Rio Acima - JBlog - Jornal do Brasil - Não há vencedores, nem vencidos. Somos todos brasileiros!: "Não há vencedores, nem vencidos. Somos todos brasileiros!
31/10/2010 - 20:19 | Enviado por: Migliaccio
Algumas considerações sobre a vitória de Dilma Rousseff, a primeira mulher a se tornar presidente do Brasil.
Serra foi mal nos estados em que era favorito. Ganhou apertado no Rio Grande do Sul e levou uma sova em Minas Gerais, onde o prestígio de Aécio Neves ficou seriamente abalado. Às 20h de domingo, eram 17 pontos de vantagem para a petista na 'terra das alterosas'.
Marina Silva também jogou mal no segundo turno. Renegou seu DNA petista e preferiu subir no muro, acreditando que precisava ficar bem com Serra caso ele ganhasse. Serra perdeu.
No Norte e Nordeste Dilma e Lula ganharam fácil, assim como no Rio, que tem tradição esquerdista (com Pernambuco, são os estados mais gauche da federação). Some-se a isso, no caso do Rio, o histórico pouco caso da elite paulistana para com seus vizinhos de fala arrastada e repleta de xiados.
Bem antes da eleição, eu escrevi aqui que Lula não seria derrotado de jeito nenhum neste pleito. Com os indicadores de seu governo, as obras que faz nos bolsões de miséria sempre esquecidos e seu carisma, o presidente não conseguiu à toa 83% de bom ou ótimo nas avaliações de seu governo (a melhor marca de FHC foram 46%...).
O inesperado segundo turno e a maior desenvoltura de José Serra nos debates da TV deram a falsa impressão de que poderia dar zebra. Mas o favorito acabou vencendo, mesmo com Dilma nervosa e claudicante nos confrontos televisivos. Aliás, para quê tanto debate igual?
Agora vem o mais importante: a eleição acabou.
A partir de primeiro de janeiro, todos teremos olhos críticos para o novo governo. Vai ser difícil Dilma alcançar a aprovação de Lula (carisma à parte), mas se ela der seguimento ao que ele fez de bom estarei feliz. Graças a Deus, não sou petista de carteirinha _ como muitos aqui me acusaram por ter apoiado Dilma _ sou livre para criticar seu governo se achar que devo. Partidos políticos aprisionam, restringem, diminuem horizontes. Além do mais, suas reuniões são chatérrimas e intermináveis. As do PT, então... Deus me livre.
Liberdade é fundamental. Já votei em Fernando Henrique Cardoso e não me arrependo. Acho Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda no governo FHC, um grande brasileiro, decente e brilhante. Há gente boa em todo canto (e gente ruim também).
Que Dilma continue aparelhando a Polícia Federal, para que mais 3 mil criminosos do colarinho branco sejam presos nos próximos oito anos.
E que a Justiça não os solte uma semana depois.
Espero que a imprensa que vestiu a camisa do PSDB aprenda a lição. Pare de se comportar como partido político e noticie sempre os dois lados da questão. A vitória de Dilma mostrou que o poder de certos jornais e revistas está cada vez mais restrito. E a emissora de TV que antes colocava e tirava presidente, felizmente não manda mais no nosso país. Até tenta, mas não manda. Demonizou Dilma durante toda a campanha, mas ontem à noite, transformou a nova presidente numa mártir da luta contra a ditadura militar, numa reportagem-perfil elogiosa que mostra o quando é frívola sua linha editorial.
Lembrei imediatamente de Leonel Brizola, que teve mais espaço nesta emissora líder de audiência no dia de sua morte que nos 30 anos anteriores, quando foi boicotado e difamado quase que diariamente no mesmo telejornal.
Uma coisa é assumir uma posição política num blog pessoal, outra é apoiar um candidato e criticar outra em panfletos disfarçados de matérias jornalísticas.
Hoje é dia de festa, não há vencedores, nem vencidos (nem mesmo a mídia anti-Lula perdeu, digamos que o povo brasileiro lhe deu mais uma lição).
Somos todos brasileiros e queremos o melhor para o nosso país e nossos irmãos. Cada um com a sua opinião, mas todos com o Brasil no coração.
Boa sorte, Dilma!
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domingo, 31 de outubro de 2010
Folha de S.Paulo - Fernanda Torres: Propaganda e marketing - 31/10/2010
Folha de S.Paulo - Fernanda Torres: Propaganda e marketing - 31/10/2010: "FERNANDA TORRES
Propaganda e marketing
Quando Marina deu o 2º turno de presente a Serra, achei que a campanha ficaria mais adulta; ledo engano
JAMAIS COMPREENDI o direcionamento populista do marketing de José Serra.
No primeiro turno, levei um choque quando assisti a uma cena em que o candidato do PSDB se sentava no sofá de uma senhora singela para ouvi-la falar a respeito de um problema de saúde no olho.
'Depois desse olho, a senhora perdeu o outro olho?' Perguntava ele. A enferma, então, ameaçava chorar e Serra abraçava-a com dó, pedindo que não se emocionasse porque, senão, ele se emocionaria junto.
Só faltou o violino cigano.
Um especialista em linguagem do corpo afirmou, logo no início do primeiro turno, que o tucano passava a ideia de que sabia do que estava falando, mas não se importava com o próximo.
Talvez opiniões como essas tenham-no levado a gravar cenas tão lacrimosas.
Quando Marina deu o segundo turno de presente para a oposição, achei que o populismo seria deixado de lado em prol de uma mensagem mais adulta e objetiva.
Ledo engano.
Serra continuou exalando bondade enquanto abria seu programa de forma sensacionalista, demonizando Dilma e rebatendo com o mesmo dólar furado as acusações de entreguismo feitas ao governo FHC pelo PT.
O público percebe quando está sendo tratado como criança.
Há duas semanas, recebi por e-mail um depoimento contundente postado por Hélio Bicudo via internet. Nele, o bacharel em direito e fundador do PT chamava a atenção para os exageros partidários de Lula, para a ameaça à liberdade de expressão e pedia que a população, por meio de seu voto, se posicionasse contra um partido que coloca seus interesses acima dos da nação.
O time de Serra devia ter poupado o trabalho e transmitido as palavras de Bicudo no ar, em looping, no horário eleitoral.
A equipe de Dilma também fez a caveira dos tucanos, mostrou sua candidata visitando casebres, brincando com o cachorro e conversando com desamparados, mas sempre como pano de fundo.
O grande trunfo do programa do PT -além da luz caprichada, do custo superior e do auxílio luxuoso de Lula- foi uma entrevista extremamente bem produzida em que a candidata petista se dirigia a um arguidor oculto.
Editada de Dilma para a própria Dilma, a peça publicitária lhe dava tempo de exprimir suas ideias sem sofrer com o que parece ser uma dislexia verbal que apresenta em público, de pausar sem que parecesse branco, de não ser agressiva como exigem os debates nem sorridente 'pede voto'.
A impressão de intimidade, criada com a longa conversa e os silêncios para reflexão, destacava a personalidade grave de Dilma e a ajudava a formar uma imagem de serenidade digna de um presidente.
Em um ano, a ex-ministra foi maternal, severa, irritável, boa, beata, vítima, algoz, seguiu o norte das pesquisas e, perseverante, enfrentou a via crucis eleitoral como poucas vezes se viu na história deste país.
Se as previsões se confirmarem nesta noite de domingo, depois de tantas metamorfoses ambulantes, talvez a própria Dilma descubra com o eleitorado quem é a mulher que hoje se torna presidente.
– Enviado usando a Barra de Ferramentas Google"
Propaganda e marketing
Quando Marina deu o 2º turno de presente a Serra, achei que a campanha ficaria mais adulta; ledo engano
JAMAIS COMPREENDI o direcionamento populista do marketing de José Serra.
No primeiro turno, levei um choque quando assisti a uma cena em que o candidato do PSDB se sentava no sofá de uma senhora singela para ouvi-la falar a respeito de um problema de saúde no olho.
'Depois desse olho, a senhora perdeu o outro olho?' Perguntava ele. A enferma, então, ameaçava chorar e Serra abraçava-a com dó, pedindo que não se emocionasse porque, senão, ele se emocionaria junto.
Só faltou o violino cigano.
Um especialista em linguagem do corpo afirmou, logo no início do primeiro turno, que o tucano passava a ideia de que sabia do que estava falando, mas não se importava com o próximo.
Talvez opiniões como essas tenham-no levado a gravar cenas tão lacrimosas.
Quando Marina deu o segundo turno de presente para a oposição, achei que o populismo seria deixado de lado em prol de uma mensagem mais adulta e objetiva.
Ledo engano.
Serra continuou exalando bondade enquanto abria seu programa de forma sensacionalista, demonizando Dilma e rebatendo com o mesmo dólar furado as acusações de entreguismo feitas ao governo FHC pelo PT.
O público percebe quando está sendo tratado como criança.
Há duas semanas, recebi por e-mail um depoimento contundente postado por Hélio Bicudo via internet. Nele, o bacharel em direito e fundador do PT chamava a atenção para os exageros partidários de Lula, para a ameaça à liberdade de expressão e pedia que a população, por meio de seu voto, se posicionasse contra um partido que coloca seus interesses acima dos da nação.
O time de Serra devia ter poupado o trabalho e transmitido as palavras de Bicudo no ar, em looping, no horário eleitoral.
A equipe de Dilma também fez a caveira dos tucanos, mostrou sua candidata visitando casebres, brincando com o cachorro e conversando com desamparados, mas sempre como pano de fundo.
O grande trunfo do programa do PT -além da luz caprichada, do custo superior e do auxílio luxuoso de Lula- foi uma entrevista extremamente bem produzida em que a candidata petista se dirigia a um arguidor oculto.
Editada de Dilma para a própria Dilma, a peça publicitária lhe dava tempo de exprimir suas ideias sem sofrer com o que parece ser uma dislexia verbal que apresenta em público, de pausar sem que parecesse branco, de não ser agressiva como exigem os debates nem sorridente 'pede voto'.
A impressão de intimidade, criada com a longa conversa e os silêncios para reflexão, destacava a personalidade grave de Dilma e a ajudava a formar uma imagem de serenidade digna de um presidente.
Em um ano, a ex-ministra foi maternal, severa, irritável, boa, beata, vítima, algoz, seguiu o norte das pesquisas e, perseverante, enfrentou a via crucis eleitoral como poucas vezes se viu na história deste país.
Se as previsões se confirmarem nesta noite de domingo, depois de tantas metamorfoses ambulantes, talvez a própria Dilma descubra com o eleitorado quem é a mulher que hoje se torna presidente.
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Folha de S.Paulo - Vinicius Torres Freire: Agora, vamos falar a sério - 31/10/2010
Folha de S.Paulo - Vinicius Torres Freire: Agora, vamos falar a sério - 31/10/2010: "VINICIUS TORRES FREIRE
Agora, vamos falar a sério
Propostas modestas para filtrar a atmosfera pútrida que ficou da eleição, serenar ânimos e azeitar a economia
É DEPRIMENTE dizê-lo, mas, agora que a campanha eleitoral terminou, espera-se que a liderança política do país minta menos. Talvez não seja mais uma expectativa demasiada conhecer o programa de governo da(o) próxima(o) presidente antes de sua posse. Ou conhecer os auxiliares políticos e intelectuais mais relevantes da(o) candidata(o) que estamos elegendo neste domingo.
Espera-se que o novo governo trate de imediato de purificar a atmosfera política, poluída pelos miasmas da campanha: ódio, invalidação dos adversários, demagogia e burrice desavergonhada. Conflito político agudo é uma coisa, vontade de extermínio é outra. Dá em besteira. Vide a Venezuela. Ou a Argentina.
Outra demonstração de boa vontade democrática e um meio de pacificação de ânimos seria o anúncio de um plano que desse cabo da politização baixa e indevida do serviço público. Isto é, reduzir ao mínimo necessário a nomeação de livre arbítrio para cargos públicos.
Há decerto uma crítica idiota à 'partidarização' de governos. Ora, espera-se que o partido eleito ponha suas ideias e seus quadros no governo. De outro modo, do que trataria a política? Mas nomear 25 mil pessoas, caso do governo federal, é um despautério que dá em incompetência, em corrupção e em partidarização mafiosa do serviço público.
No que diz respeito a urgências econômicas, não há como escapar do deficit e da dívida públicos: menos, menos. Não fazer nada a respeito será ignorância e/ou má-fé.
Ainda menos discutido que macroeconomia foi o problema das empresas. O aspecto mais útil de uma economia de mercado é a criação desimpedida de novos negócios, produtos, serviços e soluções econômicas variadas. Muita vez, o novo vem da pequena e nova empresa.
Mas a inovação queima no inferno burocrático brasileiro, na lenha da opressão fiscal. Não custa nada, além de trabalho e inteligência, reduzir os empecilhos à criação de novos negócios, o que demanda meio ano no Brasil, entre outros óbices.
É preciso sanear a barafunda de leis tributárias, as quais criam incerteza jurídica e financeira e custam caro. O cipoal jurídico abre ainda mais espaço para o arbítrio de um fisco que já tem carta branca, pois governos deficitários precisam arrecadar avidamente. Enfim, há crédito barato e várias facilidades para a criação de oligopólios. Para o empreendimento novo, migalhas.
Reformas modestas, inteligentes, de baixo custo financeiro e político podem fazer a economia dar saltos -vide o que fizeram as normas do mercado imobiliário, o crédito consignado. Custaria muito pouco um plano de incentivo ao mercado de capitais, cadastros positivos de crédito, reformas na gestão da dívida pública, desindexação. Nada disso precisa de planos bilionários, PACs, PECs etc. E faria MUITA diferença.
Custa relativamente pouco (uma fração de trem-bala) criar pontes entre universidades e empresas: institutos de pesquisa tecnológica. Temos um caso clássico, quase clichê: a Embrapa, que inventou a agricultura brasileira moderna, que sustenta o país. Mas não damos a mínima para quem será o ministro da Ciência. Porém, o futuro do país e da ação do Estado na economia está aí.
São propostas modestas, politicamente pouco inflamáveis. Deixariam o ar mais puro e a vida mais fácil. Sem dramas. Um bom começo.
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Agora, vamos falar a sério
Propostas modestas para filtrar a atmosfera pútrida que ficou da eleição, serenar ânimos e azeitar a economia
É DEPRIMENTE dizê-lo, mas, agora que a campanha eleitoral terminou, espera-se que a liderança política do país minta menos. Talvez não seja mais uma expectativa demasiada conhecer o programa de governo da(o) próxima(o) presidente antes de sua posse. Ou conhecer os auxiliares políticos e intelectuais mais relevantes da(o) candidata(o) que estamos elegendo neste domingo.
Espera-se que o novo governo trate de imediato de purificar a atmosfera política, poluída pelos miasmas da campanha: ódio, invalidação dos adversários, demagogia e burrice desavergonhada. Conflito político agudo é uma coisa, vontade de extermínio é outra. Dá em besteira. Vide a Venezuela. Ou a Argentina.
Outra demonstração de boa vontade democrática e um meio de pacificação de ânimos seria o anúncio de um plano que desse cabo da politização baixa e indevida do serviço público. Isto é, reduzir ao mínimo necessário a nomeação de livre arbítrio para cargos públicos.
Há decerto uma crítica idiota à 'partidarização' de governos. Ora, espera-se que o partido eleito ponha suas ideias e seus quadros no governo. De outro modo, do que trataria a política? Mas nomear 25 mil pessoas, caso do governo federal, é um despautério que dá em incompetência, em corrupção e em partidarização mafiosa do serviço público.
No que diz respeito a urgências econômicas, não há como escapar do deficit e da dívida públicos: menos, menos. Não fazer nada a respeito será ignorância e/ou má-fé.
Ainda menos discutido que macroeconomia foi o problema das empresas. O aspecto mais útil de uma economia de mercado é a criação desimpedida de novos negócios, produtos, serviços e soluções econômicas variadas. Muita vez, o novo vem da pequena e nova empresa.
Mas a inovação queima no inferno burocrático brasileiro, na lenha da opressão fiscal. Não custa nada, além de trabalho e inteligência, reduzir os empecilhos à criação de novos negócios, o que demanda meio ano no Brasil, entre outros óbices.
É preciso sanear a barafunda de leis tributárias, as quais criam incerteza jurídica e financeira e custam caro. O cipoal jurídico abre ainda mais espaço para o arbítrio de um fisco que já tem carta branca, pois governos deficitários precisam arrecadar avidamente. Enfim, há crédito barato e várias facilidades para a criação de oligopólios. Para o empreendimento novo, migalhas.
Reformas modestas, inteligentes, de baixo custo financeiro e político podem fazer a economia dar saltos -vide o que fizeram as normas do mercado imobiliário, o crédito consignado. Custaria muito pouco um plano de incentivo ao mercado de capitais, cadastros positivos de crédito, reformas na gestão da dívida pública, desindexação. Nada disso precisa de planos bilionários, PACs, PECs etc. E faria MUITA diferença.
Custa relativamente pouco (uma fração de trem-bala) criar pontes entre universidades e empresas: institutos de pesquisa tecnológica. Temos um caso clássico, quase clichê: a Embrapa, que inventou a agricultura brasileira moderna, que sustenta o país. Mas não damos a mínima para quem será o ministro da Ciência. Porém, o futuro do país e da ação do Estado na economia está aí.
São propostas modestas, politicamente pouco inflamáveis. Deixariam o ar mais puro e a vida mais fácil. Sem dramas. Um bom começo.
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Folha de S.Paulo - Marcelo Gleiser: Entre o espiritual e o material - 31/10/2010
Folha de S.Paulo - Marcelo Gleiser: Entre o espiritual e o material - 31/10/2010: "MARCELO GLEISER
Entre o espiritual e o material
O material sem o espiritual é cego, e o espiritual sem o material é fantasia. Nossa humanidade está na interseção
EXISTIMOS NESSA FRONTEIRA, não muito bem delineada, entre o material e o espiritual. Somos criaturas feitas de matéria, mas temos algo mais. Somos átomos animados capazes de autorreflexão, de perguntar quem somos.
Devo dizer, de saída, que espiritual não implica algo sobrenatural e intangível. Uso a palavra para representar algo natural, mesmo intangível, pelo menos por enquanto.
Pois, se olharmos para o cérebro como o único local da mente, sabemos que é lá, na dança eletro-hormonal dos incontáveis neurônios, que é gerado o senso do 'eu'.
Infelizmente, vivemos meio perdidos na polarização artificial entre a matéria e o espírito e, com frequência, acabamos optando por um dos dois extremos, criando grandes crises sociais que podem terminar em atrocidades.
Vivemos numa época onde o materialismo acentuado -do querer antes de tudo, do eu antes do outro, do agora antes do legado-, está por causar consequências sérias.
Lembro-me das sábias linhas do filósofo Robert Pirsig, no clássico 'Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas': 'Nossa racionalidade não está movendo a sociedade para um mundo melhor. Ao contrário, ela a está distanciando disso'.
Ele continua: 'Na Renascença, quando a necessidade de comida, de roupas e abrigo eram dominantes, as coisas funcionavam bem.
Mas agora, que massas de pessoas não têm mais essas necessidades, essas estruturas antigas de funcionamento não são adequadas. Nosso modo de comportamento passa a ser visto como de fato é: emocionalmente oco, esteticamente sem sentido e espiritualmente vazio'.
O ponto é claro: atingimos uma espécie de saturação material. Para chegar a isso, sacrificamos o componente espiritual. O material é reptiliano: 'Eu quero, eu pego. Se não consigo, eu mato (metaforicamente ou de fato). O que quero é mais importante do que o que você quer'.
Claro, progredimos muito, dando conforto a milhões de pessoas, mas, no frenesi do sucesso, deixamos de lado o que nos torna humanos. Não só nossas necessidades, mas nossa generosidade, nossa capacidade de dividir e construir juntos.
Quando nossa sobrevivência está garantida, recaímos em nosso modo reptiliano de agir -autocentrado- e esquecemos da comunidade.
A diferença entre nossa realidade e a de Pirsig, que escreveu essas linhas acima em 1974, é que um novo tipo de conscientização está surgindo, em que o senso de comunidade está migrando do local ao global.
Isso me deixa otimista.
Em todo o planeta, um número cada vez maior de pessoas entendeu já que os excessos materialistas da nossa geração precisam terminar. Não é apenas porque o materialismo desenfreado é superficial. É porque é letal, tanto para nós quanto para a vida à nossa volta.
Olhamos para nosso planeta de modo que não olhávamos 20 anos atrás. O sucesso do filme 'Avatar' não teria sido o mesmo em 1990.
O momento está chegando para um novo tipo de espiritualidade, que nos levará a uma existência mais equilibrada, onde o material e o espiritual mantêm um balanço dinâmico. O material sem o espiritual é cego, e o espiritual sem o material é fantasia. Nossa humanidade reside na interseção dos dois.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro 'Criação Imperfeita'
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Entre o espiritual e o material
O material sem o espiritual é cego, e o espiritual sem o material é fantasia. Nossa humanidade está na interseção
EXISTIMOS NESSA FRONTEIRA, não muito bem delineada, entre o material e o espiritual. Somos criaturas feitas de matéria, mas temos algo mais. Somos átomos animados capazes de autorreflexão, de perguntar quem somos.
Devo dizer, de saída, que espiritual não implica algo sobrenatural e intangível. Uso a palavra para representar algo natural, mesmo intangível, pelo menos por enquanto.
Pois, se olharmos para o cérebro como o único local da mente, sabemos que é lá, na dança eletro-hormonal dos incontáveis neurônios, que é gerado o senso do 'eu'.
Infelizmente, vivemos meio perdidos na polarização artificial entre a matéria e o espírito e, com frequência, acabamos optando por um dos dois extremos, criando grandes crises sociais que podem terminar em atrocidades.
Vivemos numa época onde o materialismo acentuado -do querer antes de tudo, do eu antes do outro, do agora antes do legado-, está por causar consequências sérias.
Lembro-me das sábias linhas do filósofo Robert Pirsig, no clássico 'Zen e a Arte da Manutenção de Motocicletas': 'Nossa racionalidade não está movendo a sociedade para um mundo melhor. Ao contrário, ela a está distanciando disso'.
Ele continua: 'Na Renascença, quando a necessidade de comida, de roupas e abrigo eram dominantes, as coisas funcionavam bem.
Mas agora, que massas de pessoas não têm mais essas necessidades, essas estruturas antigas de funcionamento não são adequadas. Nosso modo de comportamento passa a ser visto como de fato é: emocionalmente oco, esteticamente sem sentido e espiritualmente vazio'.
O ponto é claro: atingimos uma espécie de saturação material. Para chegar a isso, sacrificamos o componente espiritual. O material é reptiliano: 'Eu quero, eu pego. Se não consigo, eu mato (metaforicamente ou de fato). O que quero é mais importante do que o que você quer'.
Claro, progredimos muito, dando conforto a milhões de pessoas, mas, no frenesi do sucesso, deixamos de lado o que nos torna humanos. Não só nossas necessidades, mas nossa generosidade, nossa capacidade de dividir e construir juntos.
Quando nossa sobrevivência está garantida, recaímos em nosso modo reptiliano de agir -autocentrado- e esquecemos da comunidade.
A diferença entre nossa realidade e a de Pirsig, que escreveu essas linhas acima em 1974, é que um novo tipo de conscientização está surgindo, em que o senso de comunidade está migrando do local ao global.
Isso me deixa otimista.
Em todo o planeta, um número cada vez maior de pessoas entendeu já que os excessos materialistas da nossa geração precisam terminar. Não é apenas porque o materialismo desenfreado é superficial. É porque é letal, tanto para nós quanto para a vida à nossa volta.
Olhamos para nosso planeta de modo que não olhávamos 20 anos atrás. O sucesso do filme 'Avatar' não teria sido o mesmo em 1990.
O momento está chegando para um novo tipo de espiritualidade, que nos levará a uma existência mais equilibrada, onde o material e o espiritual mantêm um balanço dinâmico. O material sem o espiritual é cego, e o espiritual sem o material é fantasia. Nossa humanidade reside na interseção dos dois.
MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro 'Criação Imperfeita'
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Folha de S.Paulo - Janio de Freitas: Sobras da campanha - 31/10/2010
Folha de S.Paulo - Janio de Freitas: Sobras da campanha - 31/10/2010: "JANIO DE FREITAS
Sobras da campanha
A causa do agravamento das más relações entre a imprensa e os Poderes não esteve na criação de fatos falsos, mas no tratamento dado a fatos reais
A CAMPANHA ELEITORAL não vai se satisfazer com o fim, nas urnas, da disputa política. Além das pendências judiciais, ainda relativas ao destino de políticos, alguns dos muitos aspectos negativos da campanha plantaram as raízes de confrontos, vários outros, a se acirrarem já em futuro próximo.
As pesquisas eleitorais, por exemplo, tiveram no primeiro turno uma perda de prestígio que se projetou, no segundo, como reserva em relação a seus índices e prognósticos. As últimas sondagens e, hoje, a de boca de urna podem recuperar-se, mas a discussão sobre o papel das pesquisas nas eleições -tema já discutido em várias ondas- emite sinais de que ressurgirá com energia redobrada.
