domingo, 18 de junho de 2017

Joesley e a revista dos irmãos Marinho: faltaram as perguntas às quais o quadrilheiro deveria responder - Viomundo - O que você não vê na mídia

Joesley e a revista dos irmãos Marinho: faltaram as perguntas às quais o quadrilheiro deveria responder - Viomundo - O que você não vê na mídia



Joesley e a revista dos irmãos Marinho: faltaram as perguntas às quais o quadrilheiro deveria responder

17 de junho de 2017 às 17h17









por Luiz Carlos Azenha


Durante minhas quase duas décadas trabalhando como correspondente nos
Estados Unidos, em Nova York e Washington, li várias reportagens nos
diários locais — New York Times e Wall Street Journal, especialmenteque poderiam ser entendidas como lobby de corporações norte-americanas para abrir mercados no Exterior.


Eram textos que pareciam destinados à leitura de embaixadores e das
elites de potências estrangeiras. Japão, China e, mais recentemente, a
Índia foram os principais alvos. Grandes mercados.


No caso da China os jornalistas americanos se especializaram em
denunciar violação aos direitos humanos e sindicais dos trabalhadores
chineses.


Quando o Wall Street Journal publica algo em defesa de
direitos trabalhistas, é preciso desconfiar. Objetivo encoberto:
arrancar concessões de autoridades chinesas.


Só no Brasil a atuação de um governo em defesa de empresas nacionais é criminalizada.


Em Washington o governo serve de correia de transmissão para os
interesses das megacorporações, como se viu recentemente com a venda de
caças norte-americanos para dois Estados que se enfrentam no Oriente
Médio, Arábia Saudita e Qatar. Às favas com a diplomacia, o que
interessa é vender.


Isso vale para republicanos e democratas. Quando Bill Clinton indicou
Ron Brown para secretário de Comércio, foi com a tarefa pública de usar
a diplomacia dos Estados Unidos para abrir mercados, mais ou menos o
que fez o ex-chanceler Celso Amorim nos governos Lula.


No caso da China os americanos aprenderam com Nixon. É muito mais
eficaz trabalhar nos bastidores. Além disso, é preciso equilibrar o
interesse das corporações que pretendem vender na China com os
interesses do imenso capital norte-americano investido em parcerias com
empresas locais.


No caso de aliados como o Japão, as denúncias midiáticas são bem mais
eficazes. Eu me lembro especificamente de uma: quando as grandes lojas
de varejo dos Estados Unidos pretendiam se estabelecer no mercado
japonês — uma delas a maior empresa de varejo do mundo, o Walmart — a
mídia norte-americana denunciou vantagens concedidas pelo governo
japonês, em todas as esferas, aos mini-mercados que existem às centenas
de milhares, espalhados pelas cidades japonesas, pequenas empresas
familiares que são a base do comércio.


Todo este preâmbulo é para dizer que mercados contam e que o mercado
brasileiro vale muito, especialmente se usado por empresas brasileiras
para um salto latino-americano e, em seguida, mundial. Como diria
qualquer capitalista, num mundo globalizado a vantagem geográfica e de
escala conta muito.


Essa dimensão estratégica é completamente desconhecida pela Operação
Lava Jato nas investigações de setores-chave da economia brasileira: da
Petrobras às empreiteiras, do BNDES à JBS.


Foi o que abriu espaço para especulações em torno da íntima relação
entre os meritocratas da PGR, do MPF, da PF e da Justiça e autoridades
dos Estados Unidos, que podem influir no rumo das investigações pelo
fornecimento ou supressão de dados na troca de informações prevista em
acordos internacionais.


Seria demais esperar que, em sua entrevista à revista Época,
dos irmãos Marinho, Joesley Batista fizesse uma reflexão aprofundada
sobre o fato de que a corrupção é inerente ao capitalismo: o Estado
existe para garantir que alguns se darão melhor que outros, justamente
aqueles que podem comprar o poder.


Não é assim nos tão amados Estados Unidos do juiz Sérgio Moro?


Sim, tanto que a Suprema Corte norte-americana, para efeito de
doações eleitorais, decidiu dar o equivalente a status de pessoa física
às corporações, permitindo que elas interfiram praticamente sem limites
no processo eleitoral e moldem a legislação em todas as esferas de
governo — sempre à base de dinheiro.


Se malas de dólares não circulam entre empresários e políticos dos
Estados Unidos com a frequência que vemos no Brasil, isso não significa
que as empresas americanas não comprem legislação. Elas o fazem da mesma
forma que a JBS, através de lobistas devidamente registrados em
Washington que atuam junto aos poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário.


Legiões de advogados e associações empresariais escrevem legislação e
a submetem através daqueles que financiam. Isso é corriqueiro e
frequentemente se torna público.


