domingo, 8 de novembro de 2015

Jatos desiguais

Jatos desiguais - 08/11/2015 - Janio de Freitas - Colunistas - Folha de S.Paulo



Jatos desiguais






Uma busca preliminar no que sucedeu desde a "Operação Juízo Final",
criada há um ano para a prisão de dirigentes de empreiteiras, faz mais
do que surpreender. E, dadas as indagações que suscita, clama por uma
reflexão sobre as características não difundidas da Lava Jato e seus
efeitos presentes e futuros.





Menos de uma semana depois daquela decisão que elevou o juiz Sergio Moro
às culminâncias do prestígio, dava-se outro fato determinante na Lava
Jato. Ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco assinava, em 19 de
novembro, o acordo de delação premiada. Sua advogada era Beatriz Catta
Preta, que mais tarde abandonaria os seus clientes, invocando ameaças
recebidas. Ela e um batalhão de 14 procuradores e delegados da Polícia
Federal assinaram o acordo.





Catta Preta já conduzira acordo semelhante para Julio Camargo. Sem
vínculo com a Petrobras, esse lobista chegou a uma posição de destaque
no noticiário da Lava Jato a partir da confissão de que ganhou muito
dinheiro fazendo, em transações com dirigentes da estatal, a
intermediação para as contratações da coreana Samsung e da japonesa
Mitsui.





Mas Barusco foi o mais prolífico. Aqui mesmo, e quando seu nome mal fora
citado, saiu a informação de que era o mais temido não só pelos já
implicados, por estar com a vida pendente de um câncer. Foi dele a
promessa de devolver quase U$ 100 milhões. Dinheiro de suborno recebido
das maiores empreiteiras brasileiras. Mas não só. Além do que recebeu
como gerente da Petrobras, depois Barusco foi subornado como diretor de
uma empresa, a Sete Brasil, constituída para a produção de sondas
destinadas ao pré-sal. Os estaleiros Jurong e Keppel Fels, de Cingapura,
lhe pagaram alto pela obtenção e pelo valor das respectivas
contratações.





Para não ficar só nas empreiteiras do Brasil e em grupos asiáticos, uma
subornadora europeia enfeita a lista: um dos mais recentes delatores
premiados, João Antonio Bernardi, descreveu subornos milionários de
dirigentes da Petrobras para a contratação da italiana Saipem.





Decorrido um ano da Juízo Final, Ricardo Pessoa, dono da UTC, foi o mais
noticiado dos dirigentes de empreiteiras brasileiras presos pela PF,
com suas idas e vindas em torno da delação premiada. Dentre esses
executivos, já há condenados a penas altas, como Sergio Mendes, da
Mendes Júnior, com recente sentença de 19 anos. Em síntese, quem dentre
eles não se dobrou à delação premiada, ou já está condenado, ou aguarda
sentença em processo criminal por corrupção ativa, via suborno —e outras
possíveis acusações em cada caso.





Nenhum dos dirigentes das empresas estrangeiras que pagaram suborno foi
preso. Nem teve sua casa visitada pela PF para busca e apreensão de
documentos. Nenhum está ou foi submetido a processo por suborno. Só os
intermediários passaram por busca e apreensão. Como nos crimes de morte
em que o matador e o intermediário são presos, mas o mandante não é
incomodado. O Brasil conhece bem este tipo de critério.





As empreiteiras brasileiras acusadas de prática de suborno estão
proibidas de firmar contrato com a Petrobras. O que tem implicações
múltiplas também para a própria Petrobras.





As empresas estrangeiras Jurong, Keppel Fels, Saipem, Samsung e Mitsui
não receberam visitas policiais para busca e apreensão nas filiais que
todas têm no Brasil. Nem sofreram medida alguma por serem, como as
brasileiras, acionadoras de corrupção e pagadoras de subornos. E
continuam liberadas para fazer contratos com a Petrobras.





A diferenciação de tratamentos suscita inúmeras indagações, das quais a
primeira pode ser esta: o objetivo da Lava Jato, e tudo o que a partir
daí se irradia para o país todo, não era a corrupção, e só a corrupção?

Ah, sim, uma das cinco estrangeiras praticantes de corrupção, a Mitsui,
ficou liberada para se tornar até sócia da Petrobras na Gaspetro. É o
que acaba de fazer.



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