quinta-feira, 21 de abril de 2016

STF pode mudar decisão do Congresso sobre impeachment, diz especialista - 20/04/2016 - Poder - Folha de S.Paulo

STF pode mudar decisão do Congresso sobre impeachment, diz especialista - 20/04/2016 - Poder - Folha de S.Paulo



 RODRIGO RUSSO




Para André Ramos Tavares, 43, professor titular de direito econômico da
USP e professor de direito constitucional na PUC-SP, o pedido pelo
impeachment de Dilma usa "os mesmos argumentos do dia seguinte às
eleições" e seu mérito pode, sim, ser apreciado pelo Supremo Tribunal
Federal.





Em sua avaliação, um processo de impedimento que seja mera contagem de
votos dos parlamentares não é o que a Constituição prevê e torna-se,
assim, um golpe, afirma o professor em entrevista à Folha, por telefone.





A opinião de Tavares contra o impeachment não vem de alinhamento
automático com a esquerda. Pelo contrário, o professor e parecerista é
inclusive autor de um livro em coautoria com o advogado Ives Gandra da
Silva Martins e com o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar
Mendes, dois conhecidos críticos do governo.





Leia, abaixo os principais trechos da entrevista.




*
Qual a sua opinião sobre o impeachment?

Sou completamente contrário. Parece-me que são os mesmos argumentos do
dia seguinte às eleições. Parte da população está descontente, mas as
eleições foram limpas. Considero a crise apenas um exercício de
discordância política, não de que a presidente cometeu crimes. O
impeachment requer posição técnica, e caminha tudo muito rápido, sem
discutir, isso não é bom para o país.





Vemos uma situação de perplexidade. De um lado, uma oposição agressiva
por um impeachment; de outro, um partido do governo mirando a
Presidência sem o voto democrático. Essa não poderia ser a pauta do
partido. Em que lugar do mundo é possível um governo que não é governo,
um partido que rompe sem renunciar à Vice-Presidência!?





O pedido contra Dilma se baseia principalmente na questão das pedaladas fiscais. Qual a sua avaliação?

Em primeiro lugar, se o crime ocorreu no mandato anterior, a lei não
permite que seja usado para fins de responsabilização política. Além
disso, o correto para esse tipo de situação é o julgamento pela via da
prestação de contas, em que o Tribunal de Contas da União faz análise
técnica e emite parecer opinativo. O plenário do Congresso julga as
contas em seguida.





Não pode haver confusão: as contas dela de 2015 ainda não foram
julgadas. São coisas distintas, como um tem rito específico exclusivo
previsto na Constituição, o impeachment é inadequado.





Muitos dizem que o impeachment é um golpe. O que o senhor acha disso?

Vou te responder de uma forma bem clara. O presidente da Câmara, Eduardo
Cunha [PMDB-RJ], recentemente disse que desde 2009 o PMDB já sinalizava
para rompimento com o PT. Oras, então não deveriam ter composto a
chapa. Não é possível o partido sair sem o vice-presidente renunciar.
Aí, sim, configura-se um golpe. Só há impeachment se não houver governo.
O oportunismo é que gera um golpe. Temos problemas a resolver na
legislação, não é possível ter uma chapa eleitoral que leve a esse
cenário.





A alegação de golpe em andamento refere-se ao que efetivamente está
acontecendo, não ao instituto em si. Há uma inversão da defesa. Em geral
presume-se que o cidadão é inocente, o que no caso seria a presunção de
legitimidade do governo eleito, e precisam ser produzidas provas contra
ele, não ele provar sua inocência. Abriram um processo de impeachment
sem investigações, sem provas. O governo sabe que não há elementos
materiais para impeachment.





O Supremo Tribunal Federal poderia avaliar o mérito do processo de impeachment?

Na tomada de decisões pode haver vícios. O Supremo deveria examinar o
mérito. Ele pode com certeza atuar se a decisão final pelo impeachment
não tiver base substancial na Constituição. A falta de provas leva à
nulidade do processo.





Não há ato que não possa ser levado ao STF se violar a Constituição. O
tribunal já interveio em questões congressuais, chegou a intervir na
edição de medidas provisórias, que cabiam ao Executivo. Temos um Estado
mais consciente do Estado Constitucional. Vale para o processo ou para o
mérito do impeachment, a qualquer tempo. O Judiciário vai desagradar
alguma parte da população. Qualquer decisão terá leitura política, isso
não é novidade, mas essa não é a razão pública da Constituição.





Qual seria a saída para a atual crise político-jurídica?

Creio que a saída para a crise do impeachment seria o PMDB adotar de vez
a legalidade. O que está aí corre o risco de ter governo sem base no
Congresso. O partido tem uma responsabilidade muito grande com o país, e
gostaria que isso fosse mais bem assumido. Se o vale-tudo continuar,
afetará o PMDB; nessa toada atual, as operações anticorrupção alcançarão
todos os partidos.





A solução passa pelo PMDB e pelo Judiciário. O Judiciário não vai poder
se eximir de tomar decisões desagradáveis para alguma parte da
população, em conformidade com regras preestabelecidas.





Como o senhor analisa as decisões da operação Lava Jato até o momento?

A Operação Lava Jato é muito importante, no sentido de resgatar dinheiro
público e identificar corruptos e corruptores. Erros vão acontecer e
aconteceram, mas não é possível tolerar novas posturas que são o fim do
Estado de Direito. A divulgação indevida de conversas, por exemplo, foi
absolutamente ilegal.





É importante que a sociedade acompanhe o Judiciário, mas esse não pode
criar novos poderes apoiado em legitimidade social. A Lava Jato aplica a
lei com muito rigor. Pergunto: isso vai valer daqui para a frente para a
sociedade como um todo ou só para casos de corrupção de um governo X? É
preciso melhorar o direito, mas duvido que isso venha a ocorrer.

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