Estratégia de “usar D. Marisa” não foi de Lula. Foi de Moro e do MP
Lembra que você leu, nas trocas de mensagens de Deltan Dallagnol e do “decano” da Força-Tarefa, Carlos Fernando dos Santos Lima, sobre reforçarem o suposto fato de Lula ter “usado” a falecida mulher, D. Marisa Letícia, em seu depoimento a Sérgio Moro como forma de desqualificar o “showzinho da defesa” que acusam o ex-presidente de ter promovido? Reproduzo, acima, do Intercept.
Eu também não me lembrava, até que fui advertido por uma colega de que, naquele longínquo – para a memória – maio de 2017, foi exatamente o então juiz que conduziu insistentemente o depoimento para os atos de Marisa, chegando ao ponto de provocar uma reclamação de Lula por isso.
“Senhor Moro, é muito difícil para mim toda a hora que o senhor cita minha mulher sem ela estar aqui para se defender”.
Mas é possível recuperar isso pelo detalhado levantamento feito pela jornalista Milly Lacombe, publicado pelo GGN.Basta correr os olhos para ver (o texto está abaixo) que Sérgio Moro se fixou em citar, citar e citar mais ainda a falecida mulher de Lula.
A esta altura, não é demais imaginar que foi outra armadilha apara, como fez Santos Lima no Estadão, dizer que era “triste” que o ex-presidente, Lula, tivesse “atribuído à sua mulher, dona Marisa Letícia, a intenção de adquirir o triplex em Guarujá, em seu depoimento”.
Algo quer rendeu uma capa sórdida da Veja e uma propaganda abjeta de uma loja de departamentos, dizendo que “a culpa não é da Marisa”.
Veja o relato de Milly, onde por 23 vezes Moro provoca o assunto “D. Marisa”:
10’54”: Moro cita dona Marisa a
respeito da compra de apartamento no Guarujá. O advogado de Lula corrige
o juiz e diz que o documento não fala em compra de um apartamento, mas
em compra de uma cota. Lula então responde citando a mulher, já que a
pergunta era sobre ela. Moro quer saber como dona Marisa comprou a cota,
e Lula responde.
13’09” Moro cita dona Marisa outra
vez e mostra documento com assinatura dela. O juiz explica que o
documento foi rasurado, mas não sabe por quem.
14’25” Moro cita dona Marisa outra
vez: “A sua esposa nunca mencionou [a intenção de adquirir um Triplex e
não uma unidade simples]?”
17’30” Moro volta a citar dona Marisa.
18’25” Moro cita outra vez dona
Marisa perguntando por que Lula e ela não celebraram a compra do
apartamento como os demais cooperados da Bancop, e por que tampouco
solicitaram de volta o dinheiro já dado. Lula responde citando a mulher.
19’08” Moro cita dona Marisa dizendo que o termo de adesão está assinado por ela.
19’54” Moro cita outra vez dona Marisa.
20’35” Moro volta a citar dona Marisa, outra vez sem que Lula tivesse falado nela.
21’43” Pela primeira vez no
depoimento Lula cita a mulher sem ser perguntado. Diz que soube durante
os depoimentos dos depoentes que em 2012 dona Marisa tinha autorizado
que a OAS vendesse o apartamento.
23’12” Moro pergunta se Lula tinha
visto o apartamento do Guarujá. Lula diz que foi uma vez em 2014. Moro
pergunta com quem, Lula diz que com dona Marisa e com Leo Pinheiro.
24’08” Moro cita dona Marisa: “O senhor ou sua esposa solicitou uma reforma?” Lula diz que não.
24’25” Moro cita dona Marisa querendo
saber se ela, ou Lula ou algum familiar tinha ido outras vezes visitar o
imóvel. Lula diz que achava que dona Marisa tinha ido mais uma vez. Diz
que sabe disso porque Fabio, o filho, contou.
25’02” Moro quer saber o motivo da visita.
25’33” Moro cita dona Marisa, dizendo que essa visita teria sido em Agosto de 2014.
25’50” Moro pergunta se Lula ou dona
Marisa orientou reformas no apartamento. Lula diz que não, mas que
quando ele esteve no apartamento apontou muitos defeitos.
26’50 Lula diz que dona Marisa não
gostava de praia, respondendo a pergunta de Moro a respeito da decisão
deles sobre ficar ou não com o apartamento. Lula explica que dona Marisa
talvez tivesse interesse no apartamento como investimento.
27’15” Lula diz que não comunicou a
OAS que não tinha interesse no imóvel porque dona Marisa estava em
dúvida se o queria ou não.
27’33” Moro quer saber se depois da
segunda visita dona Marisa resolveu ficar com o apartamento. Lula
explica que só soube depois que dona Marisa tinha feito uma segunda
visita ao imóvel.
28’10” Moro cita depoimento de Lula
no primeiro inquérito (do da condução coercitiva) e fica claro que Lula
dava as mesmas explicações a respeito do apartamento, inclusive com as
citações a dona Marisa, estando ela viva na época.
30’47” Moro diz que Lula disse que
decidiu não ficar com o apartamento depois da visita de dona Marisa.
Lula explica que ele está falando as mesmas coisas em ambos os
depoimentos (portanto, citando dona Marisa da mesma forma, quando ela
era viva e agora)
31’30” Moro cita dona Marisa,
querendo falar outra vez da segunda visita que ela fez ao apartamento. O
advogado de Lula interrompe dizendo que Lula acabou de explicar
exatamente isso. Lula volta a explicar e dessa vez diz:
“Lamentavelmente, ela [dona Marisa] não está mais viva para eu
perguntar”
32’17” Moro cita dona Marisa falando
do primeiro depoimento de Lula, o da condução coercitiva, ocasião em que
o delegado quis saber se dona Marisa esteve no apartamento para ver se
cozinha e elevador tinha sido instalados. Moro então pergunta se dona
Marisa contou a Lula sobre o estado do apartamento. Lula diz que não.