No meio político, ninguém saiu em defesa das empresas pesquisadoras. As acusações, porém, não se diferenciaram entre lado vitorioso e lado derrotado nas numerosas disputas do primeiro turno. José Serra, em caso bastante ilustrativo, no segundo turno martelou as afirmações de que 'as pesquisas erram' e de 'institutos de aluguel'. As frustrações no primeiro turno, com as derrotas e vitórias insuficientes não previstas pelas pesquisas, indispõem do mesmo modo o PT & cia. com os institutos. E o tema das pesquisas ainda é facilitado por sua associação a dois outros em pauta: a reforma eleitoral e os meios de comunicação.
O desempenho da imprensa no decorrer da campanha ampliou muito as más relações entre ela e os Poderes Executivo, Legislativo e, com menos explicitude mas não menos veracidade, Judiciário. A causa do agravamento não esteve na criação de fatos falsos, mas no tratamento dado a fatos reais. As queixas, com frequência em níveis de indignação, partem de todos os lados. Com um elemento de surpresa: nestas eleições, a TV é raramente citada nas reprovações. E de fato deixou a impressão de atuar, digamos, geralmente, com maturidade jornalística muito acima do jornalismo impresso, que assumiu o anterior papel televisivo de protagonista na luta eleitoral.
Os Conselhos de Imprensa aprovados ou propostos em pelo menos sete Assembleias Estaduais e outros no Congresso são atribuídos, nas reações da imprensa, a inspiração chavista e coisas que tais. O que os inspira, no entanto, são considerações internas. É só notar que, na Assembleia do Ceará, o primeiro desses conselhos foi aprovado por unanimidade, e entre os outros há os que são de iniciativa do DEM. Chavismo no PT, vá lá. Mas no DEM e no PSDB?
O impulso que os conselhos receberam em Assembleias e no Congresso, depois do primeiro turno, tende a assumir lugar de relevância nos próximos meses, com a esperada reação corporativa da imprensa e aliados influentes que por certo terá.
A responsabilidade pela miséria mental das disputas eleitorais está posta nos marqueteiros, com seu objetivo de vender um produto, e não de proporcionar a seleção de ideias e direção para o país. O diagnóstico não admite ressalvas, tão longe a marquetagem levou seu domínio sobre os candidatos e sobre o próprio processo eleitoral: os dois disputantes da Presidência da República nem programa, por fictício que fosse, apresentaram ao eleitorado.
Toda reação a esse engodo contrário à democracia será pouca. Transformados pelos marqueteiros em recursos do engodo, os debates sem debate entraram na lista dos componentes destas eleições que dificilmente vão sobreviver, ou sobreviver tais como são, até as próximas. Mas, por favor, não esqueça, o Brasil é brasileir
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Sobras da campanha
A causa do agravamento das más relações entre a imprensa e os Poderes não esteve na criação de fatos falsos, mas no tratamento dado a fatos reais
A CAMPANHA ELEITORAL não vai se satisfazer com o fim, nas urnas, da disputa política. Além das pendências judiciais, ainda relativas ao destino de políticos, alguns dos muitos aspectos negativos da campanha plantaram as raízes de confrontos, vários outros, a se acirrarem já em futuro próximo.
As pesquisas eleitorais, por exemplo, tiveram no primeiro turno uma perda de prestígio que se projetou, no segundo, como reserva em relação a seus índices e prognósticos. As últimas sondagens e, hoje, a de boca de urna podem recuperar-se, mas a discussão sobre o papel das pesquisas nas eleições -tema já discutido em várias ondas- emite sinais de que ressurgirá com energia redobrada.
No meio político, ninguém saiu em defesa das empresas pesquisadoras. As acusações, porém, não se diferenciaram entre lado vitorioso e lado derrotado nas numerosas disputas do primeiro turno. José Serra, em caso bastante ilustrativo, no segundo turno martelou as afirmações de que 'as pesquisas erram' e de 'institutos de aluguel'. As frustrações no primeiro turno, com as derrotas e vitórias insuficientes não previstas pelas pesquisas, indispõem do mesmo modo o PT & cia. com os institutos. E o tema das pesquisas ainda é facilitado por sua associação a dois outros em pauta: a reforma eleitoral e os meios de comunicação.
O desempenho da imprensa no decorrer da campanha ampliou muito as más relações entre ela e os Poderes Executivo, Legislativo e, com menos explicitude mas não menos veracidade, Judiciário. A causa do agravamento não esteve na criação de fatos falsos, mas no tratamento dado a fatos reais. As queixas, com frequência em níveis de indignação, partem de todos os lados. Com um elemento de surpresa: nestas eleições, a TV é raramente citada nas reprovações. E de fato deixou a impressão de atuar, digamos, geralmente, com maturidade jornalística muito acima do jornalismo impresso, que assumiu o anterior papel televisivo de protagonista na luta eleitoral.
Os Conselhos de Imprensa aprovados ou propostos em pelo menos sete Assembleias Estaduais e outros no Congresso são atribuídos, nas reações da imprensa, a inspiração chavista e coisas que tais. O que os inspira, no entanto, são considerações internas. É só notar que, na Assembleia do Ceará, o primeiro desses conselhos foi aprovado por unanimidade, e entre os outros há os que são de iniciativa do DEM. Chavismo no PT, vá lá. Mas no DEM e no PSDB?
O impulso que os conselhos receberam em Assembleias e no Congresso, depois do primeiro turno, tende a assumir lugar de relevância nos próximos meses, com a esperada reação corporativa da imprensa e aliados influentes que por certo terá.
A responsabilidade pela miséria mental das disputas eleitorais está posta nos marqueteiros, com seu objetivo de vender um produto, e não de proporcionar a seleção de ideias e direção para o país. O diagnóstico não admite ressalvas, tão longe a marquetagem levou seu domínio sobre os candidatos e sobre o próprio processo eleitoral: os dois disputantes da Presidência da República nem programa, por fictício que fosse, apresentaram ao eleitorado.
Toda reação a esse engodo contrário à democracia será pouca. Transformados pelos marqueteiros em recursos do engodo, os debates sem debate entraram na lista dos componentes destas eleições que dificilmente vão sobreviver, ou sobreviver tais como são, até as próximas. Mas, por favor, não esqueça, o Brasil é brasileir
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sábado, 30 de outubro de 2010
Folha de S.Paulo - Bia Barbosa, Jonas Valente, Pedro Caribé e João Brant: Conselhos fortalecem a democracia
- 30/10/2010
Folha de S.Paulo - Bia Barbosa, Jonas Valente, Pedro Caribé e João Brant: Conselhos fortalecem a democracia<br> - 30/10/2010: "Conselhos fortalecem a democracia
BIA BARBOSA, JONAS VALENTE, PEDRO CARIBÉ e JOÃO BRANT
A aprovação do Conselho Estadual de Comunicação pela Assembleia Legislativa do Ceará foi a senha para uma nova ofensiva da mídia comercial contra a regulamentação do setor e iniciativas análogas em debate em outros Estados.
O argumento é o de que os conselhos seriam órgãos de censura da mídia pelo governo.
A afirmação confunde e esconde o objetivo real dessas estruturas, que já existem em áreas vitais para o desenvolvimento, como saúde e educação, garantindo a participação da população na elaboração das políticas públicas para tais setores e a fiscalização da prestação do serviço público de acordo com a legislação.
Ao contrário do que bradam os grupos de comunicação, e até mesmo a OAB, os conselhos visam a ampliação do exercício da liberdade de expressão, e não sua restrição; portanto, nada têm de inconstitucionais. Não se trata de censurar conteúdos, muito menos de definir a atuação da imprensa.
Ao criá-los, os Estados não definem novas regras para a radiodifusão, o que seria prerrogativa da União, mas apoiam a aplicação dos princípios constitucionais e leis já existentes, muitas vezes ignorados por concessionárias de rádio e TV.
Os conselhos tratam das políticas estaduais, como o desenvolvimento da precária radiodifusão pública e comunitária local, o acesso da população à banda larga, e de critérios democráticos de distribuição das verbas publicitárias governamentais, feitas, em geral, de forma pouco transparente.
Em parceria com o Poder Executivo federal, podem ainda, por exemplo, fazer audiências para ouvir a população no momento de renovação de uma outorga de TV. Ou encaminhar ao Ministério Público denúncias de discriminação, que se multiplicam em programas policialescos exibidos à luz do dia.
Assim, os conselhos nada mais são do que espaços para a sociedade brasileira, representada em sua diversidade, participar da construção de políticas públicas de comunicação, acompanhar a prestação desse serviço e cobrar das devidas instâncias a responsabilização por violações das regras do setor.
Tratar a legítima reivindicação da população de se fazer ouvir nesses processos como ameaça à liberdade de imprensa é movimento daqueles que, pouco afeitos à sua responsabilidade social, querem manter privilégios em um campo marcado pela concentração de propriedade, homogeneização cultural e desrespeito à legislação.
O que a sociedade reivindica é justamente o exercício direto da liberdade de expressão por todos os segmentos, e não apenas pelos poucos que detêm o controle dos meios e impõem suas ideias à opinião pública como se fossem porta-vozes de uma diversidade que ignoram e omitem. Essa é a real censura à liberdade de expressão no país.
Ao questionar esse modelo, a Conferência Nacional de Comunicação, que reuniu milhares de representantes de organizações sociais, governos (não apenas o federal) e empresários que compreenderam a importância do debate democrático com a população, aprovou, em votação quase unânime, a criação de um conselho nacional e de conselhos estaduais.
Infelizmente, a cobertura sobre o tema tem distorcido as propostas e censurado visões favoráveis aos conselhos, o que comprova que setores dos meios de comunicação interditam o debate quando ele toca em seus interesses comerciais.
É sintomático que aqueles que se arvoram no papel de informar censurem o contraditório e defendam um ambiente desprovido de obrigações legais e mecanismos de fiscalização. A regulação da comunicação está consolidada em todas as democracias como baliza de Estados efetivamente plurais.
Se nesses países, com sistemas de comunicação mais desenvolvidos, iniciativas como essa não são consideradas ameaças à liberdade de expressão, por que aqui deveriam ser?
BIA BARBOSA , 33, JONAS VALENTE, 29, PEDRO CARIBÉ, 27, e JOÃO BRANT, 31, são integrantes do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social.
– Enviado usando a Barra de Ferramentas Google"
BIA BARBOSA, JONAS VALENTE, PEDRO CARIBÉ e JOÃO BRANT
A aprovação do Conselho Estadual de Comunicação pela Assembleia Legislativa do Ceará foi a senha para uma nova ofensiva da mídia comercial contra a regulamentação do setor e iniciativas análogas em debate em outros Estados.
O argumento é o de que os conselhos seriam órgãos de censura da mídia pelo governo.
A afirmação confunde e esconde o objetivo real dessas estruturas, que já existem em áreas vitais para o desenvolvimento, como saúde e educação, garantindo a participação da população na elaboração das políticas públicas para tais setores e a fiscalização da prestação do serviço público de acordo com a legislação.
Ao contrário do que bradam os grupos de comunicação, e até mesmo a OAB, os conselhos visam a ampliação do exercício da liberdade de expressão, e não sua restrição; portanto, nada têm de inconstitucionais. Não se trata de censurar conteúdos, muito menos de definir a atuação da imprensa.
Ao criá-los, os Estados não definem novas regras para a radiodifusão, o que seria prerrogativa da União, mas apoiam a aplicação dos princípios constitucionais e leis já existentes, muitas vezes ignorados por concessionárias de rádio e TV.
Os conselhos tratam das políticas estaduais, como o desenvolvimento da precária radiodifusão pública e comunitária local, o acesso da população à banda larga, e de critérios democráticos de distribuição das verbas publicitárias governamentais, feitas, em geral, de forma pouco transparente.
Em parceria com o Poder Executivo federal, podem ainda, por exemplo, fazer audiências para ouvir a população no momento de renovação de uma outorga de TV. Ou encaminhar ao Ministério Público denúncias de discriminação, que se multiplicam em programas policialescos exibidos à luz do dia.
Assim, os conselhos nada mais são do que espaços para a sociedade brasileira, representada em sua diversidade, participar da construção de políticas públicas de comunicação, acompanhar a prestação desse serviço e cobrar das devidas instâncias a responsabilização por violações das regras do setor.
Tratar a legítima reivindicação da população de se fazer ouvir nesses processos como ameaça à liberdade de imprensa é movimento daqueles que, pouco afeitos à sua responsabilidade social, querem manter privilégios em um campo marcado pela concentração de propriedade, homogeneização cultural e desrespeito à legislação.
O que a sociedade reivindica é justamente o exercício direto da liberdade de expressão por todos os segmentos, e não apenas pelos poucos que detêm o controle dos meios e impõem suas ideias à opinião pública como se fossem porta-vozes de uma diversidade que ignoram e omitem. Essa é a real censura à liberdade de expressão no país.
Ao questionar esse modelo, a Conferência Nacional de Comunicação, que reuniu milhares de representantes de organizações sociais, governos (não apenas o federal) e empresários que compreenderam a importância do debate democrático com a população, aprovou, em votação quase unânime, a criação de um conselho nacional e de conselhos estaduais.
Infelizmente, a cobertura sobre o tema tem distorcido as propostas e censurado visões favoráveis aos conselhos, o que comprova que setores dos meios de comunicação interditam o debate quando ele toca em seus interesses comerciais.
É sintomático que aqueles que se arvoram no papel de informar censurem o contraditório e defendam um ambiente desprovido de obrigações legais e mecanismos de fiscalização. A regulação da comunicação está consolidada em todas as democracias como baliza de Estados efetivamente plurais.
Se nesses países, com sistemas de comunicação mais desenvolvidos, iniciativas como essa não são consideradas ameaças à liberdade de expressão, por que aqui deveriam ser?
BIA BARBOSA , 33, JONAS VALENTE, 29, PEDRO CARIBÉ, 27, e JOÃO BRANT, 31, são integrantes do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social.
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O país velho e conservador que emerge da campanha | Brasilianas.Org
O país velho e conservador que emerge da campanha | Brasilianas.Org: "O país velho e conservador que emerge da campanha
Enviado por luisnassif, qui, 28/10/2010 - 07:58
Uma eleição para não ser esquecida | Valor Online
Maria Inês Nassif |
O novo presidente será conhecido já no domingo, tão logo contabilizados os votos das urnas eletrônicas. O novo Brasil político, no entanto, descortinou-se durante a campanha, é velho e conservador e merecerá certamente a atenção de especialistas depois do pleito. Os partidos, em especial os de oposição, conseguiram extrair da sociedade os seus mais primitivos preconceitos, por meio de uma agenda conservadora e religiosa. Qualquer que seja o resultado da eleição - e até esse momento não existem divergências entre as pesquisas dos institutos sobre o favoritismo da candidata Dilma Rousseff (PT) - o eleito terá de lidar com uma agenda de políticas públicas da qual foram eliminadas importantes conquistas para a sociedade como um todo, e na qual o elemento religioso passou a ser um limitador da ação do Estado.
A ação da igreja conservadora e de setores do pentecostalismo contra Dilma, por conta de sua posição sobre o aborto, é o exemplo mais gritante. No Brasil, a cada dois dias morre uma mulher em conseqüência de um aborto clandestino. A legislação brasileira ao menos conseguiu trazer mulheres que correm risco de vida em decorrência de um aborto que já foi malfeito para dentro do Sistema Único de Saúde (SUS) e garante que a rede pública faça com segurança os abortos aceitos legalmente - os de vítimas de estupro ou quando a gravidez coloca em risco a vida da mulher. Como assunto de saúde pública, o aborto não poderia ter ocupado o centro dos debates. Isso é uma questão de Estado. Como convicção moral, a mudança na legislação está na órbita do Congresso - e esses setores elegeram seus representantes. O debate eleitoral sobre o aborto, numa eleição para a Presidência, foi a instrumentalização política de um dogma - pelo menos dos setores religiosos conservadores - e excluiu do debate a maior interessada, a mulher. A eleição conseguiu retroceder décadas esse debate. O movimento feminista não agradece.
Campanha trouxe à tona preconceitos que pareciam abolidos
O país que se redemocratizou há um quarto de século e há 22 anos conseguiu entender-se em torno de uma Constituinte cujo produto final foi avançado politicamente, manteve uma reverência envergonhada aos atores políticos mais importantes do regime anterior - dos militares à Igreja conservadora - e um medo subjetivo de se contrapor de fato ao passado. Sem lidar com os seus fantasmas, tem reincorporado vários deles à vida política. É inadmissível que num país que viveu 21 anos sob o tacão militar, por exemplo, setores da sociedade (e os próprios militares) tenham reagido de forma tão desproporcional ao III Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), ou rejeitem de forma tão violenta o acerto com esse passado. Ao longo dos anos de democracia, determinados setores sociais passaram a reincorporar valores que pareciam ter sido abolidos do manual de como fazer política. Ao longo desses 25 anos que nos separam do último ditador militar, a direita, que se envergonhara no final da ditadura, lentamente desenterrou os velhos fantasmas e refez os preconceitos. Aliás, não apenas a velha direita. Uma nova direita, que se formou com atores que vinham também da resistência democrática, aceitou o caminho do conservadorismo ideológico para reaglutinar uma elite que ficou sem norte, e para a qual a emergência de grandes parcelas da população que estavam na base da estrutura social à classe média assusta - até porque a elite brasileira não tem historicamente experiência com realidades onde a disparidade de renda é menor e onde o aumento da escolaridade transforma pobres em cidadãos, e não em votos a serem manipulados.
Dentre todos os setores que atravessaram da esquerda para a direita nessas últimas duas décadas, o PSDB foi o que perdeu mais. Formado com um ideário social-democrático, mas sem experiência de articulação de política partidária e sem vocação para liderança de massas, chegou ao poder junto com o neoliberalismo tardio brasileiro, assimilou valores conservadores, incorporou-os ao seu tecido orgânico e sobreviveu, enquanto mantinha o governo federal, com a ajuda da política tradicional (e conservadora). Na oposição, não conseguiu voltar ao leito social-democrata. Deixou-se empurrar para a direita pelo PT, quando o presidente Luis Inácio Lula da Silva assumiu o seu primeiro mandato, e se aproximou tanto do PFL que as divergências entre ambos se diluíram ao longo do tempo, ao ponto de canibalizarem votos uns dos outros. Incorporou o discurso neoudenista, transformou-se num partido de vida meramente parlamentar, não reorganizou o partido para formar militância. O PSDB, hoje, é um partido que aparece como tal para apenas disputar eleições.
Isso é péssimo. O primeiro turno já compôs o Legislativo federal. O PT saiu das eleições mais forte. O PMDB, que é o partido que todos falam mal, mas do qual nenhum governo consegue se livrar, continua forte com a sua fórmula de funcionar como uma federação de partidos regionais e tende a incorporar o DEM, ex-PFL, e ficará mais forte ainda. Os demais, inclusive o PSDB, serão partidos médios - com a diferença que o PSB, por exemplo, é um partido médio em crescimento, e o PSDB terá que se reinventar para voltar a crescer, se não voltar a ser governo. O PT se acomodou no espaço da social democracia e o PMDB permanece no centro, se é possível atribuir a esse partido uma posição ideológica que não seja a da fisiologia. O espaço que o PSDB tem para se reinventar fora da direita é mínimo. O DEM e o PSDB deram muito trabalho ao presidente Lula, em oito anos de governo, mas carregaram no jogo neoudenista e se desgastaram demais. Além disso, a hegemonia paulista no PSDB permanece, o que obstrui caminhos de líderes não paulistas que poderiam reduzir o desgaste neste momento, como Aécio Neves (MG).
Não é arriscado apostar na emergência de um novo partido de oposição. O PSDB precisaria de lideranças muito hábeis para se reinventar, e de uma solidariedade e organicidade que nunca cultivou. E precisaria enterrar de vez os preconceitos e preceitos conservadores que têm desenterrado a cada nova eleição. Enfim, empurrar-se de novo para uma posição de centro. O passado do partido, todavia, não recomenda que se trabalhe com essa hipótese.
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Enviado por luisnassif, qui, 28/10/2010 - 07:58
Uma eleição para não ser esquecida | Valor Online
Maria Inês Nassif |
O novo presidente será conhecido já no domingo, tão logo contabilizados os votos das urnas eletrônicas. O novo Brasil político, no entanto, descortinou-se durante a campanha, é velho e conservador e merecerá certamente a atenção de especialistas depois do pleito. Os partidos, em especial os de oposição, conseguiram extrair da sociedade os seus mais primitivos preconceitos, por meio de uma agenda conservadora e religiosa. Qualquer que seja o resultado da eleição - e até esse momento não existem divergências entre as pesquisas dos institutos sobre o favoritismo da candidata Dilma Rousseff (PT) - o eleito terá de lidar com uma agenda de políticas públicas da qual foram eliminadas importantes conquistas para a sociedade como um todo, e na qual o elemento religioso passou a ser um limitador da ação do Estado.
A ação da igreja conservadora e de setores do pentecostalismo contra Dilma, por conta de sua posição sobre o aborto, é o exemplo mais gritante. No Brasil, a cada dois dias morre uma mulher em conseqüência de um aborto clandestino. A legislação brasileira ao menos conseguiu trazer mulheres que correm risco de vida em decorrência de um aborto que já foi malfeito para dentro do Sistema Único de Saúde (SUS) e garante que a rede pública faça com segurança os abortos aceitos legalmente - os de vítimas de estupro ou quando a gravidez coloca em risco a vida da mulher. Como assunto de saúde pública, o aborto não poderia ter ocupado o centro dos debates. Isso é uma questão de Estado. Como convicção moral, a mudança na legislação está na órbita do Congresso - e esses setores elegeram seus representantes. O debate eleitoral sobre o aborto, numa eleição para a Presidência, foi a instrumentalização política de um dogma - pelo menos dos setores religiosos conservadores - e excluiu do debate a maior interessada, a mulher. A eleição conseguiu retroceder décadas esse debate. O movimento feminista não agradece.
Campanha trouxe à tona preconceitos que pareciam abolidos
O país que se redemocratizou há um quarto de século e há 22 anos conseguiu entender-se em torno de uma Constituinte cujo produto final foi avançado politicamente, manteve uma reverência envergonhada aos atores políticos mais importantes do regime anterior - dos militares à Igreja conservadora - e um medo subjetivo de se contrapor de fato ao passado. Sem lidar com os seus fantasmas, tem reincorporado vários deles à vida política. É inadmissível que num país que viveu 21 anos sob o tacão militar, por exemplo, setores da sociedade (e os próprios militares) tenham reagido de forma tão desproporcional ao III Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), ou rejeitem de forma tão violenta o acerto com esse passado. Ao longo dos anos de democracia, determinados setores sociais passaram a reincorporar valores que pareciam ter sido abolidos do manual de como fazer política. Ao longo desses 25 anos que nos separam do último ditador militar, a direita, que se envergonhara no final da ditadura, lentamente desenterrou os velhos fantasmas e refez os preconceitos. Aliás, não apenas a velha direita. Uma nova direita, que se formou com atores que vinham também da resistência democrática, aceitou o caminho do conservadorismo ideológico para reaglutinar uma elite que ficou sem norte, e para a qual a emergência de grandes parcelas da população que estavam na base da estrutura social à classe média assusta - até porque a elite brasileira não tem historicamente experiência com realidades onde a disparidade de renda é menor e onde o aumento da escolaridade transforma pobres em cidadãos, e não em votos a serem manipulados.
Dentre todos os setores que atravessaram da esquerda para a direita nessas últimas duas décadas, o PSDB foi o que perdeu mais. Formado com um ideário social-democrático, mas sem experiência de articulação de política partidária e sem vocação para liderança de massas, chegou ao poder junto com o neoliberalismo tardio brasileiro, assimilou valores conservadores, incorporou-os ao seu tecido orgânico e sobreviveu, enquanto mantinha o governo federal, com a ajuda da política tradicional (e conservadora). Na oposição, não conseguiu voltar ao leito social-democrata. Deixou-se empurrar para a direita pelo PT, quando o presidente Luis Inácio Lula da Silva assumiu o seu primeiro mandato, e se aproximou tanto do PFL que as divergências entre ambos se diluíram ao longo do tempo, ao ponto de canibalizarem votos uns dos outros. Incorporou o discurso neoudenista, transformou-se num partido de vida meramente parlamentar, não reorganizou o partido para formar militância. O PSDB, hoje, é um partido que aparece como tal para apenas disputar eleições.
Isso é péssimo. O primeiro turno já compôs o Legislativo federal. O PT saiu das eleições mais forte. O PMDB, que é o partido que todos falam mal, mas do qual nenhum governo consegue se livrar, continua forte com a sua fórmula de funcionar como uma federação de partidos regionais e tende a incorporar o DEM, ex-PFL, e ficará mais forte ainda. Os demais, inclusive o PSDB, serão partidos médios - com a diferença que o PSB, por exemplo, é um partido médio em crescimento, e o PSDB terá que se reinventar para voltar a crescer, se não voltar a ser governo. O PT se acomodou no espaço da social democracia e o PMDB permanece no centro, se é possível atribuir a esse partido uma posição ideológica que não seja a da fisiologia. O espaço que o PSDB tem para se reinventar fora da direita é mínimo. O DEM e o PSDB deram muito trabalho ao presidente Lula, em oito anos de governo, mas carregaram no jogo neoudenista e se desgastaram demais. Além disso, a hegemonia paulista no PSDB permanece, o que obstrui caminhos de líderes não paulistas que poderiam reduzir o desgaste neste momento, como Aécio Neves (MG).
