pelo que mostram as delações, a lama já chegou ao Pato Amarelo, o
que deve impedi-lo de voar.

Quando a imprensa divulga que um
depoimento de José Yunus, grande amigo de Michel Temer, reforça o
envolvimento de seu ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, em uma
suspeita de falcatrua e joga suspeição sobre o comportamento do próprio
Temer, em uma trama que envolve doleiros, muito dinheiro e Eduardo
Cunha, era de se esperar que os empresários se revoltassem tanto quanto
se revoltaram com as falcatruas do governo do PT. Mas enquanto a
encomenda estiver sendo entregue, ninguém ouve, ninguém fala, ninguém
vê.

Ninguém nem pensa em pedir a cabeça do governo, que poderia
ser entregue de bandeja pelo Congresso Nacional na tentativa de
apaziguar a gritaria na esfera pública, ''num grande acordo'', da mesma
forma que aconteceu com Dilma Rousseff.

Por isso a resposta do
título desse texto não passa pelo que o Congresso Nacional, a cúpula do
Executivo, do Legislativo e do Judiciário, grandes empresários e os
milhões que foram às ruas pedir o impeachment de Dilma Rousseff devem ou
não fazer. Eles seguem tocando suas vidas e perseguindo seus objetivos.
Perde tempo, na minha opinião, quem cobra deles uma ação no sentido de
encabeçar uma ação que deveria estar sendo feita por outros
descontentes.

De acordo com pesquisas de opinião aplicadas sobre
os manifestantes, os perfis dos favoráveis e dos contrários ao
impeachment foram mais parecidos entre si do que com o restante da
sociedade, tornando-os mais próximos de uma elite social e econômica. O
povão, em sua maioria, não foi à rua. Muito menos a maioria dos jovens
que coalharam as cidades brasileiras em junho de 2013, ao contrário do
que bradam organizações que dizem falar em nome deles.

Durante o
processo de impeachment, pesquisas mostraram que as razões pela
insatisfação com o governo Dilma eram diferentes entre os mais ricos
(que eram maioria nas manifestações de rua, reclamavam da corrupção,
defendiam uma redução do Estado menor e tinham natureza antipetista) e
os mais pobres (que passaram a querer sua saída, mas porque a economia
estava ruim e o Estado não estava sendo suficientemente grande para
garantir um colchão melhor de proteção social). Ou seja, a maioria
amorfa em nome do qual tudo é feito, mas que raramente se beneficia do
Estado, continuou onde sempre esteve: trabalhando pelo bem-estar de uma
minoria e assistindo a tudo bestializado pela TV.

A grande
pergunta é se algo (o aprofundamente do desemprego ou uma reforma da
Previdência Social mais dura com os pobres, por exemplo) ou alguém será
capaz de mobilizar o povão para levá-lo às ruas.

Se esse pessoal
resolver dizer basta às castas de políticos corruptos, de elites
econômicas sanguessugas e de demagogos violentos e antidemocráticos,
percebendo que, crise após crise, são eles que pagam o pato num país em
que lucros ficam com o andar de cima e prejuízos com o andar de baixo,
acho que, como já disse aqui, o país entra em nova fase. Se melhor (com a
população sendo protagonista de sua vida) ou pior (com a chegada de um
''salvador'' que, não se engane, podará direitos ao invés de
garanti-los), não saberia dizer.


ConJur - STF paga o pato! Existem mentiras pequenas, grandes e... estatísticas

ConJur - STF paga o pato! Existem mentiras pequenas, grandes e... estatísticas




Por
vezes, dizer que seu argumento está baseado em números parece ser o
xeque-mate de qualquer discussão: “Os números falam por si”. Mas será
que é assim? Acompanhem o que vou contar. O jornal O Globo publicou
matéria com a manchete “Levantamento mostra que 68% de ações penais de
quem tem foro privilegiado prescrevem – Estudo da FGV aponta que no
Supremo condenação só ocorreu em 0,74% dos casos”. Isso gerou um efeito
cascata, um copiando o outro. O Correio Braziliense chupou a matéria e lascou: "Coordenador do Supremo em Números defende restruturação da República". Já a Folha de S.Paulo, de forma espetacular, não fez por menos — lascou um editorial: Supremo não dá conta. No texto da Folha, uma frase: os números são espantosos...! Fiquei eu espantando. Quais números? Onde está a fonte detalhada? Fiquei em pânico. O Brasil está ruindo. Jornal Zero Hora
disse: temos que dar fim ao foro privilegiado. Rádios ofendiam o STF.
Que virou a Geni. Um locutor dizia: assim não dá mais. A culpa é do STF.
Até nos programas de esportes o Supremo apanhou. O próprio professor
Ivar Hartmann, responsável pela aludida pesquisa, deu entrevista na
Rádio Gaúcha (oiçam aqui),
a mais ouvida do Rio Grande do Sul, sobre os números. Chegou a dizer,
por exemplo, que a causa do atraso no julgamento de Renan Calheiros não é
o acúmulo de processos no STF, e sim falta de vontade política. E que,
em alguns processos, o STF leva anos; em outros, é rápido. Só que isso
já não é número. É opinativo, pois não? Mas, ao mesmo tempo, as matérias
e a entrevista mostram que o STF tem no acúmulo de feitos o motivo
central da lentidão, ao ponto do busílis proposto ser “o fim do foro
privilegiado”. Algo como “acabando com o foro, terminaremos com a
impunidade”.

