sexta-feira, 4 de julho de 2014

Colheu o que não semeou | Brasil 24/7

Dilma Rousseff colheu o que não semeou | Brasil 24/7




WANDERLEY GUILHERME DOS SANTOS

Ela colheu precisamente os resultados do que não semeou: não promoveu a emergência de um sistema democrático de informação
(originalmente publicado na Carta Maior)
Aproveitando a vaia pornofônica que
singularizou a participação dos reacionários e distraídos na abertura da
Copa das Copas, a oposição saiu-se com o comentário de que a presidenta
Dilma Roussef colheu o que semeou. Pensou que estava abafando. Não
estava. Para além da falta de compostura e civilidade, a oposição errava
outra vez no diagnóstico. A presidenta colheu precisamente os
resultados do que não semeou: não promoveu a emergência de um sistema de
informação democratizado.

A falta de pluralismo nos meios de
comunicação não é ambição de esquerdas partidárias. Trata-se da
prestação de um serviço privado, pago por consumidores, atualmente
fraudados em suas aspirações de consumo. Ler um jornal, uma revista ou
assistir ao noticiário da televisão faz parte da pauta de itens que a
vida moderna põe, ou devia por, à disposição de quem os deseje usufruir.
E os consumidores têm o direito de protestar. Assim como os passageiros
urbanos reclamam da qualidade dos serviços pelos quais pagam, os
leitores e espectadores insatisfeitos se julgam ludibriados pelos
fornecedores da mercadoria que compram.

Os jornais, revistas e emissoras de
televisão registraram com olhos complacentes os quebra-quebras
aleatórios propulsionados pela carestia e falta de qualidade dos
transportes em circulação. Não seria bom para a democracia, tal como não
o eram os destemperos de violência, que os desgostosos com o pífio
padrão do jornalismo, minorias como as de junho do ano passado ou
maiorias como a queda de audiência e circulação atestam, empastelassem
jornais ou ocupassem estações de televisão, exigindo participação e
honestidade de gestão.

Durante o período que antecedeu a Copa das
Copas e não somente em relação a ela, os meios de informação sonegaram
centenas, milhares de notícias altamente relevantes para a vida dos
leitores e espectadores. Mais do que isso, disseminaram incansavelmente
uma visão de mundo incompatível com a realidade dos fatos. Era falso que
os aeroportos, estádios, avenidas e metrôs não iriam ficar prontos. Era
falso que os gramados não drenariam as chuvas, as comunicações não
funcionariam, os holofotes não acenderiam. Era falso que os turistas
seriam assaltados, que não haveria segurança, que conflitos gigantescos
ofuscariam os jogos nos campos de futebol pela pancadaria generalizada
nas arenas do lado de fora. Tudo falso. Moeda falsa. Produto estragado
vendido a preço de luxo.

As trombetas da derrocada econômica, da
inflação sem controle, do afinal bem vindo desemprego, são igualmente
serviço fraudulento. Os leitores estão sendo diariamente lesados em sua
boa fé, duplamente: não são informados do que ocorre efetivamente na sua
cidade, no seu estado e no país, e são levados a acreditar que há um
pesadelo à espreita assim que puserem os pés fora de casa. Quando não o
vêem não é porque não exista, mas porque ainda não chegou a alguns
lares: inflação, desemprego, falta de saúde e de educação; pior, falta
de perspectiva.

A lição é terrível. Dela sabiam os tiranos da
antiguidade, os tiranos da contemporaneidade os imitaram: um sistema
articulado de falsidades pode produzir os delírios fantasistas ou as
angústias aterradoras de uma droga, se absorvido por tempo suficiente.
Uma imprensa oligopolizada é nada menos do que uma droga.
Eficientíssima, capaz de produzir o pessimismo sem fundamento das
análises econômicas, tanto quanto o desvario irracional das vaias
pornofônicas. Ao se manter indiferente à péssima qualidade do serviço
pago, inclusive com as bondades das concessões e outras benfeitorias, a
presidenta Dilma Roussef colheu o que não semeou.

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