Barroso: ‘O sistema político é uma usina do mal’
Josias de Souza
.
Ministro
do STF há um ano e meio, Luís Roberto Barroso revela-se convencido de
que, enquanto não for reformado o modelo político brasileiro, a
principal consequência de um escândalo será a produção de outro, e
outro, e mais outro… “Houve o mensalão, agora tem este que chamam de
petrolão e, certamente, enquanto a gente conversa, continuam acontecendo
coisas erradas”, disse ele, em entrevista ao blog. “O sistema político brasileiro é uma usina do mal”, acrescentou.
Para
Barroso, o sistema tornou-se “indutor da criminalidade”. Move-se na
contramão do movimento civilizatório. “A vida civilizada existe para
reprimir o mal e potencializar o bem”, disse o ministro. “O sistema
político brasileiro faz exatamente o contrário. Ele reprime o bem e
potencializa o mal.”
Há no Brasil 32
agremiações partidárias com registro na Justiça Eleitoral. Isso não é
bom. Mas o ministro receia que fique muito pior. “Eu li que existem mais
três dezenas de partidos políticos pedindo registro e se habilitando
para participar da cena política”, alarmou-se Barroso. “E ninguém se
ilude, achando que é um surto de idealismo, um surto de patriotismo, um
surto de pessoas querendo discutir ideias para o país. É porque isso
virou um negócio. A política não pode ser um negócio.”
Na visão de
Barroso, é na caixa registradora dos comitês eleitorais que a natureza
mercantil da política se manifesta de maneira mais explícita. “O modo
como as empresas participam do financiamento eleitoral é antidemocrático
e antirrepublicano. Portanto, gera um problema de constitucionalidade.”
Por
quê? “Não há nenhum tipo de disciplina jurídica, nenhum tipo de limite.
Então, a mesma empresa —e isso acontece corriqueiramente, e aconteceu
de novo— pode financiar os três candidatos a presidente da República.
Bom, se está financiando os três não é uma questão ideológica.”
De
duas, uma: “Ou as empresas são achacadas para dar dinheiro ou estão
comprando um favor futuro dando dinheiro”, afirmou Barroso. “Qualquer
uma das duas alternativas é péssima. […] Depois da eleição, esta empresa
que financiou pode contratar diretamente com a administração pública. E
pode ser contratada —às vezes sem licitação. […] Ou ela vai obter um
belo financiamento do BNDES, quando já não esteja financiando a campanha
política com o dinheiro do BNDES. Ou seja, tudo errado.”
Como se
sabe, a “usina do mal” de que fala o ministro Barroso produz réus
ilustres. São autoridades que usufruem do chamado foro por prerrogativa
de função —só podem ser processadas e julgadas no Supremo. O
procurador-geral da República Rodrigo Janot anunciou para fevereiro o
envio ao STF das denúncias contra os políticos pilhados recebendo
propinas na Petrobras.
Graças a uma proposta formulada por
Barroso, em coautoria com o colega Teori Zavascki, os políticos
encrencados em ações penais passaram a ser julgados mais rapidamente.
Relator do mensalão desde que Joaquim Barbosa aposentou-se, Barroso
propôs que as denúncias da Procuradoria da República contra
congressistas e ministros passassem a ser analisadas nas duas turmas do
STF, não mais no plenário da Corte.
Zavascki, hoje responsável
pelo caso do petrolão na Suprema Corte, propôs que, além da análise
sobre a procedência das denúncias da Procuradoria, o próprio julgamento
dos réus ficasse sob a responsabilidade das turmas do Supremo.
“Quando
eu sugeri, minha principal motivação era desobstruir o plenário”,
declarou Barroso. “O plenário do Supremo deve ser uma Corte
constitucional, deve julgar grandes temas de interesse da nacionalidade,
em ações diretas de inconstitucionalidade ou em repercussão geral.”
O
que vinha acontecendo, recordou o ministro, é que “o Supremo passava
tardes no plenário para receber uma denúncia, com 11 ministros se
pronunciando, às vezes sobre uma questão simples.” No julgamento do
mensalão, a situação chegou às raias do paroxismo. “Na ação penal 470,
que foi a do mensalão, o tribunal passou um ano praticamente em função
disso. E há outras coisas importantes.”
