Gostaria que, em cada quarteirão, houvesse uma área verde
Leonardo SakamotoAntes de mais nada: defendo o direito ao livre culto, de qualquer crença, sendo contrário a qualquer forma de limitá-la (desde isso não cause danos ao direitos fundamentais de ninguém).
Eu gostaria que em cada quarteirão houvesse uma escola, uma quadra poliesportiva, um telecentro, um parquinho infantil, uma área verde, meia dúzia de maritacas e um casal de vira-latas caramelo ou um par de gatos bem preguiçosos. Quero espaços de convivência, de discussão, de compartilhamento, para poder conhecer o outro, independentemente se ele acredita em algo ou não, e assim entendê-lo.
Igrejas podem assumir esse papel de mediação, é claro. Mas não será necessariamente por sua natureza religiosa, mas por congregar, no mesmo espaço, gente diferente que estiver disposta a depor as armas e conhecer o que o outro tem a dizer.
Tenho visto cada vez mais candidatos pregarem a elevação do número de igrejas e templos como política pública para o combate a alguma coisa. O discurso de paz presente em parte desses locais contribui, é claro. Ao passo que o comportamento tacanho da bancada evangélica, defendendo projetos que levam à discriminação, no Congresso Nacional distancia.
Não é a fé em alguém que vai impedir que barbáries sejam cometidas, mas uma série de processos que incluem a efetividade da Justiça e a diminuição da desigualdade social. Até porque não sou rebanho para estar ungindo um pastor e sim cidadão que escolhe um prefeito.
Agir conforme as regras de convivência social não tem a ver necessariamente com linha religiosa (pelo contrário, roubar está na estrutura de muita gente que perverte religiões, comprando e vendendo o divino como se fosse camarão seco em barraca de feira). Não quero alguém que aja de forma civilizada porque é temente a algo e, por isso, viva com medo. Mas porque acredita que os outros têm os mesmos direitos para serem felizes que ele porque nasceram iguais em dignidade e compartilham da mesma raça humana.
Vale lembrar que, em nome de uma interpretação deturpada do cristianismo, grandes atrocidades têm sido cometidas. Por exemplo, seguidores de uma pretensa verdade divina taxam o comportamento alheio de pecado e condenam os diferentes a uma vida de inferno aqui na Terra.
Pessoas, como o pastor Silas Malafaia, dizem que não incitam a violência com seus sermões. Não é a sua mão que segura a faca, o revólver ou a lâmpada fluorescente, mas é a sobreposicão de seus argumentos ao longo do tempo que distorce o mundo e torna o ato de esfaquear, atirar e atacar banais. Ou, melhor dizendo, “necessários”, quase um pedido do céu. São pessoas assim que alimentam lentamente a intolerância, que depois será consumida pelos malucos que fazem o serviço sujo. A presença de igrejas não resolve o problema por si. É necessário algo mais.
Coloquemos a culpa na herança do patriarcalismo português, no Jardim do Éden e por aí vai. É mais fácil justificar que somos determinados pelo passado do que tentar romper com uma inércia que mantém homens, ricos, brancos, heterossexuais em cima e mulheres, pobres, negras e índias, homossexuais em baixo. A reflexão, aceitar conhecer o outro e entendê-lo, que é o caminho para a tolerância e para a percepção da própria exploração, é difícil para alguns. É mais fácil seguir a manada, ou melhor, o rebanho.
Não importa em quem vocês votam ou o que defendem para o Brasil, participem do debate, exijam de seus candidatos que mostrem as suas propostas políticas, econômicas, sociais sem tergiversar. Nem só de pão vive o homem – mas nem por isso ele deixa de ser importante. Afinal de contas, isso não é um conclave e sim uma eleição municipal.
Quero que se eleja um prefeito, não um pastor
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