sábado, 11 de fevereiro de 2017

Blog do Sakamoto - Cotidiano

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Crise no ES e pancadaria no RJ são amostras do Brasil pós-impeachment?

Leonardo Sakamoto

Proibidos de fazer greve, policiais militares paralisaram as
atividades no Espírito Santo após suas esposas e famílias bloquearem
saídas de quartéis. Eles reivindicam reajustes atrasados e melhores
condições de trabalho. O medo disparou nas ruas do Estado.

No Rio
de Janeiro, a Polícia Militar novamente disparou bombas contra
funcionários públicos que protestavam contra o pacote de reajuste fiscal
do governo do Rio de Janeiro. Do lado dos servidores, coquetéis molotov
e fogos foram lançados.

O Espírito Santo gabava-se de ser um
exemplo na melhoria da segurança pública até que uma demanda represada
dos profissionais da área eclodisse e manchasse essa vitrine
internacional. O Rio de Janeiro é um Estado quebrado, menos por conta
dos direitos pagos a seus funcionários e mais pela farra dos subsídios e
facilidades dados a empresas, setores econômicos e megaeventos. Lá o
risco do movimento capixaba se repetir é grande.

Considerando que a
retomada da geração de empregos tem sido lenta e que boa parte da
''confiança'' que o governo Temer tem obtido entre investidores é devido
a reformas que transferem a conta da crise apenas para o bolso dos
trabalhadores mais pobres e protegem os mais ricos, a pergunta é:
estamos vendo uma amostra, nesses dois estados, do que será o Brasil nos
próximos anos? Com protestos de trabalhadores, convulsão social,
fragilidade institucional, insegurança e medo. Lembrando que o Rio não é
o único estado que está quebrado e o receituário nacional para sair da
crise tem passado por corte de empregos e de direitos.

Apesar de
Michel Temer dizer que está desarmando uma bomba-relógio, as principais
reformas que ele vem conduzindo é que são as bombas-relógio em si.
Algumas programadas para estourar quando ele já estiver longe do Palácio
do Planalto. Outras, com explosão quase que imediata.

A Reforma
da Previdência (que vai elevar a idade mínima para 65 anos, o tempo
mínimo de contribuição para 25 anos e a idade mínima para aposentadoria
rural a 65 anos), a nova emenda constitucional que limitou o
crescimentos de gastos em áreas como educação e saúde públicas nos
próximos 20 anos e a reforma do ensino médio (fruto de um processo
imposto e sem discussão com a sociedade) vão se fazer sentir daqui a
alguns anos.

Já a Reforma Trabalhista proposta por ele (que não
envolve apenas o pacote apresentado, mas todas as leis que mexem com
direitos e vêm sendo discutidas no Congresso Nacional na surdina) terá
efeito imediato em muitas categorias de trabalhadores.

Se o
trabalhador do setor privado perceber que suas perspectivas futuras são
um chulé fedido e sua vida atual uma desgraça que não melhora nem com
reza brava, a chance de protestos e greves aumenta. O que retardará a
retomada econômica prometida.

E, quanto aos servidores públicos:
por mais que o Supremo Tribunal Federal tenha decidido por limitar o
direito (constitucional) à greve dos servidores públicos, cortando o
ponto dos que cruzaram os braços, o brasileiro é criativo e consegue dar
um jeito.

As barricadas nas portas dos quartéis no Espírito Santo
são uma amostra disso, uma vez que os policiais afirmam que o movimento
não é deles, mas de suas famílias. Diante da mudança nas aposentadorias
e cortes causados pela agora aprovada PEC do Teto, quantas categorias
de servidores públicos (principalmente as que ganham pouco, como
professores, enfermeiros, policiais, entre outros) não irão às ruas como
última saída, dando uma banana para o corte de ponto?

Há, por
certo, uma questão de timing. A bomba explodirá no colo de Temer e
aliados ou numa próxima gestão, uma em que o projeto de governo
for democraticamente eleito?

É claro que com a quantidade de
sindicatos e sindicalistas subservientes ao poder político e econômico;
com uma população mal informada e porcamente consciente sobre seus
direitos; com o entorpecimento trazido pelo bombardeio na TV, que
faz você acreditar que quem faz greve em nome da própria dignidade é um
bosta; e pelo cansaço extremo de uma população pobre que, quando chega
em casa, é incapaz de refletir sobre sua própria condição antes de cair
morta na cama, fica mais difícil de imaginar que isso aconteça em massa
no curto prazo. Mas não é impossível.

Em evento na Caixa, nesta
quinta (9), Temer afirmou que seu governo conseguiu fazer em poucos
meses as reformas que ele imaginava que levariam dois anos para
acontecer. E falou das reformas citadas neste post, que tungam direitos
dos mais pobres.

Fico com receio do que isso significa. Pelo que
tudo indica, ele vai querer fazer mudanças tributárias para facilitar a
vida das pessoas jurídicas, mas sem mexer, é claro, com o fato ridículo
de que a classe média paga proporcionalmente mais imposto de renda do
que os mais ricos – dividendos recebidos de empresas não são taxados.
Noves fora, os subsídios às próprias empresas. Mas se sobrar tempo, ele
fará o quê? Fim do voto feminino? Fim da República? Revogação da Lei
Áurea?

Institucionalmente, a chance de que essas reformas que
reduzem o mínimo de Estado de bem-estar social que temos sejam
interrompidas é a Operação Lava Jato transformar a governabilidade de
Temer no rascunho do mapa do inferno (o que, acredito, apesar dos
escândalos diários, não está perto de acontecer) ou o Tribunal Superior
Eleitoral de Gilmar Mendes resolver decidir pela cassação da chapa (o
que está mais distante ainda). Principalmente porque uma parcela grande
do PIB sorri com as reformas que estão sendo realizadas.

Mas
eu ficaria de olho para ver se o que está acontecendo no Espírito Santo e
no Rio são prenúncio de algo maior ou apenas coisa isolada. Se for a
primeira opção e a população resolver ir à ruas por conta das tungadas
de curto, médio e longo prazo, o país entra em nova fase.

Se
melhor (com a população sendo protagonista de sua vida) ou pior (com a
chegada de um ''salvador'' que, não se engane, podará direitos ao invés
de garanti-los), como diria a Glória, não sou capaz de opinar.


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