Não é arriscado apostar na emergência de um novo partido de oposição. O PSDB precisaria de lideranças muito hábeis para se reinventar, e de uma solidariedade e organicidade que nunca cultivou. E precisaria enterrar de vez os preconceitos e preceitos conservadores que têm desenterrado a cada nova eleição. Enfim, empurrar-se de novo para uma posição de centro. O passado do partido, todavia, não recomenda que se trabalhe com essa hipótese.
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sexta-feira, 29 de outubro de 2010
“Lula é um gênio do povo” « CartaCapital
“Lula é um gênio do povo” « CartaCapital: "“Lula é um gênio do povo”
Publico 25 de outubro de 2010 às 15:58h
Amiga de Dilma e Serra, a economista portuguesa Maria da Conceição Tavares, figura nacional no Brasil, vota em Dilma. E explica porque acha que Lula é um líder sem par. Foto: Marcelo Carnaval
Por Alexandra Lucas Coelho*
Amiga de Dilma e Serra, a economista portuguesa Maria da Conceição Tavares, figura nacional no Brasil, vota Dilma. E explica porque acha que Lula é um líder sem par
Maria da Conceição Tavares é daquelas figuras “maiores que a vida”. Aos 80 anos, a fumar ininterruptamente na sua casa do bairro carioca Cosme Velho, tem algo de Indira Gandhi ou Churchill. Voz e riso de trovão, olhar agudo, resposta incisiva. Respeitada em todo o espectro político como economista e pensadora, é uma das grandes conselheiras do PT. Nunca quis ser ministra porque diz tudo o que pensa.
Portuguesa, nascida em Anadia, crescida em Lisboa, filha de um anarquista que alojava refugiados da Guerra Civil de Espanha, veio casada e grávida para o Brasil, aos 21 anos, por causa de Salazar. Desde então, ao longo de 60 anos, formou gerações de economistas e líderes políticos, incluindo Lula.
A senhora deve ser a única pessoa no Brasil que consegue juntar no aniversário dos seus 80 anos….
Os dois candidatos à presidência da República! [ri-se]
… Dilma Rousseff e José Serra.
Mas o clima estava muito bom. Eles nunca se trataram mal, nem nada. Eram pessoas civilizadas, que se tratavam bem. A campanha é que despertou essa trapalhada. A noite [do aniversário, 24 de Abril] correu perfeita. Nem se discutiu política. Foi uma festa.
Eles sempre tiveram boa relação?
Não que sejam amigos pessoais, como eu sou amiga dos dois. Mas sempre tiveram boa relação. O Serra era um sujeito civilizado. Não sei o que deu na cabeça dele agora.
Conhece-o muito bem…
Desde 1968.
… se tivesse de explicar quem é José Serra, o que diria?
Um bom economista. Ambos éramos do PMDB, a frente democrática contra a ditadura. E ele saiu para fundar, com o [Mário] Covas e o Fernando Henrique [Cardoso], o PSDB, uma espécie de ala esquerda. Muita gente não acompanhou isso. Eu, por exemplo, não fui porque não faço muita fé no Fernando Henrique, que sempre foi meio dúbio, trapalhão. O Covas é que era o homem importante. Morreu. E aí… A partir do momento em que Fernando Henrique foi para o poder, o Serra manteve a posição dele como economista contra a política neoliberal.
Porque é que acha o Fernando Henrique “meio dúbio”?
Diz uma coisa para agradar a uns e outra para agradar a outros. Não fazia política, mas era um político na academia. E o Serra não, sempre foi muito “straight”, muito direito.
Confiaria mais no Serra que no Fernando Henrique?
Sem dúvida [ri]. E o primeiro governo [de Fernando Henrique] mostrou isso. Porque aí o Serra foi ministro de Planejamento contra a política neo-liberal do Fernando Henrique. Depois foi um bom ministro da saúde. Não havia nada nele que demonstrasse que ia ter uma mudança assim tão brusca. Mesmo quando foi candidato contra o Lula foi uma campanha normal. Ele sempre respeitou o Lula.
Mas acha que Serra mudou?
Mudou. Por razões de interesse político.
Como é que essa mudança se manifesta?
Na arrogância, na agressão. Ele não era assim.
Mas na segunda volta quem passou ao ataque foi Dilma.
Mas não foi ataque pessoal, xingando ele. Foi atacando o governo anterior [de Fernando Henrique]. E ele não se defendeu.
Depois [a campanha] foi piorando. E agora piorou de vez.
Como vê o incidente em que Serra acusou o PT de ser nazi, ao agredirem-no com um rolo de papel?
Ah, são jovens na rua. Mesmo que sejam pêtistas não tem a ver com o partido em geral. Essa mania de chamar um partido de nazi, acho de maluco, num país democrático como é hoje o Brasil. A gente está extremando o argumento. O Serra está muito agressivo. É verdade que essa deve ser a última oportunidade, mas parece que lhe bateu o desespero.
Mas não acha que Dilma mudou de atitude também, ficou mais agressiva?
Claro. Mas é para responder. Defender a honra dela. Ele diz que ela é mentirosa, que disse isto e depois aquilo. Diz que ela abriga a corrupção, que é dela a culpa da Erenice [Guerra, ex-braço direito de Dilma, acusada de corrupção], que todos os problemas do Brasil são culpa dela. Ela está mais agressiva no tom, inclusive mais assertiva. Mas não está insultando, dizendo que ele é ladrão.
De qualquer maneira, [a campanha] degringolou. Passou a ser um debate agressivo e vazio. Conheceu Dilma nos anos 80, sua aluna na Unicamp. Como a pode apresentar?
É uma moça que sempre fez política, como o Serra. Fez política nos partidos radicais nos anos 70, ficou presa muitos anos, teve um comportamento fantástico na prisão, é uma mulher de muita coragem, de nervo. Ela não se desmorona à toa.
Em 80 veio para Campinas, para o doutoramento. Era brilhante. Brilhantes, eles são os dois.
Serra e Dilma?
É. Ambos são bons economistas. Isso é que irrita. Podiam estar falando de coisas importantes para o Brasil.
Portanto, em termos de economia, não fica preocupada com nenhum dos dois?
Não, não fico. Quero dizer, com o Serra fico, em termos de política. Porque ele virou muito conservador e é frontalmente contra a política externa do Brasil, essa política de autonomia. Ele não é a favor das relações Sul-Sul. Preferia que a gente mantivesse a relação Norte-Sul, mais estreita com os Estados Unidos, o que acho um erro. E ele é muito fiscalista. Tanto, que o que está dizendo é contraditório. É a favor do corte do gasto público, mas diz que vai dar não sei quantos mil de salário mínimo, e para os aposentados. Está fazendo promessas demagógicas, o que não é nada o estilo dele.
Existe a ideia de que a Dilma é uma construção do Lula, alguém que não tem personalidade própria.
Isso é uma bobagem. O que ela não tem é o conhecimento político do Lula. Mas foi ministra de Minas e Energias, um sector pesado, em plena crise de energia eléctrica — herança da política boba do Fernando Henrique —, e foi Chefe da Casa Civil, uma casa política. E está com ele [Lula] todos os dias. Tem aprendido com ele tudo o que há para aprender sobre o Brasil. É evidente que sem ele não teria chance. O Serra já foi candidato a várias coisas, ela não. Então, o facto de ser apoiada pelo Lula ajuda. Não bastava o PT. O PT não tem peso suficiente para fazê-la ganhar. Quem tem é o Lula, uma figura política como nunca ocorreu no país. Para dizer a verdade, pouco ocorreu no mundo.
No vídeo em que apoia à Dilma diz: não sigam a propaganda das grandes empresas, o Brasil tem de fazer as pazes com o povo, não pode ficar só votando para os 10 ou 20 por cento de cima, e a mulher do povo é a Dilma. Acha que existem dois Brasis, essa faixa de cima que é anti-Lula e o Brasil do povo?
Acho. Tranquilamente.
E isso está a manifestar-se de novo nesta eleição?
De novo. Agora, tem a classe média, que vai para cá ou para lá, conforme a conjuntura.
A classe média que ascendeu nos últimos anos?
A que ascendeu foi a média-baixa. A média-alta, não. E essa é que tem muita raiva do Lula e não vai votar na Dilma.
Nessa faixa média alta, o Lula é frequentemente descrito como um ignorante, ou um populista.
Primeiro, não é populista porque é do povo. Populista seria um cara da elite que estivesse manipulando o povo. Ele ascendeu do povo, e foi sendo feito pelo povo.
Depois, ignorante, coisa nenhuma. O Lula sabe mais do Brasil do que ninguém. E sabe mais de economia aplicada, prática, do que ninguém. Já é candidato desde 1989. Então, na primeira derrota fez o Instituto de Cidadania, uma espécie de ONG, e convidava todos os intelectuais. Eu conhecia-o de vista, mas aí passei a ser assessora dele. Eu, uma série de economistas progressistas, filósofos, sociólogos.
Era uma espécie de academia informal?Claro. De maneira que ele fez uma “universidade” que durou de 1989 a 2002.
Como “aluno”, como era?
Ah, brilhante, brilhante. Tem uma memória prodigiosa. E quando havia discussão académica e ele percebia que as questões estavam resvalando, não deixava. Ele vai no gume. Tem um sentido de oportunidade muito afiado, uma mente muito lógica. Isso é que é impressionante. Tem um coração popular, uma emoção popular, mas a cabeça dele é totalmente lógica. É dos homens mais inteligentes que conheci. Se não o mais.
Diria que o Lula é talvez o homem mais inteligente que conheceu?
Sem dúvida. E não apenas politicamente. É uma inteligência nata. É um génio do povo. Nós tivemos um génio do povo. Se não, não teria chegado lá. Você acha que alguém vindo de onde ele veio, com as dificuldades que teve, chega a presidente? Não. Ele é um génio do povo, mesmo, e impressiona qualquer um.
A senhora tem uma frase que é: “O Lula é o maior intelectual orgânico do Brasil.”
Os intelectuais como eu são clássicos. E ele é orgânico. Interpreta e representa organicamente o povo brasileiro.
Não tem nada a ver com um Hugo Chávez?
Não, imagina! O Chávez é de origem militar. Ao Chávez é que se podia chamar populista, embora eu o ache mais uma espécie de caudilho ilustrado.
E o Lula não tem nada de caudilho [líder carismático e autoritário]?
Não, que caudilho! Ele jamais faz apelos carismáticos. Ele fala com o povo, ou com quem quer que seja, de igual para igual. Faz piada, faz humor.
É um deles?
É um deles. Mas também quando se encontra com a classe média é como um de nós. Não tem complexo de inferioridade, nem de superioridade.
Não tem ressentimento, é isso?
De nenhuma espécie. E não gosta que fiquem elogiando ele de mais. É muito lúcido. Como a lucidez é uma característica da inteligência analítica, ele tem uma inteligência analítica poderosa. E como é do povo, eu digo que é orgânico.
A senhora escreveu que ele foi quem mais avançou na “republicanização do Brasil”. No sentido de democratização?
É. Porque está dando voz ao povo. A preocupação dele é tornar cidadãos os que estão à margem. E não com palavras, com factos. Indo até eles, dando-lhes direitos, com a preocupação de que as políticas sociais sejam para incorporação.
O Lula, entre as derrotas, fez várias viagens ao Brasil inteiro, chamadas Caravanas da Cidadania. A palavra que escolhe sempre é cidadania. Por isso digo que é republicanização. O que ele quer é que todos os brasileiros tenham cidadania, possam-se expressar, ter direitos. Quer acabar com os dois Brasis, em resumo. Quer fazer disto uma nação.
Quando chegou ao Brasil, o pensamento do antropólogo Darcy Ribeiro foi importante para si, a ideia de construir uma democracia multiracial nos trópicos. O Brasil está mais perto disso?
Está. Nunca julguei que chegasse. Mas agora acho que a democracia está consolidada no Brasil. A coisa multiracial está avançando, porque os direitos dos negros, dos índios, estão sendo reconhecidos. E os dois Brasis estão terminando. Essa nossa vergonha.
Lula é acusado de tentações autoritárias, de se apoderar da máquina do Estado, de se enfurecer com a imprensa. Há toda esta tensão.
Ele ironiza, ridiculariza, o que é outra coisa, porque é muito do estilo popular, rir dos defeitos do adversário.
Mas não há uma tentação autoritária? Quando se fala do inchaço da máquina do Estado…
Que inchaço da máquina do Estado, coisa nenhuma. Nós desmontámos o Estado do Fernando Henrique, que fez uma política neo-liberal durante oito anos, nunca fez concurso público e deixou que todo o Estado ficasse terciarizado, com gente que trabalhava sem contrato, sem carteira assinada. Isso é que inchaço. O Lula faz concurso público, a terciarização está diminuindo, está aumentando o pessoal com carteira assinada. Enfim, estão-se reconhecendo formalmente os direitos trabalhistas. E isto é autoritarismo?
É possível que em alguns cargos de confiança o Lula tenha errado, mas também o Fernando Henrique errou, botou vários em cargos de confiança que nas privatizações se revelaram pessoas sem escrúpulos. Errar em cargo de confiança acontece em qualquer governo. Agora, no Estado, não, porque o Lula fez concurso. Foi por mérito, não para inchar a máquina.A corrupção foi o problema que prejudicou mais o governo Lula?
Foi o que prejudicou a imagem. Não propriamente dele, que tem 80 por cento de aprovação. Prejudicou os candidatos dele, como está prejudicando Dilma, prejudicou a imagem do governo.
Mas ele tirou, por exemplo, o José Dirceu [protagonista do escândalo Mensalão, em que o PT pagava a deputados uma mesada], de quem era amigo antiquíssimo. Não há nepotismo.
Todos os casos de corrupção declarada, ou objecto de inquérito público, foram demitidos.
Por exemplo, com o Berlusconi, não há dúvida nenhuma de que aquilo é um governo corrupto, porque ele é um corrupto. Agora, ninguém acusou o Lula directamente. Acusaram-no de ter fechado os olhos, mas ele não fechou olho nenhum. Podia ter mantido o José Dirceu, e dizer que era culpa de fulaninho e sicraninho, enfim daqueles que fizeram lá os “mal-feitos”.
Como podia ter mantido a Erenice, não tinha processo contra ela.
Agora, tem pêtistas que não gostaram que o PT não expulsasse esses quadros. Eu fazia parte da tendência chamada refundação. Achava que devíamos dar uma refundada e ter um código de ética mais pesado. O argumento dos outros era que seria injusto expulsar enquanto não ficasse provada a culpa.
Obviamente, não tenho a menor simpatia pelos quadros que foram acusados. Quanto mais não seja por ineficácia política. De um homem da importância de José Dirceu, que foi presidente do partido anos, e deixa o tesoureiro nomeado por ele fazer o que fez, dele é que se pode dizer que como estava preocupado com o poder esqueceu essa parte [ter mão na corrupção]. Ele pode ser acusado disso. O Lula não. Não tinha nada que ver com a máquina do partido. Lançou a Dilma, e depois é que o partido referendou. O Lula sempre teve muita autonomia em relação ao partido. Tanto que o pessoal fala que há o pêtismo e o lulismo.
Acha que há?
Há mesmo. Porque o Lula é maior que o partido. Acha que essa malta pobre que vota nele é pêtista? Coisa nenhuma. São pentecostais, a maior parte não tem partido. Acreditam no Lula. O lulismo é um fenómeno de massas. O pêtismo é um fenómeno orgânico, de um partido de esquerda que foi andando para uma espécie de centro-esquerda, social-democrata, que hoje já não existe na Europa, porque a Europa está decadente.
A Europa está decadente?
Ah, está. Puxa vida. Bota decadência, não é? Até nós.
Até nós?
Nós, portugueses [risos].
Seguimos o exemplo dos outros. O único país que seguiu menos esse exemplo foi a Suécia, que teve um período neo-liberal muito curto. Nós virámos neo-liberais. Não somos social-democratas faz horas. Nem nós, nem a Europa inteira continental. Nem a Inglaterra, nem nada.
O Lula é um social-democrata?
É. Vamos ver: social-democrata é quando você representa organicamente os trabalhadores. Ora, se há social-democrata é o Lula. Jamais foi a favor da luta armada, jamais. Sempre ficava meio chateado entre a discussão dos intelectuais e dos que vinham da igreja. O PT tem três origens: a sindical, que é a dele, a da igreja, católica, e a dos intelectuais revolucionários. Perdiam um tempo danado a discutir e a vontade dele era mandar os padres rezar e os intelectuais para a academia, e não chatearem ele [ri]. Isso ele disse uma vez para mim, rindo: “Você não tem ideia do que era!” Quando eu entrei, [o PT] já estava manso.Nunca quis ser ministra?
Não. Não tenho temperamento para ser executiva. Fui deputada porque me pediram.
O Lula nunca a convidou?
Não. Ele conhece-me, sabe que eu sou pêlo no vento. Eu sou muito mais agressiva do que a Dilma, muito mais. Ela consegue disfarçar a raiva dela, eu não. Quando fico com raiva, fico. Digo na cara das pessoas o que acho. Eu não seria uma boa ministra. Sou uma boa assessora.
Porque diz o que pensa.
Isso. O que é importante. Alguém que não fica puxando o saco do chefe. Eu não puxo saco de ninguém. Várias vezes disse ao Lula coisas com que ele não concordava.
Por exemplo?
Por exemplo, quando ele fez a aliança com o Garotinho [ex-governador do Rio, condenado por corrupção]. Eu não votei.
Já agora, Collor de Melo e Sarney [ex-presidentes envolvidos em escândalos, que também fazem parte da base de apoio de Lula]. Sente-se confortável com estas alianças?
Eu não sigo as instruções. Se a aliança for com alguém que considero indecoroso, não voto.
É o caso de Sarney ou Collor?
Collor, sim. Sarney, nem tanto. O Sarney que conheço é o da transição. Na primeira parte do governo fez o que pôde. Depois, degringolou. E nunca mais foi candidato a nada. Acho injusto confundir o Sarney com o Collor. O Collor é uma coisa desqualificada.
Há quem critique programas como o Bolsa Família como a criação de uma rede de dependência do governo, que pode ter o efeito contrário justamente a essa autonomia dos cidadãos. O que acha disto?
Acho que é mentira. O Lula tirou 28 milhões da pobreza. Esses não são mais dependentes da Bolsa Família, porque a Bolsa Família é para os pobres. Esses 28 milhões entraram no mercado de trabalho, são assalariados, ou têm os seus pequenos negócios. O que o Lula fez foi proteger os pobres, não deixar os caras morrer de fome. Mas uma vez que ficaram acima do salário mínimo, não. Ninguém que ganhe acima do salário mínimo tem Bolsa Família. Pode ter outras.
Como economista, como vê estes programas?
Acho que é o correcto. Ao tirar da pobreza, e meter no mercado de trabalho vinte e tantos milhões, você está consolidando o mercado interno. Por isso é que a crise internacional não nos atingiu duramente. Por isso, e porque o sector externo estava bem. Tínhamos pago a dívida externa.
E Lula investiu no consumo…
É, deu crédito, além de ter dado emprego. Deu muito emprego. Mais do que prometeu. Investiu no mercado interno e deu financiamento para aquisição de bens necessários, tipo geladeira [frigorífico]. As pessoas dizem: “Ah, fica financiando geladeira…” Mas neste país quente querem que não se financie geladeira? E as pessoas comem o quê? Carne podre? Evidentemente que o que ele fez está correcto. Passámos de uma taxa de crédito de 20 e tantos por cento para 40 e tantos. O que é bom. Não é como nos países ricos, que era 120, 130, o que deu na catástrofe que deu [crise de 2008]. Aqui não tem alavancagem do crédito. Não tem incumprimento alto, inclusive, ou seja, não pagar a prestação que deve. Os devedores pagam, e quem mais paga são os pobres, exactamente. Essa é outra ideia, que pobre não paga. É mentira. Quem não paga é a classe média-alta, que usa cartão de crédito, cheque especial, vai-se endividando e endividando. O povo não faz isso. Nem tem cartão de crédito nem cheque especial. Tem banco, isso sim. Foi uma coisa importante.
O Lula não fez só o Bolsa Família. Fez O Luz para Todos, fez a Bancarização, que é você ter direito, mesmo sem carteira de trabalho, a poder ir ao banco e ter crédito. Essas coisas que implicam integrar o cidadão na sociedade.O que é está em jogo nesta eleição, de facto? É uma eleição importante?
É importante. É a continuidade deste esforço em todos os sentidos. Desde a política externa autónoma, que é fundamental. As pessoas não se dão conta, porque aqui ninguém sabe nada de política externa, então a classe média nem fala no assunto.
Uma das críticas maiores ao governo Lula é o facto dele falar no tom em que fala com Chávez, com o regime cubano, com Ahmadinejad.
Isso é tudo uma bobagem, porque tem de falar com todo o mundo. Lula também fala, e é amigo, do presidente dos Estados Unidos. Só que não se submete.
Mas a questão não é falar, é…
É falar sim, porque ele não fez nada que não fosse de acordo com as regras da nossa constituição e as regras internacionais.
A questão que algumas pessoas colocam é se faz sentido um presidente como Lula ir abraçar os irmãos Castro num momento em que estão dissidentes a morrer e a serem mortos.
Faz sentido como faz sentido ir abraçar qualquer um. Então eu pergunto: faz sentido o governo dos Estados Unidos ter sustentado com dinheiro, com apoio da CIA, todos os golpes de Estado da América Latina?! Isso ninguém critica! Aposto que essa gente da classe média nunca falou nos golpes latino-americanos financiados pelos Estados Unidos e pela CIA!
Certo. Mas a pergunta…
Então?! Nós não estamos financiando golpe de Estado! Só estamos indo a governos legítimos. Não estou falando democráticos, estou falando legítimos.
Como alguém que acredita profundamente da democracia não a incomoda…
Não me incomoda nada! O Oriente Médio não tem democracia nenhuma, e não terá tão cedo. Há tanta possibilidade de ter democracia no Irão, no Iraque, naquela república petroleira que sustenta tudo…
A Arábia Saudita. Mas eu não estava a falar do Oriente Médio…
Como não? Uma das críticas maiores foi ele ter falado com o Irão. Como não está falando no Oriente Médio, se foi aí que a imprensa espirrou? O Castro é periódico. Todo o mundo sabe que ele é amigo do Castro de Cuba.
Mas estou a perguntar-lhe a si.
Acho que ele tem todo o direito. Eu também não teria nenhum inconveniente se fosse a Cuba — não tenho nada que fazer lá, de momento, nem tive, no passado — em cumprimentar o velho Castro, imagina, que é uma figura histórica totalmente relevante. Agora de repente o Castro não tem importância nenhuma? Eu teria inconveniente era em cumprimentar o primeiro-ministro da Itália [Berlusconi], esse sim, que é um ladrão.
No caso da Itália, não é só por causa da corrupção. É por causa do neo-fascismo, que Berlusconi promoveu, e de que é aliado. O que está acontecendo na Itália é gravíssimo, voltar o fascismo à Itália como partido legal. Mas se cumprimentasse Castro, provavelmente também lhe diria o que pensa, não?
Sem dúvida nenhuma. Ia dizer: “Sei que agora não é você quem manda, é o Raul, mas porque é que não libera logo esses caras, e pára de ter uma praga em cima de você?” Eu diria. E ele diria: “Porque não, nhim-nhim-nhim, nhim-nhim-nhim, lá os argumentos dele. Digo sempre o que penso. Nos Estados Unidos também dizia, quando estava lá.
A senhora acha que isso não teve custos políticos para Lula?
Custos políticos não teve, porque as pessoas que dizem isso nunca votaram no Lula.
Há pessoas que votaram nele e dizem isso.
Não senhora. Não é pela política externa. Não é verdade. Podem ter-te dito que votaram, mas é mentira. A política externa [de Lula] não é uma crítica da esquerda. Ao contrário. Isso é uma crítica da direita.
Concentrando-nos na América Latina, a minha questão era se faz sentido uma figura como o Lula, justamente pelo que transporta de inspiração, de exemplo…
Faz todo o sentido! Não é uma política de autonomia? É! Cuba está ou não cercada pelo boicote económico americano? Está. Um dos problemas económicos deles é esse.
Justamente. Uma palavra de Lula aí não teria força em relação à repressão política, dos prisioneiros?
O Lula não se vai meter nas decisões de cada país. Vai lá para mostrar simpatia pelo facto de que eles estão sendo cercados. E deve ter falado [na questão dos presos políticos]. Porque ele disse-me que isso foi tocado.
É?
Mas amigavelmente. Não vai agora se meter na política dos outros. Chama-se política de não intervenção. Ninguém se intromete. Se fosse à Itália provavelmente também cumprimentaria o Berlusconi. Só que não foi, graças a Deus. Acho que é um dos poucos países onde não foi. Não deve ter sido por acaso. Foi à Alemanha, a França, e também não deve morrer de amores pela Merkel, ou por aquele francês, que é um autoritário de direita, o Sarkozy. E daí? Por acaso ele critica o Sarkozy em público, ou vai lá peruar sobre os direitos dos franceses? Isso não se usa. Isso não é diplomacia. Eu faria, mas o Lula é um estadista, representa o estado brasileiro.
