sábado, 24 de janeiro de 2015

O capitalismo do século XXI

Juremir Machado da Silva - Blogs - Correio do Povo


O capitalismo do século XXI

Postado por Juremir em 23 de janeiro de 2015 
 
A coisa mais boba que alguém pode dizer é: não faça críticas, apresente soluções.


Trata-se do ressentimento contra a crítica certeira.


Papel de crítico é criticar. O resto é conversa fiada.


Tem conversa fiada de racista, de homofóbico, de esquerdista e de capitalista.


Exemplo de conversa fiada é aquela do cara que diz “vai precisar cota
para heterossexual, branco e homem no mundo de hoje”. É o lamento do
machista branco e homofóbico contra as críticas que enfrenta.


É assim. Assim vai.


Continua a farra. Cada vez mais, menos é mais. Ou menos tem mais. O
economista francês Thomas Piketty sacudiu a roseira ao provar com
números que o capitalismo não vem distribuindo riqueza, como conta a
mitologia liberal para enganar inocentes, mas concentrando-a cada vez
mais. Até a minha avó, em Palomas, percebia isso, mas não tinha tempo de
formar um bom banco de dados para sustentar a sua tese. Ela via o
estancieiro local ficar mais rico a cada ano e os 300 habitantes do
lugar ficarem sempre mais pobres. Tirava uma conclusão baseada na sua
sabedoria empírica: “Dinheiro chama dinheiro”. Não foi desmentida. O
estancieiro foi viver de rendas.


Depois de Piketty, a Oxfam praticou um ato terrorista: anunciou que
até 2016 a riqueza do mundo estará dividida fraternalmente assim: 1%
mais rico com mais de 50% de tudo e 99% mais pobres com o restante. É o
que se pode chamar de uma divisão justa, clara e incontestável. Alguns,
mais atilados, usam o termo meritocracia para explicar essa partilha
aparentemente desequilibrada da riqueza mundial. Segundo a Oxfam, os
mais aquinhoados lambuzavam-se com 44% do bolo global em 2009. Em 2014,
já dispunham de 49% de tudo que produzem com modesta ajuda dos 99%
restantes da população. Claro que essa divisão ligeiramente enviesada
nada tem a ver com os males, ressentimentos, guerras, insatisfações e
ódios deste mundo. É tudo coincidência. Basta deixar a mão invisível do
capitalismo continuar agindo que um dia os 99% citados entregarão tudo o
que ainda têm.


O que é essa tal de Oxfam? É a Oxford Committee for Famine Relief
(Comitê de Oxford de Combate à Fome). Com um nome desses, não pode ser
confiável. Deve ser coisa de comunistas. Esquerdistas nunca param de
falar nessa história de combate à fome. Não mudam o disco. Na parte
inferior da tabela, essa dos 99%, 20% ficam com 94,5% do que lhes cabe
enquanto os outros 80% regalam-se com os 5,5% restantes. Não é lindo?
Não é justo? Não é assim que se constrói um mundo seguro, feliz e, acima
de tudo, capaz de vencer os piores conflitos?


A solução, então, é o comunismo? O negócio é virar Cuba ou Coreia do
Norte? Essas respostas ou provocações são geniais. Revelam muito do
capital intelectual de quem as pronuncia. Certamente são pessoas que
intelectualmente compartilham algo equivalente ao que sobra em termos
econômicos para o setor menos favorecido dos 99% que atrapalham o
crescimento do 1% em ascensão graças aos seus méritos como
especuladores. Não fossem as intervenções estatais absurdas, o 1%
dominante não teria de esperar até o longínquo ano de 2016 para deter a
maior parte da riqueza universal. Barack Obama tem atrasado esse avanço
com suas políticos assistencialistas anacrônicas de previdência social e
de saúde. Nem vamos falar das suas tentações comunistas quanto à
taxação de grandes fortunas e heranças. Como dizem os liberais, isso
pune quem tem boas ideias e produz mais.


Uau!


A Oxfam produziu o seu relatório para influenciar o 1% do 1% mais
rico que vai a Davos tomar champagne e criticar a desigualdade promovida
pelas políticas estatais que recusam a austeridade. Só cortando gastos
sociais e produzindo desemprego é que se cresce. O Brasil, com Joaquim
Lévy, deve estar no bom caminho.


A propósito, Piketty pulverizou a tentativa do Financial Times de
contestar a validade dos seus dados estatísticos: “ Les données qu’on a
sur les patrimoines sont imparfaites mais d’autres comme les
déclarations de succession sont plus fiables. Je fais cela en toute
transparence, je mets tout en ligne  (…)  Là où le Financial Times est
malhonnête, c’est qu’il laisse entendre que cela change des choses aux
conclusions alors que cela ne change rien”.


Pobres lacerdinhas, tentam de tudo. Perdem sempre.

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