O lucro do Itaú e a farra dos bancos |
O lucro do Itaú e a farra dos bancos |
O grupo Itaú-Unibanco registrou em 2013 o maior lucro anual de um
banco no Brasil. Nunca antes na história desse país a banca ganhou tanto
dinheiro.
Todo mês de fevereiro a história se
repete. Pouco a pouco começam a pipocar pela imprensa notícias a
respeito dos resultados econômicos dos bancos para o exercício do ano
anterior. Em geral, os números são indecentes, para dizer o mínimo!
Aquela coisa mesmo que chega ao ponto de causar vergonha alheia, em
especial para quem tem um mínimo de preocupação com noções como justiça
distributiva e equidade social.
Até o presente momento, nesse
início de 2014, o centro das atenções do povo do financismo tem sido o
mega conglomerado financeiro do Itaú. Aquele que já era um dos grandes
do sistema financeiro e que acabou se fundindo com o Unibanco em 2008,
constituindo um gigante ainda maior. Essa operação de reforço da
centralização e da oligopolização do setor acabou contando com todo o
apoio do órgão que, ao contrário, deveria zelar pela defesa da
concorrência – o CADE.
Pois então, o grupo Itaú-Unibanco
registrou em 2013 o maior lucro anual de um banco no Brasil. Nunca antes
na história desse país a banca ganhou tanto dinheiro. Na verdade, a
cada ano as instituições financeiras se revezam, nessa espécie de
disputa acirrada, com o intuito de saber quem é que vai ocupar o
primeiro lugar no quesito da lucratividade. Um campeonato do qual
ninguém deveria ter nada do que se orgulhar, uma vez que apenas serve
para confirmar o grau das desigualdades que nossa sociedade acolhe em
seu interior.
Itaú: mais um lucro recorde em 2013
Ao
longo do ano passado, esse banco privado apurou o lucro líquido de R$
15,7 bilhões. Isso significa que depois de todos os exercícios
elaborados e requintados do chamado “planejamento tributário”, ainda
assim ficaram registrados esses valores para serem apropriados entre
seus dirigentes, proprietários e acionistas.
Isso porque a
legislação tributária oferece um sem-número de caminhos e atalhos para
que as empresas não sejam alcançadas pela incidência dos impostos. Como
nosso sistema impositivo é descaradamente regressivo, as camadas de
menor renda – os assalariados basicamente – acabam contribuindo muito
mais para o fisco do que os detentores do capital.
O mesmo Itaú
já detinha o recorde anterior de maior lucro anual dentre as
instituições financeiras, quando apresentou um resultado de R$ 13,8 bi
em 2011.
O Bradesco atingiu R$ 12 bi em 2013. O Banco do Brasil
chegou a 12,7 bi em 2011. Enfim, entre avanços de muitos e recuos de
alguns poucos, o fato é que todos eles ganham muito dinheiro nessa terra
em que se privilegia o lucro fácil e derivado da atividade parasita. A
título de comparação, vale lembrar alguns eventos para se ter uma
dimensão de tais valores. Em 2012 e 2011, por exemplo, os 5 maiores
lucros dos bancos atuando no Brasil somaram R$ 50 bi. Esse montante é
superior ao que seria a estimativa de arrecadação anual da Contribuição
Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que foi extinta em
2007. Ou seja, tratava-se de uma campanha muito bem orquestrada pelo
próprio financismo para acabar com aquela importante base tributária da
saúde e que tinha como foco de arrecadação as operações bancárias e das
finanças em geral.
Lucratividade dos bancos: supremacia do financismo
Essa
realidade escandalosa de lucros monstruosos é apenas mais uma
demonstração concreta da supremacia absoluta do sistema financeiro sobre
o conjunto de nossa sociedade. Em nossas terras, a banca ainda consegue
exercer sua hegemonia política e ideológica, tendo atravessado sem
maiores sobressaltos o período de severa turbulência da crise
internacional, a partir de 2008. As filiais dos conglomerados
internacionais, por exemplo, usaram e abusaram de suas operações por
aqui para remeter lucros em direção às matrizes e, assim, buscar uma
forma de aliviar as suas dificuldades em escala global.