Outra coisa com que a direita não concorda é a política Sul-Sul, e é o caso do Serra, que hoje é um homem de direita.
Acha que ele é um homem de direita?
Hoje, virou. Porque o partido dele virou a direita possível. Dado que a direita clássica está encolhendo no Brasil, ele foi-se estendendo para a direita. Então o partido dele hoje, no máximo, pode-se chamar de centro-direita. Como, no máximo, o nosso pode ser chamado de centro-esquerda. Você tem o centro dominando o espectro ideológico. Ora vai para a esquerda, em certas eleições. Ora vai para a direita.
MEMÓRIAS DE PORTUGAL
Falemos um pouco do seu percurso antes de vir para o Brasil. O seu pai acolheu refugiados da Guerra Civil de Espanha.
É verdade [ri].
Era anarquista, o meu velho. Nasci em Anadia mas vim com um mês para Lisboa. Então sou alfacinha. Estive em Sacavém, nas Avenidas Novas, perto lá da Igreja de Fátima…
Avenida de Berna.
Isso. Estive em vários lugares.
O seu pai era comerciante.
Era. E essa frase de que me lembro [dos refugiados] era quando estávamos num bairro popular, de maneira que não se notava tanto. Se enfiasse anarquistas em bairro de classe média tinha-se ferrado. O pessoal estava saindo, estavam perdendo a guerra, e Lisboa era um lugar de passagem de todo o pessoal que estava sendo perseguido, judeu, anarquista. E tinha sempre vários segmentos da população que ajudavam. Aí cresci no meio do debate. O meu tio era comunista e o meu pai anarquista. Então, você imagina, no caso da Catalunha, em que a briga entre anarquistas e comunistas foi feroz, como é que se discutia. Cresceu a ver esses refugiados em casa.
Quanto tinha sete, oito anos. Quando terminou a guerra, foram à vida deles. Depois teve a II Guerra Mundial. E aí é que eu cresci, no sentido em que aos 12 anos caiu Paris. Foi uma tristeza geral. Me lembro de nós todos em torno da BBC, ouvindo a notícia, chorando. Depois a fronteira russa, a queda de Leninegrado, que foi uma brutalidade. E finalmente no dia D, a gente começou a se animar. A guerra terminou quando eu tinha 15 anos. E venho para o Brasil em 1954. Vim casada, grávida da minha filha mais velha e matemática.
E veio porquê?
Ah, porque aquilo ali não dava.
Por razões políticas?
Ah, sim. Não havia emprego para gente como nós, por causa da ficha política.
Era comunista?
Não. Dado que tinha um pai anarquista, uma mãe da esquerda católica e um tio comunista, eu era progressista, digamos. Naquela altura até era mais de uma esquerda católica. Tinha amigos comunistas, anarquistas. Aqui, quando cheguei, também tinha trotskistas, mas isso não me lembro em Portugal. Aqui tinha muito intelectual ilustre que era trotskista. Tinha vários salões intelectuais: o dos comunistas, o dos trotskistas, e o da esquerda católica. E eu frequentava os três, para variar. Era muito estimulante.
Apesar de que, como morreu logo o Vargas, ficou um período meio brabo. Até me lembro de pensar: “Puxa, onde eu vim amarrar o meu cavalo. Fui em busca de democracia e pego um golpe pela cara.” Mas depois melhorou. E com JK [Juscelino Kubitschek] ficou aquela alegria. Aí, me naturalizei brasileira e fui fazer o curso de Economia. Já tinha 27 anos.
Depois atravessou toda a ditadura brasileira.
Menos um período de cinco anos, em que estive no Chile. Porque aqui estava muito difícil.
Não se cruzou com Serra [que esteve exilado no Chile]?
Claro que cruzei.
Então é lá que se encontram.
Claro. E foi lá que escrevemos o nosso artigo contra o “milagre económico” [brasileiro]. Depois eu voltei em 1973, fiz concurso para Campinas, e fiquei na ponte aérea Rio-Campinas. Dava parte das aulas lá e parte cá. Ajudei a formar o mestrado de Campinas, o doutoramento. Entrei pesado na vida académica. Foi bom ter feito matemática, porque o meu catedrático não tinha nenhuma noção de matemática. E foi assim que ele me indicou para auxiliar, depois fiz os concursos todos.
Houve um momento em que passou a sentir-se brasileira? Um clique?
Houve. O JK [Juscelino Kubitschek]. Trabalhei no Plano de Metas dele. Era uma tamanha alegria que você achava que o país estava indo para a frente. Paradoxalmente, eles não trataram da questão agrária, e também o salário mínimo não foi nenhuma maravilha, a partir de 1958 começou a cair, por causa da inflacção. A inflacção realmente é uma praga. Sou uma das poucas economistas de esquerda que é contra a inflacção. Os economistas de esquerda acham que a inflacção não faz diferença. Faz muita diferença. Para quem? Para os pobres. Para os ricos não faz diferença nenhuma.
Os brasileiros ficaram traumatizados com a inflacção, não é?
Foram décadas. É um país classicamente inflaccionário. Esta é a primeira vez que não. E isso começou, diga-se a verdade, no Fernando Henrique.
O que é que acha que o Brasil lhe deu?
Inicialmente, susto [ri]. Uma pessoa chegar aqui, mata-se o presidente e fica tudo imerso… Susto. E como aqui o pessoal é meio inconsciente, a esquerda, mesmo quando era ilegal, vivia batendo papo nos botequins. E eu dizia [sussurra]:
“Escuta, aqui não tem PIDE?”
“PIDE?”
“Sim, polícia política.”
“Ah, não sei, deve ter, mas a gente está aqui num bar.”
“Ué, mas um bar é uma coisa aberta!”
[risos] Eu ficava espantadíssima. Não tinha aquela clima português em que você olhava para a esquerda e para a direita até para ler um jornal. Então, essa foi a primeira coisa: relaxei mais. Em segundo lugar, a coisa da alegria, de ver uma civilização brotar, o que é muito bacana. Ver música, teatro… Culturalmente era muito rico. Aqui, essa parte, era liberal. Só na ditadura propriamente dita é que censuraram as manifestações culturais.
Na ditadura, fiquei no Brasil de 1964 a 68, quando ainda tinha muita crítica. Em 68 é que eles endureceram. E por sorte eu fui [para o exílio] antes. Aí caiu gente para burro, intervieram nas universidades. Se eu tivesse aqui teria sido expulsa.
Eu tava lá [Chile] e também foi uma alegria.
Conheceu Salvador Allende?
Conheci. Conheci todo o mundo. Até pedi uma licença — porque estava a fazer um doutoramento em Paris — e fui trabalhar com o governo. Eu e o Serra.
Com o governo Allende?
[Acena] Fomos os dois colegas no ministério da Economia. Como tinha de voltar para tomar posse na universidade, voltei em Março de 1973. E o golpe [de Pinochet] foi no Outono. Eu tinha deixado a minha filha e o meu filho, porque pretendia fazer outra licença. Mas aí vi que não dava, porque já tinha havido o diabo, trouxe o menino, e ela que tinha casado com um chileno ficou lá. Aí foi uma coisa muito angustiante. Depois quando ia para um seminário no México, prenderam-me no aeroporto aqui no Brasil e fiquei lá num desses aparelhos de repressão 48 horas. Assustador. Não teve tortura. Ameaça, ficar nua, fotografada de todos os lado, não poder comer, não poder beber, não poder fumar, e aquelas celas isoladas.
Sempre fumou assim sem parar?
Sempre, desde os 14 anos. Fumo dois maços. Claro, em entrevista fico nervosa e fumo mais [ri].
Então o Brasil me deu maturidade e uma experiência de vida rica.
E Portugal para si é o quê?
É remoto. Hoje não tenho mais nenhuma ligação íntima. Tenho uns primos vagos na Anadia. A Maria de Lourdes Pintasilgo, que era minha colega, morreu.
Foi sua colega onde?
No liceu Filipa de Lencastre, e depois No Instituto Superior Técnico, onde entrei com 16 anos. Estive com ela várias vezes, quando ela vinha aqui eu sempre a via. Essa era uma mulher fantástica. A verdade é que nós, as mulheres portuguesas, somos fantásticas. A coisa das Marias portuguesas é um facto. São mais lutadoras que os homens. Eu acho. Desde a Padeira de Aljubarrota para cá.
No tempo do Salazar era uma apagada e vil tristeza. Agora, como eu tinha sido presa aqui na véspera da revolução dos cravos e me disseram que me cortavam a nacionalidade se eu saísse, fiquei com medo e não saí do Brasil [nos dois anos a seguir ao 25 de Abril]. Depois fui, e talvez tenha ido numa das últimas marchas com os cravos, com os capitães e o velho comuna, que acho que já morreu…
Álvaro Cunhal.
O Álvaro já morreu, não já? O velho Cunhal. Descemos a Avenida da Liberdade com os cravos na mão. Foi simpático. Mas não é um país estimulante como o Brasil. O Brasil é um país imenso e muito diversificado. Lá é muito pequenininho.
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Publico 25 de outubro de 2010 às 15:58h
Amiga de Dilma e Serra, a economista portuguesa Maria da Conceição Tavares, figura nacional no Brasil, vota em Dilma. E explica porque acha que Lula é um líder sem par. Foto: Marcelo Carnaval
Por Alexandra Lucas Coelho*
Amiga de Dilma e Serra, a economista portuguesa Maria da Conceição Tavares, figura nacional no Brasil, vota Dilma. E explica porque acha que Lula é um líder sem par
Maria da Conceição Tavares é daquelas figuras “maiores que a vida”. Aos 80 anos, a fumar ininterruptamente na sua casa do bairro carioca Cosme Velho, tem algo de Indira Gandhi ou Churchill. Voz e riso de trovão, olhar agudo, resposta incisiva. Respeitada em todo o espectro político como economista e pensadora, é uma das grandes conselheiras do PT. Nunca quis ser ministra porque diz tudo o que pensa.
Portuguesa, nascida em Anadia, crescida em Lisboa, filha de um anarquista que alojava refugiados da Guerra Civil de Espanha, veio casada e grávida para o Brasil, aos 21 anos, por causa de Salazar. Desde então, ao longo de 60 anos, formou gerações de economistas e líderes políticos, incluindo Lula.
A senhora deve ser a única pessoa no Brasil que consegue juntar no aniversário dos seus 80 anos….
Os dois candidatos à presidência da República! [ri-se]
… Dilma Rousseff e José Serra.
Mas o clima estava muito bom. Eles nunca se trataram mal, nem nada. Eram pessoas civilizadas, que se tratavam bem. A campanha é que despertou essa trapalhada. A noite [do aniversário, 24 de Abril] correu perfeita. Nem se discutiu política. Foi uma festa.
Eles sempre tiveram boa relação?
Não que sejam amigos pessoais, como eu sou amiga dos dois. Mas sempre tiveram boa relação. O Serra era um sujeito civilizado. Não sei o que deu na cabeça dele agora.
Conhece-o muito bem…
Desde 1968.
… se tivesse de explicar quem é José Serra, o que diria?
Um bom economista. Ambos éramos do PMDB, a frente democrática contra a ditadura. E ele saiu para fundar, com o [Mário] Covas e o Fernando Henrique [Cardoso], o PSDB, uma espécie de ala esquerda. Muita gente não acompanhou isso. Eu, por exemplo, não fui porque não faço muita fé no Fernando Henrique, que sempre foi meio dúbio, trapalhão. O Covas é que era o homem importante. Morreu. E aí… A partir do momento em que Fernando Henrique foi para o poder, o Serra manteve a posição dele como economista contra a política neoliberal.
Porque é que acha o Fernando Henrique “meio dúbio”?
Diz uma coisa para agradar a uns e outra para agradar a outros. Não fazia política, mas era um político na academia. E o Serra não, sempre foi muito “straight”, muito direito.
Confiaria mais no Serra que no Fernando Henrique?
Sem dúvida [ri]. E o primeiro governo [de Fernando Henrique] mostrou isso. Porque aí o Serra foi ministro de Planejamento contra a política neo-liberal do Fernando Henrique. Depois foi um bom ministro da saúde. Não havia nada nele que demonstrasse que ia ter uma mudança assim tão brusca. Mesmo quando foi candidato contra o Lula foi uma campanha normal. Ele sempre respeitou o Lula.
Mas acha que Serra mudou?
Mudou. Por razões de interesse político.
Como é que essa mudança se manifesta?
Na arrogância, na agressão. Ele não era assim.
Mas na segunda volta quem passou ao ataque foi Dilma.
Mas não foi ataque pessoal, xingando ele. Foi atacando o governo anterior [de Fernando Henrique]. E ele não se defendeu.
Depois [a campanha] foi piorando. E agora piorou de vez.
Como vê o incidente em que Serra acusou o PT de ser nazi, ao agredirem-no com um rolo de papel?
Ah, são jovens na rua. Mesmo que sejam pêtistas não tem a ver com o partido em geral. Essa mania de chamar um partido de nazi, acho de maluco, num país democrático como é hoje o Brasil. A gente está extremando o argumento. O Serra está muito agressivo. É verdade que essa deve ser a última oportunidade, mas parece que lhe bateu o desespero.
Mas não acha que Dilma mudou de atitude também, ficou mais agressiva?
Claro. Mas é para responder. Defender a honra dela. Ele diz que ela é mentirosa, que disse isto e depois aquilo. Diz que ela abriga a corrupção, que é dela a culpa da Erenice [Guerra, ex-braço direito de Dilma, acusada de corrupção], que todos os problemas do Brasil são culpa dela. Ela está mais agressiva no tom, inclusive mais assertiva. Mas não está insultando, dizendo que ele é ladrão.
De qualquer maneira, [a campanha] degringolou. Passou a ser um debate agressivo e vazio. Conheceu Dilma nos anos 80, sua aluna na Unicamp. Como a pode apresentar?
É uma moça que sempre fez política, como o Serra. Fez política nos partidos radicais nos anos 70, ficou presa muitos anos, teve um comportamento fantástico na prisão, é uma mulher de muita coragem, de nervo. Ela não se desmorona à toa.
Em 80 veio para Campinas, para o doutoramento. Era brilhante. Brilhantes, eles são os dois.
Serra e Dilma?
É. Ambos são bons economistas. Isso é que irrita. Podiam estar falando de coisas importantes para o Brasil.
Portanto, em termos de economia, não fica preocupada com nenhum dos dois?
Não, não fico. Quero dizer, com o Serra fico, em termos de política. Porque ele virou muito conservador e é frontalmente contra a política externa do Brasil, essa política de autonomia. Ele não é a favor das relações Sul-Sul. Preferia que a gente mantivesse a relação Norte-Sul, mais estreita com os Estados Unidos, o que acho um erro. E ele é muito fiscalista. Tanto, que o que está dizendo é contraditório. É a favor do corte do gasto público, mas diz que vai dar não sei quantos mil de salário mínimo, e para os aposentados. Está fazendo promessas demagógicas, o que não é nada o estilo dele.
Existe a ideia de que a Dilma é uma construção do Lula, alguém que não tem personalidade própria.
Isso é uma bobagem. O que ela não tem é o conhecimento político do Lula. Mas foi ministra de Minas e Energias, um sector pesado, em plena crise de energia eléctrica — herança da política boba do Fernando Henrique —, e foi Chefe da Casa Civil, uma casa política. E está com ele [Lula] todos os dias. Tem aprendido com ele tudo o que há para aprender sobre o Brasil. É evidente que sem ele não teria chance. O Serra já foi candidato a várias coisas, ela não. Então, o facto de ser apoiada pelo Lula ajuda. Não bastava o PT. O PT não tem peso suficiente para fazê-la ganhar. Quem tem é o Lula, uma figura política como nunca ocorreu no país. Para dizer a verdade, pouco ocorreu no mundo.
No vídeo em que apoia à Dilma diz: não sigam a propaganda das grandes empresas, o Brasil tem de fazer as pazes com o povo, não pode ficar só votando para os 10 ou 20 por cento de cima, e a mulher do povo é a Dilma. Acha que existem dois Brasis, essa faixa de cima que é anti-Lula e o Brasil do povo?
Acho. Tranquilamente.
E isso está a manifestar-se de novo nesta eleição?
De novo. Agora, tem a classe média, que vai para cá ou para lá, conforme a conjuntura.
A classe média que ascendeu nos últimos anos?
A que ascendeu foi a média-baixa. A média-alta, não. E essa é que tem muita raiva do Lula e não vai votar na Dilma.
Nessa faixa média alta, o Lula é frequentemente descrito como um ignorante, ou um populista.
Primeiro, não é populista porque é do povo. Populista seria um cara da elite que estivesse manipulando o povo. Ele ascendeu do povo, e foi sendo feito pelo povo.
Depois, ignorante, coisa nenhuma. O Lula sabe mais do Brasil do que ninguém. E sabe mais de economia aplicada, prática, do que ninguém. Já é candidato desde 1989. Então, na primeira derrota fez o Instituto de Cidadania, uma espécie de ONG, e convidava todos os intelectuais. Eu conhecia-o de vista, mas aí passei a ser assessora dele. Eu, uma série de economistas progressistas, filósofos, sociólogos.
Era uma espécie de academia informal?Claro. De maneira que ele fez uma “universidade” que durou de 1989 a 2002.
Como “aluno”, como era?
Ah, brilhante, brilhante. Tem uma memória prodigiosa. E quando havia discussão académica e ele percebia que as questões estavam resvalando, não deixava. Ele vai no gume. Tem um sentido de oportunidade muito afiado, uma mente muito lógica. Isso é que é impressionante. Tem um coração popular, uma emoção popular, mas a cabeça dele é totalmente lógica. É dos homens mais inteligentes que conheci. Se não o mais.
Diria que o Lula é talvez o homem mais inteligente que conheceu?
Sem dúvida. E não apenas politicamente. É uma inteligência nata. É um génio do povo. Nós tivemos um génio do povo. Se não, não teria chegado lá. Você acha que alguém vindo de onde ele veio, com as dificuldades que teve, chega a presidente? Não. Ele é um génio do povo, mesmo, e impressiona qualquer um.
A senhora tem uma frase que é: “O Lula é o maior intelectual orgânico do Brasil.”
Os intelectuais como eu são clássicos. E ele é orgânico. Interpreta e representa organicamente o povo brasileiro.
Não tem nada a ver com um Hugo Chávez?
Não, imagina! O Chávez é de origem militar. Ao Chávez é que se podia chamar populista, embora eu o ache mais uma espécie de caudilho ilustrado.
E o Lula não tem nada de caudilho [líder carismático e autoritário]?
Não, que caudilho! Ele jamais faz apelos carismáticos. Ele fala com o povo, ou com quem quer que seja, de igual para igual. Faz piada, faz humor.
É um deles?
É um deles. Mas também quando se encontra com a classe média é como um de nós. Não tem complexo de inferioridade, nem de superioridade.
Não tem ressentimento, é isso?
De nenhuma espécie. E não gosta que fiquem elogiando ele de mais. É muito lúcido. Como a lucidez é uma característica da inteligência analítica, ele tem uma inteligência analítica poderosa. E como é do povo, eu digo que é orgânico.
A senhora escreveu que ele foi quem mais avançou na “republicanização do Brasil”. No sentido de democratização?
É. Porque está dando voz ao povo. A preocupação dele é tornar cidadãos os que estão à margem. E não com palavras, com factos. Indo até eles, dando-lhes direitos, com a preocupação de que as políticas sociais sejam para incorporação.
O Lula, entre as derrotas, fez várias viagens ao Brasil inteiro, chamadas Caravanas da Cidadania. A palavra que escolhe sempre é cidadania. Por isso digo que é republicanização. O que ele quer é que todos os brasileiros tenham cidadania, possam-se expressar, ter direitos. Quer acabar com os dois Brasis, em resumo. Quer fazer disto uma nação.
Quando chegou ao Brasil, o pensamento do antropólogo Darcy Ribeiro foi importante para si, a ideia de construir uma democracia multiracial nos trópicos. O Brasil está mais perto disso?
Está. Nunca julguei que chegasse. Mas agora acho que a democracia está consolidada no Brasil. A coisa multiracial está avançando, porque os direitos dos negros, dos índios, estão sendo reconhecidos. E os dois Brasis estão terminando. Essa nossa vergonha.
Lula é acusado de tentações autoritárias, de se apoderar da máquina do Estado, de se enfurecer com a imprensa. Há toda esta tensão.
Ele ironiza, ridiculariza, o que é outra coisa, porque é muito do estilo popular, rir dos defeitos do adversário.
Mas não há uma tentação autoritária? Quando se fala do inchaço da máquina do Estado…
Que inchaço da máquina do Estado, coisa nenhuma. Nós desmontámos o Estado do Fernando Henrique, que fez uma política neo-liberal durante oito anos, nunca fez concurso público e deixou que todo o Estado ficasse terciarizado, com gente que trabalhava sem contrato, sem carteira assinada. Isso é que inchaço. O Lula faz concurso público, a terciarização está diminuindo, está aumentando o pessoal com carteira assinada. Enfim, estão-se reconhecendo formalmente os direitos trabalhistas. E isto é autoritarismo?
É possível que em alguns cargos de confiança o Lula tenha errado, mas também o Fernando Henrique errou, botou vários em cargos de confiança que nas privatizações se revelaram pessoas sem escrúpulos. Errar em cargo de confiança acontece em qualquer governo. Agora, no Estado, não, porque o Lula fez concurso. Foi por mérito, não para inchar a máquina.A corrupção foi o problema que prejudicou mais o governo Lula?
Foi o que prejudicou a imagem. Não propriamente dele, que tem 80 por cento de aprovação. Prejudicou os candidatos dele, como está prejudicando Dilma, prejudicou a imagem do governo.
Mas ele tirou, por exemplo, o José Dirceu [protagonista do escândalo Mensalão, em que o PT pagava a deputados uma mesada], de quem era amigo antiquíssimo. Não há nepotismo.
Todos os casos de corrupção declarada, ou objecto de inquérito público, foram demitidos.
Por exemplo, com o Berlusconi, não há dúvida nenhuma de que aquilo é um governo corrupto, porque ele é um corrupto. Agora, ninguém acusou o Lula directamente. Acusaram-no de ter fechado os olhos, mas ele não fechou olho nenhum. Podia ter mantido o José Dirceu, e dizer que era culpa de fulaninho e sicraninho, enfim daqueles que fizeram lá os “mal-feitos”.
Como podia ter mantido a Erenice, não tinha processo contra ela.
Agora, tem pêtistas que não gostaram que o PT não expulsasse esses quadros. Eu fazia parte da tendência chamada refundação. Achava que devíamos dar uma refundada e ter um código de ética mais pesado. O argumento dos outros era que seria injusto expulsar enquanto não ficasse provada a culpa.
Obviamente, não tenho a menor simpatia pelos quadros que foram acusados. Quanto mais não seja por ineficácia política. De um homem da importância de José Dirceu, que foi presidente do partido anos, e deixa o tesoureiro nomeado por ele fazer o que fez, dele é que se pode dizer que como estava preocupado com o poder esqueceu essa parte [ter mão na corrupção]. Ele pode ser acusado disso. O Lula não. Não tinha nada que ver com a máquina do partido. Lançou a Dilma, e depois é que o partido referendou. O Lula sempre teve muita autonomia em relação ao partido. Tanto que o pessoal fala que há o pêtismo e o lulismo.
Acha que há?
Há mesmo. Porque o Lula é maior que o partido. Acha que essa malta pobre que vota nele é pêtista? Coisa nenhuma. São pentecostais, a maior parte não tem partido. Acreditam no Lula. O lulismo é um fenómeno de massas. O pêtismo é um fenómeno orgânico, de um partido de esquerda que foi andando para uma espécie de centro-esquerda, social-democrata, que hoje já não existe na Europa, porque a Europa está decadente.
A Europa está decadente?
Ah, está. Puxa vida. Bota decadência, não é? Até nós.
Até nós?
Nós, portugueses [risos].
Seguimos o exemplo dos outros. O único país que seguiu menos esse exemplo foi a Suécia, que teve um período neo-liberal muito curto. Nós virámos neo-liberais. Não somos social-democratas faz horas. Nem nós, nem a Europa inteira continental. Nem a Inglaterra, nem nada.
O Lula é um social-democrata?
É. Vamos ver: social-democrata é quando você representa organicamente os trabalhadores. Ora, se há social-democrata é o Lula. Jamais foi a favor da luta armada, jamais. Sempre ficava meio chateado entre a discussão dos intelectuais e dos que vinham da igreja. O PT tem três origens: a sindical, que é a dele, a da igreja, católica, e a dos intelectuais revolucionários. Perdiam um tempo danado a discutir e a vontade dele era mandar os padres rezar e os intelectuais para a academia, e não chatearem ele [ri]. Isso ele disse uma vez para mim, rindo: “Você não tem ideia do que era!” Quando eu entrei, [o PT] já estava manso.Nunca quis ser ministra?
Não. Não tenho temperamento para ser executiva. Fui deputada porque me pediram.
O Lula nunca a convidou?
