sab, 01/03/2014 - 10:14
- Atualizado em 01/03/2014 - 10:25
Há dois tempos na vida de um Ministro do STF (Supremo Tribunal - Atualizado em 01/03/2014 - 10:25
Federal): o momento prévio à indicação e o momento depois de indicado.
Antes da indicação, ele necessita da aprovação do presidente da
República. Para espíritos menores, é o momento da lisonja, das
articulações políticas, das promessas futuras. Para espíritos políticos,
a afinidade com o padrinho ou com o projeto político.
Depois da indicação, cessa qualquer subordinação ao Executivo. O
Ministro torna-se irremovível e a salvo de qualquer pressão. O único
poder capaz de afetá-lo é a mídia, seja expondo-o a críticas, ao
deboche, a denúncias consistentes ou a escândalos vazios.
Os espíritos maduros mantém a altivez; os espíritos menores, exorbitam.
***
Poucos têm a solidez de um Ricardo Lewandowski para remar contra a
maré e não se deslumbrar com as luzes dos holofotes. E nenhum deles foi
fruto tão direto da meritocracia quanto Luís Roberto Barroso.
Em que pese seu inegável preparo, Celso de Mello e Sepúlveda Pertence
assumiram por favores explícitos prestados ao governo Sarney e ao
polêmico Ministro da Justiça Saulo Ramos. Marco Aurélio de Mello deve o
cargo ao primo Fernando Collor. Gilmar Mendes foi nomeado por FHC para
blindá-lo de qualquer aventura jurídica futura do STF; Lula nomeou Dias
Toffoli com a mesma intenção. Joaquim Barbosa entrou na cota racial;
Ayres Britto recorrendo a padrinhos; e Luiz Fux, à dupla malandragem, de
prometer “quebrar o galho” antes, e de não cumprir com a palavra
depois.
***
Há muitos anos Luís Roberto Barroso já era unanimidade no meio jurídico.
Sua indicação não foi um favor da Presidente a ele; foi um favor dele
às instituições, especialmente a uma instituição ameaçada, como o STF.
Com vida tranquila, titular de uma banca de alto nível, com
reconhecimento geral, sendo aceito pelo meio econômico, social e
midiático do Rio, um dos preferidos da Globo, o que teria a ganhar indo
para o STF?
Certamente, não o prêmio do reconhecimento, que já tinha; ou da
popularidade, que não o cativa. Parece que queria algo mais substantivo.
***
Ao se insurgir contra o julgamento anterior da AP 470, para o crime
de formação de quadrilha, aparece o objetivo. Barroso tem muito a perder
– a simpatia da mídia, a tranquilidade da unanimidade, a blindagem
contra ataques, a exposição pública (porque televisionada) às baixarias
de valentões de bar, como Joaquim Barbosa ou Gilmar Mendes, até os
ataques presenciais, como os que sofreu Lewandowski.
E o que teria a ganhar expondo as mazelas de seus pares, indagariam
os cidadãos (e Ministros) que enxergam o mundo da planície das vaidades
pontuais? Não precisa do Executivo, não se identifica em nada com o PT,
não tem as pretensões políticas de Joaquim Barbosa, nem as comerciais de
Gilmar Mendes, nem quer entrar no grito na história, como Celso de
Mello. Não precisa incorrer no ridículo permanente de um Ayres Britto
para ser aceito pelo establishment: já faz parte da elite social e
jurídica do país.
Seu único objetivo foi o da restauração da imagem do Supremo – e, a
partir dela, do direito -, afetada pelos exageros de um julgamento que
tinha de tudo para ser exemplar. Como um pedagogo, pregar a lição de que
não há politização que justifique a instrumentalização da justiça, como
os atos que cometeram em co-autoria Joaquim Barbosa, Gilmar Mendes,
Luiz Fux, Celso de Mello, Marco Aurélio de Mello e Ayres Britto.
Em toda minha carreira jornalística, poucas vezes testemunhei ato tão
desprendido e apaixonado de amor à profissão quanto a atitude de
Barroso.
Confirma o que ouvi de grandes juristas, antes da sua posse: Barroso é
uma instituição maior que o próprio STF de hoje. É um iluminista em uma
terra em que a selvageria insistentemente se sobrepõe à civilização.
PS – Na esteira da rebeldia legitimadora de Barroso, outro brado,
agora de mais um jornalista em defesa dos fatos: o depoimento do
setorista do Estadão no STF, repórter Felipe Recondo, relatando o que
viu e ouviu nos bastidores do julgamento da AP 470, e rompendo a cortina
de silêncio que foi auto-imposta pelos setoristas menos jornalistas, e
impostas aos verdadeiramente jornalistas.
O Estadão sonegou a informação de seus leitores: ela ficou restrita ao blog do repórter.
Em sua matéria, mostra que Joaquim Barbosa não acreditava na peça
acusatória do Procurador Geral da República, Roberto Gurgel.
Considerava-se inconsistente e sem provas contra seu principal alvo,
José Dirceu. E que o aumento da pena, no crime de formação de quadrilha,
era essencial para completar o jogo.
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