Assustei-me com a contundência. Resultado: eu e minha
equipe passamos a tarde inteira de terça-feira (21/2) ligando para a
FGV-Rio (a tarde inteira é literal, porque ligamos para cinco números
durante horas) e ninguém de lá pode falar da pesquisa. Tentamos falar
com o responsável, professor Hartmann, e uma moça da FGV disse que não
estava autorizada a fornecer o contato. Uma funcionária da FGV mandou um
conjunto de links. No anexo, os mesmos links que estão no site.
Respondemos que esses links não davam pistas sobre as matérias
jornalísticas que estão abalando o país. Então a mesma moça repassou a
reclamação ao próprio professor coordenador. Até o fechamento desta
coluna, não houve retorno ou resposta.

Vejamos. Os jornais publicam números e não pedem o relatório, a fonte? Querem ver? O jornal O Globo dá como fonte a FGV. Fui ao site da FGV e este remete a um link de O Globo. Círculo vicioso. Quem quer saber o que a FGV relatou ao O Globo deve ir para a FGV... que remete de volta para O Globo. Genial, não?

Atenção,
uma nova pista. Quarta-feira (22/2) pela manhã, um dos meus
pesquisadores ligou de novo para a FGV. Falou com Daniel (fone final
300), da equipe do Supremo em Números, que disse: o relatório
que trata do foro privilegiado não foi publicado e não existe data para
publicação. "São dados adiantados para a mídia de um relatório muito
maior." Fantástico, não? Joga-se dados ao vento e descobre-se que se
tratam de dados “adiantados” à imprensa. Pergunto: como avaliar a
correção das conclusões "pessoais" do coordenador? Pior: a imprensa nem
pediu comprovação. Tudo vai muito mal, mesmo.

Portanto, em face da
limitação de dados, o máximo que conseguirei fazer nos limites desta
coluna é tentar comentar alguns dos números apresentados pelo jornal O Globo (a holding
da notícia) e republicados por centenas de veículos. E eu que achava
que o doutrina jurídica é que ia mal... Na imprensa, deve haver, como no
Direito, livros facilitadores; resumos de resumos. Isso pega. E se
espraia. Imaginem se eu ligasse para O Globo e dissesse: meu
projeto no Núcleo de Estudos Hermenêuticos chegou à conclusão que
87,538% das decisões nos tribunais superiores não citam doutrina ou só
citam doutrina manualesca ou facilitada/resumida (inventei agora isso). E
O Globo tascasse a manchete a ser chupada por Folha, Correio etc.:
“Números mostram mediocridade nos acórdãos”. Já um jornal mais ousado
diria: “Números de pesquisa mostram a necessidade de queimarmos os
manuais...”. Compreendem o perigo disso?

Benjamin Disraeli um dia
disse que existem mentiras pequenas, grandes e... estatísticas. Parece
correto, pois não? Como se vê, a partir dos dados “adiantados” foi dada a
largada para propagar a ideia de que a impunidade está associada à
prerrogativa de função e que a rapidez e eficiência da Justiça ocorre
somente na primeira instância. Bingo! Em um país em que, pateticamente,
agências de viagens de Curitiba organizam visitas à Justiça Federal para
que a horda de fiéis possa conhecer de perto a nossa Meca da antítese
da impunidade [1], o problema desse enunciado performativo “impunidade” logo se transfere e se reduz ao STF e ao chamado foro privilegiado.

Vejamos, então. Em relação aos processos criminais no STF, afirma O Globo
que “(68%) prescreveram ou foram repassados para instâncias inferiores
(...)”. Aqui o equívoco é duplo. Primeiro, a notícia confunde — ao que
parece para inflar o percentual — prescrição com remessa para outra
instância, situações completamente diversas. Prescrição é uma coisa;
declinação de competência é bem outra. Acaciano. O segundo problema diz
respeito à omissão dos percentuais específicos. Afinal, qual o
percentual prescreveu? A reportagem não diz. Para tornar o percentual
significativo, como visto, soma percentuais que não guardam qualquer
relação. Observa-se que essa mesma estratégia é utilizada para chegar ao
índice de 38,4% de inquéritos prescritos — ou repassados para
instâncias inferiores. Mas afinal, quantos prescreveram? 1%? 10%? 30%?

Como é possível que se joguem dados “adiantados” (sic)
de extrema gravidade, dando possibilidade a tantas ilações e críticas
ao STF? Por exemplo, juntar absolvição com pedido de arquivamento do
PGR, que é irrecusável, parece uma irresponsabilidade, além do problema
de somar isso tudo com declínio de competência por perda de mandato. Os
“dados adiantados” sequer dizem quantas denúncias foram oferecidas ou
rejeitadas, além de dividirem o número de denúncias recebidas com o
total de inquéritos abertos no período.

O que importa é que a reportagem, porque não dispunha dos dados específicos, parece ter sido uma barrigada, fruto de um press release. Sorry, mas isso tem de ser dito. O país está ardendo e alguém põe gasolina.

A notícia de O Globo
(chupada por todos os demais) conclui que é “muito mais vantajoso para
os réus serem julgados no Supremo”. Vantajoso em relação a que? As
faculdades de Jornalismo não ensinam o repórter a questionar? Ora, para
fazer tal afirmação, deve-se estabelecer o comparativo em relação ao que
é mais vantajoso. Não se pode esquecer que o foro dito “privilegiado”
acaba por afastar dos ocupantes de tais cargos uma das principais
garantias constitucionais, o duplo grau de jurisdição. A afirmação toma
por base a comparação com o primeiro grau? Acredito é essa a intenção. Mas aqui, pergunto: a situação é — ou seria — diferente na primeira instância? Esses números não foram facultados.

