Mudar para continuar
Um escândalo é um escândalo, não é uma solução. O otimismo, que não é só
de Dilma Rousseff, mas foi por ela sintetizado na convicção de que o
escândalo da Petrobras "pode mudar o país para sempre" ao "acabar com a
impunidade", já foi submetido a muitos testes. E não passou por nenhum.
No caso extremo dessas esperadas mudanças a história oferece a fileira
de golpes de Estado, consumados ou não. A cada recuperação do regime
legal estuprado pelos militares, "nunca mais haveria golpe". Até vir o
seguinte.
Entre nós, na melhor hipótese, mudam-se os métodos. Já na primeira
eleição com princípios democráticos, pós-ditadura militar, exibiu-se o
golpe eleitoral preventivo. Solucionou o temido risco de violência
civil, em dimensão nacional, contra a conspiração e o golpe militar no
caso da possível eleição de Lula. Agora mesmo passeia pelas ruas de São
Paulo uma gangue de marcolas ideológicos pedindo um golpe sob a forma de
impeachment.
Passa-se o mesmo com a impunidade. Além de não acabar só porque a prisão
de empreiteiros seria exemplar, assume no próprio escândalo da
Petrobras uma nova face, para facilitar-lhe a permanência. A delação
premiada é uma forma de impunidade. O patife delata alguns comparsas,
devolvem o que ninguém sabe se é o todo do que furtaram, e vão viver em
casa como aposentados ricos (o que devolveram não inclui o que ganharam
com uso do dinheiro furtado, nem há quem saiba qual foi esse ganho
total). Em palavras de Rodrigo Janot, que mantém um desempenho muito
acima de seus dois últimos antecessores como procurador-geral da
República, e falou à Folha:
"Eu só não aceito perdão judicial [no acordo de delação]. Se for um
crime que tenha já [direito a] semiaberto, sempre que for possível eu
vou botar no aberto. Vá cumprir pena em casa, sem problema nenhum".
Importante na delação premiada não é a conduta criminosa, antissocial, é
a recuperação do valor furtado –o dinheiro ou o bem valioso posto como
valor acima de todos. Só o preconceito moral distinguirá o cidadão
honesto do criminoso premiado pela delação. E pelo investimento do
furto, porque, entre os dois, o tolo não é ele.
Ainda assim, um outro otimismo ruiu aos primeiros depoimentos de
empreiteiros presos. Negaram-se a responder aos inquiridores,
contrariando a convicção dos controladores da Operação Lava Jato,
exposta por Rodrigo Janot, de que as prisões levariam os empreiteiros "a
falar mesmo". Se não respondem, não aceitam a delação premiada. Se não a
aceitam, o comprometimento dependerá de que o delator-acusador prove o
que disse ou investigações policiais consigam fazê-lo. Dificuldade que,
no caso dos grandes corruptores da administração pública, não costuma
perturbar a impunidade, aqui ou lá fora.
NOVELA
A identificação de procedência da foto estava deslocada, não onde o
"Globo" a usa. Não a vi, e aqui afirmei não existir. Mas existia, a foto
foi comprada da Folhapress, e mostrava o embarque, em Belo Horizonte,
de um dos três presos pela Polícia Federal em Brasília por levarem,
respectivamente, R$ 80 mil, R$ 30 mil e R$ 6.000. Haviam trabalhado para
a campanha do petista e governador eleito Fernando Pimentel. Nenhum
ficou preso, passou-se quase mês e meio, mas a PF ainda não achou que
deva alguma explicação do fato –um entre ao menos três semelhantes na
disputa eleitoral.
AINDA INTRIGANTE
Sob o título "Sem briga", Demétrio Magnoli
não negou nem confirmou a inverdade com que me atribuiu "paralelos
entre a publicação da denúncia [de que Dilma e Lula sabiam da corrupção
na Petrobras] e o golpe militar de 1964". Tão disposto a me agredir sem
motivo –e não na Folha, mas no "Globo", onde não tenho voz nem
vez–, no entanto adotou o escapismo, no meu protesto, de apenas dizer
que não remeti o leitor aos textos respectivos. Não o fiz porque não
precisei dizer mais do que disse para o entendimento comum. Nem preciso
fugir do que digo. Até por entender que há brigas justificadas e são
para ser brigadas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário