Os EUA fizeram a Lava Jato e dela se beneficiam
Estudo da UFRJ mostra como EUA instalaram a bactéria que desestruturou o Brasil
publicado
14/06/2019
A guerra de todos contra todos e a Lava Jato: a Crise Brasileira e a vitória do Capitão Jair Bolsonaro
Eduardo Costa Pinto
Professor do Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
José Paulo Guedes Pinto
Professor do Bacharelado de Relações Internacionais na Universidade Federal do ABC
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
Alexis Saludjian
Professor do Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
Isabela Nogueira
Professora do Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
Paulo Balanco
Professor do Faculdade de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Economia da UFBA
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
Carlos Schonerwald
Professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
Grasiela Baruco
Professora da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)
Membro do Grupo de Análise Marxista Aplicada (GAMA)
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A Lava Jato e os interesses externos
A existente colaboração entre o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e a Lava Jato nos lança luz a respeito da conexão entre os interesses externos e internos. Para muitos analistas, as primeiras informações sobre a corrupção na Petrobras e suas conexões com as empresas líderes da construção civil nacional, obtidas pela Lava Jato em Curitiba, teriam vindo do Departamento de Justiça americano repassadas, provavelmente, pela Agência Nacional de Segurança (NSA), a mesma Agência que espionou a Petrobras por estar interessada na exploração em águas profundas da camada pré-sal. Isso não significa dizer que há um cérebro da Lava Jato fora do país, mas sim que ocorreram convergências de interesses entre agentes externos e internos. Os órgãos de inteligência americanos, ao passarem as informações sobre a corrupção na Petrobras, inocularam uma bactéria perigosa no organismo institucional brasileiro mas que, provavelmente, poderia ter sido contida por anticorpos institucionais básicos em sua fase inicial de proliferação. No entanto, a bactéria foi se nutrindo e ganhando força em virtude dos alimentos fornecidos (crise econômica, republicanismo tupiniquim da Dilma, flexibilização do regramento jurídico, legitimidade da Lava Jato, impeachment/Golpe Parlamentar, messianismo) por diversas forças sociais nacionais (frações de classe, políticos, burocracia estatal, classes médias, STF, etc.) que buscavam alcançar seus interesses num contexto de crise econômica e política. Essas forças sociais achavam que, cada uma delas individualmente, poderiam conter a contaminação bacteriana ou direcioná-la para destruir seus competidores, adversários e desafetos. Com isso, a bactéria ganhou uma força inimaginável e segue deixando um rastro de degradação institucional e de desestruturação de bases produtivas. No que diz respeito aos interesses internos (integrantes da força tarefa), a colaboração com órgãos norte-americanos permitiu acessar informações sobre os mecanismos de corrupção intrínsecas do capitalismo patrimonialista brasileiro, criando, para eles – em seus delírios liberais difusos e messiânicos – as condições para “passar a limpo” o país, sendo necessário para isso um período de expurgação em que o combate a corrupção mais do que compensaria a deslegitimação política e institucional e a desestruturação das empresas brasileiras. A desestruturação das bases produtivas e institucionais brasileiras interessa sim aos agentes externos, especialmente aos norte-americanos e seu estado nacional, pois isso (i) possibilitou a abertura da exploração do pré-sal para as empresas estrangeiras e (ii) a ampliação de vendas de equipamentos para essa exploração por empresas estrangeiras, como a americana Halliburton ; (iii) desestabilizou o engajamento do Brasil aos arranjos configurados pelos BRICS; (iv) desestabilizou a presença das empresas de construção civil nacional (Odebrecht, OAS, Camargo Correia) na América Latina e África, abrindo espaços para novos entrantes; (v) permitiu a compra da Embraer pela empresa norteamericana Boeing; e (iv) possibilitou o acordo de uso da base de Alcântara pelos EUA. É sabido que no tabuleiro do sistema internacional os Estados nacionais mais poderosos patrocinam ou auxiliam o ataque contra outra estrutura econômica e institucional de menor envergadura. Nesse sentido, os agentes governamentais americanos, que colaboram com a Lava Jato, têm como objetivo maior (em essência) a defesa dos interesses do seu país (do seu Estado e de suas empresas), sendo que a defesa abstrata e idealizada contra a corrupção é apenas a aparência desse processo de colaboração. Por outro lado, os condutores da Lava Jato não percebem esse tipo de movimento, pois eles estão enraizados em uma visão liberal difusa (combate ao capitalismo patrimonialista) e messiânica, sem levar em conta os interesses nacionais. Isso pode ser exemplificado com a iniciativa de uma instituição nacional (MPF brasileiro) em ajudar autoridades dos Estados Unidos a aplicar uma multa milionária contra a empresa brasileira Embraer – que foi acusada de pagamento de suborno para autoridades da República Dominicana durante negociações para venda de aviões. Não seria demasiado lembrar que a Embraer – que foi comprada recentemente pela Boeing americana –, a Petrobras e a Odebrecht atuam no mercado internacional competindo com empresas norte-americanas e europeias. Poderíamos imaginar se algum procurador norte-americano repassaria informações de suas empresas nacionais para procuradores de outros países como o Brasil? Quando as empresas se internacionalizam os estados nacionais funcionam como ponta de lança nesses processos, defendendo os interesses de suas empresas transnacionais em espaços estrangeiros. Em linhas gerais, é possível afirmar que a criminalização da operacionalidade da acumulação capitalista brasileira, por parte da Lava Jato, tem funcionado como um mecanismo de desestruturação de empresas e de suas cadeias, o que abriu espaço para a entrada de empresas internacionais.
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Conclusões
Procuramos, ao longo deste trabalho, analisar a crise do capitalismo brasileiro buscando evidenciar que os problemas da acumulação se avolumaram com a crise institucional. Tal crise é fruto da utilização, por parte da Lava Jato, da flexibilização do regramento legal e da instabilidade como seu instrumento de poder para combater a corrupção. Esse mecanismo, quando posto em movimento, provocou uma guerra de todos contra todos no país. Esse contexto crítico abriu a possibilidade para que certas forças sociais, desgarradas dos setores dominantes nacionais, as quais teriam pouca capacidade de controlar ou desestabilizar a ordem vigente, ganhem autonomia própria diante do bloco no poder e da cena política, passando pelos integrantes da força tarefa da Lava Jato (procuradores, delegados, juízes de 1ª instância), até Jair Bolsonaro, que se tornou presidente do Brasil. A crise institucional, originária do mecanismo da operação Lava Jato e impulsionada pela vitória eleitoral de Jair Bolsonaro, retroalimenta a crise de acumulação (baixíssimo crescimento econômico) que é aprofundada pelo “consenso da insensatez” dos setores dominantes brasileiros que apostam, desde o governo Temer, no ajuste fiscal e nas reformas (trabalhista, do teto dos gastos e da previdência) para estabelecer o crescimento. Tal postura acelera e aumenta a instabilidade. Os Brumários tupiniquins permanecem com o governo Bolsonaro. Todos chantageiam todos para alcançar seus interesses específicos e as instituições seguem perdendo legitimidade, inclusive as Forças Armadas, que entraram no projeto bolsonarista. Diante disso tudo, os interesses externos são, por hora, os maiores beneficiados.
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