Não
nego — e seria tapar o sol com a peneira ignorar isso — que existem
muitos abusos. Existe uma enorme quantidade de cargos públicos que não
deveria receber o status de foro privilegiado. Mas, a partir
disso, concluir que um regime republicano seria incompatível com esse
instituto é o mesmo que fazer terra arrasada de nossa complexa
engenharia constitucional. Ou alguém acredita que seria interessante
para a estabilidade política e o equilíbrio entre os Poderes ver o
ministro da Justiça julgado pela primeira instância? Foro de
prerrogativa de função existe em razão do cargo, e não em razão da
pessoa. E mais, se a pesquisa da FGV (ou a reportagem de O Globo)
dá a entender que a impunidade se concentra principalmente no STF e que
na primeira instância os processos caminham de maneira mais eficiente, estaríamos autorizados a transferir tudo para a primeira instância?

Todavia,
como um bom conservador institucional, que assume muita prudência ao
tratar do funcionamento de nossa engenharia constitucional, prefiro
analisar com maior cuidado os números — no dia em que forem
disponibilizados.

Para mostrar que os números (sic) não falam por si e que os desvios que ocorrem em nosso sistema de Justiça são muito mais complexos do que os dados adiantados
pela FGV, podemos iniciar perguntando pelos casos de investigação
criminal de homicídios que ocorrem pelo país (isso é primeira
instância)[2].
Poderia falar que somente uma percentagem de 5% a 8% dos assassinos
foram condenados pela Justiça em primeiro grau (vamos comparar com o
percentual de condenações do STF?). Também em casos de corrupção, dados
apresentados pelo CNJ em 2013 mostravam que, no período de 1º de janeiro
a 31 de dezembro de 2011, foi declarada a prescrição de 2.918 casos
(vamos comparar isso com o STF?). Além disso, conforme a mesma pesquisa,
em 2012 ocorreram 1,4 mil denúncias por crimes de corrupção e lavagem
de dinheiro. Dos 422 julgamentos de pessoas acusadas por esses crimes,
em casos que envolviam 609 réus, foram condenados em definitivo 180 réus
[3] (isso é pouco ou muito?).

É
claro que a questão do foro decorrente do cargo (e não da pessoa) deve
ser debatida e pensada com maior racionalidade. Mas não creio que esse,
mesmo da forma que esteja, seja o responsável pela impunidade. A
realidade indica que esses processos demorariam ainda mais caso
iniciados no primeiro grau, onde os juízes estão tão ou mais
assoberbados de trabalho que os tribunais. Ainda, o destino final desses
processos seria, por via de recursos, os mesmos tribunais. Bingo. Temo
também que com a pulverização de demandas por todo o território nacional
a publicidade que ora se dispõem também se desapareça na imensidão,
juntamente com a possibilidade do pouco controle social que se dispõe
hoje. Tenho certa dificuldade em admitir que juízes de primeiro grau
passem a julgar parlamentares, governadores, juízes, promotores.
Imaginem o juiz julgar o promotor com quem trabalha. E o juiz ser
julgado por seu colega.... Ou alguém sinceramente acredita que os juízes
de primeiro grau sofrerão menos pressão ou estarão mais capacitados a
não serem influenciados por ela? O problema da impunidade não é o foro,
que é garantia do cargo. O problema é tudo o que venho escrevendo há
anos nesta coluna e em diversos outros lugares.

Outra coisa: a
reportagem induz a que se acredite que pequeno percentual de condenações
é sempre ruim. Eficiência do Judiciário quer dizer condenar mais?
Depende. Com quais dados concretos se pode afirmar ou fazer alguém a
acreditar que isso é correto? Se os números ajudam a enxergar uma
pequena parte da realidade, por outro lado eles também podem contribuir
para ocultar uma parte significativa do problema
.

Por
exemplo, por que o percentual de 5,8% de abertura de processo penal e
0,74% de condenação no STF é pequeno (lembre-se que, em coisas mais
graves como homicídios, o percentual não é maior do que esse!)? Alguém
examinou o tipo de crime? Alguém se deu conta de que, dos 404 casos,
136, ou seja, mais de 25%, eram de crime ambiental? Foi levado em conta
que é o PGR que requer o arquivamento? Foi arquivado por qual motivo?
Pedido do MP por ausência de elementos? Nesse caso, havia outra conduta
adequada? E quem mandou esse material para o MP? Ou foi o próprio MP
quem investigou mal dando azo a esse número de arquivamentos? Onde estão
esses dados? Ah, estão em uma pesquisa maior, responde Daniel da FGV.
OK. Então que seja mostrada em detalhes, para evitar manipulações e
conclusões apressadas. Tudo o que o Supremo em Números diz pode estar correto, desde que demonstrado. E sem as opiniões pessoais baseados em “dados adiantados” à imprensa.