Não. Ele conhece-me, sabe que eu sou pêlo no vento. Eu sou muito mais agressiva do que a Dilma, muito mais. Ela consegue disfarçar a raiva dela, eu não. Quando fico com raiva, fico. Digo na cara das pessoas o que acho. Eu não seria uma boa ministra. Sou uma boa assessora.
Porque diz o que pensa.
Isso. O que é importante. Alguém que não fica puxando o saco do chefe. Eu não puxo saco de ninguém. Várias vezes disse ao Lula coisas com que ele não concordava.
Por exemplo?
Por exemplo, quando ele fez a aliança com o Garotinho [ex-governador do Rio, condenado por corrupção]. Eu não votei.
Já agora, Collor de Melo e Sarney [ex-presidentes envolvidos em escândalos, que também fazem parte da base de apoio de Lula]. Sente-se confortável com estas alianças?
Eu não sigo as instruções. Se a aliança for com alguém que considero indecoroso, não voto.
É o caso de Sarney ou Collor?
Collor, sim. Sarney, nem tanto. O Sarney que conheço é o da transição. Na primeira parte do governo fez o que pôde. Depois, degringolou. E nunca mais foi candidato a nada. Acho injusto confundir o Sarney com o Collor. O Collor é uma coisa desqualificada.
Há quem critique programas como o Bolsa Família como a criação de uma rede de dependência do governo, que pode ter o efeito contrário justamente a essa autonomia dos cidadãos. O que acha disto?
Acho que é mentira. O Lula tirou 28 milhões da pobreza. Esses não são mais dependentes da Bolsa Família, porque a Bolsa Família é para os pobres. Esses 28 milhões entraram no mercado de trabalho, são assalariados, ou têm os seus pequenos negócios. O que o Lula fez foi proteger os pobres, não deixar os caras morrer de fome. Mas uma vez que ficaram acima do salário mínimo, não. Ninguém que ganhe acima do salário mínimo tem Bolsa Família. Pode ter outras.
Como economista, como vê estes programas?
Acho que é o correcto. Ao tirar da pobreza, e meter no mercado de trabalho vinte e tantos milhões, você está consolidando o mercado interno. Por isso é que a crise internacional não nos atingiu duramente. Por isso, e porque o sector externo estava bem. Tínhamos pago a dívida externa.
E Lula investiu no consumo…
É, deu crédito, além de ter dado emprego. Deu muito emprego. Mais do que prometeu. Investiu no mercado interno e deu financiamento para aquisição de bens necessários, tipo geladeira [frigorífico]. As pessoas dizem: “Ah, fica financiando geladeira…” Mas neste país quente querem que não se financie geladeira? E as pessoas comem o quê? Carne podre? Evidentemente que o que ele fez está correcto. Passámos de uma taxa de crédito de 20 e tantos por cento para 40 e tantos. O que é bom. Não é como nos países ricos, que era 120, 130, o que deu na catástrofe que deu [crise de 2008]. Aqui não tem alavancagem do crédito. Não tem incumprimento alto, inclusive, ou seja, não pagar a prestação que deve. Os devedores pagam, e quem mais paga são os pobres, exactamente. Essa é outra ideia, que pobre não paga. É mentira. Quem não paga é a classe média-alta, que usa cartão de crédito, cheque especial, vai-se endividando e endividando. O povo não faz isso. Nem tem cartão de crédito nem cheque especial. Tem banco, isso sim. Foi uma coisa importante.
O Lula não fez só o Bolsa Família. Fez O Luz para Todos, fez a Bancarização, que é você ter direito, mesmo sem carteira de trabalho, a poder ir ao banco e ter crédito. Essas coisas que implicam integrar o cidadão na sociedade.O que é está em jogo nesta eleição, de facto? É uma eleição importante?
É importante. É a continuidade deste esforço em todos os sentidos. Desde a política externa autónoma, que é fundamental. As pessoas não se dão conta, porque aqui ninguém sabe nada de política externa, então a classe média nem fala no assunto.
Uma das críticas maiores ao governo Lula é o facto dele falar no tom em que fala com Chávez, com o regime cubano, com Ahmadinejad.
Isso é tudo uma bobagem, porque tem de falar com todo o mundo. Lula também fala, e é amigo, do presidente dos Estados Unidos. Só que não se submete.
Mas a questão não é falar, é…
É falar sim, porque ele não fez nada que não fosse de acordo com as regras da nossa constituição e as regras internacionais.
A questão que algumas pessoas colocam é se faz sentido um presidente como Lula ir abraçar os irmãos Castro num momento em que estão dissidentes a morrer e a serem mortos.
Faz sentido como faz sentido ir abraçar qualquer um. Então eu pergunto: faz sentido o governo dos Estados Unidos ter sustentado com dinheiro, com apoio da CIA, todos os golpes de Estado da América Latina?! Isso ninguém critica! Aposto que essa gente da classe média nunca falou nos golpes latino-americanos financiados pelos Estados Unidos e pela CIA!
Certo. Mas a pergunta…
Então?! Nós não estamos financiando golpe de Estado! Só estamos indo a governos legítimos. Não estou falando democráticos, estou falando legítimos.
Como alguém que acredita profundamente da democracia não a incomoda…
Não me incomoda nada! O Oriente Médio não tem democracia nenhuma, e não terá tão cedo. Há tanta possibilidade de ter democracia no Irão, no Iraque, naquela república petroleira que sustenta tudo…
A Arábia Saudita. Mas eu não estava a falar do Oriente Médio…
Como não? Uma das críticas maiores foi ele ter falado com o Irão. Como não está falando no Oriente Médio, se foi aí que a imprensa espirrou? O Castro é periódico. Todo o mundo sabe que ele é amigo do Castro de Cuba.
Mas estou a perguntar-lhe a si.
Acho que ele tem todo o direito. Eu também não teria nenhum inconveniente se fosse a Cuba — não tenho nada que fazer lá, de momento, nem tive, no passado — em cumprimentar o velho Castro, imagina, que é uma figura histórica totalmente relevante. Agora de repente o Castro não tem importância nenhuma? Eu teria inconveniente era em cumprimentar o primeiro-ministro da Itália [Berlusconi], esse sim, que é um ladrão.
No caso da Itália, não é só por causa da corrupção. É por causa do neo-fascismo, que Berlusconi promoveu, e de que é aliado. O que está acontecendo na Itália é gravíssimo, voltar o fascismo à Itália como partido legal. Mas se cumprimentasse Castro, provavelmente também lhe diria o que pensa, não?
Sem dúvida nenhuma. Ia dizer: “Sei que agora não é você quem manda, é o Raul, mas porque é que não libera logo esses caras, e pára de ter uma praga em cima de você?” Eu diria. E ele diria: “Porque não, nhim-nhim-nhim, nhim-nhim-nhim, lá os argumentos dele. Digo sempre o que penso. Nos Estados Unidos também dizia, quando estava lá.
A senhora acha que isso não teve custos políticos para Lula?
Custos políticos não teve, porque as pessoas que dizem isso nunca votaram no Lula.
Há pessoas que votaram nele e dizem isso.
Não senhora. Não é pela política externa. Não é verdade. Podem ter-te dito que votaram, mas é mentira. A política externa [de Lula] não é uma crítica da esquerda. Ao contrário. Isso é uma crítica da direita.
Concentrando-nos na América Latina, a minha questão era se faz sentido uma figura como o Lula, justamente pelo que transporta de inspiração, de exemplo…
Faz todo o sentido! Não é uma política de autonomia? É! Cuba está ou não cercada pelo boicote económico americano? Está. Um dos problemas económicos deles é esse.
Justamente. Uma palavra de Lula aí não teria força em relação à repressão política, dos prisioneiros?
O Lula não se vai meter nas decisões de cada país. Vai lá para mostrar simpatia pelo facto de que eles estão sendo cercados. E deve ter falado [na questão dos presos políticos]. Porque ele disse-me que isso foi tocado.
É?
Mas amigavelmente. Não vai agora se meter na política dos outros. Chama-se política de não intervenção. Ninguém se intromete. Se fosse à Itália provavelmente também cumprimentaria o Berlusconi. Só que não foi, graças a Deus. Acho que é um dos poucos países onde não foi. Não deve ter sido por acaso. Foi à Alemanha, a França, e também não deve morrer de amores pela Merkel, ou por aquele francês, que é um autoritário de direita, o Sarkozy. E daí? Por acaso ele critica o Sarkozy em público, ou vai lá peruar sobre os direitos dos franceses? Isso não se usa. Isso não é diplomacia. Eu faria, mas o Lula é um estadista, representa o estado brasileiro.
Outra coisa com que a direita não concorda é a política Sul-Sul, e é o caso do Serra, que hoje é um homem de direita.
Acha que ele é um homem de direita?
Hoje, virou. Porque o partido dele virou a direita possível. Dado que a direita clássica está encolhendo no Brasil, ele foi-se estendendo para a direita. Então o partido dele hoje, no máximo, pode-se chamar de centro-direita. Como, no máximo, o nosso pode ser chamado de centro-esquerda. Você tem o centro dominando o espectro ideológico. Ora vai para a esquerda, em certas eleições. Ora vai para a direita.
MEMÓRIAS DE PORTUGAL
Falemos um pouco do seu percurso antes de vir para o Brasil. O seu pai acolheu refugiados da Guerra Civil de Espanha.
É verdade [ri].
Era anarquista, o meu velho. Nasci em Anadia mas vim com um mês para Lisboa. Então sou alfacinha. Estive em Sacavém, nas Avenidas Novas, perto lá da Igreja de Fátima…
Avenida de Berna.
Isso. Estive em vários lugares.
O seu pai era comerciante.
Era. E essa frase de que me lembro [dos refugiados] era quando estávamos num bairro popular, de maneira que não se notava tanto. Se enfiasse anarquistas em bairro de classe média tinha-se ferrado. O pessoal estava saindo, estavam perdendo a guerra, e Lisboa era um lugar de passagem de todo o pessoal que estava sendo perseguido, judeu, anarquista. E tinha sempre vários segmentos da população que ajudavam. Aí cresci no meio do debate. O meu tio era comunista e o meu pai anarquista. Então, você imagina, no caso da Catalunha, em que a briga entre anarquistas e comunistas foi feroz, como é que se discutia. Cresceu a ver esses refugiados em casa.
Quanto tinha sete, oito anos. Quando terminou a guerra, foram à vida deles. Depois teve a II Guerra Mundial. E aí é que eu cresci, no sentido em que aos 12 anos caiu Paris. Foi uma tristeza geral. Me lembro de nós todos em torno da BBC, ouvindo a notícia, chorando. Depois a fronteira russa, a queda de Leninegrado, que foi uma brutalidade. E finalmente no dia D, a gente começou a se animar. A guerra terminou quando eu tinha 15 anos. E venho para o Brasil em 1954. Vim casada, grávida da minha filha mais velha e matemática.
E veio porquê?
Ah, porque aquilo ali não dava.
Por razões políticas?
Ah, sim. Não havia emprego para gente como nós, por causa da ficha política.
Era comunista?
Não. Dado que tinha um pai anarquista, uma mãe da esquerda católica e um tio comunista, eu era progressista, digamos. Naquela altura até era mais de uma esquerda católica. Tinha amigos comunistas, anarquistas. Aqui, quando cheguei, também tinha trotskistas, mas isso não me lembro em Portugal. Aqui tinha muito intelectual ilustre que era trotskista. Tinha vários salões intelectuais: o dos comunistas, o dos trotskistas, e o da esquerda católica. E eu frequentava os três, para variar. Era muito estimulante.
Apesar de que, como morreu logo o Vargas, ficou um período meio brabo. Até me lembro de pensar: “Puxa, onde eu vim amarrar o meu cavalo. Fui em busca de democracia e pego um golpe pela cara.” Mas depois melhorou. E com JK [Juscelino Kubitschek] ficou aquela alegria. Aí, me naturalizei brasileira e fui fazer o curso de Economia. Já tinha 27 anos.
Depois atravessou toda a ditadura brasileira.
Menos um período de cinco anos, em que estive no Chile. Porque aqui estava muito difícil.
Não se cruzou com Serra [que esteve exilado no Chile]?
Claro que cruzei.
Então é lá que se encontram.
Claro. E foi lá que escrevemos o nosso artigo contra o “milagre económico” [brasileiro]. Depois eu voltei em 1973, fiz concurso para Campinas, e fiquei na ponte aérea Rio-Campinas. Dava parte das aulas lá e parte cá. Ajudei a formar o mestrado de Campinas, o doutoramento. Entrei pesado na vida académica. Foi bom ter feito matemática, porque o meu catedrático não tinha nenhuma noção de matemática. E foi assim que ele me indicou para auxiliar, depois fiz os concursos todos.
Houve um momento em que passou a sentir-se brasileira? Um clique?
Houve. O JK [Juscelino Kubitschek]. Trabalhei no Plano de Metas dele. Era uma tamanha alegria que você achava que o país estava indo para a frente. Paradoxalmente, eles não trataram da questão agrária, e também o salário mínimo não foi nenhuma maravilha, a partir de 1958 começou a cair, por causa da inflacção. A inflacção realmente é uma praga. Sou uma das poucas economistas de esquerda que é contra a inflacção. Os economistas de esquerda acham que a inflacção não faz diferença. Faz muita diferença. Para quem? Para os pobres. Para os ricos não faz diferença nenhuma.
Os brasileiros ficaram traumatizados com a inflacção, não é?
Foram décadas. É um país classicamente inflaccionário. Esta é a primeira vez que não. E isso começou, diga-se a verdade, no Fernando Henrique.
O que é que acha que o Brasil lhe deu?
Inicialmente, susto [ri]. Uma pessoa chegar aqui, mata-se o presidente e fica tudo imerso… Susto. E como aqui o pessoal é meio inconsciente, a esquerda, mesmo quando era ilegal, vivia batendo papo nos botequins. E eu dizia [sussurra]:
“Escuta, aqui não tem PIDE?”
“PIDE?”
“Sim, polícia política.”
“Ah, não sei, deve ter, mas a gente está aqui num bar.”
“Ué, mas um bar é uma coisa aberta!”
[risos] Eu ficava espantadíssima. Não tinha aquela clima português em que você olhava para a esquerda e para a direita até para ler um jornal. Então, essa foi a primeira coisa: relaxei mais. Em segundo lugar, a coisa da alegria, de ver uma civilização brotar, o que é muito bacana. Ver música, teatro… Culturalmente era muito rico. Aqui, essa parte, era liberal. Só na ditadura propriamente dita é que censuraram as manifestações culturais.
Na ditadura, fiquei no Brasil de 1964 a 68, quando ainda tinha muita crítica. Em 68 é que eles endureceram. E por sorte eu fui [para o exílio] antes. Aí caiu gente para burro, intervieram nas universidades. Se eu tivesse aqui teria sido expulsa.
Eu tava lá [Chile] e também foi uma alegria.
Conheceu Salvador Allende?
Conheci. Conheci todo o mundo. Até pedi uma licença — porque estava a fazer um doutoramento em Paris — e fui trabalhar com o governo. Eu e o Serra.
Com o governo Allende?
[Acena] Fomos os dois colegas no ministério da Economia. Como tinha de voltar para tomar posse na universidade, voltei em Março de 1973. E o golpe [de Pinochet] foi no Outono. Eu tinha deixado a minha filha e o meu filho, porque pretendia fazer outra licença. Mas aí vi que não dava, porque já tinha havido o diabo, trouxe o menino, e ela que tinha casado com um chileno ficou lá. Aí foi uma coisa muito angustiante. Depois quando ia para um seminário no México, prenderam-me no aeroporto aqui no Brasil e fiquei lá num desses aparelhos de repressão 48 horas. Assustador. Não teve tortura. Ameaça, ficar nua, fotografada de todos os lado, não poder comer, não poder beber, não poder fumar, e aquelas celas isoladas.
Sempre fumou assim sem parar?
Sempre, desde os 14 anos. Fumo dois maços. Claro, em entrevista fico nervosa e fumo mais [ri].
Então o Brasil me deu maturidade e uma experiência de vida rica.
E Portugal para si é o quê?
É remoto. Hoje não tenho mais nenhuma ligação íntima. Tenho uns primos vagos na Anadia. A Maria de Lourdes Pintasilgo, que era minha colega, morreu.
Foi sua colega onde?
No liceu Filipa de Lencastre, e depois No Instituto Superior Técnico, onde entrei com 16 anos. Estive com ela várias vezes, quando ela vinha aqui eu sempre a via. Essa era uma mulher fantástica. A verdade é que nós, as mulheres portuguesas, somos fantásticas. A coisa das Marias portuguesas é um facto. São mais lutadoras que os homens. Eu acho. Desde a Padeira de Aljubarrota para cá.
No tempo do Salazar era uma apagada e vil tristeza. Agora, como eu tinha sido presa aqui na véspera da revolução dos cravos e me disseram que me cortavam a nacionalidade se eu saísse, fiquei com medo e não saí do Brasil [nos dois anos a seguir ao 25 de Abril]. Depois fui, e talvez tenha ido numa das últimas marchas com os cravos, com os capitães e o velho comuna, que acho que já morreu…
Álvaro Cunhal.
O Álvaro já morreu, não já? O velho Cunhal. Descemos a Avenida da Liberdade com os cravos na mão. Foi simpático. Mas não é um país estimulante como o Brasil. O Brasil é um país imenso e muito diversificado. Lá é muito pequenininho.
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Clipping do dia | Brasilianas.Org
Clipping do dia | Brasilianas.Org: "A eleição do domingo 31 não vai apontar apenas o nome do vencedor da corrida presidencial. Ela também simboliza um inédito confronto entre os partidos que dominaram a cena política nos últimos anos – o PT e o PSDB. Pela primeira vez, os brasileiros terão como base de comparação dois períodos precisos, que duraram exatamente oito anos, e que ficaram marcados por diretrizes econômicas e ações políticas divergentes na maioria das vezes. O PSDB deteve o poder de 1995 a 2002, com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Desde 2003, é o PT quem dá as cartas por intermédio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A despeito de convicções ideológicas, tão exacerbadas nestes tempos de eleição, os dois inegavelmente estão na lista dos líderes mais importantes da história do Brasil. Ambos tiveram méritos e defeitos, erros e acertos, e é impossível não creditar à dupla o excepcional momento vivido pelo País. Mas, afinal, como comparar os dois governos? Por mais que um lado ou outro possa reclamar, não há forma mais justa de avaliar as duas eras do que colocar na mesa de discussões os indicadores de cada gestão. Foi isso o que ISTOÉ fez, no levantamento mais completo já realizado a respeito dos dois governos.
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Clipping do dia | Brasilianas.Org: "Crescimento e distribuição de renda
Para cada ponto percentual de queda no índice de Gini brasileiro, a China eleva em 1,4 ponto a desigualdade na renda Uma das principais novidades surgidas no contexto de evolução da crise global de 2008 encontra-se justamente na recuperação econômica mundial atual, cada vez mais determinada pela dinâmica dos países não desenvolvidos. O fato de nações como China, Brasil e Índia responderem por mais da metade do crescimento econômico pós-recessão mundial acontece pela primeira vez desde a Grande Depressão de 1929. Em contrapartida, o conjunto das nações desenvolvidas parece, cada vez mais, prisioneiro do ciclo vicioso originado pela nova reprodução da armadilha japonesa, constituída desde 1991 por força do tipo de crise que se abateu naquele país. Ou seja, a combinação da anorexia do consumo familiar com a retenção e adiamento dos investimentos das empresas, acrescido do desajuste fiscal e de medidas ortodoxas de contenção do gasto social. O resultado disso reflete-se na deterioração da confiança nacional potencializada pelo risco da deflação em meio à onda das desvalorizações cambiais competitivas e, infelizmente, o ressurgimento da marcha protecionista. Na sequência do desemprego em alta, ocorre a elevação nas taxas de pobreza e de suicídios entre os países desenvolvidos. Não parece haver dúvidas de que o abandono atual, pelos países ricos, da convergência das políticas anticíclicas adotadas na crise de 2008 aponta para um período relativamente longo de convivência com o baixo dinamismo econômico e piora na distribuição de renda. Ademais, a prevalência de enormes assimetrias de poder entre a força e os interesses das grandes corporações transnacionais e o apequenamento das ações dos Estados nacionais, aliada ao contínuo esvaziamento das instituições multilaterais, tende a tornar mais distante a coordenação urgente e necessária da governança mundial. Tal como na Grande Depressão de 1873 a 1896, que acompanhada pelo circuito da industrialização retardatária ocorrido na Alemanha e nos Estados Unidos, permitiu surgir - meio século depois - o deslocamento do centro dinâmico mundial assentado na hegemonia inglesa, se percebe hoje, guardada a devida proporção, o aparecimento de novas polaridades geoeconômicas no desenvolvimento global. China, Brasil e Índia são crescentemente apontados como nações portadoras de futuro e de grande potencial necessário para assumir maior centralidade na dinâmica do desenvolvimento mundial. Por conta disso, se deve procurar compreender como o comportamento do crescimento econômico e do padrão de distribuição de renda, especialmente na China e no Brasil, se tornam referência de como o novo mundo poderá mover-se, com maior ou menor expansão e ampliada ou contida desigualdade na repartição da renda. Ainda que se trate de países muito diferentes, Brasil e China apresentam tendências recentes distintas em relação ao crescimento econômico e à repartição da renda nacional entre seus habitantes. No Brasil, por exemplo, observa-se que para cada 1 ponto percentual de expansão da economia, a China consegue crescer 2,5 pontos percentuais a mais. Entre 1995 e 2010, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro foi multiplicado por 1,6 vez, enquanto o PIB chinês foi multiplicado por 3,9 vezes. O modelo veloz de crescimento econômico da China praticamente não se alterou entre 1995 e 2003, e de 2004 a 2010 (crescimento médio anual de 10%), ao contrário do Brasil, que registrou expansão média anual de 2,1% de 1995 a 2003, e de 4,5% de 2004 a 2010. Por outro lado, se percebe divergência importante em relação ao padrão de desigualdade na repartição de renda entre os brasileiros e chineses. Entre 1995 e 2010, o índice de Gini aumentou 21% na China, enquanto no Brasil caiu 14%. Ou seja, para cada 1 ponto percentual de queda no índice de Gini brasileiro, a China eleva em 1,4 ponto percentual o grau de desigualdade na renda. Interessante notar ainda que, de 1995 a 2001, o comportamento no índice de Gini se manteve relativamente inalterado, apesar das oscilações anuais - de 2,6% para mais na China e de 0,83% para menos no Brasil. Todavia, se constata que a partir daí houve uma grande diferenciação na trajetória da repartição da renda na China e no Brasil. Com o crescimento econômico maior no Brasil, o comportamento do índice de Gini tornou-se mais decrescente (-12,2%), ao passo que a China, que manteve inalterada a trajetória de alta expansão do PIB, passou a registrar ampliado aumento no grau de desigualdade na repartição pessoal da renda (+17,9%). Em síntese, se nota que desde 2004 o PIB brasileiro tem crescido, como média anual, quase a metade do ritmo de aumento do Produto Interno Bruto chinês, ao contrário do período anterior (1995 e 2003), quando a expansão econômica brasileira representava somente 25% do crescimento do PIB chinês. Com a maior expansão das atividades da economia brasileira no período recente, houve concomitantemente o aprofundamento da queda no grau de desigualdade da renda pessoal, diferentemente da situação chinesa, com forte piora na repartição do conjunto dos rendimentos dos seus habitantes. Essas diferenças tornam-se importantes e devem ser ressaltadas, especialmente quando se avaliam as novas trajetórias mundiais possíveis a partir da sequência da crise nos países desenvolvidos iniciada em 2008. Não obstante o menor ritmo de crescimento econômico, o Brasil revela melhor trajetória de repartição da renda em relação ao desempenho chinês recente.