34’25” Lula, impaciente, cita dona
Marisa, dizendo que vai repetir o que vem dizendo: “O apartamento estava
no nome da minha mulher , ela queria fazer negócio”.
34’36” Moro quer saber se Lula sabe
se dona Marisa comunicou formalmente a OAS que não queria mais o
apartamento. Lula diz não saber.
37’40” Lula reclama da Lava Jato, dos
métodos da operação, e Moro pede que Lula tenha paciência. Lula diz: “É
que perguntar coisas para mim de uma pessoa que já morreu é muito
difícil”. Moro, solidário, diz: “Eu imagino”.
38’00” Moro cita dona Marisa falando
das visitas ao apartamento e ligando as reformas do Guarujá e de
Atibaia. Lula explica que o sítio é um outro processo, o advogado de
Lula pede que Moro se atenha ao processo do triplex.
47’40” Moro cita dona Marisa,
supostamente mencionada como “a dama” em conversa entre executivos da
OAS. Na conversa, “a dama” teria aprovado o projetos das reformas da
cozinha do Guarujá e de Atibaia. Lula diz que não pode responder por
mensagens trocadas entre terceiros.
52’00” Moro cita dona Marisa dizendo
que os projetos das reformas das cozinhas do sítio e do Guarujá teriam
sido submetidas a ela. Lula diz que não tomou conhecimento disso.
1h06” 30” Moro cita dona Marisa.
1h10’01” Moro cita dona Marisa
1h11’10” Moro mostra documento com
assinatura de dona Marisa feita em 2009 e pede explicação para as
circunstâncias dessa assinatura. Lula analisa documento e diz ter a
impressão que dona Marisa autorizou a venda do apartamento somente em
2012.
1h14’04” Lula diz: “Senhor Moro, é
muito difícil para mim toda a hora que o senhor cita minha mulher sem
ela estar aqui para se defender”. Moro diz que não está acusando dona
Marisa, Lula diz que sabe, “mas o senhor me pergunta se eu vi, se não
vi… sabe? Uma das causas que ela morreu foi as pressões que sofreu então
não quero mais discutir isso”
1h15’02” Moro cita dona Marisa sobre pedido de restituição dos valores pagos até ali
1h17’50” Moro cita nota do Instituto
Lula que fala do ressarcimento do montante pago. Nota é de 2014, quando
dona Marisa estava viva.
1h 29’ 09” Moro cita dona Marisa. Lula repete o que está dizendo desde o primeiro depoimento em relação a dona Marisa.
3h01’ Lula cita Marisa dizendo que na
época em que ela comprou a cota do apartamento o presidente da Bancop
era João Vaccari Neto, em resposta à pergunta feita pelo representante
do MP a respeito da relação entre Lula e Vaccari.
3h01’50” Representante do MP cita
dona Marisa a respeito de nota divulgada pelo Instituto Lula sobre o
apartamento no Guarujá, assunto que já havia sido tratado por Moro
minutos antes. Lula responde usando o nome de dona Marisa, já que foi
essa a pergunta.
3h03’05” Em nova resposta ao
representante do MP Lula diz que quem cuidava das coisas do apartamento
era dona Marisa, e que por isso não tinha conhecimento de como a cota
foi paga, e explica o que tem explicado há algum tempo: que foi dona
Marisa que comprou a cota.
3h08’55” Lula explica ao
representante do MP, respondendo pergunta sobre visita ao apartamento do
Guarujá, que dona Marisa autorizou a cota do apartamento a ser vendida.
3h12’04” O representante do MP cita a
visita que dona Marisa fez ao apartamento com o filho Fabio e quer
saber de quem foi a iniciativa para essa visita. Lula diz que deve ter
sido de dona Marisa, mas que ela não comentou com ele. Lula explica
outra vez que a cota era de dona Marisa.
3h22’27” Lula volta a dizer que quem
comprou a cota foi dona Marisa, repetindo o que disse no primeiro
depoimento, quando ela estava viva.
A partir daí, dona Marisa não é mais citada.
Não é possível adivinhar se foi expressamente combinado, mas é possível ter certeza de que foi sórdido.A partir daí, dona Marisa não é mais citada.
A conclusão de Milly Lacombe, há dois anos atrás, sem saber – como todos nós – que as citações a D. Marisa seriam usadas para fazer Lula parecer um covarde.
Fica claro, portanto, que quem trouxe
dona Marisa ao depoimento foram o juiz e o MP, que Lula usou o nome da
ex-mulher em respostas, e que ele não disse nada diferente do que já
havia dito no primeiro depoimento, quando dona Marisa ainda estava viva.
A narrativa de que Lula culpou a ex-mulher diante de Moro é cínica e covarde, e usar uma mentira para criar capa de revista e campanha publicitária é moralmente indecente.
Mas, mais do que isso, é apenas uma desesperada tentativa de alienar a opinião pública, sedenta por sentenças, e, com isso, tentar fazer com que ela não enxergue a completa falta de provas para condenar Lula pelo triplex do Guarujá.
O jogo é muito, mas muito sujo.
A narrativa de que Lula culpou a ex-mulher diante de Moro é cínica e covarde, e usar uma mentira para criar capa de revista e campanha publicitária é moralmente indecente.
Mas, mais do que isso, é apenas uma desesperada tentativa de alienar a opinião pública, sedenta por sentenças, e, com isso, tentar fazer com que ela não enxergue a completa falta de provas para condenar Lula pelo triplex do Guarujá.
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