Veja-se: o dado considerado espantoso pela Folha de S.Paulo (5,8%),
mesmo que considerado baixo, pode ser visto por um ângulo mais adequado
e explicado pela própria natureza dos fatos. Não se trata de descaso ou
omissão. Pelo contrário, pode demonstrar a extrema cautela com que os
processos criminais são tratados pela corte suprema — o contrário do que muitas vezes ocorre no primeiro grau com recebimentos de denúncias sem compulsar os autos.
Duvido que pesquisadores e jornalistas prefeririam ser denunciados e/ou
processados no primeiro grau, se pudessem ser processados pelo STF...
Na verdade, esse percentual “pequeno” (sic) pode demonstrar que
na maioria dos casos o Ministério Público não possui elementos para o
oferecimento de denuncia ou para pedir a condenação. São notitias criminis mal formuladas, muitas vezes com nítidos propósitos político-eleitorais.

A
coluna tem limites de espaço. Gostaria de ter falado sobre a pretensão
do ministro Barroso de fazer uma interpretação restritiva do foro, tese
que, ao meu ver, transforma mais uma vez o STF em legislador. Mas isso
fica para outra coluna. Só para adiantar — e me louvo dos números da
FGV: os recursos (e não as ações originárias) representam 92% dos
processos em curso no STF e são de responsabilidade de 10 atores
(partes), 9 dos quais ligados ao Executivo Federal[4]. Temos que enfrentar essa situação, cuja solução certamente será muito mais eficaz do que o sacrifício do foro especial.

Precisamos
falar sobre esse tema, sim. E louvo o esforço da FGV. Mas, por vezes,
ela exagera. Temos de falar sobre isso com todos os dados disponíveis,
caso contrário estaremos lendo a cada mês uma nova pesquisa do STF ou do
STJ em números, e lá vêm os meios de comunicação — com os conhecidos
filósofos contemporâneos (alemães e norte-americanos) Merval Birnbaum,
Christy Wolf, Jorge Ontaim e Ger Son. Kabina gritando que “assim não dá
mais”. E os radialistas pedindo ditadura, porque assim não dá mais. E o
STF pagando o pato.

E as pesquisas? Acreditarei nelas quando
estiverem eivadas do “fator ácaro”, em que a especificidade dos casos
apareça em suas entranhas, para que não se confunda alhos com bugalhos.
Desculpem-me, mas parece que o Brasil vive algo como no filme Tanga (deu no New York Times?),
dirigido pelo inesquecível Henfil. Para quem não viu, no filme o
sujeito só acreditava nas coisas do mundo se saísse a notícia no New York Times. No Brasil, sem o Supremo em Números
da FGV, parece que nada existe. Tempos atrás, com base em números,
alguém (que não da FGV) disse que o STF não era ativista. Peguei os
números e mostrei exatamente o contrário. Digo isso só para exemplificar.


que cuidar com os números. Não dá para “adiantar dados” desse modo.
Números, estatísticas, médias... são coisas complexas que podem
machucar. Repito aqui uma blague que gosto de fazer acerca da
manipulação de números e estatísticas: dou um tiro em um pato e erro um
metro à esquerda; em seguida, atiro de novo e erro um metro à direita.
Na média, acertei o pato.

Desde o dia em que alguém disse que
decidir é primeiro achar a solução e depois buscar uma justificação,
passamos ao império dos raciocínios teleológicos. No caso, primeiro
culpo o STF, e depois busco as razões. Ou seja, se quer produzir um
resultado, faça a conclusão e depois arrume os fundamentos. Vendo o modo
como isso se multiplicou pela imprensa, posso afirmar que, por vezes, a conclusão antecipada é tão contundente que já ninguém dá bola para os fundamentos.

No novo livro que sai em março pela Livraria do Advogado (Jurisdição e Hermenêutica – Diálogos com Lenio Streck, em que respondo a 130 perguntas de quatro entrevistadores), chamo a isso de Target Effect (Efeito ou Fator Alvo). O atirador dispara a flecha. Depois vai lá e pinta o alvo. Bingo. Não errará nunca.

Como falei, a FGV pode estar correta, desde que os números assim demonstrem de forma bem explicadinha.


Moro ocultou o crime da mula? — Conversa Afiada

Moro ocultou o crime da mula? — Conversa Afiada



Além de Padilha e Temer, denúncia de Yunes compromete Moro


Jeferson Miola


O depoimento que José Yunes prestou ao MP assumindo-se como simples
“mula” para transportar os R$ 4 milhões da propina da Odebrecht
destinada a Eliseu Padilha é demolidor para o governo golpista.


A denúncia do amigo de mais de meio século do Michel Temer põe luz
sobre acontecimentos relevantes da história do golpe, e pode indicar que
os componentes do plano golpista foram estruturados em pleno curso da
eleição presidencial de 2014:


1. a Odebrecht atendeu o pedido do Temer, dos R$ 10 milhões [os R$ 4
milhões ao Padilha são parte deste montante] operados através de Lucio
Funaro, ainda durante o período eleitoral de 2014;


2. mesmo sendo o candidato a vice-presidente da Dilma, na campanha
Temer trabalhava pelo esquema do Eduardo Cunha [que na eleição apoiou
Aécio Neves, e não a chapa do seu partido, o PMDB], que tinha como meta
eleger uma grande bancada de deputados oposicionistas ao governo Dilma;


2. a organização criminosa financiou com o esquema de corrupção a
campanha de 140 deputados para garantir a eleição de Eduardo Cunha à
Presidência da Câmara;


3. Lúcio Funaro, tido até então exclusivamente como o “operador do
Eduardo Cunha”, na realidade também atuava a mando de Eliseu Padilha e,
tudo indica, de Michel Temer. José Yunes diz que Temer sabia tudo sobre o
serviço de “mula” que Padilha lhe encomendara;


4. em janeiro/fevereiro de 2015, na disputa para a presidência da
Câmara, embora em público Temer dissimulasse uma posição de
“neutralidade”, nos subterrâneos trabalhou pela eleição do Cunha;


5. mesmo sendo vice-presidente da Presidente Dilma, o conspirador
conhecia o plano golpista desde sempre, e participou desde o início da
conspiração para derrubá-la.