Márcio Pochmann é professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
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Para cada ponto percentual de queda no índice de Gini brasileiro, a China eleva em 1,4 ponto a desigualdade na renda Uma das principais novidades surgidas no contexto de evolução da crise global de 2008 encontra-se justamente na recuperação econômica mundial atual, cada vez mais determinada pela dinâmica dos países não desenvolvidos. O fato de nações como China, Brasil e Índia responderem por mais da metade do crescimento econômico pós-recessão mundial acontece pela primeira vez desde a Grande Depressão de 1929. Em contrapartida, o conjunto das nações desenvolvidas parece, cada vez mais, prisioneiro do ciclo vicioso originado pela nova reprodução da armadilha japonesa, constituída desde 1991 por força do tipo de crise que se abateu naquele país. Ou seja, a combinação da anorexia do consumo familiar com a retenção e adiamento dos investimentos das empresas, acrescido do desajuste fiscal e de medidas ortodoxas de contenção do gasto social. O resultado disso reflete-se na deterioração da confiança nacional potencializada pelo risco da deflação em meio à onda das desvalorizações cambiais competitivas e, infelizmente, o ressurgimento da marcha protecionista. Na sequência do desemprego em alta, ocorre a elevação nas taxas de pobreza e de suicídios entre os países desenvolvidos. Não parece haver dúvidas de que o abandono atual, pelos países ricos, da convergência das políticas anticíclicas adotadas na crise de 2008 aponta para um período relativamente longo de convivência com o baixo dinamismo econômico e piora na distribuição de renda. Ademais, a prevalência de enormes assimetrias de poder entre a força e os interesses das grandes corporações transnacionais e o apequenamento das ações dos Estados nacionais, aliada ao contínuo esvaziamento das instituições multilaterais, tende a tornar mais distante a coordenação urgente e necessária da governança mundial. Tal como na Grande Depressão de 1873 a 1896, que acompanhada pelo circuito da industrialização retardatária ocorrido na Alemanha e nos Estados Unidos, permitiu surgir - meio século depois - o deslocamento do centro dinâmico mundial assentado na hegemonia inglesa, se percebe hoje, guardada a devida proporção, o aparecimento de novas polaridades geoeconômicas no desenvolvimento global. China, Brasil e Índia são crescentemente apontados como nações portadoras de futuro e de grande potencial necessário para assumir maior centralidade na dinâmica do desenvolvimento mundial. Por conta disso, se deve procurar compreender como o comportamento do crescimento econômico e do padrão de distribuição de renda, especialmente na China e no Brasil, se tornam referência de como o novo mundo poderá mover-se, com maior ou menor expansão e ampliada ou contida desigualdade na repartição da renda. Ainda que se trate de países muito diferentes, Brasil e China apresentam tendências recentes distintas em relação ao crescimento econômico e à repartição da renda nacional entre seus habitantes. No Brasil, por exemplo, observa-se que para cada 1 ponto percentual de expansão da economia, a China consegue crescer 2,5 pontos percentuais a mais. Entre 1995 e 2010, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro foi multiplicado por 1,6 vez, enquanto o PIB chinês foi multiplicado por 3,9 vezes. O modelo veloz de crescimento econômico da China praticamente não se alterou entre 1995 e 2003, e de 2004 a 2010 (crescimento médio anual de 10%), ao contrário do Brasil, que registrou expansão média anual de 2,1% de 1995 a 2003, e de 4,5% de 2004 a 2010. Por outro lado, se percebe divergência importante em relação ao padrão de desigualdade na repartição de renda entre os brasileiros e chineses. Entre 1995 e 2010, o índice de Gini aumentou 21% na China, enquanto no Brasil caiu 14%. Ou seja, para cada 1 ponto percentual de queda no índice de Gini brasileiro, a China eleva em 1,4 ponto percentual o grau de desigualdade na renda. Interessante notar ainda que, de 1995 a 2001, o comportamento no índice de Gini se manteve relativamente inalterado, apesar das oscilações anuais - de 2,6% para mais na China e de 0,83% para menos no Brasil. Todavia, se constata que a partir daí houve uma grande diferenciação na trajetória da repartição da renda na China e no Brasil. Com o crescimento econômico maior no Brasil, o comportamento do índice de Gini tornou-se mais decrescente (-12,2%), ao passo que a China, que manteve inalterada a trajetória de alta expansão do PIB, passou a registrar ampliado aumento no grau de desigualdade na repartição pessoal da renda (+17,9%). Em síntese, se nota que desde 2004 o PIB brasileiro tem crescido, como média anual, quase a metade do ritmo de aumento do Produto Interno Bruto chinês, ao contrário do período anterior (1995 e 2003), quando a expansão econômica brasileira representava somente 25% do crescimento do PIB chinês. Com a maior expansão das atividades da economia brasileira no período recente, houve concomitantemente o aprofundamento da queda no grau de desigualdade da renda pessoal, diferentemente da situação chinesa, com forte piora na repartição do conjunto dos rendimentos dos seus habitantes. Essas diferenças tornam-se importantes e devem ser ressaltadas, especialmente quando se avaliam as novas trajetórias mundiais possíveis a partir da sequência da crise nos países desenvolvidos iniciada em 2008. Não obstante o menor ritmo de crescimento econômico, o Brasil revela melhor trajetória de repartição da renda em relação ao desempenho chinês recente.
Márcio Pochmann é professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
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Carta Maior - Direitos Humanos - A tentação de ver
Carta Maior - Direitos Humanos - A tentação de ver: "A tentação de ver
Os arquivos – em especial os que contêm informações de caráter pessoal, como os dos serviços de segurança –, possibilitam duas constatações: a de que lá se encontram também informações improcedentes, inexatas e enganadoras; e a de que lá se inscreveu a história de um órgão de Estado. Os “documentos da Ditadura” não devem ser tomados como a verdade da vida dos indivíduos neles registrada, mas sim como a expressão da lógica da desconfiança que permeava um órgão com características ditatoriais. O artigo é de Beatriz Kushnir.
Beatriz Kushnir (*)
O ministro da Justiça no governo Geisel, Armando Falcão, pronunciava que tanto pela Emenda Constitucional n° 1, de 1969, como pelo AI-5 o país vivia em pleno Estado de Direito e democracia. E, por isso, segundo ele, cabia a censura. Assim, relembrando a proibição ao filme Je vous salue, Marie, impunha: “Se fosse ministro, não deixaria passar. Todo mundo deve ser poupado da tentação de ver”.
Símbolo e base do governo autoritário, a extinção dos DOPS e do aparato repressivo deveriam garantir ao cidadão liberdade de expressão e de ir e vir – pilares da democracia. A difícil marca de ser fichado no DOPS e as dificuldades que esse estigma impõe a uma parcela dos que tiveram suas vidas registradas, somadas às garantias constitucionais que permitem o acesso à informação, ao mesmo tempo em que garantem a preservação da intimidade do cidadão, são os ingredientes que demonstram o quão calorosa é esta seara.
O uso e a introjeção da ideia de criminalidade política demonstra como um organismo de repressão e um governo autoritário juntos cunham a imagem do que é impróprio e, portanto, passível de ser reprimido; e como, socialmente, essa noção é aceita e passa a justificar a existência de uma instituição como o DOPS, por exemplo. A existência de uma “lógica” do censor faz dessa polícia política uma entidade “necessária”. As origens de uma sociedade baseada no autoritarismo e na exclusão dimensionam o peso e o papel de uma cultura da censura – o esforço de delimitar o legal e o ilegal. No Estado brasileiro republicano, essa foi uma tarefa, um ato de fundação.
A censura à grande imprensa nos tempos da mais recente ditadura civil-militar brasileira corrobora com a ideia de que, em um tempo de imposições e silêncio, se informar apenas pelas notícias permitidas era ficar décadas atrás de seu tempo. A “queda-de-braço” entre os meios de comunicação e os órgãos repressivos tinha um objeto de desejo: impor o que podia ser legal, por um lado, e legalizar, explicitando, o ilegal, por outro. Assim, o binômio ordem pública/segurança nacional regeu a polícia política, e estabeleceu o que se podia difundir como notícia. Aos órgãos de repressão cabia definir o que era permitido.
Lidar com o sigilo e a privacidade nos faz pensar. Alguns dos “fichados” afirmam que os “acervos da Ditadura” são fruto das incursões policiais nas suas residências, e contêm documentos extremamente íntimos, além de cartas e objetos de uso pessoal. A natureza desse arquivo impõe que alguns deles não queiram vê-los aberto ao público de maneira indiscriminada.
O ponto central é: será que algum arquivo tem o mérito de conter as informações verdadeiras acerca dos fatos por ele guardados? A formação dos “arquivos da Repressão”, e sua posterior abertura, foi pensada pelos cientistas sociais europeus para o caso da antiga URSS. A problemática para eles era como tornar aquele acervo um instrumento de pesquisa, ao mesmo tempo que refletiam tanto em manter sua organização original, como em estabelecer critérios para a sua institucionalização enquanto um instrumento de consulta pública. Era também uma questão para esses pesquisadores europeus a seara dos direitos civis, da manutenção da privacidade dos indivíduos fichados e, principalmente, do que realmente se poderia esperar daquele tipo de fonte.
Como se pode verificar, pesquisadores brasileiros e europeus enfrentam dilemas semelhantes. Mais que isso: o que esperar desse material, que perguntas fazer, e o que realmente ele poderia responder?
Nesse contexto, as ponderações são sobre as funções e os limites dos arquivos para a tessitura da história. O cerne da preocupação, de fato, é pensar o mito da “verdade histórica”. Em que situação o historiador se sente mais seguro: no registro escrito ou no depoimento a posteriori.
Quanto ao acesso aos “acervos da Ditadura” e à possibilidade de consultá-los como fonte histórica no Brasil, não podemos esquecer que, entre a sua formação e a sua constituição como um arquivo, um longo período de abandono caracterizou o material. Há limites tênues e tensos que separaram o que é permitido e o que deve ser considerado ilegal; o que é público para o corpo social e o que fere a dimensão privada da história de cada cidadão. Assim, os pesquisadores se encontram em uma encruzilhada: por um lado, dependem da informação produzida pelo Estado, que – sob a égide da segurança da nação – se entende no direito de “conhecer” os atos dos seus cidadãos; por outro, encontram-se limitados em suas pesquisas pelas pessoas alvo dessa vigilância, que desejam preservar sua vida pessoal, sua intimidade e honra.
Não sabemos quanto do conjunto original se manteve intacto após a doação às instituições de guarda, ocorrida com a extinção legal das agências repressivas. O arquivo não é apenas um lugar de reunião de documentos ou o locus de trabalho do arquivista. No caso dos “arquivos da Ditadura”, há que se ressaltar uma peculiaridade: durante a sua vigência, funcionaram como acervo interno de um órgão de segurança; após a sua extinção, assumiu o caráter de arquivo público. Esse perfil concede ao acervo uma característica própria. Se, num primeiro momento, ele é um instrumento restrito de um órgão público, “vivo” e constantemente realimentado, numa segunda fase ele é deslocado para a seara pública, e as informações ali contidas passam das mãos de poucos, para um acesso, a princípio, irrestrito.
Estes acervos, por um lado, têm como objetivo identificar o “fichado” no mundo social; por outro, trata-se de um arquivo que explicita o universo do outro a partir da lógica interna de seu titular. Ou seja, da perspectiva da polícia. O acervo permite tanto reconstituir uma trajetória do “fichado”, a partir da perspectiva do agente policial, como a do “fichador”.
Quando esses acervos passam ao domínio público, certas nuanças se explicitam. O material chega desorganizado, e certamente houve uma “limpeza” realizada por ex-agentes do órgão, o que nos leva a crer que a sua lógica interna tenha sido muitas vezes deliberadamente manipulada. Uma característica, contudo, lhes é marcante: contêm informações sobre determinadas pessoas, mas não são arquivos privados. Por pertencerem a um órgão público, sua documentação é de domínio da sociedade, sendo esta situação um nó difícil de desatar.
Outra forma de apreender o conteúdo dos “arquivos da Ditadura” é verificar as premissas que ditaram sua acumulação. As informações ali contidas foram recolhidas sob a orientação do olhar da polícia. Há, portanto, que se levar em conta a distância entre as atividades políticas outrora realizadas e o conteúdo das fichas policiais elaboradas, compreendendo-se que foi a lógica da desconfiança de um Estado autoritário que produziu o acervo. Por outro lado, foi a lógica da democracia da informação que os transformou em arquivos públicos, abertos à consulta. Esse acesso é uma forma positiva de falar de um “silêncio”, como também de permitir ao pesquisador rediscutir a constituição de uma memória.·.
A volta ao passado, para alguns, é um ato de abrandamento e de eliminação das arestas e das diferenças, é um redesenhar que deve respeitar uma lógica da harmonia e que dispensa tensões e atritos. Há que se redimensionar o fascínio que os “arquivos da Ditadura” despertaram, quando a esse deslumbre se contrapõem as dificuldades do seu manuseio.
O arrebatamento de poder consultar um material secreto em um momento de liberdade política gerou a sensação de que todo o segredo do passado seria finalmente liberto. Todavia, muito rapidamente renunciamos a essas pretensões e começamos a perceber que tudo não é assim tão simples, que os novos arquivos não falam por si sós, que, como todos os outros arquivos, eles devem ser submetidos a uma crítica exigente das fontes, que seu manuseio só pode ser feito se forem respeitadas as preocupações éticas e metodológicas elementares, e que, mesmo bem utilizados, e interrogados a partir de questões pertinentes, não dispensam o historiador de seu trabalho habitual de reconstituição e de interpretação − e não têm resposta para tudo.
Ao perceber a onipotência com que alguns os encaram e a decepção que tamanha expectativa pode gerar, poder-se-á concluir que tais arquivos são apenas mais uma fonte para as pesquisas. Uma fonte rica e que não pode ser negligenciada, mas as informações ali contidas necessitam do eterno cotejar com outras para mais bem se compreender aquele período da História. Sem dúvida, o mais importante é que, com a liberação desses acervos, houve um aumento de pesquisas e reflexões nesta temática, a exigência metodológica e ética, certa modéstia e humildade quanto aos resultados e ao requestionamento das certezas adquiridas.
Os arquivos – em especial os que contêm informações de caráter pessoal, como os dos serviços de segurança –, possibilitam duas constatações: a de que lá se encontram também informações improcedentes, inexatas e enganadoras; e a de que lá se inscreveu a história de um órgão de Estado. Os “documentos da Ditadura” não devem ser tomados como a verdade da vida dos indivíduos neles registrada, mas sim como a expressão da lógica da desconfiança que permeava um órgão com características ditatoriais. O passado, conforme lembra Henry Rousso, é uma “terra estrangeira”, que exige, no presente, o passaporte do documento conservado para nele ingressar. Nesse sentido, ”[...] acessíveis ou fechados, os arquivos são sintomas de uma falta, e a tarefa do historiador consiste tanto em tentar suprimi-la de maneira inteligível, a fim de reduzir o máximo possível a estranheza do passado”.
(*) Beatriz Kushnir é mestre em História Social pela Universidade Federal Fluminense e doutora em História Social do Trabalho pela Unicamp. É autora de 'Baile de máscaras: mulheres judias e prostituição', organizadora de 'Perfis cruzados: trajetórias e militância política no Brasil' (ambos publicados pela Imago) e de 'Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988' (Boitempo Editorial)
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Os arquivos – em especial os que contêm informações de caráter pessoal, como os dos serviços de segurança –, possibilitam duas constatações: a de que lá se encontram também informações improcedentes, inexatas e enganadoras; e a de que lá se inscreveu a história de um órgão de Estado. Os “documentos da Ditadura” não devem ser tomados como a verdade da vida dos indivíduos neles registrada, mas sim como a expressão da lógica da desconfiança que permeava um órgão com características ditatoriais. O artigo é de Beatriz Kushnir.
Beatriz Kushnir (*)
O ministro da Justiça no governo Geisel, Armando Falcão, pronunciava que tanto pela Emenda Constitucional n° 1, de 1969, como pelo AI-5 o país vivia em pleno Estado de Direito e democracia. E, por isso, segundo ele, cabia a censura. Assim, relembrando a proibição ao filme Je vous salue, Marie, impunha: “Se fosse ministro, não deixaria passar. Todo mundo deve ser poupado da tentação de ver”.
Símbolo e base do governo autoritário, a extinção dos DOPS e do aparato repressivo deveriam garantir ao cidadão liberdade de expressão e de ir e vir – pilares da democracia. A difícil marca de ser fichado no DOPS e as dificuldades que esse estigma impõe a uma parcela dos que tiveram suas vidas registradas, somadas às garantias constitucionais que permitem o acesso à informação, ao mesmo tempo em que garantem a preservação da intimidade do cidadão, são os ingredientes que demonstram o quão calorosa é esta seara.
O uso e a introjeção da ideia de criminalidade política demonstra como um organismo de repressão e um governo autoritário juntos cunham a imagem do que é impróprio e, portanto, passível de ser reprimido; e como, socialmente, essa noção é aceita e passa a justificar a existência de uma instituição como o DOPS, por exemplo. A existência de uma “lógica” do censor faz dessa polícia política uma entidade “necessária”. As origens de uma sociedade baseada no autoritarismo e na exclusão dimensionam o peso e o papel de uma cultura da censura – o esforço de delimitar o legal e o ilegal. No Estado brasileiro republicano, essa foi uma tarefa, um ato de fundação.
A censura à grande imprensa nos tempos da mais recente ditadura civil-militar brasileira corrobora com a ideia de que, em um tempo de imposições e silêncio, se informar apenas pelas notícias permitidas era ficar décadas atrás de seu tempo. A “queda-de-braço” entre os meios de comunicação e os órgãos repressivos tinha um objeto de desejo: impor o que podia ser legal, por um lado, e legalizar, explicitando, o ilegal, por outro. Assim, o binômio ordem pública/segurança nacional regeu a polícia política, e estabeleceu o que se podia difundir como notícia. Aos órgãos de repressão cabia definir o que era permitido.
Lidar com o sigilo e a privacidade nos faz pensar. Alguns dos “fichados” afirmam que os “acervos da Ditadura” são fruto das incursões policiais nas suas residências, e contêm documentos extremamente íntimos, além de cartas e objetos de uso pessoal. A natureza desse arquivo impõe que alguns deles não queiram vê-los aberto ao público de maneira indiscriminada.
O ponto central é: será que algum arquivo tem o mérito de conter as informações verdadeiras acerca dos fatos por ele guardados? A formação dos “arquivos da Repressão”, e sua posterior abertura, foi pensada pelos cientistas sociais europeus para o caso da antiga URSS. A problemática para eles era como tornar aquele acervo um instrumento de pesquisa, ao mesmo tempo que refletiam tanto em manter sua organização original, como em estabelecer critérios para a sua institucionalização enquanto um instrumento de consulta pública. Era também uma questão para esses pesquisadores europeus a seara dos direitos civis, da manutenção da privacidade dos indivíduos fichados e, principalmente, do que realmente se poderia esperar daquele tipo de fonte.
Como se pode verificar, pesquisadores brasileiros e europeus enfrentam dilemas semelhantes. Mais que isso: o que esperar desse material, que perguntas fazer, e o que realmente ele poderia responder?
Nesse contexto, as ponderações são sobre as funções e os limites dos arquivos para a tessitura da história. O cerne da preocupação, de fato, é pensar o mito da “verdade histórica”. Em que situação o historiador se sente mais seguro: no registro escrito ou no depoimento a posteriori.
Quanto ao acesso aos “acervos da Ditadura” e à possibilidade de consultá-los como fonte histórica no Brasil, não podemos esquecer que, entre a sua formação e a sua constituição como um arquivo, um longo período de abandono caracterizou o material. Há limites tênues e tensos que separaram o que é permitido e o que deve ser considerado ilegal; o que é público para o corpo social e o que fere a dimensão privada da história de cada cidadão. Assim, os pesquisadores se encontram em uma encruzilhada: por um lado, dependem da informação produzida pelo Estado, que – sob a égide da segurança da nação – se entende no direito de “conhecer” os atos dos seus cidadãos; por outro, encontram-se limitados em suas pesquisas pelas pessoas alvo dessa vigilância, que desejam preservar sua vida pessoal, sua intimidade e honra.
Não sabemos quanto do conjunto original se manteve intacto após a doação às instituições de guarda, ocorrida com a extinção legal das agências repressivas. O arquivo não é apenas um lugar de reunião de documentos ou o locus de trabalho do arquivista. No caso dos “arquivos da Ditadura”, há que se ressaltar uma peculiaridade: durante a sua vigência, funcionaram como acervo interno de um órgão de segurança; após a sua extinção, assumiu o caráter de arquivo público. Esse perfil concede ao acervo uma característica própria. Se, num primeiro momento, ele é um instrumento restrito de um órgão público, “vivo” e constantemente realimentado, numa segunda fase ele é deslocado para a seara pública, e as informações ali contidas passam das mãos de poucos, para um acesso, a princípio, irrestrito.
Estes acervos, por um lado, têm como objetivo identificar o “fichado” no mundo social; por outro, trata-se de um arquivo que explicita o universo do outro a partir da lógica interna de seu titular. Ou seja, da perspectiva da polícia. O acervo permite tanto reconstituir uma trajetória do “fichado”, a partir da perspectiva do agente policial, como a do “fichador”.
Quando esses acervos passam ao domínio público, certas nuanças se explicitam. O material chega desorganizado, e certamente houve uma “limpeza” realizada por ex-agentes do órgão, o que nos leva a crer que a sua lógica interna tenha sido muitas vezes deliberadamente manipulada. Uma característica, contudo, lhes é marcante: contêm informações sobre determinadas pessoas, mas não são arquivos privados. Por pertencerem a um órgão público, sua documentação é de domínio da sociedade, sendo esta situação um nó difícil de desatar.
Outra forma de apreender o conteúdo dos “arquivos da Ditadura” é verificar as premissas que ditaram sua acumulação. As informações ali contidas foram recolhidas sob a orientação do olhar da polícia. Há, portanto, que se levar em conta a distância entre as atividades políticas outrora realizadas e o conteúdo das fichas policiais elaboradas, compreendendo-se que foi a lógica da desconfiança de um Estado autoritário que produziu o acervo. Por outro lado, foi a lógica da democracia da informação que os transformou em arquivos públicos, abertos à consulta. Esse acesso é uma forma positiva de falar de um “silêncio”, como também de permitir ao pesquisador rediscutir a constituição de uma memória.·.
A volta ao passado, para alguns, é um ato de abrandamento e de eliminação das arestas e das diferenças, é um redesenhar que deve respeitar uma lógica da harmonia e que dispensa tensões e atritos. Há que se redimensionar o fascínio que os “arquivos da Ditadura” despertaram, quando a esse deslumbre se contrapõem as dificuldades do seu manuseio.
O arrebatamento de poder consultar um material secreto em um momento de liberdade política gerou a sensação de que todo o segredo do passado seria finalmente liberto. Todavia, muito rapidamente renunciamos a essas pretensões e começamos a perceber que tudo não é assim tão simples, que os novos arquivos não falam por si sós, que, como todos os outros arquivos, eles devem ser submetidos a uma crítica exigente das fontes, que seu manuseio só pode ser feito se forem respeitadas as preocupações éticas e metodológicas elementares, e que, mesmo bem utilizados, e interrogados a partir de questões pertinentes, não dispensam o historiador de seu trabalho habitual de reconstituição e de interpretação − e não têm resposta para tudo.
Ao perceber a onipotência com que alguns os encaram e a decepção que tamanha expectativa pode gerar, poder-se-á concluir que tais arquivos são apenas mais uma fonte para as pesquisas. Uma fonte rica e que não pode ser negligenciada, mas as informações ali contidas necessitam do eterno cotejar com outras para mais bem se compreender aquele período da História. Sem dúvida, o mais importante é que, com a liberação desses acervos, houve um aumento de pesquisas e reflexões nesta temática, a exigência metodológica e ética, certa modéstia e humildade quanto aos resultados e ao requestionamento das certezas adquiridas.
Os arquivos – em especial os que contêm informações de caráter pessoal, como os dos serviços de segurança –, possibilitam duas constatações: a de que lá se encontram também informações improcedentes, inexatas e enganadoras; e a de que lá se inscreveu a história de um órgão de Estado. Os “documentos da Ditadura” não devem ser tomados como a verdade da vida dos indivíduos neles registrada, mas sim como a expressão da lógica da desconfiança que permeava um órgão com características ditatoriais. O passado, conforme lembra Henry Rousso, é uma “terra estrangeira”, que exige, no presente, o passaporte do documento conservado para nele ingressar. Nesse sentido, ”[...] acessíveis ou fechados, os arquivos são sintomas de uma falta, e a tarefa do historiador consiste tanto em tentar suprimi-la de maneira inteligível, a fim de reduzir o máximo possível a estranheza do passado”.
(*) Beatriz Kushnir é mestre em História Social pela Universidade Federal Fluminense e doutora em História Social do Trabalho pela Unicamp. É autora de 'Baile de máscaras: mulheres judias e prostituição', organizadora de 'Perfis cruzados: trajetórias e militância política no Brasil' (ambos publicados pela Imago) e de 'Cães de guarda: jornalistas e censores, do AI-5 à Constituição de 1988' (Boitempo Editorial)
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MINHA EXPERIÊNCIA DE TRABALHO COM O MINISTRO JOSÉ SERRA (Helvécio Bueno, Médico sanitarista) - Portal Luis Nassif
MINHA EXPERIÊNCIA DE TRABALHO COM O MINISTRO JOSÉ SERRA (Helvécio Bueno, Médico sanitarista) - Portal Luis Nassif: "MINHA EXPERIÊNCIA DE TRABALHO
COM O MINISTRO JOSÉ SERRA
Sou Helvécio Bueno, 57 anos, nascido em São Gotardo – MG, morei em Belo Horizonte de 1961 a 1971 e, desde 1972 moro em Brasília. Formei em medicina pela Universidade de Brasília – UnB, fiz especialização em saúde pública e administração de sistemas de saúde e sou mestre em saúde coletiva.
Entrei para a Secretaria de Saúde do DF em 1982. Na SES-DF fui médico sanitarista do Centro de Saúde n° 4 de Taguatinga – CST4, depois da Coordenação de Saúde da Comunidade, em seguida Chefe do CST4 e vice diretor do Hospital Regional de Taguatinga – HRT.
