domingo, 5 de março de 2017

Transposição de águas está em curso

Transposição de águas está em curso, falta transpor a intolerância - 05/03/2017 - Elio Gaspari - Colunistas - Folha de S.Paulo



Transposição de águas está em curso, falta transpor a intolerância

Lalo de Almeida/ Folhapress





Durante o consulado petista, Lula encantou-se com a ideia de
transposição das águas do rio São Francisco e transformou-a numa das
joias de sua coroa. A obra demorou dez anos e custou o dobro do que se
previa, salpicada por mordidas de empreiteiras. Apesar de tudo isso, uma
parte do projeto está ficando pronta. As coisas boas também acontecem.





Desde janeiro, as águas do São Francisco saem do lago da barragem de
Itaparica, em Pernambuco, percorrem 222 quilômetros pelo chamado Eixo
Leste e entram na Paraíba. Na próxima quinta-feira (9), elas chegarão ao
açude de Poções, no município de Monteiro, de onde descerão por
gravidade para o reservatório de Boqueirão, que abastece Campina Grande e
outras 18 cidades.





Ao contrário do que diziam os adversários do projeto, a transposição das
águas do São Francisco não foi "a Transamazônica do Lula". A ideia foi
vista com um certo preconceito regional e uma greve de fome de um bispo
transformou em problema algo que era solução. No capítulo dos grandes
projetos petistas, o do trem-bala, que ligaria o Rio a São Paulo apanhou
muito menos que o da transposição. Com uma diferença: a velha ideia das
águas do São Francisco era boa e deu certo. Felizmente, o trem-bala
ficou no papel.





Os quilômetros de canais que atravessam o semiárido estarão para Lula
assim como Brasília está para Juscelino Kubitschek. (Também vai para a
conta do estilo petista de operar, a transposição de R$ 200 milhões para
o bolso de maganos metidos na obra do Eixo Leste.)





Em janeiro passado, quando inaugurou uma estação de bombeamento no
município de Floresta, em Pernambuco, o presidente Michel Temer pareceu
generoso: "Quero render homenagens aos governos anteriores que tiveram a
ideia, desde 15 anos atrás, de fazer a transposição". Deu também uma
aula de ciência política: "Aqui no Brasil é assim, quando você faz uma
obra o sujeito esquece quem começou".





Temer esqueceu o nome de Lula e fez uma conta astuciosa. O primeiro
projeto de transposição de águas do São Francisco para terras do
semiárido é de 1847. Há "15 anos" (portanto, em 2002, durante o governo
de Fernando Henrique Cardoso), continuava-se no mundo dos debates e dos
projetos centenários. Quem transpôs a ideia para a vida real, arrostando
anos de críticas, foi a jararaca petista. Temer tem o mérito de estar
concluindo uma obra que estava encalhada no final do governo de Dilma
Rousseff. Tendo seu quinhão no êxito, não deve fazer com Lula o que ele
fez com Fernando Henrique, jamais reconhecendo o valor da moeda estável
que lhe entregou em 2003.

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