O primeiro passo, como se comprovou, seria dado com a vitória do
Eduardo Cunha à presidência da Câmara para desestabilizar o ambiente
político, implodir os projetos de interesse do governo no Congresso e
incendiar o país.


A denúncia de Yunes reabre o questionamento sobre a decisão no mínimo
estranha, para não dizer obscura e suspeita, do juiz Sergio Moro.


Em despacho de 28/11/2016, Moro anulou por considerar “impertinentes”
as perguntas sobre José Yunes que o presidiário Cunha endereçou a
Temer, arrolado como sua testemunha de defesa.


Moro tem agora a obrigação de prestar esclarecimentos mais
convincentes e objetivos que o argumento subjetivo de “impertinência”,
alegado no despacho.


Caso contrário, ficará a suspeita de ter prevaricado para proteger
Temer e encobrir o esquema criminoso que derrubaria o governo golpista.


Afinal, sabendo do envolvimento direto de Michel Temer no esquema criminoso, Moro teria agido para ocultar o fato?


A cada dia fica mais claro que o Brasil está dominado pela cleptocracia que assaltou o poder de Estado com o golpe.


(Assistir, na TV Afiada, a "São duas quadrilhas - a que assaltou o poder e a quadrilha dos cumplices".)


O melhor que Temer faria ao país seria demitir toda a corja corrupta –
a começar pelo Eliseu Padilha – e renunciar, porque perdeu totalmente a
confiança política e a credibilidade.


A permanência ilegítima de Temer na cadeira presidencial é um
obstáculo instransponível à recuperação do Brasil, que assim seguirá o
caminho acelerado do abismo.


Lula ministro e o silêncio do Supremo |

Lula ministro e o silêncio do Supremo |

  

Thomaz Pereira



 Supremo encerrou 2016 sem responder
algo fundamental: Lula podia ser ministro? Aparentemente, o tribunal
nunca responderá essa pergunta.



A nomeação do ex-presidente Lula foi, para alguns, a última cartada
política para salvar o governo Dilma. Para outros, uma manobra para
evitar que as denúncias contra ele fossem julgadas pelo juiz Sérgio
Moro. Os livros de história talvez registrem a decisiva suspensão de sua
nomeação por uma liminar do ministro Gilmar Mendes. Os livros de
direito constitucional, porém, nunca poderão dizer se a liminar
representava ou não o entendimento do Supremo.


Com o recebimento da denúncia e o
posterior impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ato que nomeava
Lula ministro-chefe da Casa Civil deixou de existir, e Gilmar Mendes
declarou a perda de objeto dos Mandados de Segurança (
34.070 e 34.071) que questionavam sua nomeação. Existiam também duas ADPFs (390 e 391),
de relatoria do ministro Teori Zavascki, ambas indeferidas liminarmente
sob o argumento de, em vista da subsidiariedade, não ser esta a via
adequada.



A ação que questionava o ato específico perdeu o objeto, a ação que
discutia a tese em abstrato foi indeferida por ser subsidiária às ações
que perderam o objeto e, com isso, a decisão que impediu a posse de Lula
desapareceu do mundo jurídico sem nunca ser discutida pelo plenário do
Supremo. Existiu apenas pelo tempo suficiente para gerar seus efeitos,
no direito e na política, subsistindo agora apenas na história.


O que tornou possível o silêncio do plenário sobre decisão individual tão importante?


O Supremo não é inerte, julga aquilo que quer, quando quer, na via processual que der. No caso, esse cálculo deliberado do timing se
expressou tanto pela ação individual de Mendes, quanto pelo tratamento
que os processos envolvidos receberam pelo plenário. Foi da interação de
ambos que se produziu o problemático silêncio institucional.



O roteiro já é bem conhecido.
Mandados de Segurança e ADPFs são propostas simultaneamente a cada nova
crise política, são distribuídas para ministros diferentes, e
liminares são concedidas e ações são indeferidas conforme a subjetividade dos relatores.


No caso de Lula, como o ato que o nomeou não existe mais, não
subsiste a via do mandado de segurança e, como essa existia antes, não
cabia ADPF. No caso do afastamento de Eduardo Cunha da presidência da
Câmara, pedida em uma cautelar em uma ação penal e em uma ADPF, apesar
de concedida a cautelar (e apesar da cassação do mandato de Cunha)
subsiste a ADPF para decidir a questão em tese (mesmo que, em concreto,
diga respeito agora a situação de Renan Calheiros, que não foi sequer
discutida no âmbito da ação penal contra ele).


A liminar de Gilmar Mendes, suspendendo a posse de Lula, é prima-irmã das controversas decisões monocráticas do ministro Marco Aurélio, suspendendo Renan Calheiros da presidência do Senado, e do ministro Luiz Fux, devolvendo à Câmara o pacote de medidas anticorrupção.