Em 1985 fui convidado para trabalhar no Ministério da Saúde - MS como técnico do Grupo de Trabalho para a Erradicação da Poliomielite no Brasil – GT Pólio. Trabalhei no MS de 1985 a 1999. Foram quase 15 anos e nesse período convivi com os seguintes ministros da saúde:
1 Carlos Corrêa de Menezes Sant'anna 15 de março de 1985 13 de fevereiro de 1986 José Sarney
2 Roberto Figueira Santos 14 de fevereiro de 1986 23 de novembro de 1987
3 Luiz Carlos Borges da Silveira 23 de novembro de 1987 15 de janeiro de 1989
4 Seigo Tsuzuki 16 de janeiro de 1989 14 de março de 1990
5 Alceni Guerra 15 de março de 1990 23 de janeiro de 1992 F. Collor de Mello
6 José Goldemberg 24 de janeiro de 1992 12 de fevereiro de 1992
7 Adib Jatene 12 de fevereiro de 1992 2 de outubro de 1992
8 de outubro de 1992 29 de dezembro de 1992
8 Jamil Haddad 29 de dezembro de 1992 18 de agosto de 1993 Itamar Franco
9 Saulo Moreira 19 de agosto de 1993 30 de agosto de 1993
10 Henrique Santillo 30 de agosto de 1993 1 de janeiro de 1995
11 Adib Jatene 1 de janeiro de 1995 6 de novembro de 1996 FHC
12 José Carlos Seixas 6 de novembro de 1996 13 de dezembro de 1996
13 Carlos Albuquerque 13 de dezembro de 1996 31 de março de 1998
14 José Serra 31 de março de 1998 20 de fevereiro de 2002
Nesses anos tive a oportunidade de ser o Coordenador do GTPólio e acompanhar o último caso desta doença ocorrido no Brasil; a seguir, como 1º diretor do Departamento de Operações da Fundação Nacional de Saúde – DEOPE/FUNASA pude coordenar a criação do Programa Nacional de Agentes Comunitários de Saúde – PNACS (depois mudado para PACS) e, do Programa Nacional de Parteiras Tradicionais – PNPT (descontinuado na gestão seguinte). Em 1991/1992 participei da reestrutração, por meio de empréstimos junto ao Banco Mundial, do Programa Nacional de Controle das DST/Aids – PN DST/Aids onde fui o 1° Chefe da Unidade de Controle das DST e posteriormente Chefe da Unidade de Assistência à Aids (o PN DST/Aids foi criado em 1985 na gestão do ministro Carlos Santana).
Em 1996 foi criada, no MS, a Secretaria de Políticas de Saúde da qual fui convidado para ser o 1º diretor do Departamento de Avaliação de Políticas de Saúde e depois, em 1998, diretor do Departamento de Informação em Saúde. Nesse período, participei da criação, em conjunto com a Organização Pan-Americana da Saúde - OPAS e fui o 1° coordenador da secretaria técnica da Rede Interagencial de Informações para a Saúde – RIPSA e, junto com o DATASUS, da Rede Nacional de Informações em Saúde – RNIS.
Aí assumiu o MS o ministro José Serra.
Meu 1º contato com o então ministro José Serra ocorreu da seguinte maneira: eu estava participando de uma reunião com todo o 1º escalão do MS na sala de reunião, ao lado do gabinete do ministro, que não se encontrava. A reunião era conduzida pelo Chefe de Gabinete. Depois de uma hora e meia de reunião, no momento em que falava o Secretário de Políticas de Saúde, o ministro Serra entrou na sala, não cumprimentou ninguém, interrompendo o palestrante, sem pedir licença, perguntou ao Chefe de Gabinete o que ele, Serra, precisava saber do que já havia ocorrido naquela reunião. Pegou o Chefe de Gabinete pelo braço e levou-o para seu gabinete deixando seu 1° escalão e alguns convidados sem dirigir-lhes uma única palavra. Essa era a forma com que tratava seus subordinados, o sorriso só aparecia na presença da mídia.
Porém, o mais importante e demonstrativo de seu caráter, foi quando, após 1 ano de sua posse, o ministro Serra solicitou uma avaliação da situação de saúde do país e, quando apresentei, entre outros dados, o aumento da mortalidade infantil na região nordeste ele simplesmente disse: “esta informação não pode sair deste ministério”. Foi quando, em setembro de 1999, pedi demissão do cargo que ocupava no MS.
Além disso, o candidato Serra diz, em sua propagando política, que criou o Programa de Aids e o medicamento genérico. O programa de Aids foi criado pelo ministro Carlos Santana em 1985 e reestruturado, ganhando dimensão internacional, em 1992, na gestão do ministro Adib Jatene; já o genérico foi criado em abril de 1993 pelo ministro Jamil Haddad, durante o governo de Itamar Franco.
Destes 14 ministros, com os quais convivi, destaco pela relevância do trabalho em prol da saúde da população brasileira o ministro Adib Jatene, Henrique Santillo e Carlos Albuquerque.
Se trago este depoimento é unicamente pela preocupação com o destino da maior parte da população brasileira que necessita continuar a melhorar sua qualidade de vida, não só de sobrevivência, mas de cidadania. Toda minha vida profissional, como médico sanitarista, foi dedicada à saúde pública, mas nunca me filiei a nenhum partido político, pois isso me dá a independência necessária para criticar quem precisa e elogiar só quem merece.
Brasília – DF, 20 de outubro de 2010.
Helvécio Bueno
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COM O MINISTRO JOSÉ SERRA
Sou Helvécio Bueno, 57 anos, nascido em São Gotardo – MG, morei em Belo Horizonte de 1961 a 1971 e, desde 1972 moro em Brasília. Formei em medicina pela Universidade de Brasília – UnB, fiz especialização em saúde pública e administração de sistemas de saúde e sou mestre em saúde coletiva.
Entrei para a Secretaria de Saúde do DF em 1982. Na SES-DF fui médico sanitarista do Centro de Saúde n° 4 de Taguatinga – CST4, depois da Coordenação de Saúde da Comunidade, em seguida Chefe do CST4 e vice diretor do Hospital Regional de Taguatinga – HRT.
Em 1985 fui convidado para trabalhar no Ministério da Saúde - MS como técnico do Grupo de Trabalho para a Erradicação da Poliomielite no Brasil – GT Pólio. Trabalhei no MS de 1985 a 1999. Foram quase 15 anos e nesse período convivi com os seguintes ministros da saúde:
1 Carlos Corrêa de Menezes Sant'anna 15 de março de 1985 13 de fevereiro de 1986 José Sarney
2 Roberto Figueira Santos 14 de fevereiro de 1986 23 de novembro de 1987
3 Luiz Carlos Borges da Silveira 23 de novembro de 1987 15 de janeiro de 1989
4 Seigo Tsuzuki 16 de janeiro de 1989 14 de março de 1990
5 Alceni Guerra 15 de março de 1990 23 de janeiro de 1992 F. Collor de Mello
6 José Goldemberg 24 de janeiro de 1992 12 de fevereiro de 1992
7 Adib Jatene 12 de fevereiro de 1992 2 de outubro de 1992
8 de outubro de 1992 29 de dezembro de 1992
8 Jamil Haddad 29 de dezembro de 1992 18 de agosto de 1993 Itamar Franco
9 Saulo Moreira 19 de agosto de 1993 30 de agosto de 1993
10 Henrique Santillo 30 de agosto de 1993 1 de janeiro de 1995
11 Adib Jatene 1 de janeiro de 1995 6 de novembro de 1996 FHC
12 José Carlos Seixas 6 de novembro de 1996 13 de dezembro de 1996
13 Carlos Albuquerque 13 de dezembro de 1996 31 de março de 1998
14 José Serra 31 de março de 1998 20 de fevereiro de 2002
Nesses anos tive a oportunidade de ser o Coordenador do GTPólio e acompanhar o último caso desta doença ocorrido no Brasil; a seguir, como 1º diretor do Departamento de Operações da Fundação Nacional de Saúde – DEOPE/FUNASA pude coordenar a criação do Programa Nacional de Agentes Comunitários de Saúde – PNACS (depois mudado para PACS) e, do Programa Nacional de Parteiras Tradicionais – PNPT (descontinuado na gestão seguinte). Em 1991/1992 participei da reestrutração, por meio de empréstimos junto ao Banco Mundial, do Programa Nacional de Controle das DST/Aids – PN DST/Aids onde fui o 1° Chefe da Unidade de Controle das DST e posteriormente Chefe da Unidade de Assistência à Aids (o PN DST/Aids foi criado em 1985 na gestão do ministro Carlos Santana).
Em 1996 foi criada, no MS, a Secretaria de Políticas de Saúde da qual fui convidado para ser o 1º diretor do Departamento de Avaliação de Políticas de Saúde e depois, em 1998, diretor do Departamento de Informação em Saúde. Nesse período, participei da criação, em conjunto com a Organização Pan-Americana da Saúde - OPAS e fui o 1° coordenador da secretaria técnica da Rede Interagencial de Informações para a Saúde – RIPSA e, junto com o DATASUS, da Rede Nacional de Informações em Saúde – RNIS.
Aí assumiu o MS o ministro José Serra.
Meu 1º contato com o então ministro José Serra ocorreu da seguinte maneira: eu estava participando de uma reunião com todo o 1º escalão do MS na sala de reunião, ao lado do gabinete do ministro, que não se encontrava. A reunião era conduzida pelo Chefe de Gabinete. Depois de uma hora e meia de reunião, no momento em que falava o Secretário de Políticas de Saúde, o ministro Serra entrou na sala, não cumprimentou ninguém, interrompendo o palestrante, sem pedir licença, perguntou ao Chefe de Gabinete o que ele, Serra, precisava saber do que já havia ocorrido naquela reunião. Pegou o Chefe de Gabinete pelo braço e levou-o para seu gabinete deixando seu 1° escalão e alguns convidados sem dirigir-lhes uma única palavra. Essa era a forma com que tratava seus subordinados, o sorriso só aparecia na presença da mídia.
Porém, o mais importante e demonstrativo de seu caráter, foi quando, após 1 ano de sua posse, o ministro Serra solicitou uma avaliação da situação de saúde do país e, quando apresentei, entre outros dados, o aumento da mortalidade infantil na região nordeste ele simplesmente disse: “esta informação não pode sair deste ministério”. Foi quando, em setembro de 1999, pedi demissão do cargo que ocupava no MS.
Além disso, o candidato Serra diz, em sua propagando política, que criou o Programa de Aids e o medicamento genérico. O programa de Aids foi criado pelo ministro Carlos Santana em 1985 e reestruturado, ganhando dimensão internacional, em 1992, na gestão do ministro Adib Jatene; já o genérico foi criado em abril de 1993 pelo ministro Jamil Haddad, durante o governo de Itamar Franco.
Destes 14 ministros, com os quais convivi, destaco pela relevância do trabalho em prol da saúde da população brasileira o ministro Adib Jatene, Henrique Santillo e Carlos Albuquerque.
Se trago este depoimento é unicamente pela preocupação com o destino da maior parte da população brasileira que necessita continuar a melhorar sua qualidade de vida, não só de sobrevivência, mas de cidadania. Toda minha vida profissional, como médico sanitarista, foi dedicada à saúde pública, mas nunca me filiei a nenhum partido político, pois isso me dá a independência necessária para criticar quem precisa e elogiar só quem merece.
Brasília – DF, 20 de outubro de 2010.
Helvécio Bueno
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Tijolaço – O Blog do Brizola Neto
Tijolaço – O Blog do Brizola Neto: "Serra e o relógio da mentira
Essa ótima piada foi enviada pelo Dimas e é boa para a gente descontrair enquanto prossegue na batalha pela vitória no domingo.
Um cidadão morreu e foi para o céu. Enquanto estava em frente a São Pedro nos Portões Celestiais, viu uma enorme parede com relógios atrás dele.
Ele perguntou: – O que são todos aqueles relógios?
São Pedro respondeu: – São Relógios da Mentira. Todo mundo na Terra tem um Relógio da Mentira.
Cada vez que você mente, os ponteiros de seu relógio movem-se.
- Oh!! – exclamou o cidadão – De quem é aquele relógio ali?
- É o de Madre Teresa. Os ponteiros nunca se moveram, indicando que ela nunca mentiu.
- E aquele, é de quem?
- É o de Abraham Lincoln. Os ponteiros só se moveram duas vezes, indicando que ele só mentiu duas vezes em toda a sua vida.
- E o Relógio do Serra, também está aqui?
- Ah! O do Serra está na minha sala.
- Ué – espantou-se o cidadão, – por quê?
E São Pedro, rindo, respondeu:
- Estou usando como ventilador de teto.”
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Essa ótima piada foi enviada pelo Dimas e é boa para a gente descontrair enquanto prossegue na batalha pela vitória no domingo.
Um cidadão morreu e foi para o céu. Enquanto estava em frente a São Pedro nos Portões Celestiais, viu uma enorme parede com relógios atrás dele.
Ele perguntou: – O que são todos aqueles relógios?
São Pedro respondeu: – São Relógios da Mentira. Todo mundo na Terra tem um Relógio da Mentira.
Cada vez que você mente, os ponteiros de seu relógio movem-se.
- Oh!! – exclamou o cidadão – De quem é aquele relógio ali?
- É o de Madre Teresa. Os ponteiros nunca se moveram, indicando que ela nunca mentiu.
- E aquele, é de quem?
- É o de Abraham Lincoln. Os ponteiros só se moveram duas vezes, indicando que ele só mentiu duas vezes em toda a sua vida.
- E o Relógio do Serra, também está aqui?
- Ah! O do Serra está na minha sala.
- Ué – espantou-se o cidadão, – por quê?
E São Pedro, rindo, respondeu:
- Estou usando como ventilador de teto.”
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Folha de S.Paulo - São Paulo - Fernando de Barros e Silva: Vilmar não vai votar - 29/10/2010
Folha de S.Paulo - São Paulo - Fernando de Barros e Silva: Vilmar não vai votar - 29/10/2010: "FERNANDO DE BARROS E SILVA
Vilmar não vai votar
SÃO PAULO - Falou-se muito em direito à vida neste segundo turno. Quase sempre de modo oportunista ou com propósitos obscurantistas.
Dilma Rousseff e José Serra gostam de enfatizar que o objetivo final de seus governos é 'cuidar das pessoas'. As propagandas insistem em nos mostrar personagens pobres, emocionados diante daquele a quem atribuem alguma conquista.
O núcleo da mensagem é arcaico -o que deveria ser um direito aparece como bondade e favor. Sem contar o apelo novelesco, melodramático, à custa da miséria.
Pois bem. Vilmar Camargo dos Santos não vai votar. Tinha 47 anos e era pedreiro. Morreu na terça-feira, depois de agonizar numa calçada na região central de São Paulo.
Com dor no peito, procurou um posto de saúde (uma UBS/AMA, onde, em tese, há consultas agendadas e atendimento ambulatorial de emergência). Na recepção, no entanto, indicaram-lhe o pronto-socorro na quadra ao lado. Vilmar morreu no meio do caminho, em frente a uma escola. Estava, segundo a reportagem, 'a 20 passos de uma Unidade Básica de Saúde e a 40 passos de um pronto-socorro municipal'. Ninguém se mexeu, nem na UBS nem no hospital, para salvar sua vida. O IML levou quatro horas para remover o corpo.
Alguém ousaria dizer que Vilmar é 'um caso isolado'? Parece, antes, um caso exemplar do que ainda significa ser pobre no Brasil.
Duas semanas atrás, noticiou-se a morte da aposentada Magda dos Santos, de 61 anos, que esperou em vão durante cinco dias por atendimento adequado num posto de saúde da Baixada Fluminense depois de ter sofrido um AVC.
Vilmar e Magda são vítimas do sistema público de saúde, a cuja precariedade estão condenadas 150 milhões de pessoas sem condições de pagar plano privado. Direito à vida? Comecemos por essa tragédia social sem rosto, estampada no destino desses dois personagens acidentais da campanha eleitoral.
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Vilmar não vai votar
SÃO PAULO - Falou-se muito em direito à vida neste segundo turno. Quase sempre de modo oportunista ou com propósitos obscurantistas.
Dilma Rousseff e José Serra gostam de enfatizar que o objetivo final de seus governos é 'cuidar das pessoas'. As propagandas insistem em nos mostrar personagens pobres, emocionados diante daquele a quem atribuem alguma conquista.
O núcleo da mensagem é arcaico -o que deveria ser um direito aparece como bondade e favor. Sem contar o apelo novelesco, melodramático, à custa da miséria.
Pois bem. Vilmar Camargo dos Santos não vai votar. Tinha 47 anos e era pedreiro. Morreu na terça-feira, depois de agonizar numa calçada na região central de São Paulo.
Com dor no peito, procurou um posto de saúde (uma UBS/AMA, onde, em tese, há consultas agendadas e atendimento ambulatorial de emergência). Na recepção, no entanto, indicaram-lhe o pronto-socorro na quadra ao lado. Vilmar morreu no meio do caminho, em frente a uma escola. Estava, segundo a reportagem, 'a 20 passos de uma Unidade Básica de Saúde e a 40 passos de um pronto-socorro municipal'. Ninguém se mexeu, nem na UBS nem no hospital, para salvar sua vida. O IML levou quatro horas para remover o corpo.
Alguém ousaria dizer que Vilmar é 'um caso isolado'? Parece, antes, um caso exemplar do que ainda significa ser pobre no Brasil.
Duas semanas atrás, noticiou-se a morte da aposentada Magda dos Santos, de 61 anos, que esperou em vão durante cinco dias por atendimento adequado num posto de saúde da Baixada Fluminense depois de ter sofrido um AVC.
Vilmar e Magda são vítimas do sistema público de saúde, a cuja precariedade estão condenadas 150 milhões de pessoas sem condições de pagar plano privado. Direito à vida? Comecemos por essa tragédia social sem rosto, estampada no destino desses dois personagens acidentais da campanha eleitoral.
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Folha de S.Paulo - Análise/Religião: Papa asfixiou esquerda, e agora promove agenda - 29/10/2010
Folha de S.Paulo - Análise/Religião: Papa asfixiou esquerda, e agora promove agenda - 29/10/2010: "Papa asfixiou esquerda, e agora promove agenda
Bento 16 se envolve em política quando o que se discute são pontos da doutrina católica associados ao conservadorismo
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O eventual efeito eleitoral da fala de Bento 16 ontem ainda é insondável, mas ela não causa surpresa.
Expoente do movimento que despolitizou a igreja à esquerda, como homem-forte no papado de João Paulo 2º, Joseph Ratzinger costuma envolver-se em debates políticos quando o que está em questão é a defesa de pontos da doutrina católica associados ao conservadorismo.
Entre esses conceitos, a ampla definição de 'defesa da vida', que vai da classificação de aborto como homicídio ao veto ao uso de camisinhas como contraceptivos.
A tradição que Bento defende, contudo, não é tão consensual na história. A oposição total ao aborto só foi estabelecida a partir 1869, quando Pio 9º determinou que era um pecado passível de excomunhão.
Até então, com idas e vindas, o pensamento predominante era o de santo Tomás de Aquino (1225-1274), segundo o qual o feto não recebia a alma imediatamente após a concepção. A briga era mais por 'quando' a alma se alojava no embrião.
Ratzinger foi eleito papa em 2005 com um discurso claro sobre sua visão da igreja como uma entidade que precisa aferrar-se à tradição para sobreviver num mundo de relativismos, ainda que isso seja impopular e aumente a sangria de fiéis.
Papa, levou o discurso à prática. Em 2006, causou rebuliço na Itália ao condenar a pílula do dia seguinte como abortiva em plena campanha eleitoral do país, que discutia o tema. Em 2007, apoiou a excomunhão de políticos mexicanos favoráveis à descriminalização do aborto e fez a 'defesa da vida' na sua viagem ao Brasil.
Quando criticou o uso de preservativos na luta contra a Aids na África, ano passado, o papa foi duramente criticado por governos e pela ONU. Sua viagem a Portugal foi marcada por protestos contra a condenação da liberação do aborto e da união gay no país. O mesmo acontecerá agora na Espanha.
No Brasil, por fim, há a polêmica devido à mudança de posição de Dilma Rousseff sobre a descriminalização do aborto -ela era a favor e agora se diz contrária, contradição explorada por José Serra em debates e na TV.
Bispos também criticaram o PT pela defesa histórica da descriminalização, como partido e no governo. O PT contra-atacou, vendo ingerência no processo eleitoral, ao mesmo tempo em que tentou colar uma imagem 'pró-vida' em Dilma.
É nesse contexto que Bento 16 defendeu o que chamou de 'grave dever de emitir juízo moral, mesmo em matérias políticas'.
O episódio como um todo parece marcar uma espécie de epílogo da disputa entre o Vaticano conservador e o chamado clero progressista -influenciado pelo marxismo e pelas ideias liberalizantes do Concílio Vaticano 2º, encontro encerrado em 1965.
Os progressistas ajudaram a fundar o PT e eram bem-vindos pelo partido no debate eleitoral. Ao longo dos anos, perderam espaço na hierarquia, e a manifestação papal demonstra que a doutrina Ratzinger fincou raízes por aqui, com a inevitável repercussão política.
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Bento 16 se envolve em política quando o que se discute são pontos da doutrina católica associados ao conservadorismo
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O eventual efeito eleitoral da fala de Bento 16 ontem ainda é insondável, mas ela não causa surpresa.
Expoente do movimento que despolitizou a igreja à esquerda, como homem-forte no papado de João Paulo 2º, Joseph Ratzinger costuma envolver-se em debates políticos quando o que está em questão é a defesa de pontos da doutrina católica associados ao conservadorismo.
Entre esses conceitos, a ampla definição de 'defesa da vida', que vai da classificação de aborto como homicídio ao veto ao uso de camisinhas como contraceptivos.
A tradição que Bento defende, contudo, não é tão consensual na história. A oposição total ao aborto só foi estabelecida a partir 1869, quando Pio 9º determinou que era um pecado passível de excomunhão.
Até então, com idas e vindas, o pensamento predominante era o de santo Tomás de Aquino (1225-1274), segundo o qual o feto não recebia a alma imediatamente após a concepção. A briga era mais por 'quando' a alma se alojava no embrião.
Ratzinger foi eleito papa em 2005 com um discurso claro sobre sua visão da igreja como uma entidade que precisa aferrar-se à tradição para sobreviver num mundo de relativismos, ainda que isso seja impopular e aumente a sangria de fiéis.
Papa, levou o discurso à prática. Em 2006, causou rebuliço na Itália ao condenar a pílula do dia seguinte como abortiva em plena campanha eleitoral do país, que discutia o tema. Em 2007, apoiou a excomunhão de políticos mexicanos favoráveis à descriminalização do aborto e fez a 'defesa da vida' na sua viagem ao Brasil.
Quando criticou o uso de preservativos na luta contra a Aids na África, ano passado, o papa foi duramente criticado por governos e pela ONU. Sua viagem a Portugal foi marcada por protestos contra a condenação da liberação do aborto e da união gay no país. O mesmo acontecerá agora na Espanha.
No Brasil, por fim, há a polêmica devido à mudança de posição de Dilma Rousseff sobre a descriminalização do aborto -ela era a favor e agora se diz contrária, contradição explorada por José Serra em debates e na TV.
Bispos também criticaram o PT pela defesa histórica da descriminalização, como partido e no governo. O PT contra-atacou, vendo ingerência no processo eleitoral, ao mesmo tempo em que tentou colar uma imagem 'pró-vida' em Dilma.
É nesse contexto que Bento 16 defendeu o que chamou de 'grave dever de emitir juízo moral, mesmo em matérias políticas'.
O episódio como um todo parece marcar uma espécie de epílogo da disputa entre o Vaticano conservador e o chamado clero progressista -influenciado pelo marxismo e pelas ideias liberalizantes do Concílio Vaticano 2º, encontro encerrado em 1965.
Os progressistas ajudaram a fundar o PT e eram bem-vindos pelo partido no debate eleitoral. Ao longo dos anos, perderam espaço na hierarquia, e a manifestação papal demonstra que a doutrina Ratzinger fincou raízes por aqui, com a inevitável repercussão política.
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Aldeia Giramundo
Aldeia Giramundo: "Dilma Presidente
Eu era moleque e encontrei uma coleção na Biblioteca do meu pai de nome “História das Revoluções”. Ali, ao falar da Revolução Russa, despertei para a consciência política. Era algo subversivo, ler escondido palavras pesadas de um tal de Marx. O texto era didático e clareou na minha cabeça imagens que eu, adolescente, via e não entendia. Desigualdades, miséria, pobreza, favelas. Então tudo aquilo tinha uma origem? Foi uma descoberta do mundo e de mim mesmo. Algo que me acompanha, persegue, destina.
Na mesma época o Brasil iniciava sua redemocratização ( lenta, gradual e interminável). Repentinamente a estrela vermelha chamou minha atenção. Eram políticos diferentes. Usavam camisas Hering vermelha, falavam errado, pregavam a transformação da sociedade brasileira. Defendiam o direito dos trabalhadores, dos pobres, das mulheres, dos negros. Lutavam pelo fim da ditadura. Pela melhoria salarial. Eram operários, intelectuais, artistas, muitos deles gente simples e humilde, mas com a dor do sofrimento e a fala dos oprimidos.
Era 1982 e a luta acontecia pelo Governo do Estado. Aquele partido pequeno era massacrado diariamente pelos jornais e o Diário Oficial televisivo ( conhecido por Jornal Nacional, da Globo). A revista semanal denominava o partido de Bolchevique e dizia que a CUT era os soviete, e que o único objetivo do grupo era fazer a Revolução Socialista no Brasil ( ai que bom seria). A propaganda política era um desastre: permitiam-se só fotos dos candidatos e a voz oficial do narrador. Sentava na sala e ouvia o locutor narrar sobre a foto daquele barbudo e cabeludo, com um número embaixo, ‘Luiz Ignácio, metalúrgico, 1º grau completo, candidato a Governador’.