Apesar de
ser considerada pelo mundo afora como atividade estratégica e de
elevada importância para o desempenho das economias no plano nacional e
global, o setor financeiro ainda consegue resistir a qualquer tentativa
de regulamentação. No Brasil o financismo se impõe através dos meios de
comunicação, das universidades, das instituições de pesquisa e das áreas
econômicas dos governos. Seu discurso e sua lógica de funcionamento são
incorporados pelos formadores de opinião e pelos formuladores de
políticas públicas como se fosse algo “normal”. Esse processo de
naturalização da exploração e da desigualdade procura transformar os
bancos em entidades simples e ordinárias, como todas as demais de nosso
tecido social. Sofrem demais, produzem muito, contribuem para o
crescimento da economia e ainda - coitadinhos! – têm de pagar impostos.
A
realidade, no entanto, é bem diversa. Os bancos operando no Brasil
apresentam as maiores taxas de lucratividade do mundo. Contribui para
tanto o ambiente favorável de taxas oficiais de juros elevadíssimas há
décadas e seu papel de destaque na administração do processo de
endividamento público. Os sucessivos governos gostaram das regras desse
jogo e se fizeram reféns do poder do financismo. O maior exemplo foi a
longa permanência de Henrique Meirelles à frente do Banco Central (BC).
Durante os 2 mandatos do Presidente Lula, o responsável pela política
monetária foi aquele que havia sido, até às vésperas de sua nomeação, o
presidente internacional do Bank of Boston. Ninguém duvida de qual tipo
de interesse ele defendeu ao longo do período que passou por Brasília.
Necessidade de um BC que regule e fiscalize.
Contando
com a conivência e a solidariedade do órgão regulador e fiscalizador, a
banca nada de braçada nesse mar revolto, em que se apropria de todo o
tipo de excedente gerado na atividade produtiva e na vida das famílias
em geral. O “spread” praticado pelas instituições financeiras é também
dos mais elevados do planeta. Trata-se simplesmente da diferença que
existe entre a taxa que ele remunera os depósitos que são ali aplicados e
a taxa que ele cobra dos que emprestam recursos sob a forma de crédito
ou empréstimo. O BC se omite em sua obrigação legal e institucional de
fiscalizar e regular essa prática espoliadora.
Por outro lado, os
bancos também auferem resultados enormes por meio das tarifas, sempre
exorbitantes, que cobram de seus clientes. Ora, os serviços prestados
por tais instituições são de natureza pública e as mesmas operam em
regime de oligopólio. Caberia ao órgão regulador zelar pelos interesses
dos agentes mais frágeis na relação comercial que envolva o setor
financeiro. Na prática, no entanto, a lógica de funcionamento do BC é a
oposta. Os bancos contam liberdade total para impor os preços que bem
entendem sobre esses serviços, que se tornam a cada dia mais universais e
inescapáveis para o cidadão comum. A generalização das operações
virtuais e a universalização do uso dos cartões terminam por reforçar o
papel das instituições financeiras na vida das empresas, das famílias e
dos indivíduos.
Frente a um quadro como esse, o governo não pode
continuar se comportando de forma passiva, sempre na espera das
“contribuições” do financismo para formular sua própria política
econômica. São amplamente conhecidos os temores de tomar essa ou aquela
decisão, sob pena de encontrar alguma resistência no interior do sistema
financeiro. Ou ainda as pesquisas institucionalizadas pelo BC junto aos
representantes da banca para avaliar a condução da política econômica e
monetária, com a consequente obrigação de atender aos pleitos do setor
no que se refere, por exemplo, à definição da taxa oficial de juros.
Durante os dias que antecedem as reuniões do COPOM, as pressões se
exercem por meio da exigência de cumprimento das previsões desse ente
onipotente e onisciente, o poderoso mercado.
É passada a hora de
transformar o BC em órgão regulador fiscalizador, de fato. O debate
eleitoral pode se transformar em momento oportuno, pois a antiga
reivindicação de “independência do BC” nem surge mais na imprensa. A
explicação é que tal realidade já existe na prática. Ele se apresenta,
no dia a dia de seu funcionamento, com muito mais do que a “simples
autonomia” prevista em lei. Ele usufrui de uma quase “independência” de
atuação. A qualificação recebe muitas aspas, pois o BC pode até ser
independente da maioria da sociedade, a quem não presta contas. Mas é
completamente dependente do financismo, a quem obedece de forma
sistemática e cheio de entusiasmo.
(*) Economista e militante por um mundo mais justo em termos sociais e econômicos.
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