No caso de Mendes, o Supremo deixou a ação perder o objeto sem se
pronunciar sobre o caso; no caso de Marco Aurélio, o Supremo se
pronunciou imediatamente para cassar a sua liminar; no caso de Fux
ninguém sabe quando (ou, se) o plenário se manifestará sobre o caso.


Em todos os casos, o problema comum:
um ministro dando uma ordem de grande impacto político, sem apoio na
jurisprudência do tribunal ou em votos dos demais ministros, diante de
um tribunal que se mostra incapaz, ou sem vontade, de se pronunciar
coletivamente sobre o tema.



No caso da nomeação de Lula, é verdade que Mendes pode ser criticado
por ter concedido a ordem, mas a ausência de uma posição coletiva do
tribunal naquele momento – e, provavelmente, para sempre – não é apenas
sua responsabilidade.


Mendes chegou a submeter a liminar à
apreciação do plenário. É verdade que isso ocorreu apenas alguns dias
depois da Câmara votar a abertura do impeachment. Mas, diante disso, foi
o Supremo que optou pelo silêncio.
A liminar foi pautada, mas os ministros decidiram que seria melhor julgá-la conjuntamente com as ADPFs sobre o mesmo tema.
As mesmas ADPFs que posteriormente foram indeferidas liminarmente por
falta de adequação, enquanto o impeachment se tornava um fato consumado e
o Mandado de Segurança contra a nomeação de Lula perdia o objeto.



Entender o funcionamento do Supremo exige mais do que compreender
suas decisões. É importante também compreender seus silêncios. Mendes
falou mais alto ao suspender a nomeação, mas o silêncio do tribunal que
se seguiu é ensurdecedor.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

"Não existiria Bolsonaro como opção viável sem a Globo"

Diário do Centro do Mundo "Não existiria Bolsonaro como opção viável sem a Globo", diz o sociólogo Jessé Souza



“Não existiria Bolsonaro como opção viável sem a Globo”, diz o sociólogo Jessé Souza




“O público não é imbecil, ele é tornado imbecil pela mídia comprada,
direta ou indiretamente, para fazer este papel”. A sentença é do
sociólogo Jessé Souza, ex-presidente do Instituto de Pesquisas
Econômicas Aplicadas (Ipea).


Autor de “A tolice da inteligência brasileira” e “A radiografia do
golpe”, Jessé explica na entrevista a seguir, concedida ao jornalista Paulo Henrique Arantes,
como e por quê pregadores do ódio ganham espaço no mundo, o papel da
Globo no fenômeno Bolsonaro e a maneira como o capital financeiro se
apossa do estado.


Por que a extrema-direita ganha espaço no mundo?


Eu acho que o avanço da direita tem a ver com uma relação de forças
que é internacional. O capitalismo financeiro cria uma nova relação com a
política que é desvalorizada para ser capturada. A política sempre foi
influenciada pelo dinheiro, obviamente, mas você tinha contrapesos
antes, os quais você não tem mais. O capital financeiro age globalmente,
planetariamente, e a reação a ele é nacional, local, fragmentada,
frágil.


O golpe no Brasil teve uma articulação internacional, foi o interesse
do capital financeiro em se apropriar de tudo que possa rapinar:
pré-sal, Petrobrás, destruir o capital tecnológico de empreiteiras,
orçamento público, etc. Tudo com ajuda nacional da mídia e dos seus
sócios internos. Dentre eles o aparelho jurídico do Estado que funcionou
e funciona, com ou em consciência disso, como “advogados do capital
financeiro” internacional.  O capital financeiro quer uma captura direta
da política e do Estado.


O primeiro motivo é que a própria realização de lucro do capital
financeiro exige e vai exigir cada vez mais desigualdade. Isso reflete
numa nova forma de expropriação do trabalho coletivo que é via orçamento
– aliás pago pelos pobres e apropriado pelos rentistas -, e é
precisamente o que acontece no Brasil, o golpe foi feito para isso.
Agora, inclusive, a ação do capital financeiro ficou mais nítida no
Brasil do que em qualquer outro lugar.


Como o capital financeiro se apodera da política?


Quando ele desvaloriza a política, as instituições políticas, usando a
mídia e a balela da “corrupção seletiva”, só dos políticos, escondendo a
corrupção legal e ilegal do mercado que compra direta ou indiretamente a
mídia e a própria política. Nesta quadra histórica, o dinheiro está se
apropriando da política completamente.


A própria linguagem do dinheiro criminalizou a política. O Dória no
Brasil é o melhor exemplo disso, e o Trump nos EUA, quando diz: “você
deve me eleger porque eu não sou político”. Você só pode dizer isso
porque a “corrupção real”, que é a do mercado, por meios legais e
ilegais, é tornada invisível pela mídia.


A base de tudo tem a ver com isso: você tem que imbecilizar o
público. O público não é imbecil, ele é tornado imbecil pela mídia
comprada direta ou indiretamente para fazer este papel.


O populismo de direita que vemos hoje crescer no mundo todo carrega o risco de um novo fascismo?


O fascismo assumiu a forma que assumiu nos anos 30 pelas
circunstâncias históricas. Eu acho que o que está acontecendo agora é
sim uma forma de fascismo. Ele não precisa assumir a forma que assumiu
na década de 30. Hoje ele exerce mais uma violência simbólica,
“imbecilizando” o público, por exemplo, ao invés de usar 
majoritariamente a violência física, como o antigo fascismo, embora a
violência física seja utilizada hoje em dia também.


