O húngaro George Pólya, um matemático sensato, o que é uma raridade, nos
sugere ataques alternativos quando um problema parece ser insolúvel.
Um deles consiste em buscar exemplos semelhantes paralelos de problemas
já resolvidos e usar suas soluções como primeira aproximação. Pois bem, a
história tem muitos exemplos de justiceiros messiânicos como o juiz
Sergio Moro e seus sequazes da Promotoria Pública.
Dentre os exemplos se destaca o dominicano Girolamo Savonarola,
representante tardio do puritanismo medieval. É notável o fato de que
Savonarola e Leonardo da Vinci tenham nascido no mesmo ano. Morria a
Idade Média estrebuchando e nascia fulgurante o Renascimento.
Educado por seu avô, empedernido moralista, o jovem Savonarola
agiganta-se contra a corrupção da aristocracia e da igreja. Para ele ter
existido era absolutamente necessário o campo fértil da corrupção que
permeou o início do Renascimento.
Imaginem só como Moro seria terrivelmente infeliz se não existisse
corrupção para ser combatida. Todavia existe uma diferença essencial,
apesar das muitas conformidades, entre o fanático dominicano e o juiz do
Paraná -não há indícios de parcialidade nos registros históricos da
exuberante vida de Savonarola, como aliás aponta o jovem Maquiavel, o
mais fecundo pensador do Renascimento italiano.
É preciso, portanto, adicionar um outro componente à constituição da
personalidade de Moro -o sentimento aristocrático, isto é, a sensação,
inconsciente por vezes, de que se é superior ao resto da humanidade e de
que lhe é destinado um lugar de dominância sobre os demais, o que
poderíamos chamar de "síndrome do escolhido".
Essa convicção tem como consequência inexorável o postulado de que o
plebeu que chega a status sociais elevados é um usurpador. Lula é um
usurpador e, portanto, precisa ser caçado. O PT no poder está usurpando o
legítimo poder da aristocracia, ou melhor, do PSDB.
A corrupção é quase que apenas um pretexto. Moro não percebe, em seu
esquema fanático, que a sua justiça não é muito mais que intolerância
moralista. E que por isso mesmo não tem como sobreviver, pois seus
apoiadores do DEM e do PSDB não o tolerarão após a neutralização da
ameaça que representa o PT.
Savonarola, após ter abalado o poder dos Médici em Florença, é atraído
ardilosamente a Roma pelo papa Alexandre 6º, o Borgia, corrupto e
libertino, que se beneficiara com o enfraquecimento da ameaçadora
Florença.
Em Roma, Savonarola foi queimado. Cuidado Moro, o destino dos moralistas
fanáticos é a fogueira. Só vai vosmecê sobreviver enquanto Lula e o PT
estiverem vivos e atuantes.
Ou seja, enquanto você e seus promotores forem úteis para a elite
política brasileira, seja ela legitimamente aristocrática ou não.
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE *, físico, é professor emérito da
Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do
Conselho Editorial da Folha*
Unicamp e membro do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia e do
Conselho Editorial da Folha*
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