sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Folha de S.Paulo - Sem diagnóstico - 30/12/2010

Folha de S.Paulo - Sem diagnóstico - 30/12/2010: "MARIANA VERSOLATO
DE SÃO PAULO

Eles vivem tensos, com medo de uma piora repentina. Saem frustrados do médico ao ouvir: 'Seus exames estão perfeitos'. E esperam por um resposta, para saber o que têm e como tratar.
Não saber o diagnóstico de uma doença pode gerar mais estresse do que receber a notícia de que se tem um problema de saúde grave.
A constatação, de um estudo da Sociedade Norte-Americana de Radiologia, é confirmada por quem vive a angústia de não ter respostas para suas dores.
Conhecer a causa dos sintomas dá conforto ao paciente, porque tira o foco da ameaça da doença, diz o psiquiatra Renério Fráguas Júnior, do HC de São Paulo. 'O problema passa a ter nome e prescrição médica.'
Ceane Soares, de Curitiba, espera por um 'nome' há 12 anos. Seu filho, Bruno, nasceu em 1998 e teve hipoglicemia no segundo dia de vida. Aos seis meses, não ficava 'durinho' e era apático, não sorria nem chorava.
Um neuropediatra constatou que ele tinha traços autistas. Meses depois, começou a ter convulsões que nenhum remédio controlava.
Bruno já recebeu os diagnósticos 'mais cabeludos', diz a mãe, todos descartados.
Tanta investigação rendeu uma caixa de exames no guarda-roupa: tomografias, ressonâncias, avaliações genéticas, endoscopias.
'A gente o observa 24 horas por dia. Nunca sabemos se a medicação é a certa, se vai melhorar. Estamos andando sem saber para onde.'
A sensação de estar perdido é compartilhada pelo professor J.S., 25, de São Paulo. Neste ano, ele começou a ter urticária. Foi a dermatologistas, alergistas, fez exames e foi internado com dores e inchaço no rosto e no corpo.
Em 45 dias, gastou quase R$ 1.000 em remédios, trocados a cada nova consulta.
Os médicos cogitaram imunidade baixa, estresse, sífilis e Aids. Exames para os dois últimos deram negativo.
J.S. também tem convulsões. Foi a neurologistas e cada um fez um diagnóstico. 'Não saber o que acontece no próprio corpo assusta.'

COMUNICAÇÃO
Infelizmente, é comum que urticárias fiquem sem solução, diz Ana Paula Castro, presidente da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia de SP.
Exames de sangue detectam substâncias que causam alergia. Mas não há testes para várias delas, como remédios, corantes e conservantes. O diagnóstico é limitado.
Em casos sem solução, médicos e pacientes concordam: a ansiedade é pior quando a comunicação entre as duas partes é falha.
Profissionais que prescrevem drogas e exames sem explicar por que geram desconfiança nos pacientes.
A aposentada Maria Amália Moraes, 57, que passou quase a vida toda acordando com dores nos olhos e nas têmporas, reclama que sua relação com os médicos foi sempre superficial.
Quatro vezes ao ano, tomava antibióticos para uma suposta sinusite, mas achava que o problema tinha origem dentária. 'Já gastei o valor de um carro na minha boca.'
Foi uma dentista que acertou o que ela tinha: distúrbio temporomandibular (DTM), que a fazia apertar os dentes durante o sono. A solução é uma placa usada à noite.
A aposentada criou um blog para ajudar quem tem o problema (doressemdiagnostico.blogspot.com).
Maria Amália diz que torcia para que os exames achassem o problema. Quando isso não acontecia, saía chorando do consultório.
'Ficava desiludida. Ao mesmo tempo, agradecia a Deus por não ter nada grave. Achavam que eu inventava doenças, ninguém acreditava nas dores.'

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