Esses novos líderes, todos eles, têm a ver com a reação dos
perdedores do capital financeiro que são a imensa maioria. O Bernie
Sanders foi uma reação racional, que conseguiu forte penetração na
juventude intelectualizada. O Trump é a resposta menos inteligente,
emotiva, que pede um “bode expiatório”, lá os mexicanos e aqui os pobres
beneficiados pelo PT, o ódio, é a linguagem fascista sobre o medo. É a
versão que está ganhando aqui.


Por que o discurso populista de direita, que prega o ódio, alcance tanta receptividade?


A base do fascismo no Brasil é a classe média. A mídia manipula o
falso moralismo dessa classe para que sirva de “tropa de choque” dos
interesses inconfessos das elites. O grande elemento aí, que é sempre
esquecido, é a mídia. A mídia é o partido da elite que rapina o país.


A mídia representa, antes de tudo, interesses, mas “tira onda” de
neutra. Como esses interesses elitistas são difusos, a mídia concentra e
sistematiza esses interesses e dá boca para eles. O capitalismo, o
dinheiro, não tem boca – a mídia é a boca do dinheiro, então ela vai
manipular o povo a partir disso.


Não há um papel positivo na atuação da mídia?


Não sei se concordo contigo. De que papel e de que mídia você se
refere? Não existiria Bolsonaro como opção viável sem a Rede Globo. Você
tem que lembrar, apenas para ficar num único exemplo que pode ser
multiplicado milhares de vezes, como eu me lembro, do jornalista Merval
Pereira, no jornal da “Globo News”, falando que vazamento ilegal não é
nenhum problema real, que isso é “normal” e acontece sempre – imagine
coisas assim ditas 500 vezes ao dia.


Como não existe contraposição de opiniões, você vai criando um
terreno favorável a preconceitos contra os direitos individuais e,
portanto, contra a própria democracia. Quando você cria o terreno, fica
fácil para um cara como o Bolsonaro entrar, pois ele vai ocupar um
espaço que foi “construído” para ele.


É a mesma coisa do Trump. Você criou esse discurso virulento com a
criminalização da esquerda. Você criminaliza e torna suspeito todo
discurso que tenta proteger os mais frágeis. E quando você criminaliza
esse discurso, você abre espaço para a violência explícita. E quem fez
isso foi a imprensa, não o Bolsonaro.


Dias atrás, outro exemplo entre milhares, eu vi, também na “Globo
News” – que a classe média feita de tola assiste massivamente – a turma
de “analistas”  dizendo no Jornal das Dez que foi Cabral quem quebrou o
Rio. É uma deslavada mentira. Quem quebrou o Rio foi a mídia, comandada
pela Globo, associada à Lava Jato, que destruiu os empregos da Petrobrás
e de toda sua cadeia produtiva que é vital ao Rio.


Foram bilhões de reais e milhões de empregos perdidos. Depois você
diz que foi a propina do Cabral. É claro que Cabral perdeu a noção das
coisas. Mas o que ele roubou é uma gota nesse oceano. É assim que você
produz uma fábrica de mentira cotidiana. O público não tem defesa contra
isso.


Alguns políticos evangélicos não se enquadrariam entre os populistas de direita?


É claro que sim, mas eu acho que temos de separar muito bem essas
coisas. O fato de esses indivíduos serem demagogos de direita não
significa que toda a clientela evangélica o seja. Ela está sendo
obviamente cooptada, de novo pelo trabalho da imprensa.


Como esses evangélicos são de classes populares, isso vira mais um
preconceito da classe média contra as classes populares, contra a
“burrice” das classes populares etc. Isso é uma coisa ruim, e falsa: em
termos de inteligência, a mais burra, melhor, a mais feita de tola de
todas as classes foi a classe média, que a partir de agora vai ter
obrigatoriamente de pagar muito mais que pagava antes por tudo. Já está
acontecendo.


Para você apoiar a destruição do Estado via captura do orçamento para
o rentismo e a privatização, agora muito mais cara, dos serviços que o
Estado presta, você tem que ser uma entre duas coisas: rico ou otário. É
essa a questão que as pessoas que têm que responder sem medo e com
sinceridade.


Mais uma vez: as pessoas não nascem tolas, elas são feitas de tolas. E
para mim a fábrica da tolice no Brasil é uma mídia que se apresenta
como neutra e “serviço público” para, sorrateiramente, destilar seu
veneno todo dia. Ela ganha dinheiro e poder com isso e representa os
interesses de uma elite predatória.

Economista alerta para risco real de Brasil se tornar uma Grécia

Economista alerta para risco real de Brasil se tornar uma Grécia



Economista alerta para risco real de Brasil se tornar uma Grécia

Professora do Instituto de Economia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro avalia que o risco de o Brasil viver uma
situação similar à vivida pela Grécia é real

