quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

‘Minha Vaca, Minha Vida’: microcrédito tira família da pobreza - economia - geral - Estadão

‘Minha Vaca, Minha Vida’: microcrédito tira família da pobreza - economia - geral - Estadão



‘Minha Vaca, Minha Vida’: microcrédito tira família da pobreza

Modalidade de financiamento ao microprodutor dispara 68% em 2013 e favorece a ascensão social no Brasil

29 de janeiro de 2014 | 17h 41


Mariana Congo e Gustavo Santos Ferreira - Economia & Negócios
SÃO PAULO - Um empréstimo de R$ 100 aqui, outro de R$ 1 mil acolá. De
pouco em pouco, o microcrédito destinado aos microempreendedores
alcançou em 2013 seu saldo em carteira recorde: R$ 4,8 bilhões. Do fim
de 2012 ao do último ano, os financiamentos aos pequenos produtores
subiram nada menos que 68%. Enquanto isso, os repasses aos consumidores,
em tendência de queda desde 2010, recuaram mais 39% no ano passado -
leia o "histórico", mais abaixo. No total, entre microempreendedores e
consumidores, o saldo em carteira do microcrédito subiu 42% em 2013.



Perto do saldo total do crédito direcionado no País, de R$ 1,2
trilhão no mesmo mês, o microcrédito é, de fato, "micro". Mas é "macro",
no entanto, por sua função social.



"O mercado de trabalho não supre toda a necessidade de vagas", diz o
presidente da Associação Brasileira de Entidades Operadoras de
Microcrédito e Microfinanças (Abcred), Almir da Costa Pereira. "Por
isso, um cliente típico de microcrédito produtivo é aquele que não tem
condição de empregabilidade e busca como alternativa abrir um negócio
próprio e se tornar um microempreendedor."



Os microempreendedores urbanos mantêm, por exemplo, pequenas lojas,
confecções, mercearias e salões de beleza nas periferias. Na zona rural
do Brasil, quem recebe os financiamentos são produtores, normalmente,
com mínimas condições de sair sozinhos das classes D e E.



A paranaense Beatriz Rocha, de 37 anos, está entre esses brasileiros.
Mãe de três crianças entre 2 e 11 anos, mora num barraco de madeira de
20 metros quadrados, na cidade de Santo Antônio do Sudoeste, divisa do
Paraná com a Argentina. Com um empréstimo de R$ 3 mil adquirido no banco
Fomento Paraná, pôde comprar um freezer e uma vaca - de nome Ariana.
Somada às outras duas vacas que já tinha comprado com ajuda do programa
Bolsa Família, do governo federal, a dona de casa pôde iniciar pequena
produção, vendida a uma cooperativa da região.







Para Antonio Mendonça, diretor executivo do Banco do Povo Paulista
(BPP), ligado ao Governo do Estado de São Paulo, o microcrédito faz
parte da "revolução social" observada no Brasil nos últimos anos. Embora
ainda não seja possível calcular o tamanho do impacto do acesso ao
microcrédito na inserção de mais de 40 milhões de brasileiros nas
classes consumidoras desde a última década, ele não tem dúvidas da
importância da modalidade. "O microcrédito é responsável por mudar a
vida de muitas famílias", diz.



O BBP realizou entrevistas com microempreendedores para avaliar seus
serviços. De acordo com a pesquisa, 98,9% dos clientes entrevistados
dizem que seus negócios melhoraram após tomarem microempréstimos; 79,2%
tiveram aumento de faturamento; e outros 95,8% disseram que suas vidas
melhoraram após os financiamentos.



O BBP oferece linhas de microcrédito entre R$ 200 e R$ 15 mil e dez
minicursos voltados ao microempreendedor. Diz atender hoje 74 mil
famílias em 514 municípios. Tem saldo em carteira de R$ 290 milhões, com
recursos do Estado e dos municípios. "As parcerias são feitas com
prefeituras de diversos partidos, aliados ou não", diz Mendonça.



Histórico. Em 2007, início da série histórica do
Banco Central, o microcrédito no Brasil era majoritariamente voltado ao
consumo: 75% do total. E, embora o crescimento econômico do País tenha
sido estimulado pela demanda desde a última década, a partir de 2011 o
cenário do microcrédito mudou radicalmente. Hoje, 89% dos empréstimos é
para microempreendedores.



O microcrédito ao microempreendedor é oferecido basicamente por
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips de
microcrédito); programas do governo federal (como o Crescer) e de
governos regionais (como o Paraná Juro Zero e o Programa de Microcrédito
Gaúcho); ou diretamente em bancos públicos ou privados.



Os financiamentos são de baixo valor - a partir de R$ 100. Os juros giram na casa dos 5% ao ano - bem abaixo do juro médio de 29% do ano passado.
Na região Nordeste, onde o Banco do Nordeste consolidou o programa
Crediamigo nos últimos 15 anos, por exemplo, o tíquete médio dos
empréstimos em 2013 foi de R$ 1,2 mil.



Principalmente por meio da atuação das Oscips de microcrédito, os
empréstimos incluem parcela da população excluída do sistema financeiro
comum. É gente que não tem garantias de patrimônio ou renda. O
compromisso de pagamento é baseado na confiança ou na atuação de grupos
solidários (conhecidos que garantem o pagamento uns dos outros).



'Microinadimplência'. Ao contrário do senso comum, esses
empréstimos para quem quer (e tem) pouco dinheiro têm taxa de
inadimplência igual ou menor que a do sistema financeiro em geral.
Somados os consumidores e os microempreendedores, a inadimplência do
microcrédito foi de 6,94% - em linha com a taxa de toda total de toda a
economia brasileira em 2013, de 6,7%, de acordo com o Banco Central.



"No microcrédito produtivo orientado, temos profissionais agentes de
crédito que acompanham os empreendimentos para oferecer o crédito
acertado", avalia Pereira, da Abcred. Dessa forma, quem recebe o
financiamento pode investir em algo que dará retorno". A inadimplência
média dos empréstimos feitos via Oscips de microcrédito gira em torno de
3%, calcula a Abcred.



A taxa de inadimplência (mais de 90 dias de atraso) do microcrédito
ao microempreendedor em dezembro foi de 5,34%. Para o consumidor, o
registro é bem menos favorável: 20,77% de taxa de inadimplência. Ou
seja, a orientação produtiva gera maior compromisso com os pagamentos
que empréstimos feitos para mero consumo.

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