Folha de S.Paulo - Vinicius Torres Freire: Baixar impostos ou baixar juros? - 07/12/2010: "Baixar impostos ou baixar juros?
Ministro volta a falar em redução de tributos, mas prioridade deveria ser baixar deficit e taxa de juro
O MINISTRO da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que a 'redução de tributos vai continuar'. Alguém perguntará como pode continuar algo que não começou, mas o fato é que houve redução de alíquotas para alguns setores da economia (e aumentos para outras, resultado de decisões judiciais sobre contribuições inventadas faz anos).
Sim, a carga tributária, a receita de impostos como parcela do PIB, subiu nos anos Lula, rateando apenas em 2009. A receita crescia rápido porque houve mais consumo das famílias, que pagam muito imposto, e porque houve mais formalização do emprego, de empresas e mais linha dura na Receita. Isto posto, qual o sentido de dizer que os impostos vão continuar a cair? Não muito.
Talvez como alívio para um ou outro setor produtivo no bico do corvo, não parece viável baixar impostos nos próximos anos (nos próximos dois? Três?). O governo diz ter (ou deveria ter) um plano de redução de deficit e dívida públicos, plano que prevê equilíbrio fiscal e dívida pública em 30% do PIB em 2014. Ao mesmo tempo, promete controlar a inflação, que vai ser chata em 2011; por ora, se dá como certo que a Selic sobe ao menos 1,5 ponto percentual, para 12,25% ao final de 2011. Reduzir a dívida em tempo de aumento da despesa com juros não combina com redução de impostos.
Além do mais, redução de impostos é, em tese, um estímulo adicional à atividade econômica, incentivo fora de propósito neste momento em que a utilização da capacidade produtiva já está em nível alto e ainda cresce, em que o desemprego não para de cair e que salários e consumo crescem além do PIB.
Para complicar, o Congresso está desorganizado, sem lideranças sensatas tanto no governo como na oposição, disposto a aprovar uma sangria de gastos. O governo por ora mal sabe como vai arranjar as contas de 2011 e, ao mesmo tempo, se acertar com o novo Parlamento.
Além do mais, vários economistas sensatos estimam que a receita federal de impostos não deve crescer no mesmo ritmo do segundo governo Lula, quando o aumento da arrecadação chegou a correr ao dobro da velocidade de crescimento do PIB. Há menos negócios e empregos a formalizar, e o que sobra na informalidade é mais difícil de legalizar. Há menos empresas para a Receita apertar com fiscalização mais rígida. Isso não é ciência, claro, mas é improvável que a arrecadação corra indefinidamente muito à frente da economia. Enfim, a economia deve crescer menos em 2011.
Reduzir deficit e dívida é essencial para levar as taxas de juros para algum degrau decente. Pode-se argumentar que a carga de impostos é um problema igualmente sério, desarranjo que ajuda a matar empresas brasileiras, com a contribuição adicional de infraestrutura ruim e de câmbio prejudicial (real forte).
Decidir entre baixar juros ou baixar impostos é ficar entre a cruz e a caldeirinha, decerto. Mas juros altos e o modo ainda lunático de financiamento da dívida pública brasileiros são aberrações 'estruturais'. Custam caro e, além do mais, dificultam a criação de um mercado de crédito e de capitais decente no país. Como diz o pessoal da moda, faz tempo que 'a taxa de juros' é a 'nova inflação' nas passarelas das esquisitices brasileiras deletérias. Baixar imposto, com a casa em ordem, é coisa mais simples. Primeiro, os juros.
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