Nossa campanha era precária e primária. Era um boca a boca. Pessoa a pessoa. Entregando santinhos, brochinhos e explicando porque o Brasil seria diferente com o PT. Não havia dinheiro, então comprávamos os broches, contribuíamos com quanto dava e os nossos políticos eleitos entregavam 30% do salário para o partido ( o único até hoje assim). Acusavam-nos de sonhadores, idealistas e vivendo num mundo à parte. Mas lá íamos nós. Às vezes num domingo de manhã, numa reunião do partido ou do sindicato. Tudo pela causa, da maioria da população brasileira.
Final de 1983. Fomos à rua lutar por eleições ‘Diretas Já’. Éramos só nós: PT, CUT, PC do B, PDT, Lula, Brizola, Darcy, Genoíno, Plínio, Zé Dirceu, Gushiken, Erundina, Tarso, Suplicy, Chauí, etc... Todos nos acusavam de baderneiros e incapazes de aceitar as regras do jogo. No ano seguinte, os nossos comícios cresciam a cada reunião e aos poucos os outros partidos foram se juntando ao PT. Depois veio a imprensa e por último, a Globo. Eram milhões com uma certeza: a Democracia. Derrotados, assistimos a direita descontente com Maluf fazer acordo com o PMDB. Fomos acusados de novo de sermos sempre do contra.
Enquanto isso, o arsenal de agressões era diário, em todos os lugares e ruas. Partido dos Analfabetos. Comunistas. Destruidores da família e dos bons costumes. Vagabundos que pararam de trabalhar para entrar na política. Ignorantes. Financiados por Moscou. Criminosos. Defensores dos bandidos e dos direitos humanos. Incapacitados para o poder. E toda uma coleção de xingamentos baixos e vazios.
E foi assim. O Partido foi crescendo. Na Constituinte elegemos 16 deputados! E nela fomos responsáveis pelos mais importantes avanços sociais da Carta de 1988. E a cada pleito eram mais deputados ( hoje somos 97!), senadores, vereadores, e até Prefeitos. Até que em 1988 o Partido chegou onde poucos esperavam, na Prefeitura da maior cidade do país. Foi a glória. Fomos à rua comemorar, cantando a vitória e a mudança do Brasil. Passamos em frente a FIESP e berramos “Fiesp, Ciesp, óóóhhh” acompanhados de um gesto obsceno.
Sempre ao lado das lutas populares e defendendo os interesses sociais em primeiro lugar o partido foi governando. Enfrentando a mais cruel e diária oposição, que nenhum outro político ou agremiação sofriam ou sofrem. Erramos? Sim. Afinal não estávamos a 500 anos encastelados no poder e além disso, tivemos de enfrentar a oposição da própria burocracia estatal. Mas fomos tentando e inventando novas formas de governar. Olhamos para os de baixo com respeito e lhes demos dignidade. Erundina, por exemplo, comprou 4mil ônibus novos (35% a mais do que antes), construiu corredores, estabilizou a passagem em US$ 0,50 ( hoje é US$ 1,75). Investimos em educação e saúde públicas, transportes, habitação popular, melhoramos salários, ou seja, aquilo de que mais o povo precisava.
O Partido cresceu, se profissionalizou. A cúpula se afastou dos ideais só românticos e viu, com justiça, a possibilidade do poder. A mídia então começou a apertar em outro cerco. Além das agressões tradicionais, agora a questão era considerar o partido o inventor da corrupção no país. Como se nos últimos 500 anos o país vivesse num paraíso, em que tudo havia sido feito de forma honesta e que os políticos e partidos que dilapidaram a nação só agora conheciam a corrupção. Nada mais hipócrita e falso. Casos há no partido, mas até agora todos os seus responsáveis foram afastados, muitos estão sendo processados. O partido não fez vista grossa para a corrupção. Combate-a diariamente e pune severamente os responsáveis, e isso nos diferencia dos outros. Os outros, ao contrário, se elegem, se reelegem, se perpetuam no poder, ou nas estatais. Fingem que nada tem a ver com a corrupção, ou que é mas simples, dizem que é intriga do PT. Lula sofreu mais de 200 pedidos de impeachment e enfrentou 39 CPIs. O PSDB governa São Paulo há 23 anos ( ou vai dizer que o Montoro era do PMDB e que Quércia era oposição até 1989), e não sofreu nenhuma CPI. Isso é comprar a História. Falcatruas sem nenhuma, nenhuma investigação. Calhordas!
A Globo não permitiu que Lula vencesse em 1989. Mas também as agressões diárias do ‘homem de saco roxo’. E não faltou a polícia de São Paulo ( de Quércia e futuros membros do PSDB) colocar camisas do PT nos seqüestradores de Abilio Diniz no dia anterior a votação. Fraude eleitoral!
O Impeachment do Collor foi a mesma deturpação histórica das ‘Diretas Já’. O PT começou os protestos e foi acusado de não aceitar a derrota eleitoral. Com o crescimento das passeatas populares, aos poucos os outros foram aderindo, esperando apenas o barco afundar para tomar posse de seu espólio. Não podemos nos esquecer que FHC e Serra chegaram a fazer um acordo sórdido com Collor para estabelecer um ’ministério dos notáveis’( salafrários provavelmente).
Veio o Plano Real, e o PSDB conseguiu chegar ao poder. Iniciaram seu projeto de privatizações, endividamento interno e destruição da indústria nacional, para dar lugar a autocracia do mercado financeiro. Enganaram o povo durante 4 anos com a estabilidade. Reeleitos, começou a devastação do Brasil. Desvalorização do Real em 250%; dívida externa pulando para US$ 230 bilhões; desemprego a 13%; a dívida interna cresceu 14.000%; o que nos faz pagar cerca de R$ 140 bilhões ao ano de juros para bancos; estatais sucateadas; ‘apagão’ e racionamento de energia elétrica; explosão de preços de serviços privatizados; saúde e educação abandonadas. Um caos tão grande, que apesar de toda a campanha unificada da mídia, Lula venceu com mais de 60% dos votos do candidato do PSDB.
A festa durou dois meses. Do dia 27 de Outubro de 2002 a 1 de Janeiro de 2003. O Bombardeio perdurou por 1460 dias. Má administração. Só coloca gente do PT no governo. Corrupção. Lula é ignorante e analfabeto. Só que o povo foi percebendo as mudanças sociais do país e a esquizofrenia da imprensa. Lula é reeleito com mais de 63% dos votos. As reformas se aprofundaram. O Brasil mudou profundamente, mas ainda temos de mudar muito, mas muito mesmo. Por isso não podemos voltar atrás. Destruir todas as conquistas democráticas em nome de uma campanha sórdida, doentia e nojenta, de uma elite mesquinha, racista, machista, excludente, fascista, preconceituosa, homofóbica. Lula terminará seu mandato com a maior aprovação popular da História do Brasil, e da maior aprovação dentro de um regime democrático em todo o mundo. Como diria Obama, “That´s the man!”. O Brasil não pode correr o risco do retrocesso, do atraso, do conservadorismo de extrema-direita ditar as normas do país. Um país que durante 502 anos foi governado pela elite, para a elite e a partir da elite. Queremos novamente um governo do povo, para o povo e pelo povo. Queremos Dilma Presidente do Brasil!
Porque Dilma Presidente:
• Lula e Dilma criaram 16 milhões de empregos enfrentando duas crises mundiais ( uma delas a mais grave desde 1929) e uma brasileira ( herdada de FHC), FHC e Serra com o apoio maciço da mídia , do mercado internacional e nacional criaram só 5 milhões. Como o Crescimento Vegetativo do Brasil é de cerca de 1,2% e o emprego crescia a média de 0,8% o saldo foi extremamente negativo na era tucana;
• Lula e Dilma entregam o Brasil com uma taxa de 6,2% de desemprego contra 13% de FHC e Serra, ou seja mais do que o dobro. Se levarmos em conta que o Brasil tem hoje 14 milhões de brasileiros a mais esse número petista é mais impressionante ainda;
• O PIB brasileiro cresceu em média 4,5% nos 8 anos de Lula e Dilma, contra míseros 2,1% de FHC e Serra ( a segunda pior média da História republicana);
• Cerca de 28 milhões de brasileiros saíram da miséria no governo Lula e Dilma ( cerca de 60% do total), no governo FHC e Serra foram só 2 milhões;
• Segundo dados de agências independentes, o governo Lula e Dilma produziu a primeira distribuição de renda em toda a História do Brasil, hoje cerca de 51% da população é de classe média, as classes D e E foram reduzidas de 57% para 32%;
• O salário mínimo tem aumentos reais há 8 anos, e vale hoje com Lula e Dilma US$ 300, em 1998, o então Ministro José Serra pregou contra a proposta de subir o mínimo para US$ 100, “pois isto iria quebrar o Brasil”. Detalhe , ele valia míseros US$ 72 na época;
• Lula e Dilma criaram a maior plano de assitência social do mundo, o Bolsa Família, que atende 12 milhões de famílias (50 milhões de pessoas), considerado pela ONU o mais importante projeto social do mundo e que será apliacado por ela em vários países africanos;
• No governo Lula e Dilma o desmatamento na Amazõnia foi de 110.000 km2 ( uma enormidade ainda), mas 100% menor na era FHC e Serra que permitiram a devastação de 230.000 km2. Quase um Estado de São Paulo em 8 anos;
• Durante 8 anos FHC e Serra mantiveram os salários dos funcionários públicos congelados e mesmo com o crescimento da população brasileira em 10%, demitiram cerca de 200mil servidores. Lula e Dilma melhoraram o serviço público, com contratações e melhorias salariais. Um Fiscal Federal ganhava R$ 4mil em 2002 e hoje recebe R$ 15mil; um diplomata recebia R$ 1,5 mil de Serra e FHC, hoje Lula e Dilma pagam R$ 14,5 mil
• Lula e Dilma não tentaram privatizar a educação, sucateando-a e criando cursos desmembrados, criaram mais de 50 Universidades Públicas e Federais, as vagas cresceram 100%. Os professores de federais ganhavam R$ 950 com FHC e Serra, com Lula e Dilma recebem R$8,8 mil!;
• O Prouni concedeu bolsa integral para mais de 800mil alunos, o programa de Lula e Dilma é tão eficiente que o Serra vem prometendo um Prouni para o Ensino Médio ( com certeza, para salvar os colégios particulares que votam em peso nele);
• Com Lula e Dilma o Brasil parou de vender suas estatais a preço de banana e aportou capitais para as mesmas. Não é sem razão que a Petrobrás ( que começou a ser vendida por Serra e FHC, mudando até de nome para Petrobrax), quase dobrou sua produção de petróleo e achou em 2006 as maiores jazidas mundiais novas de petróleo, o Pré Sal;
• A São Paulo dos tucanos e dos bandeirantes que sequer conseguiu sediar um Pan-americano, viu Lula e Dilma trazerem o Pan de 2007 no Rio, a Copa de 2014 ( e São Paulo de Serra e FHC ainda nem sabe se vai ter condições de sediar um mísero joguinho) e o maior evento esportivo da humanidade, as Olimpíadas do Rio de 2016. OBrasil entrou na História;
• As exportações brasileiras pularam de minguados US$ 60 bilhões ao ano com FHC e Serra para US$ 210 bilões com Lula e Dilma;
• O Brasil com Lula e Dilma quitou a dívida com o FMI, reduziu a dívida externa do governo a parcos US$ 60 bilhões e tem reservas internacionais ( boa parte delas em títulos do governo americano) de cerca de US$ 235 bilhões. Na era FHC-Serra eram US$18 bilhões de reservas;
Por isto e por muito mais, no dia 31 de Outubro de 2010 vote em Dilma 13!!!Para o Brasil seguir mudando
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Eu era moleque e encontrei uma coleção na Biblioteca do meu pai de nome “História das Revoluções”. Ali, ao falar da Revolução Russa, despertei para a consciência política. Era algo subversivo, ler escondido palavras pesadas de um tal de Marx. O texto era didático e clareou na minha cabeça imagens que eu, adolescente, via e não entendia. Desigualdades, miséria, pobreza, favelas. Então tudo aquilo tinha uma origem? Foi uma descoberta do mundo e de mim mesmo. Algo que me acompanha, persegue, destina.
Na mesma época o Brasil iniciava sua redemocratização ( lenta, gradual e interminável). Repentinamente a estrela vermelha chamou minha atenção. Eram políticos diferentes. Usavam camisas Hering vermelha, falavam errado, pregavam a transformação da sociedade brasileira. Defendiam o direito dos trabalhadores, dos pobres, das mulheres, dos negros. Lutavam pelo fim da ditadura. Pela melhoria salarial. Eram operários, intelectuais, artistas, muitos deles gente simples e humilde, mas com a dor do sofrimento e a fala dos oprimidos.
Era 1982 e a luta acontecia pelo Governo do Estado. Aquele partido pequeno era massacrado diariamente pelos jornais e o Diário Oficial televisivo ( conhecido por Jornal Nacional, da Globo). A revista semanal denominava o partido de Bolchevique e dizia que a CUT era os soviete, e que o único objetivo do grupo era fazer a Revolução Socialista no Brasil ( ai que bom seria). A propaganda política era um desastre: permitiam-se só fotos dos candidatos e a voz oficial do narrador. Sentava na sala e ouvia o locutor narrar sobre a foto daquele barbudo e cabeludo, com um número embaixo, ‘Luiz Ignácio, metalúrgico, 1º grau completo, candidato a Governador’.
Nossa campanha era precária e primária. Era um boca a boca. Pessoa a pessoa. Entregando santinhos, brochinhos e explicando porque o Brasil seria diferente com o PT. Não havia dinheiro, então comprávamos os broches, contribuíamos com quanto dava e os nossos políticos eleitos entregavam 30% do salário para o partido ( o único até hoje assim). Acusavam-nos de sonhadores, idealistas e vivendo num mundo à parte. Mas lá íamos nós. Às vezes num domingo de manhã, numa reunião do partido ou do sindicato. Tudo pela causa, da maioria da população brasileira.
Final de 1983. Fomos à rua lutar por eleições ‘Diretas Já’. Éramos só nós: PT, CUT, PC do B, PDT, Lula, Brizola, Darcy, Genoíno, Plínio, Zé Dirceu, Gushiken, Erundina, Tarso, Suplicy, Chauí, etc... Todos nos acusavam de baderneiros e incapazes de aceitar as regras do jogo. No ano seguinte, os nossos comícios cresciam a cada reunião e aos poucos os outros partidos foram se juntando ao PT. Depois veio a imprensa e por último, a Globo. Eram milhões com uma certeza: a Democracia. Derrotados, assistimos a direita descontente com Maluf fazer acordo com o PMDB. Fomos acusados de novo de sermos sempre do contra.
Enquanto isso, o arsenal de agressões era diário, em todos os lugares e ruas. Partido dos Analfabetos. Comunistas. Destruidores da família e dos bons costumes. Vagabundos que pararam de trabalhar para entrar na política. Ignorantes. Financiados por Moscou. Criminosos. Defensores dos bandidos e dos direitos humanos. Incapacitados para o poder. E toda uma coleção de xingamentos baixos e vazios.
E foi assim. O Partido foi crescendo. Na Constituinte elegemos 16 deputados! E nela fomos responsáveis pelos mais importantes avanços sociais da Carta de 1988. E a cada pleito eram mais deputados ( hoje somos 97!), senadores, vereadores, e até Prefeitos. Até que em 1988 o Partido chegou onde poucos esperavam, na Prefeitura da maior cidade do país. Foi a glória. Fomos à rua comemorar, cantando a vitória e a mudança do Brasil. Passamos em frente a FIESP e berramos “Fiesp, Ciesp, óóóhhh” acompanhados de um gesto obsceno.
Sempre ao lado das lutas populares e defendendo os interesses sociais em primeiro lugar o partido foi governando. Enfrentando a mais cruel e diária oposição, que nenhum outro político ou agremiação sofriam ou sofrem. Erramos? Sim. Afinal não estávamos a 500 anos encastelados no poder e além disso, tivemos de enfrentar a oposição da própria burocracia estatal. Mas fomos tentando e inventando novas formas de governar. Olhamos para os de baixo com respeito e lhes demos dignidade. Erundina, por exemplo, comprou 4mil ônibus novos (35% a mais do que antes), construiu corredores, estabilizou a passagem em US$ 0,50 ( hoje é US$ 1,75). Investimos em educação e saúde públicas, transportes, habitação popular, melhoramos salários, ou seja, aquilo de que mais o povo precisava.
O Partido cresceu, se profissionalizou. A cúpula se afastou dos ideais só românticos e viu, com justiça, a possibilidade do poder. A mídia então começou a apertar em outro cerco. Além das agressões tradicionais, agora a questão era considerar o partido o inventor da corrupção no país. Como se nos últimos 500 anos o país vivesse num paraíso, em que tudo havia sido feito de forma honesta e que os políticos e partidos que dilapidaram a nação só agora conheciam a corrupção. Nada mais hipócrita e falso. Casos há no partido, mas até agora todos os seus responsáveis foram afastados, muitos estão sendo processados. O partido não fez vista grossa para a corrupção. Combate-a diariamente e pune severamente os responsáveis, e isso nos diferencia dos outros. Os outros, ao contrário, se elegem, se reelegem, se perpetuam no poder, ou nas estatais. Fingem que nada tem a ver com a corrupção, ou que é mas simples, dizem que é intriga do PT. Lula sofreu mais de 200 pedidos de impeachment e enfrentou 39 CPIs. O PSDB governa São Paulo há 23 anos ( ou vai dizer que o Montoro era do PMDB e que Quércia era oposição até 1989), e não sofreu nenhuma CPI. Isso é comprar a História. Falcatruas sem nenhuma, nenhuma investigação. Calhordas!
A Globo não permitiu que Lula vencesse em 1989. Mas também as agressões diárias do ‘homem de saco roxo’. E não faltou a polícia de São Paulo ( de Quércia e futuros membros do PSDB) colocar camisas do PT nos seqüestradores de Abilio Diniz no dia anterior a votação. Fraude eleitoral!
O Impeachment do Collor foi a mesma deturpação histórica das ‘Diretas Já’. O PT começou os protestos e foi acusado de não aceitar a derrota eleitoral. Com o crescimento das passeatas populares, aos poucos os outros foram aderindo, esperando apenas o barco afundar para tomar posse de seu espólio. Não podemos nos esquecer que FHC e Serra chegaram a fazer um acordo sórdido com Collor para estabelecer um ’ministério dos notáveis’( salafrários provavelmente).
Veio o Plano Real, e o PSDB conseguiu chegar ao poder. Iniciaram seu projeto de privatizações, endividamento interno e destruição da indústria nacional, para dar lugar a autocracia do mercado financeiro. Enganaram o povo durante 4 anos com a estabilidade. Reeleitos, começou a devastação do Brasil. Desvalorização do Real em 250%; dívida externa pulando para US$ 230 bilhões; desemprego a 13%; a dívida interna cresceu 14.000%; o que nos faz pagar cerca de R$ 140 bilhões ao ano de juros para bancos; estatais sucateadas; ‘apagão’ e racionamento de energia elétrica; explosão de preços de serviços privatizados; saúde e educação abandonadas. Um caos tão grande, que apesar de toda a campanha unificada da mídia, Lula venceu com mais de 60% dos votos do candidato do PSDB.
A festa durou dois meses. Do dia 27 de Outubro de 2002 a 1 de Janeiro de 2003. O Bombardeio perdurou por 1460 dias. Má administração. Só coloca gente do PT no governo. Corrupção. Lula é ignorante e analfabeto. Só que o povo foi percebendo as mudanças sociais do país e a esquizofrenia da imprensa. Lula é reeleito com mais de 63% dos votos. As reformas se aprofundaram. O Brasil mudou profundamente, mas ainda temos de mudar muito, mas muito mesmo. Por isso não podemos voltar atrás. Destruir todas as conquistas democráticas em nome de uma campanha sórdida, doentia e nojenta, de uma elite mesquinha, racista, machista, excludente, fascista, preconceituosa, homofóbica. Lula terminará seu mandato com a maior aprovação popular da História do Brasil, e da maior aprovação dentro de um regime democrático em todo o mundo. Como diria Obama, “That´s the man!”. O Brasil não pode correr o risco do retrocesso, do atraso, do conservadorismo de extrema-direita ditar as normas do país. Um país que durante 502 anos foi governado pela elite, para a elite e a partir da elite. Queremos novamente um governo do povo, para o povo e pelo povo. Queremos Dilma Presidente do Brasil!
Porque Dilma Presidente:
• Lula e Dilma criaram 16 milhões de empregos enfrentando duas crises mundiais ( uma delas a mais grave desde 1929) e uma brasileira ( herdada de FHC), FHC e Serra com o apoio maciço da mídia , do mercado internacional e nacional criaram só 5 milhões. Como o Crescimento Vegetativo do Brasil é de cerca de 1,2% e o emprego crescia a média de 0,8% o saldo foi extremamente negativo na era tucana;
• Lula e Dilma entregam o Brasil com uma taxa de 6,2% de desemprego contra 13% de FHC e Serra, ou seja mais do que o dobro. Se levarmos em conta que o Brasil tem hoje 14 milhões de brasileiros a mais esse número petista é mais impressionante ainda;
• O PIB brasileiro cresceu em média 4,5% nos 8 anos de Lula e Dilma, contra míseros 2,1% de FHC e Serra ( a segunda pior média da História republicana);
• Cerca de 28 milhões de brasileiros saíram da miséria no governo Lula e Dilma ( cerca de 60% do total), no governo FHC e Serra foram só 2 milhões;
• Segundo dados de agências independentes, o governo Lula e Dilma produziu a primeira distribuição de renda em toda a História do Brasil, hoje cerca de 51% da população é de classe média, as classes D e E foram reduzidas de 57% para 32%;
• O salário mínimo tem aumentos reais há 8 anos, e vale hoje com Lula e Dilma US$ 300, em 1998, o então Ministro José Serra pregou contra a proposta de subir o mínimo para US$ 100, “pois isto iria quebrar o Brasil”. Detalhe , ele valia míseros US$ 72 na época;
• Lula e Dilma criaram a maior plano de assitência social do mundo, o Bolsa Família, que atende 12 milhões de famílias (50 milhões de pessoas), considerado pela ONU o mais importante projeto social do mundo e que será apliacado por ela em vários países africanos;
• No governo Lula e Dilma o desmatamento na Amazõnia foi de 110.000 km2 ( uma enormidade ainda), mas 100% menor na era FHC e Serra que permitiram a devastação de 230.000 km2. Quase um Estado de São Paulo em 8 anos;
• Durante 8 anos FHC e Serra mantiveram os salários dos funcionários públicos congelados e mesmo com o crescimento da população brasileira em 10%, demitiram cerca de 200mil servidores. Lula e Dilma melhoraram o serviço público, com contratações e melhorias salariais. Um Fiscal Federal ganhava R$ 4mil em 2002 e hoje recebe R$ 15mil; um diplomata recebia R$ 1,5 mil de Serra e FHC, hoje Lula e Dilma pagam R$ 14,5 mil
• Lula e Dilma não tentaram privatizar a educação, sucateando-a e criando cursos desmembrados, criaram mais de 50 Universidades Públicas e Federais, as vagas cresceram 100%. Os professores de federais ganhavam R$ 950 com FHC e Serra, com Lula e Dilma recebem R$8,8 mil!;
• O Prouni concedeu bolsa integral para mais de 800mil alunos, o programa de Lula e Dilma é tão eficiente que o Serra vem prometendo um Prouni para o Ensino Médio ( com certeza, para salvar os colégios particulares que votam em peso nele);
• Com Lula e Dilma o Brasil parou de vender suas estatais a preço de banana e aportou capitais para as mesmas. Não é sem razão que a Petrobrás ( que começou a ser vendida por Serra e FHC, mudando até de nome para Petrobrax), quase dobrou sua produção de petróleo e achou em 2006 as maiores jazidas mundiais novas de petróleo, o Pré Sal;
• A São Paulo dos tucanos e dos bandeirantes que sequer conseguiu sediar um Pan-americano, viu Lula e Dilma trazerem o Pan de 2007 no Rio, a Copa de 2014 ( e São Paulo de Serra e FHC ainda nem sabe se vai ter condições de sediar um mísero joguinho) e o maior evento esportivo da humanidade, as Olimpíadas do Rio de 2016. OBrasil entrou na História;
• As exportações brasileiras pularam de minguados US$ 60 bilhões ao ano com FHC e Serra para US$ 210 bilões com Lula e Dilma;
• O Brasil com Lula e Dilma quitou a dívida com o FMI, reduziu a dívida externa do governo a parcos US$ 60 bilhões e tem reservas internacionais ( boa parte delas em títulos do governo americano) de cerca de US$ 235 bilhões. Na era FHC-Serra eram US$18 bilhões de reservas;
Por isto e por muito mais, no dia 31 de Outubro de 2010 vote em Dilma 13!!!Para o Brasil seguir mudando
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