Barroso celebrou o êxito
da novidade que ajudou a introduzir na rotina do STF. “A partir do
momento que nós passamos para a turma, que não tem televisão, tem menos
pessoas e uma dinâmica muito mais ágil, nós já recebemos quase três
dezenas de denúncias na Primeira Turma, que é a minha. E já julgamos dez
ou 15 ações penais em pouco mais de seis meses. Ou seja, o que estava
atravancado no plenário passou a andar nas turmas.”
A falta de
televisionamento não compremete a transparência das decisões? “A turma é
transmitida internamente com acesso aos jornalistas. Portanto, as
sessões são públicas”, disse Barroso. “Todos os jornalistas que cobrem o
Supremo assistem às sessões das turmas. Ela não passa na TV aberta. […]
Mas não há nenhum tipo de impedimento de que, havendo um julgamento
relevante feito pela turma, ela seja transmitida pela TV Justiça.”
A
transmissão televisiva das futuras sessões de julgamento dos prováveis
réus do petrolão não está assegurada. Mas Barroso esclarece que não se
opõe à entrada das câmeras. “Os advogados reclamavam muito de
julgamentos criminais transmitidos pela TV Justiça. Mas não há nenhum
impedimento regimental, constitucional ou legal. E acho que, nessas
grandes questões públicas, a transparência, a visibilidade, é
prioritária.”
Barroso falou ao blog nesta
quinta-feira (18), em seu gabinete. Entre outros temas, discorreu sobre:
1) a urgência de o Congresso aprovar uma reforma política, a
conveniência de retirar do STF a atribuição de julgar ações penais
contra congressistas e ministros; 2) a decisão de conceder aos
condenados José Dirceu, Delúbio Soares e Valdemar Costa Neto a
“progressão de regime” que os converteu em beneficiários da prisão
domiciliar; 3) o despacho que negou ao condenado João Paulo Cunha o
mesmo benefício; e 4) o futuro da Lei da Anistia no STF. Não deixe de
assistir aos principais trechos da entrevista, disponíveis nos vídeos lá
do alto.
Ministro
do STF há um ano e meio, Luís Roberto Barroso revela-se convencido de
que, enquanto não for reformado o modelo político brasileiro, a
principal consequência de um escândalo será a produção de outro, e
outro, e mais outro… “Houve o mensalão, agora tem este que chamam de
petrolão e, certamente, enquanto a gente conversa, continuam acontecendo
coisas erradas”, disse ele, em entrevista ao blog. “O sistema político brasileiro é uma usina do mal”, acrescentou.
Para
Barroso, o sistema tornou-se “indutor da criminalidade”. Move-se na
contramão do movimento civilizatório. “A vida civilizada existe para
reprimir o mal e potencializar o bem”, disse o ministro. “O sistema
político brasileiro faz exatamente o contrário. Ele reprime o bem e
potencializa o mal.”
Há no Brasil 32
agremiações partidárias com registro na Justiça Eleitoral. Isso não é
bom. Mas o ministro receia que fique muito pior. “Eu li que existem mais
três dezenas de partidos políticos pedindo registro e se habilitando
para participar da cena política”, alarmou-se Barroso. “E ninguém se
ilude, achando que é um surto de idealismo, um surto de patriotismo, um
surto de pessoas querendo discutir ideias para o país. É porque isso
virou um negócio. A política não pode ser um negócio.”
Na visão de
Barroso, é na caixa registradora dos comitês eleitorais que a natureza
mercantil da política se manifesta de maneira mais explícita. “O modo
como as empresas participam do financiamento eleitoral é antidemocrático
e antirrepublicano. Portanto, gera um problema de constitucionalidade.”
Por
quê? “Não há nenhum tipo de disciplina jurídica, nenhum tipo de limite.
Então, a mesma empresa —e isso acontece corriqueiramente, e aconteceu
de novo— pode financiar os três candidatos a presidente da República.
Bom, se está financiando os três não é uma questão ideológica.”
