Prisões: promiscuidade entre público e privado dilapida patrimônio público
Mário Magalhães
A
impunidade é combustível indispensável à expansão da corrupção,
modalidade criminosa que exige quem dê e quem receba, o corruptor e o
corrupto. Quando bandidos acabam na cadeia, emite-se um aviso: quem
reeditar práticas semelhantes se arrisca a ter idêntico destino. Se
prevalece a impunidade, o combustível da gatunagem ganha aditivo.
Faz
bem ao Brasil que o senador petista Delcídio do Amaral tenha ido para o
xilindró e que o banqueiro amigo de tantos partidos André Esteves lhe
faça companhia. É saudável que o STF tenha respondido com altivez às
provas e que, no caso do líder do governo no Senado, a maioria dos seus
pares tenha autorizado a prisão, nos termos da lei.
Por mais óbvio
que seja a muita gente, para outros passa despercebido quem é a maior
vítima da corrupção. É o patrimônio público, bem coletivo dos cidadãos,
mais caro ainda aos que dependem do Estado para sobreviver. Num exemplo:
se há quem tenha dinheiro para pagar o colégio privado da gurizada,
parcela expressiva dos brasileiros depende de estabelecimentos públicos
de ensino; a corrupção retira do Estado condições de manter escolas e
oferecer educação de qualidade _no contraste com o desempenho das
particulares, amplia-se o desnível de oportunidades. (Sem falar que os
ricos costumam preferir faculdades públicas, bancadas por todos, em
especial os mais pobres.)
A promiscuidade entre o segmento público
e o privado serve ao segundo. Não que não devam existir parcerias,
pactos, vínculos que promovam vantagens lá e cá. O setor público
melhorando a vida das pessoas. O privado auferindo lucro legítimo.
Relações não promíscuas. O problema é quando o público é prejudicado,
favorecendo o privado, rompendo o equilíbrio na balança de interesses.
Pior ainda, quando o patrimônio público é dilapidado em proveito de
companhias e bolsos particulares.
A Petrobras é exemplar. Sua
constituição foi uma batalha cívica de décadas, vencida contra
petrolíferas privadas nacionais e sobretudo estrangeiras. Sabotagem
nunca faltou contra a Petrobras. Por um bom tempo, opuseram-se opiniões
distintas sobre o monopólio estatal do petróleo, hoje erradicado.
A
partir de determinada quadra, uniram-se para pilhar a Petrobras aqueles
que alardeavam a privatização e os que discursavam em alto brados
contra ela. Associaram-se para roubar. Na prática, para privatizar,
transferindo ilegalmente patrimônio público para mãos de larápios.
Que
independência tem um governante ou legislador cuja campanha é
financiada por empreiteiras, estaleiros e bancos, como o BTG Pactual de
Esteves? Assim como não existe almoço gratuito, “doação de campanha'' é
história da carochinha. As empresas não doam, elas investem. O que o
administrador público e o legislador têm a oferecer em troca, a não ser
abrir mão de interesses públicos, privilegiando os de conglomerados
privados? Podem falar em “contribuição'' em nome de valores da
cidadania, de veleidades sociais, do pragmatismo de o país ir bem, para
as empresas avançarem. Não creio. Basta observar a atuação dos
beneficiários das “doações'', a quem eles servem, por que causas
batalham. Por que a Vale foi tão bem tratada depois da tragédia
criminosa de Mariana?
A promiscuidade é a antessala do crime.
O
senador do PT é o mesmo sujeito nomeado diretor da Petrobras no governo
FHC. O banqueiro seu camarada destinou milhões de reais às campanhas de
Dilma Rousseff e Aécio Neves em 2014. E um trocado ao caixa 1 de
Delcídio _sem contar eventuais pixulecos por baixo do pano.
A verborragia radicalíssima no choque entre vultos da politicalha brasileira disfarça comportamentos parecidos.
Nada
foi tão constrangedor ontem como assistir aos senadores, aos menos de
PT, PSDB e PMDB se humilhando ao elogiar Delcídio do Amaral. O que
temem? A convicção de que lugar de ladrão é na cadeia?
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