 
Eduardo Maretti, RBA
A estimativa do Banco Mundial de que a crise
econômica brasileira pode levar, ou devolver, numa projeção mais
pessimista, até 3,6 milhões de cidadãos a um patamar abaixo da linha de
pobreza até o fim de 2017 pode impressionar, mas não é uma surpresa.
Porém, a causa não é só a crise. Aliado a ela, cumpre papel importante
para a previsão o desmonte das políticas públicas. Juntos, os dois
fatores têm o potencial explosivo não só de consolidar, como também
agravar a previsão e aumentar a tensão social.
De modo geral, as previsões não são nada otimistas.
O mercado projeta que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça apenas 0,5%
em 2017. A professora Esther Dweck, do Instituto de Economia da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e secretária de Orçamento
Federal entre 2015 e 2016 avalia que o risco de o Brasil viver uma
situação similar à vivida pela Grécia é real. “Não estou nem um pouco
otimista. Se o país crescer 0,5% este ano, o desemprego aumenta. Precisa
crescer 2%, 3% para ter uma queda de desemprego razoável. A Grécia foi
proibida de fazer política anticíclica pela Troika (União Europeia,
Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional). No nosso caso,
estamos abrindo mão pelas políticas de destruição do nosso sistema de
bem-estar social e da indução do desenvolvimento”.
Entre outras consequências, os oito anos de
austeridade fiscal imposta pelo sistema financeiro à Grécia levou a uma
redução de cerca de 30% do PIB do país. Com isso, o desemprego está há
cinco anos acima dos 20%, com impacto dramático sobre os mais jovens –
44% dos gregos até 24 anos.
“No médio prazo, medidas como a PEC que estabelece
limites aos gastos públicos e a reforma da Previdência, tendem a
eliminar o ‘colchão’, a rede de proteção social que, no Brasil, é
bastante consolidada para um país em desenvolvimento, apesar de pequena
em comparação com países desenvolvidos”, diz Esther. “Eliminado esse
‘colchão’, o país fica mais vulnerável a convulsões sociais em caso de
crise econômica, como a de agora.”
Emblemático é o caso do Bolsa Família. O programa
beneficia cerca de 14 milhões de famílias no país, foi importante não
apenas como parte da “rede de proteção” como ajudou a movimentar a
economia do país, mas foi estigmatizado por setores da população como
“bolsa esmola”. O governo Michel Temer parece estar de acordo com esses
últimos. Embora não admita que quer diminuí-lo, está tentando acabar com
uma das lógicas do programa, que fazia uma avaliação sobre se a simples
saída da chamada “linha de pobreza” é motivo imediato da saída do
beneficiário do Bolsa Família.
Para o governo atual, se a pessoa saiu da linha da
pobreza, tem que deixar o programa. Mas essa política é uma das que
subvertem sua lógica. “Quem está muito perto da linha da pobreza pode
ter algum revés, perder a renda e precisar continuar no benefício. Havia
um mecanismo mais sensível a quem está nesse limiar. O governo quer
acabar com isso porque diz que a pessoa recebe assistência indevida,
quando na verdade é uma preocupação com as flutuações de renda que
acontecem com qualquer um”, diz Esther.
Esse é apenas um exemplo. Na verdade, o que é mais
urgente é a recuperação da economia. “Mas para isso é preciso que se
tomem medidas concretas de retomada do crescimento, e também de medidas
distributivas. Este ano o salário mínimo não teve aumento real. O Bolsa
Família teve um aumento no ano passado, mas neste ano não foi anunciado
nada.”
A economista entende ainda que outras iniciativas
poderiam ajudar a estender a proteção aos cidadãos atingidos no momento
de crise. Por exemplo, a ampliação das parcelas do seguro desemprego,
como foi feito em momentos de crise no passado, como em 2009. Outro
exemplo: a devolução, pelo BNDES, de R$ 100 bilhões ao Tesouro Nacional
em janeiro, dinheiro que poderia estar sendo usado para o investimento e
o crescimento, inclusive no seguro-desemprego.
“Numa faixa no limiar da linha da pobreza, a pessoa
fica muito mais exposta à crise com qualquer revés, por isso precisamos
de mais mecanismos de proteção. Como todas as ações estão sendo feitas
para tirar o que tem, e não para ampliar, a situação tende a ser
bastante preocupante.”

Crises nos estados

Enquanto isso, as crises nos estados pouco a pouco
vão pipocando, como no Espírito Santo e no Rio de Janeiro. A economista
ressalta que existem particularidades nos estados, mas aqueda de
arrecadação em todo o país agrava as situações locais. “O Espírito Santo
é emblemático, porque de fato os policiais ficaram anos sem reajuste.
Isso claramente tem ligação com o ajuste fiscal forte feito no estado
(pelo governador Paulo Hartung, do PSDB).”
Já no Rio há o movimento dos servidores, que, como
lembra a economista, estão pagando a conta decorrente da enorme queda de
arrecadação com a baixa dos preços do petróleo, já que a receita do
estado é muito dependente dos royalties (o Espírito Santo também, embora
em menor grau). “Em todos os estados e municípios está havendo queda de
arrecadação muito forte. Com cada vez mais cortes nos gastos, vamos
indo cada vez mais para o buraco”, conclui a professora da UFRJ.
Ironicamente, em sua página da internet, o Banco
Mundial, que não é nenhum organismo marxista, diz o seguinte sobre o
Brasil: “Entre 2003 e 2014, o Brasil viveu uma fase de progresso
econômico e social em que mais de 29 milhões de pessoas saíram da
pobreza e a desigualdade diminuiu expressivamente (o coeficiente de Gini
caiu 6,6% no mesmo período, de 58,1 para 51,5). O nível de renda dos
40% mais pobres da população aumentou, em média, 7,1% (em termos reais)
entre 2003 e 2014, em comparação ao crescimento de renda de 4,4%
observado na população geral. No entanto, desde 2015 o ritmo de redução
da pobreza e da desigualdade parece ter estagnado”.