Um dos casos mais recentes foi revelado pelo documentário Emenda 13,
da Netflix, que demonstrou como o complexo industrial-penitenciário
comprou legislação para expandir a rede de prisões privadas que explora a
mão-de-obra escrava dos dias de hoje, 60% dela negra.


Trata-se de uma ação muito menos descarada que a do gângster Eduardo Cunha, mas não menos perversa.


Na entrevista à Época, o pilantra Joesley Batista se diz
surpreso com a dimensão das organizações criminosas que tomaram conta da
política brasileira, sem ser forçado a reconhecer que, como subornador,
ele também fez crescer seus negócios nos moldes de uma clássica
organização criminosa.


Faltou perguntar a Joesley, por exemplo, como se deu a expansão da JBS e da J&F fora do Brasil.


Ele subornou alguém? Ofereceu alguma vantagem? Contratou algum
lobista? Tentou interferir de alguma maneira no processo legislativo?
Ele não considera que sua expansão internacional, feita com capital
acumulado no Brasil, a juros subsidiados, está contaminada pelos vícios
de origem?


Joesley teve a oportunidade de expor seu “altruísmo”, afirmando
que buscava criar empregos e, assim, beneficiar as comunidades nas quais
trabalha. Sendo assim, os políticos que atenderam suas demandas não
poderiam usar o mesmo argumento e ter direito à mesma leniência?


Santa hipocrisia!


Mas, por que Joesley não foi encostado contra a parede durante a entrevista?


Podemos testar a hipótese: é um grande anunciante das Organizações Globo, além de aliado de ocasião.


Diego Escosteguy, autor da entrevista, é conhecido pelo antipetismo e se esmera em agradar ao patrão.


A entrevista de Joesley se encaixa no plano dos irmãos Marinho de derrubar Temer para promover um eleição indireta no Congresso.


O empresário, assim, é mero instrumento da disputa institucional
entre PGR-Globo e o acordão antecipado por Romero Jucá, “com STF, com
tudo”.


Paulo Nogueira, que trabalhou tanto na Abril quanto na Globo — agora está no Diário do Centro do Mundoconhece Escosteguy bem, e escreveu sobre ele depois de ler manifestações do jornalista no twitter:


Escosteguy parece não ter ideia, ou finge, de que a
Globo foi inteiramente construída com dinheiro público, em troca de
conhecidos favores sobretudo aos generais que mataram, torturaram e
perseguiram tantos brasileiros.



Escosteguy não sabe que sua empresa ainda hoje se beneficia de
uma inacreditável reserva de mercado, coisa de quem quer capitalismo e
concorrência só para os outros.



Saberá da sonegação da Copa de 2002? Do detalhe da trapaça fiscal
feita pela Globo: alegou que ia fazer um investimento no exterior para
não pagar o imposto devido pela compra dos direitos? Da tentativa de dar
fim, por uma ex-funcionária da Receita, ao documento que comprovava a
fraude dos Marinhos?



A Época mesma em que ele é vice-chefe com ares napoleônicos agora.


Quando eu cheguei à Editora Globo, o pobre contribuinte do
Amazonas era instado a melhorar as contas da editora mediante compras
milionárias de livros da Globo.



Dinheiro público, sempre dinheiro público.


Em troca, o governador recebia matérias louvatórias da Época.


Meu primeiro choque na Globo, e na Época, se deu exatamente aí.
Briguei com o “operador” que fazia a ponte entre a editora e o governo
do Amazonas.



O governador do Amazonas foi a São Paulo me intimidar. Tivemos um
encontro patético, ao fim do qual ele me ameaçou: “Vou falar com o João
Roberto Marinho.”



Escosteguy terá noção de como foi feito o Projac? Com dinheiro do
Banerj, sempre público, e pago depois, pausa para gargalhadas, com
anúncios.



E vem posar de Catão, este Kim Kataguiri do jornalismo, como se
trabalhasse na Santa Casa de Misericórdia? Tem coragem de falar em
“sites financiados pelo PT” — sem prova nenhuma, aliás — quando a
empresa em que trabalha leva só das estatais federais 500 milhões de
reais por ano com audiências despencando?
Vivemos no Brasil uma guerra intestina entre facções que ativamente
promoveram ou se omitiram diante de um golpe de Estado que afastou a
presidente legítima sem crime de responsabilidade, usando pedaladas fiscais de forma obscena. Um golpe que, conforme antecipamos, se tornaria uma verdadeira Galeria dos Hipócritas.


Um golpe contra a Constituição de 1988, contra os direitos
trabalhistas, contra a soberania nacional e pela completa submissão do
Brasil à globalização financeirizada.


A única saída é o STF anular o impeachment, Dilma Rousseff reassumir o
Planalto e organizar eleições gerais antecipadas que restaurem a
soberania popular.


PS do Viomundo: Este texto foi originalmente publicado sem os parágrafos finais. Nosso pedido de desculpas aos leitores.

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