De
duas, uma: “Ou as empresas são achacadas para dar dinheiro ou estão
comprando um favor futuro dando dinheiro”, afirmou Barroso. “Qualquer
uma das duas alternativas é péssima. […] Depois da eleição, esta empresa
que financiou pode contratar diretamente com a administração pública. E
pode ser contratada —às vezes sem licitação. […] Ou ela vai obter um
belo financiamento do BNDES, quando já não esteja financiando a campanha
política com o dinheiro do BNDES. Ou seja, tudo errado.”
Como se
sabe, a “usina do mal” de que fala o ministro Barroso produz réus
ilustres. São autoridades que usufruem do chamado foro por prerrogativa
de função —só podem ser processadas e julgadas no Supremo. O
procurador-geral da República Rodrigo Janot anunciou para fevereiro o
envio ao STF das denúncias contra os políticos pilhados recebendo
propinas na Petrobras.
Graças a uma proposta formulada por
Barroso, em coautoria com o colega Teori Zavascki, os políticos
encrencados em ações penais passaram a ser julgados mais rapidamente.
Relator do mensalão desde que Joaquim Barbosa aposentou-se, Barroso
propôs que as denúncias da Procuradoria da República contra
congressistas e ministros passassem a ser analisadas nas duas turmas do
STF, não mais no plenário da Corte.
Zavascki, hoje responsável
pelo caso do petrolão na Suprema Corte, propôs que, além da análise
sobre a procedência das denúncias da Procuradoria, o próprio julgamento
dos réus ficasse sob a responsabilidade das turmas do Supremo.
“Quando
eu sugeri, minha principal motivação era desobstruir o plenário”,
declarou Barroso. “O plenário do Supremo deve ser uma Corte
constitucional, deve julgar grandes temas de interesse da nacionalidade,
em ações diretas de inconstitucionalidade ou em repercussão geral.”
O
que vinha acontecendo, recordou o ministro, é que “o Supremo passava
tardes no plenário para receber uma denúncia, com 11 ministros se
pronunciando, às vezes sobre uma questão simples.” No julgamento do
mensalão, a situação chegou às raias do paroxismo. “Na ação penal 470,
que foi a do mensalão, o tribunal passou um ano praticamente em função
disso. E há outras coisas importantes.”
Barroso celebrou o êxito
da novidade que ajudou a introduzir na rotina do STF. “A partir do
momento que nós passamos para a turma, que não tem televisão, tem menos
pessoas e uma dinâmica muito mais ágil, nós já recebemos quase três
dezenas de denúncias na Primeira Turma, que é a minha. E já julgamos dez
ou 15 ações penais em pouco mais de seis meses. Ou seja, o que estava
atravancado no plenário passou a andar nas turmas.”
A falta de
televisionamento não compremete a transparência das decisões? “A turma é
transmitida internamente com acesso aos jornalistas. Portanto, as
sessões são públicas”, disse Barroso. “Todos os jornalistas que cobrem o
Supremo assistem às sessões das turmas. Ela não passa na TV aberta. […]
Mas não há nenhum tipo de impedimento de que, havendo um julgamento
relevante feito pela turma, ela seja transmitida pela TV Justiça.”
A
transmissão televisiva das futuras sessões de julgamento dos prováveis
réus do petrolão não está assegurada. Mas Barroso esclarece que não se
opõe à entrada das câmeras. “Os advogados reclamavam muito de
julgamentos criminais transmitidos pela TV Justiça. Mas não há nenhum
impedimento regimental, constitucional ou legal. E acho que, nessas
grandes questões públicas, a transparência, a visibilidade, é
prioritária.”
Barroso falou ao blog nesta
quinta-feira (18), em seu gabinete. Entre outros temas, discorreu sobre:
1) a urgência de o Congresso aprovar uma reforma política, a
conveniência de retirar do STF a atribuição de julgar ações penais
contra congressistas e ministros; 2) a decisão de conceder aos
condenados José Dirceu, Delúbio Soares e Valdemar Costa Neto a
“progressão de regime” que os converteu em beneficiários da prisão
domiciliar; 3) o despacho que negou ao condenado João Paulo Cunha o
mesmo benefício; e 4) o futuro da Lei da Anistia no STF. Não deixe de
assistir aos principais trechos da entrevista, disponíveis nos vídeos lá
do alto.
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