Decepção da mídia
Michel Temer recuou. É da sua natureza.
Nasceu para os ardis. A sua reforma da Previdência passou de orangotango
a mico sem qualquer mágica. A voracidade reformista está parindo um
ratinho. A mídia da turma dos camarotes cospe marimbondos de fogo por
causa disso. Sente-se traída. Passei a semana lendo colunas da Folha de
S. Paulo, de O Estado de S. Paulo e de O Globo. Sou profissional. Cumpro
meus deveres. Vi lágrimas e mais lágrima. Assisti a telejornais da Rede
Globo, da Band e da GloboNews. Emociona ver e ouvir jornalistas de
salários milionários lamentando que a plebe escapará do tido por
necessário arrocho das aposentadorias para salvar o nosso futuro.
Não há qualquer constrangimento em misturar previdência e seguridade
social. Apresenta-se como indiscutível esta relação: o dinheiro
arrecadado pelas contribuições é muito menor do que o necessário ao
pagamento dos benefícios. Até os gelatinosos comentaristas da GloboNews,
mais neoliberais do que os antigos neoliberais, sabem, no entanto, que
essa relação não diz toda a verdade, pressupondo-se que diga alguma
verdade. A diferença vem da falta de contribuições. Se isolar
contribuições e benefícios, não há rombo. Tudo sai do mesmo caixa? Mas
são rubricas diferentes. Uma coisa é a legítima necessidade de dar
sustento aos vulneráveis, que o governo queria sovar, com dinheiro dos
impostos e outra é defender que esse recurso tenho de sair da
contribuição previdenciária. Sabe-se também que o dinheiro da
previdência não sai só das contribuições.
Nunca se deve sacrificar o ofídio sem acenar com o instrumento de
execução. Hélio Schwartsman, colunista da Folha de S. Paulo, que adora
cientificizar suas opiniões, regurgitou com sua tradicional incapacidade
de empatia: “Que certas categorias profissionais, sindicatos e pessoas
prestes a aposentar-se pressionem para defender seus interesses é
esperado. Faz parte da democracia. O sistema político, porém, deveria
atuar como o córtex pré-frontal e modular os impulsos mais imediatistas
com o propósito de assegurar uma transição ao mesmo tempo mais tranquila
e mais justa para grupos com menor capacidade de vocalização, incluídas
aí as próximas gerações”.
O grupo com menor capacidade de vocalização no Brasil é dos
detentores das grandes fortunas. Não faz manifestações, não berra nos
microfones, mantém-se fleumaticamente nos seus bastiões dourados. Leva
tudo. Ninguém se atreve a sobretaxá-lo, como em outros países, para que
dê a sua contribuição ao equilíbrio das contas nacionais. É um pessoal
sensível. Qualquer pressão o desestimula. Se duvidar, corre para o
estrangeiro. Só traz seu capital de volta quando alguma anistia é
aprovada transformando crime em pacto pela salvação do país. É
lamentável que patriotas não aceitem se aposentar aos 65 anos e morrer
aos 66 pelo grande bem do equilíbrio fiscal. Egoístas.
Há um ímpeto de luta contra privilégios. Beleza.
Não tenho visto, porém, lufadas capazes de atingir as benesses dos
parlamentares e os auxílios que adornam a vida dos magistrados.
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